Já nem sei quantas vezes modifiquei este texto ou adiei sua
publicação, tantos foram os fatos e versões que se sucederam desde que a Folha denunciou a
laranjada do PSL nas eleições, transformando o cenário político
numa espécie de figura produzida num caleidoscópio. E se a novela Fabrício Queiroz/Flávio Bolsonaro — que ainda não terminou — já continha
elementos bastantes para preocupar o núcleo do governo, este novo folhetim está aí
para provar que nada é tão ruim que não possa piorar.
Até onde a vista alcança, a crise que culminou com a exoneração do
secretário-geral da Presidência se deve em grande medida a Carlos Bolsonaro, que nunca simpatizou com Bebianno e sempre teve ciúmes de sua influência sobre o pai. A essa antipatia se acirrou o filho do capitão se viu sem cargo no governo, enquanto o desafeto ganhou um ministério. Aliás, de tudo
que vi, li e ouvi sobre esse rebosteio, nada supera o tuíte do impagável J.R. Guzzo, que reproduzo a seguir:
“Ninguém na oposição está
conseguindo prejudicar mais o trabalho do governo do que os três filhos do
presidente. Não importam as intenções de cada um, mas sua conduta pública; o
que fazem está sabotando o país. Ou Bolsonaro faz os três se calarem, hoje, ou
vira um banana completo.”
Cabe ao Presidente da República escolher seus ministros e demiti-los
a qualquer momento, a seu talante. Mas a demissão serôdia de Bebianno, oficializada
quase uma semana depois de a Folha denunciar o laranjal do PSL, produziu uma crise que talvez não tivesse existido se Carlos Bolsonaro não se aproveitasse da
situação para se vingar do desafeto, desmentindo as conversas que ele afirmou ter tido com o Presidente, como forma de minimizar o estrago produzido
pela denúncia da Folha.
Bebianno foi um
dos primeiros a vislumbrar o potencial da candidatura de Jair Bolsonaro, a quem auxiliou de diversas maneiras ao longo do
trajeto que o levou o capitão da Câmara ao Planalto. Ele nega
as irregularidades, afirmando que não, como presidente nacional
do PSL, não escolheu as candidatas que receberam dinheiro do partido, já que
isso é prerrogativa dos diretórios regionais. Se a mágoa pode transformá-lo em “homem-bomba”, bem, sabemos que conhecimento é poder.
Pelo visto, nem a nota lacônica lida pelo porta-voz da Presidência, na última segunda-feira, agradecendo os
valorosos serviços prestados pelo ex-ministro, nem o pronunciamento feito em seguida pelo próprio Presidente, que elogiou tanto a
atuação de Bebianno na campanha quanto sua dedicação ao cargo que ocupou por 50 dias, tiveram o condão de evitar a sucessão de desdobramentos que a mídia
vem explorando alegremente, com destaque para os áudios que Veja divulgou na última terça-feira, e
que, salvo melhor juízo, desmentem a versão de Carlos Bolsonaro (endossada pelo próprio Presidente), sobre Bebianno não teria conversado com o chefe. A menos, naturalmente, que não se considere como conversa uma troca de mensagens feita
pelo WhatsApp, mas isso seria flertar
com o ridículo. A pergunta é: Quem mentiu em toda essa história? Responda quem
souber.
Observação: O jornalista Augusto Nunes, durante a transmissão do programa OS PINGOS NOS IS, na Rádio Jovem Pan, assumiu a responsabilidade pela
divulgação dos áudios com as conversas por WhatsApp
entre Bolsonaro e Bebianno, que lhe foram repassados
pelo próprio ex-presidente do PSL.
Sem passado político nem mandato popular, Bebianno só ganhou maior protagonismo
devido aos recorrentes entreveros com zero
dois, a quem o Presidente se refere
carinhosamente como “meu pitbull” — aliás,
Carluxo anunciou praticamente todos
os ministros pelo Twitter, com
exceção de Bebianno, com quem disputava
desde a campanha o controle da comunicação digital do capitão. Por outro lado,
sua exoneração preocupa políticos, militares e assessores mais próximos do núcleo do governo, que receiam ter suas conversas privadas vazadas para o público pelos filhos do capitão, que usam suas contas no Twitter
como metralhadoras giratórias sem controle, mirando em qualquer um.
Parafraseando o Major
Olímpio, líder do PSL no Senado,
“Bolsonaro
precisa fazer uma modulação do papel de pai com o papel de Presidente, assim
como seus filhos têm que fazer o mesmo. Qualquer espécie de confusão entre
esses papéis pode ser realmente desgastante em alguns
episódios”. Mesmo assim, o senador
afirma que a saída de Bebianno não deve atrapalhar a articulação política do
governo para aprovar a reforma da Previdência e o pacote de medidas
anticrime. Parafraseando a mim mesmo, urge livrar o governo dessa aura de
pseudo realeza e conscientizar os pseudo príncipes de que eles devem cuidar de
seus próprios mandatos e deixar o comando da nação a cargo de quem foi eleito
para comandá-la.
