segunda-feira, 22 de junho de 2020

MAIS SOBRE A NOVELA QUEIROZ/BOLSONAROS — CONTINUAÇÃO



Ao longo de toda essa novela, Flávio Bolsonaro tentou barrar as investigações do MP-RJ pelo menos nove vezes, mas foi finalmente derrotado em dezembro do ano passado, quando a suprema montanha pariu o óbvio ao reconhecer, por 9 votos a 2, que os órgãos de controle foram criados para controlar, e que, quando submetidos a indícios de crimes, têm a obrigação de compartilhar os dados com as autoridades encarregadas de investigar e denunciar criminosos. Diante dessa decisão, o ministro Gilmar Mendes autorizou a retomada das investigações.

Havia, então, quatro procedimentos contra Zero Um (três em âmbito estadual e um em federal), mas não havia informações sobre os próximos passos nem previsão de conclusão (devido ao segredo de Justiça). A novidade veio ainda em dezembro, quando o MP-RJ deflagrou uma operação de busca e apreensão em endereços ligados a Queiroz e a outros ex-assessores de Zero Um.

De acordo com O Globo, os mandados baseados em suspeitas de lavagem de dinheiro e peculato (desvio de dinheiro público) miravam outros nove parentes de Ana Cristina Siqueira Valle, ex-mulher do presidente Bolsonaro, além de Carluxo — que, ao longo de 18 anos de mandato na Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, empregou Ana Cristina e sete familiares dela. Na Alerj, Flávio Bolsonaro empregara nove familiares da então mulher de seu pai. Na Câmara dos Deputados, o próprio Jair Bolsonaro nomeara seis membros da família dela. A operação atingiu também a mulher e a enteada de Queiroz

O final dessa (não tão) breve retrospectiva deságua na Operação Anjo, que resultou na prisão de Queiroz. Embora não estivesse foragido, já que até então não havia mandado de prisão contra si, Gasparzinho estava mocosado em Atibaia (SP) havia mais de um ano (segundo informações do caseiro da propriedade onde ele foi encontrado).

A prisão de Queiroz joga luz sobre uma outra figura do bolsonarismo: Frederick Wassef, advogado do Clã Bolsonaro e anfitrião do ex-assessor, que em setembro do ano passado disse à Globonews: Não sei [onde Queiroz está], não sou advogado dele. Aliás, a proximidade de Wassef com o presidente agrava ainda mais a crise. Na última quarta-feira, o advogado compareceu à posse de Fábio Faria, novo ministro das Comunicações.

Wassef se aproximou de Jair Bolsonaro ainda em 2014, quando assistiu a um discurso do então deputado federal em prol de armar a população. A partir daí procurou se aproximar da família. “Eu não só fui o primeiro a acreditar no Bolsonaro, como fui o primeiro a colocar na cabeça dele a ideia de concorrer à Presidência”, disse o advogado, segundo relato do UOL publicado na última quinta-feira (estranhamente, Gustavo Bebianno, em outro momento, disse mais ou menos a mesma coisa).

Wassef passou, então, a ser uma espécie de conselheiro do clã dos Bolsonaro para assuntos diversos, especialmente nos temas relacionados ao campo jurídico, segundo perfil escrito pela revista Veja e publicado em abril de 2019. A mesma reportagem trazia informações sobre a compra de um carro realizada por Bolsonaro em 2015, na loja cuja dona era a empresária Cristina Boner, ex-mulher de Wassef.

Segundo reportagem da revista Época publicada no dia 25 de julho, Wassef deu conselhos jurídicos à equipe de Bolsonaro no processo movido pela deputada petista Maria do Rosário — no qual o presidente foi condenado, no ano passado, a pagar R$ 10 mil à autora da ação e a publicar uma retratação. Em entrevista ao programa Aqui na Band, no dia 11 de maio, foi apresentado como advogado de Bolsonaro no caso da facada de Adélio Bispo, mas seu nome não aparece no acompanhamento processual.

De acordo com Bela Megale, do jornal O Globo, Wassef teve o nome citado em um relatório da PF por espalhar informações não comprovadas sobre o atentado, e ganhou projeção a partir de junho de 2019, quando assumiu oficialmente a defesa de Flávio Bolsonaro.

Wassef define as investigações do esquema das rachadinhas como um “grande golpe” contra seu cliente e diz que os ataques destinados à família Bolsonaro têm como objetivo a cadeira presidencial depois de 2022. Foi ele o autor do pedido acolhido por Dias Toffoli quando o magistrado concedeu liminar para suspender todas as investigações criminais que envolviam o uso de dados do Coaf

Segundo relato da revista Época, após a decisão do presidente do Supremo o advogado comemorou a determinação em conversa com um interlocutor: “A decisão… Amor… O meu nome… Tá o Brasil inteiro me ligando e me chamando de Deus! Você não tem noção! É uma bomba atômica! Amor, está comigo, te mando agora. O Flávio, o presidente, tudo infartado, chorando…”. 

Em entrevista ao jornal Estado de S. Paulo, em dezembro de 2019, Wassef afirmou que “qualquer brasileiro pode depositar, sacar, comprar, transferir, emprestar (...) nós precisamos separar as coisas (...) existem provas robustas de crime, ou vamos agora pegar milhões de movimentaçõezinhas que cada brasileiro fez e atribuir àquilo ilação de que é crime?”.

Observação: Em entrevista à CNN Brasil, Wassef disse: “Houve informação de que pegaram lá [no imóvel em Atibaia] uma caixa com vários papéis e documentos, e eu estou afirmando que isto é uma mentira, porque não tinha sequer uma caneta Bic lá. A casa estava em reforma, vazia, e não tinha nada lá. (...) Se bater no Fred atinge o presidente, eu e o presidente viramos uma pessoa só, então todos estão empenhados em atingir minha vida, em destruir minha vida, minha imagem, minha reputação. Mas vão cair do cavalo, que eu nunca fiz nada de errado na vida. Tá claro isso? (...) A estratégia das forças inimigas da democracia e da Presidência da República hoje é: todos estão unidos, se unindo, sabendo que se me destruir ou se vier pra cima de mim, inclusive fazendo uma série de fake news que eu tô sofrendo há 3 dias seguidos, fake news sem parar, mentiras, ilações e todo o tipo de absurdo, eles estão com essa convicção de que vão atingir o presidente da República. Pois eu digo, ledo engano.”

Continua no próximo episódio.