segunda-feira, 9 de setembro de 2019

DE MÉDICO E DE LOUCO TODO MUNDO TEM UM POUCO




Louco que é louco come merda e rasga dinheiro. O resto é conversa fiada.

Bolsonaro não é louco. Perde tempo e energia quem visa afastá-lo com base em "grave alteração mental". Sua maneira desmiolada de ser, falar e agir não se enquadra nos pressupostos legais que autorizam a abertura de um processo de impeachment — por ora, pelo menos. Nesse caso, atribuir-lhe a suposta "enfermidade mental" produz o efeito inverso ao desejado, pois dá margem a considerá-lo inimputável.

Não se nega aqui a grosseria, a falta de educação, a ausência argumentativa e a total falta de autocrítica do capitão. Nem tampouco a legitimidade dos debates a respeito do seu comportamento. Como dizia Nelson Rodrigues, "toda unanimidade é burra". Mas, pela régua da burrice unânime, há inteligência em opiniões extremadas, e o exercício do antagonismo fortalece os músculos e prepara a sociedade para uma vigilância constante.

Em seus dois mandatos, Lula praticamente não teve oposição. Foi bom para ele, mas péssimo para o Brasil. Se o povo brasileiro tivesse sido menos crédulo e mais crítico, poderia ter evitado a ousada ofensiva do Mensalão — impropriamente classificado como "o maior esquema de corrupção da história deste país". Impropriamente porque, comparada ao Petrolão, a rapinagem dos mensaleiros foi coisa de punguista de feira. E à luz das maracutaias no BNDES, os esbulhos anteriores são café-pequeno. Mas o fato é que, Lula e o PT foram os protagonistas em todos esses episódios, embora dividissem o palco com um elenco suprapartidário de coadjuvantes.

Lula terminou consagrado no quesito aceitação popular, o que tornava objeto de reprovação críticas mais assertivas às bobagens que ele dizia ou fazia — foram muitas, mas no geral aceitas como parte do "jeitão dele" —, e, no limite, possibilitou a eleição de uma incompetente de quatro costados, como era perceptível desde a campanha de 2010, da mesma forma que era visível o "mito" não estar à altura da Presidência muito antes do fechamento das urnas. 

A diferença é que Bolsonaro enfrentou rejeição e enfrenta forte reação, que se faz crescente quanto mais extremo é o seu modo de operar na lógica do confronto a fim de manter acesas as chamas das paixões eleitorais. E paixão, como sabemos, vai como vem, num átimo fortuito de ilusão.

Mudando de um ponto a outro, ao optar pela indicação do subprocurador Augusto Aras para o comando da PGR, o presidente conseguiu a proeza de desagradar afetos e desafetos: o nome, que ainda será submetido ao escrutínio do Senado — mas tudo indica que será aprovado sem grandes dificuldades —, foi mal recebido em praticamente todas as esferas, das profissionais às ideológicas. O MPF e entidades da área jurídica reagiram à não observância da lista tríplice — escolher um dos três nomes sugeridos pelo MPF era uma praxe que vinha desde 2003.

Os críticos do governo avaliam Aras conservador demais e inapropriadamente subserviente às ideias do capitão; os bolsonaristas enxergam-no com desconfiança por considerá-lo dono de um passado de perigosa tendência esquerdista. O escolhido é, portanto, uma incógnita a ser desvendada no exercício do cargo. A prévia dada pelo comportamento dele como candidato à vaga não recomenda, pois procurou todo o tempo se enquadrar no perfil traçado pelo presidente. É certo que de outro modo não teria sido escolhido, mas a PGR requer observância a critérios constitucionais, sendo o principal a preservação da independência no cumprimento do papel de defensor da sociedade.

A ver.

Com Dora Kramer