A revista VEJA
desta semana antecipa os próximos
capítulos da novela envolvendo o “noivado” de Regina Duarte com
o governo Bolsonaro. Para Dora Kramer, o capitão foi esperto ao convidar
a atriz para assumir a Secretaria da Cultura, já que, no mínimo, isso deve
apaziguar os ânimos no setor. A questão é que não há como Regina ter
garantias de que poderá exercer um bom trabalho, pois só Deus sabe como o capitão
reagirá diante da primeira contrariedade que ela venha a protagonizar.
Já Augusto Nunes
avalia que o “noivado” serve para a artista “sentir a temperatura da água”, e
deixa claro que ela quer um canal direto com o presidente, pois irá comandar
uma secretaria subordinada ao ministério do Turismo e precisa ter a certeza de
que não lhe será criado nenhum obstáculo.
J.R. Guzzo, em sua coluna na Gazeta
do Povo, escreveu que noivados que duram muito — ou pelo menos aqueles do
tipo antigo, que passavam anos a fio sem maiores inconvenientes para as duas
partes — costumam ser uma mão na roda para os noivos, pois evitam que as
pessoas se casem, economizando um caminhão de problemas. O de Bolsonaro
com Regina é uma chance única para eles não se casarem e continuarem
bons amigos. Se continuem “noivando” para sempre, a Secretaria da Cultura ficará
sem dono e, com alguma sorte, acabará morrendo de morte morrida.
O Brasil não
precisa de um Ministério ou Secretaria da Cultura, mas, sim, salvar seu belo
patrimônio histórico e cultural de goteiras, incêndios, desabamentos, furtos e
de todo tipo de ruína — e isso é garantido que o ministério ou a secretaria não
fazem e jamais vão fazer. A presença do Estado, principalmente quando envolve
um negócio chamado “verba”, não é apenas inútil para a cultura — é um perigo.
Deixem que o público responda, com o seu apoio voluntário, pelo sucesso
cultural brasileiro. Talento não precisa de culturocratas para nascer, crescer
e vencer.
Outro assunto que vem
dando o que falar é o fatiamento do ministério da Justiça. Depois de
muitas idas e vindas, o capitão-decepção afirmou que a separação tem chance
zero de acontecer, mas suas promessas são tão confiáveis quanto as
previsões de horoscopistas, cartomantes e assemelhados. Num de seus pronunciamentos,
Bolsonaro afirmou candidamente que ofereceu ao ex-juiz Sérgio Moro o
ministério da Justiça, mas postagens antigas que ambos publicaram nas redes
sociais falam claramente em ministério da Justiça e Segurança Pública.
Na avaliação de Dora
Kramer, o presidente, enciumado do bom
desempenho de Moro no programa Roda Viva, quis dar uma “alfinetada” no
auxiliar — uma ideia que Augusto Nunes classifica como um tiro no pé. O
dito ficou pelo não dito, mas sua excelência poderia ter negado dado o assunto
por encerrado dois dias antes, quando recebeu secretários estaduais de
Segurança Pública. Em vez disso, ele alimentou o debate falando que a proposta
estava em “estudo”.
Em off, o capitão fala
em promover ajustes no ministério desde o final do ano passado. Quando o tema
chegou ao noticiário, declarou: "É fake news, tá ok?" Mas fake
não era a notícia, e sim Bolsonaro, que diz uma coisa e faz exatamente o
contrário. Moro acreditou quando ele desmentiu o plano de desmembrar a
pasta e dar o comando da Segurança Pública para Alberto Fraga, mas
voltou à frigideira na semana passada, dias depois de afirmar que o
relacionamento de ambos era excelente, quando seu chefe admitiu em público o
que apenas sussurrava à sombra.
Bolsonaro e Moro
parecem ter feito apostas erradas quando um acabara de ser eleito e outro ainda
era o juiz da Lava-Jato. O presidente ainda não empossado imaginou que
usufruiria da popularidade do magistrado sem pagar qualquer preço, e Moro,
que teria no capitão um apoio firme no enfrentamento da corrupção, numa
sequência animadora do seu trabalho como juiz na maior operação anticorrupção
da história desta Banânia. O imbróglio envolvendo Fabrício Queiroz e Flávio
Bolsonaro na administração de uma banca de “rachadinha” no gabinete do
então deputado na Alerj, mostrou que a bandeira anticorrupção do presidente
era apenas um gesto eleitoreiro, pois, uma vez empossado, moveu mundos e fundos
para blindar o primogênito das investigações. Tudo somado e subtraído, resta ao
ministro uma incerta indicação ao Supremo ou uma (cada vez mais
provável) candidatura a presidente em 2022.
Bolsonaro
incutiu em Moro a crença de que o tornaria um superministro, e agora o
submete a sucessivas humilhações públicas. Embora tenha descartado (durante sua
viagem à Índia) o desmembramento comandada pelo ex-juiz, sua excelência teve o
cuidado de acrescentar: "Não sei o amanhã, porque na política tudo
muda." Ou seja, o fogo continua aceso... Mas não será fácil convencer a sociedade de
que a grande necessidade da segurança pública é a recriação de um ministério
específico. Talvez o presidente devesse duvidar um pouco de si mesmo, ou
acabará descobrindo da pior maneira que, por melhor que seja o seu teatro,
parte da plateia não está suficientemente ensaiada para fazer o papel de
idiota.
Assombrações e
fantasmas aparecem para quem acredita neles. Ou Sérgio Moro ergue a
coluna vertebral, ou compromete, por excesso de submissão, o prestígio que lhe
rende altos índices de popularidade. Quanto a Jair Bolsonaro, se quiser mesmo
ver o ministro pelas costas, terá de assumir o ônus da demissão em vez de
continuar testando os limites da paciência do auxiliar, que tem se mostrado
ilimitada. E nesse jogo de gato e rato é o presidente quem tem mais a perder,
haja vista a profusão de críticas a que foi submetido nas redes sociais, seu
habitat natural. A pergunta é: o que acontecerá se Moro chamar o
caminhão de mudança e sair batendo a porta?
Josias de Souza sintetiza a resposta de
maneira magistral. Segundo ele, ciente de que o passado político da
primeira-família estava enrolado em rachadinhas e relações perigosas com Fabrício
Queiroz e milicianos, Bolsonaro recrutou o xerife da Lava-Jato
para cuidar do combate à corrupção e ao crime organizado, e agora tenta cortar
as asas de Moro, que, ironicamente, contribui para a própria fritura por
não ter traçado limites a partir dos quais não recuaria, e sofre calado uma
sequência de humilhações que já evoluíram para o esquartejamento: Foi-lhe
arrancado o braço do Coaf e, para manter os dedos da direção-geral da PF,
teve de dar o anel da superintendência da instituição no Rio de Janeiro — onde Zero
Um enfrenta sua tormenta judicial. O presidente lhe quebrou as pernas ao
sancionar o juiz das garantias, e só vem adiando a amputação da Segurança
Pública por razões estratégicas.
A impressão que se tem é a de que Bolsonaro
e Moro, picados pela mosca azul de 2022, perderam o rumo, mas há um rumo
nesse encrenca: o rumo da crise. E para o presidente, existe ainda um risco
adicional: ele chamou Moro para o governo com o argumento de que lhe daria
condições para melhorar sua biografia, e agora lhe oferece a oportunidade ganhar
respeito (e pavimentar o caminho para as urnas em 2022) pedindo o boné.