Comemora-se se hoje o 86º aniversário da Revolução Constitucionalista de 1932, e como acontece
desde 1997, é feriado no estado de São Paulo (por conta disso, os paulistas têm
mais um final de semana prolongado —
que seria ainda maior se a seleção brasileira não tivesse sido derrotada pela
belga, na última sexta-feira, mas isso já é outra conversa).
Para os que
faltaram às aulas de história, a Revolução de 32 não foi exatamente um movimento separatista, mas constitucionalista, já que exigia uma
nova Carta Magna. Seja como for, trata-se do maior confronto armado
do século XX no Brasil, que mobilizou 100 mil homens e mulheres (entre tropas
paulistas e federais) e resultou em quase 800 mortes (número superior ao das
baixas contabilizadas durante a participação do Brasil na Segunda Grande Guerra).
Tudo começou
quando Getúlio Dornelles Vargas, inconformado
com sua derrota na eleição presidencial de 1930 e apoiado pelos mineiros,
gaúchos e paraibanos, usurpou para si a
presidência desta Banânia — isso, sim, foi um golpe de estado como manda
o figurino, ao contrário do impeachment
de certa ex-presidanta incompetenta, que foi constitucionalmente expelida do
Planalto devido ao nefasto conjunto de sua obra, embora o “motivo oficial” tenha
sido o crime de responsabilidade representado pelas famosas “pedaladas fiscais”.
Até
o início da “Segunda República” — ou
“Era Vargas” —, o Brasil era regido
pela “política do café com leite”, assim
chamada devido ao fato de oligarquias de São
Paulo e Minas Gerais se revezarem
na presidência do País. Ao tomar o poder, o tiranete de São Borja dissolveu os congressos estaduais e
municipais e nomeou interventores nos estados, o que desagradou a elite
paulista.
Vale frisar que São Paulo concentrava a cultura do café, responsável
pela maior parte do orçamento do País, e os grandes fazendeiros não viram com
bons olhos a legislação trabalhista articulada pelo ditador, a quem atribuíram —
a ele e aos que o apoiavam — a pecha de “comunista”.
Com a “Nova República,
as relações entre São Paulo e o governo federal se tornaram cada vez mais
tensas e marcadas pela insatisfação dos paulistas, que não só se viram
obrigados a “engolir” os interventores, mas também perderam o controle sobre as
decisões referentes à política econômica — o que afrontou os cafeicultores. Mas
o acirramento atingiu seu ápice com a nomeação de um interventor, que deveria
ser civil e paulista, segundo as exigências das forças políticas agregadas na
Frente Única.
No dia 23 de maio (que hoje dá nome a uma das principais
avenidas de Sampa), quando seria anunciado o secretariado de Pedro de Toledo (que empresta o nome a
uma rua e um viaduto aqui na capital), formou-se um monumental comício na Praça
do Patriarca. Parte dessa multidão, inflamada, dirigiu-se ao Palácio dos Campos Elísios, onde seria
feito o anúncio. Na confusão, jornais getulistas foram atacados e o tumulto
resultou na morte de 13 pessoas, além de muitos feridos. Entre os mortos estavam
os estudantes Miragaia, Martins, Dráusio
e Camargo, alçados à condição de símbolos do movimento por meio da sigla “MMDC” (que os menos informados tomam
pela representação do número 2.600 em algarismos romanos).
Observação: O Obelisco do Ibirapuera —
um dos monumentos mais emblemáticos de São Paulo, inaugurado em 1955 e batizado
oficialmente de Obelisco Mausoléu aos
Heróis de 32 — faz referência à revolução. Lá estão sepultados os corpos dos
quatro “mártires da revolução” e de outras 713 pessoas que sucumbiram na luta contra
a ditadura de Vargas.
A revolução eclodiu
na noite de 9 de julho terminou a 1º de outubro, com a rendição dos paulistas. Nesse
interregno, centenas de combatentes se alistaram, indústrias se mobilizaram
para oferecer armamentos e a população se uniu na chamada campanha do Ouro para o Bem de São Paulo. Vargas, numa tentativa de aproximação
com a elite local, nomeou para a chefia do governo do estado o paulista civil Armando de Sales Oliveira, engenheiro,
empresário e cunhado de Júlio de Mesquita
Filho, herdeiro do fundar do jornal O Estado de S. Paulo
— publicação que existe até hoje e que também se envolveu ativamente na revolução
de 1932.
O tão falado viés
separatista foi secundário, mas nem por isso deixou de existir. De
acordo com a historiadora Ilka Stern
Cohen, figuras proeminentes na década de 1930, como o escritor Monteiro Lobato, o historiador Alfredo Ellis Junior e o advogado e
poeta Tácito de Almeida, eram
separatistas. Mas a verdade é que, para combater a revolução, Vargas, numa jogada política que visava
obter o apoio de outros estados, classificou o movimento de separatista.
Desde 1822,
quando o Brasil se libertou do jugo português, vez por outra surgem movimentos
separatistas aqui e acolá. Segundo o site do Movimento São Paulo Livre — que luta por
tornar o estado uma unidade independente —, existem documentos que comprovam
que o rei de Portugal era alertado para vigiar de perto os paulistas, devido a
seu “excessivo amor à liberdade”.
De
um tempo a esta parte, cada vez mais iniciativas que tais despontam no horizonte,
não havendo estado ou região que não esteja nos planos de independência de
algum grupo: Sul, Nordeste, Norte, São Paulo, Rio, Minas, Ceará, Roraima... e
até mesmo o Distrito Federal.
Curiosamente,
embora todos esses grupos pugnem por separar seus estados ou regiões dos demais,
alguns pontos em comum os levam a se unir pela mesma causa, qual seja lutar pela independência regional ou
estadual, hoje proibida por cláusula
pétrea Constituição Federal (ou seja, que não pode ser modificada).
Em 2016,
movimentos separatistas de São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Espírito
Santo, Roraima, Paraná e Rio Grande do Sul formaram a Aliança Nacional, cujo objetivo é criar um partido para mudar a
Constituição e permitir a independência. Em junho do ano passado, nove grupos
publicaram o Manifesto dos Movimentos
Independentistas do Brasil, assinado por representantes de entidades que
defendem a separação das regiões Sul, Nordeste e Norte e os estados do Rio de
Janeiro, São Paulo e Espírito Santo.
Para os
separatistas paulistas, São Paulo é a “locomotiva
do Brasil”; as Bandeiras que desbravaram o sertão saíram daqui; o grito de
independência, atribuído a D. Pedro I,
foi dado às margens do Riacho do Ypiranga
(onde hoje fica o Parque da
Independência, na zona sul de Sampa), e por aí afora. Durante a primeira
república, São Paulo era indubitavelmente a unidade mais próspera, desenvolvida
e importante da Federação, e a mim me parece que pouco ou nada mudou desde
então. Mas isso já é outra conversa e fica para uma próxima vez.
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