No comando da Saúde desde a demissão do oncologista Nelson Teich, em maio do ano passado, o
general-interventor-taifeiro Eduardo
Pazuello afirma candidamente que “o
SUS vem cumprindo com as suas obrigações, cabendo a cada governo fazer a sua
parte”, e que, portanto, acha “injusto
e desnecessário” o pedido feito à ministra Rosa Weber sobre a retomada do custeio de leitos de UTI. O fardado está prestes a descobrir
que rosas têm espinhos: em sendo confirmada pelo plenário (e nem é uma questão
de “se”, mas de “quando”), a decisão da ministra esvaziará a falácia
bolsonarista de que a Corte “tirou das
mãos do presidente” o controle das medidas contra a pandemia.
A desculpa esfarrapada e falaciosa do general da banda e
seus miquinhos amestrados já foi demolida pelos ministros Marco Aurélio e Cármen Lúcia:
segundo o decano, “as decisões do Supremo
não tiravam a
responsabilidade do governo federal; de acordo com a magistrada, “a responsabilidade é
dos três níveis [federativos] — e não é hierarquia, porque na federação não há
hierarquia — para estabelecer condições necessárias”.
Pazuello
transformou a Saúde num festival de horrores, mas não é o único nem o maior
responsável pelos 260 mil cadáveres empilhados pela Covid até agora, sendo injusto,
portanto, a PGR (aparelhada por Bolsonaro com a indicação de Augusto Aras) abrir um inquérito para
investigar o servo e deixar de fora o mestre da dupla “um manda e o outro obedece”. A
subserviência do vassalo é tamanha que assistir a seus pronunciamentos só não
causa comiseração porque a repulsa prepondera sobre o dó (para quem não sabe, “dó”
é um substantivo masculino), dadas
as incontáveis contradições e mentiras proferidas pelo morubixaba de turno e
pelos boçais que lhe puxam o saco.
Em meados de dezembro, perguntado sobre o cronograma da
vacinação, o ministro-estrelado teve o desplante de perguntar: Para que essa ansiedade e essa angústia?
Graças à expertise desse luminar em logística, mais de 6 milhões de testes RT-PCR,
que deveriam ter sido enviados ao SUS, foram “esquecidos” num armazém
federal em Guarulhos. Desse total, cerca 6,86 milhões estavam
prestes a vencer. Depois que imprensa noticiou a barbárie, a Anvisa prorrogou a validade
por mais quatro meses, e o Ministério da Saúde se propôs a doar 1
milhão desses exames ao Haiti,
reduzindo, assim o estoque de 5 milhões de unidades que vencem a partir de
abril.
Pazuello só conseguiu comprar 2,4% dos 331 milhões de
seringas e agulhas no pregão eletrônico em que ofereceu valores bem
abaixo dos de mercado. Disse que a Pfizer
ofereceu apenas 9 milhões de doses do imunizante, das quais as primeiras 500
mil seriam entregues somente em janeiro, mas a empresa afirma que ofereceu 70 milhões de doses e que
parte desse quantitativo seria entregue a partir de dezembro do ano passado.
Pressionado por todos os lados, Pazunaro (ou seria Bolzuello?)
finalmente autorizou a aquisição de 100 milhões de doses da vacina da Pfizer e está negociando com a Janssen (braço farmacêutico da Johnson & Johnson) outros 38
milhões de doses (com entrega prevista para dezembro deste ano). O aval ocorreu um dia depois que o Congresso aprovou
uma lei que autoriza União, Estados e municípios a assumir responsabilidade por eventuais
evento adversos causados pela vacina — exigência da Pfizer que vinha sendo criticada por Bolsonaro e era citada por ele como um
entrave à aquisição do imunizante.
No início do ano, enquanto manauenses morriam por falta de
oxigênio hospitalar, Pazuello
inundou a capital do Amazonas com kits-Covid
à base de cloroquina. Quando soube pela cunhada que o irmão dela não tinha
oxigênio nem para passar o dia, disse o ministro: “Você e todo mundo vão esperar chegar o
oxigênio e ser distribuído. Não tem o que fazer. Então, vamos com calma.”