Nesse meio tempo, a Folha
critica a Globo e classifica o SBT e a Record de emissoras “chapa-branca”. Para quem aprecia esse tipo de "jornalismo", recomendo dar uma lida nesta
matéria. Antes de encerrar, algumas linhas da lavra de Augusto Nunes e, em seguida, a opinião de Josias de Souza.
"O preço pago por Jair Bolsonaro para livrar-se de um
ministro que nada fez de errado merece ser festejado por quem torce para que o
governo dê certo. Na semana passada, o vereador Carlos Bolsonaro, que
desencadeou a crise ao chamar Gustavo
Bebianno de mentiroso, foi enfim devolvido ao local do emprego. E
reapareceu na Câmara Municipal do Rio depois de meses de sumiço. Levou com ele
o primo Leonardo Rodrigues de Jesus,
vulgo Leo Índio.
Desde 1º de janeiro,
quando desfilou no Rolls Royce presidencial com os pés sobre o banco traseiro, Carlos Bolsonaro permaneceu 24 horas
por dia ao lado do pai. Hospedado no Palácio da Alvorada, ia de manhã para o
Palácio do Planalto e ficava até o fim do expediente acampado no gabinete
presidencial. Essa rotina só foi interrompida com a viagem do chefe de governo
a Davos.
Carlos não desgrudou do
pai nem mesmo no período em que Bolsonaro
permaneceu hospitalizado, recuperando-se da terceira cirurgia desde o atentado
ocorrido em Juiz de Fora. Léo Índio,
por sua vez, foi 58 vezes ao Palácio do Planalto nos 49 dias de novo governo. A
menos que tenha usado a alcunha como currículo para virar assessor especial
para questões indígenas, ele não ocupa nenhum cargo oficial. Carlos e Léo Índio sumiram do Planalto. São duas
ausências que preenchem uma lacuna. Ou duas."
Segue o texto de Josias de Souza:
"O vídeo divulgado pelo Presidente após o anúncio oficial da exoneração de Bebianno foi gravado por exigência do ex-ministro. O teor do pronunciamento foi minuciosamente negociado, com direito rasgados elogios. Em troca do silêncio do ora desafeto, Bolsonaro ladrilhou com pedrinhas de brilhante o caminho percorrido por Bebianno desde a coordenação da campanha presidencial até a poltrona de ministro, passando pelo período em que exerceu o comando de um PSL cítrico. Apenas os dois conhecem na plenitude os segredos que compartilham, mas o desfecho da negociação sinaliza o potencial destrutivo de uma eventual inconfidência.
Numa articulação que teve o ministro Onyx Lorenzoni como principal intermediário, Bebianno esclareceu que não aceitaria calado a "humilhação" de ser exonerado sob as pechas de desleal, incompetente e corrupto. Inicialmente, Bolsonaro deu de ombros, mas as conversas do final de semana suavizaram suas convicções. O Bolsonaro implacável com "todos aqueles que tentam praticar corrupção no Brasil" perdeu-se em algum lugar no trajeto que separa o entrevistado da Record do leitor de teleprompter da última segunda-feira. Acabrunhado com o resultado de sua metamorfose, o ex-Bolsonaro se absteve de reproduzir nas redes sociais o vídeo de sua contrição, comportando-se como um Narciso que acha feio o que deixou de ser o espelho dos habitantes de sua bolha no Twitter."
Segue o texto de Josias de Souza:
"O vídeo divulgado pelo Presidente após o anúncio oficial da exoneração de Bebianno foi gravado por exigência do ex-ministro. O teor do pronunciamento foi minuciosamente negociado, com direito rasgados elogios. Em troca do silêncio do ora desafeto, Bolsonaro ladrilhou com pedrinhas de brilhante o caminho percorrido por Bebianno desde a coordenação da campanha presidencial até a poltrona de ministro, passando pelo período em que exerceu o comando de um PSL cítrico. Apenas os dois conhecem na plenitude os segredos que compartilham, mas o desfecho da negociação sinaliza o potencial destrutivo de uma eventual inconfidência.
Numa articulação que teve o ministro Onyx Lorenzoni como principal intermediário, Bebianno esclareceu que não aceitaria calado a "humilhação" de ser exonerado sob as pechas de desleal, incompetente e corrupto. Inicialmente, Bolsonaro deu de ombros, mas as conversas do final de semana suavizaram suas convicções. O Bolsonaro implacável com "todos aqueles que tentam praticar corrupção no Brasil" perdeu-se em algum lugar no trajeto que separa o entrevistado da Record do leitor de teleprompter da última segunda-feira. Acabrunhado com o resultado de sua metamorfose, o ex-Bolsonaro se absteve de reproduzir nas redes sociais o vídeo de sua contrição, comportando-se como um Narciso que acha feio o que deixou de ser o espelho dos habitantes de sua bolha no Twitter."