Atualização: Escolhido para ser o quarto ministro da Saúde em plena pandemia, o cardiologista Marcelo Queiroga afirmou ontem que dará continuidade ao trabalho até agora executado na pasta, que “não tem avaliação” sobre a gestão do general pesadelo nem “vara de condão” para resolver os problemas da saúde nacional. Ele foi escolhido na última segunda-feira, depois que a também cardiologista Ludhmila Hajjar declinou do convite, alegando “falta de convergência técnica” com o capitão-negação. Queiroga é tido como bolsonarista de raiz, razão pela qual não se espera que promova mudanças significativas na pasta e no combate à pandemia, até porque, depois da exoneração de Mandetta e do pedido de demissão de Teich (que não chegou a esquentar lugar), o chefe do Executivo Federal acumula o cargo de ministro da Saúde. Queiroga usou máscara e pediu aos jornalistas que não se aglomerem durante as entrevistas. Ele deve acompanhar Pazuello em agendas da Saúde nesta semana e ao longo do período de transição, que deve se estender por duas semanas. Nesse meio tempo, seria prudente ele manter uma distância segura do general logístico. Vai que incompetência seja transmissível pelo ar, como a Covid...
O descaso do governo federal com a efetivação de um
plano de vacinação para o país levou um grupo de 352 juristas,
intelectuais, artistas e ambientalistas a solicitar a abertura de uma
ação criminal contra Bolsonaro no STF, responsabilizando-o por “sabotar e frustrar” o processo de
imunização de modo a colocar em risco a saúde pública. Para além disso,
seis subprocuradores-gerais da República cobraram de Augusto Aras medidas para investigar e responsabilizar
Bolsonaro por crimes comuns, pela sabotagem no combate à
pandemia. Mas o passador-de-pano-geral saiu pela tangente, alegando
que cabe ao Legislativo responsabilizar
o presidente por crimes de responsabilidade e, para deixar claro que não aceita
pressão, afirmou que o estado de calamidade pública decretado por conta da
pandemia é “antessala do estado de defesa”.
Em nota, os procuradores responderam que
a atribuição para a persecução penal de crimes comuns é de
responsabilidade da competência do STF, tratando-se,
portanto, de função constitucionalmente conferida ao Procurador-Geral da República, cujo cargo é dotado de independência
funcional.
Bolsonaro nega
ser negacionista e afirma que acredita na eficácia das vacinas. Eu digo que
acredito no coelhinho da Páscoa e na
inocência da “alma viva mais honesta do
Brasil”. No passado, o capitão das trevas não só jurou de pés juntos que não
se vacinaria como colocou em dúvida a
eficácia da CoronaVac. Em outubro, chegou mesmo a declarar que o
governo não compraria "vachina”
(que acabou sendo a primeira utilizada pelos brasileiros).
Em live nas redes sociais, o presidente disse que lamenta as
mortes causadas pela pandemia, mas que "agora parece que só (se) morre de Covid no Brasil" — o
comentário se deu em meio ao colapso
no sistema de saúde de diversos estados brasileiros. Segundo nosso
general da banda, essa história de negacionismo é "conversa para boi dormir". Apesar disso, ele continua exortando
a população a "tocar a vida"
medidas restritivas, como o lockdown,
que conseguiram desacelerar o avanço da pandemia em países como Portugal e
Alemanha.
Com 3,6% da população vacinada, o mandatário afirmou que
desde meados do ano passado o Brasil "vem
contratando laboratórios buscando vacinas", e que “alguns teimam em dizer que nós não nos
preocupávamos com vacina; a partir de janeiro, quando a Anvisa deu o primeiro
sinal verde, certificou a primeira vacina, eu sempre disse que havendo a
certificação por parte da Anvisa nós compraremos aquela vacina, não interessa
qual o país seja o fabricante, e assim começamos a fazer.” Até a última
terça-feira, no entanto, a contratação de vacinas com os laboratórios Janssen e Pfizer estava emperrada por resistência do governo, mesmo depois do
aval da Anvisa. As tratativas só
foram destravadas após o Congresso
aprovar um projeto que autoriza a União a assumir as responsabilidades por
eventuais efeitos adversos dos imunizantes, uma das cláusulas exigidas pelas
empresas.
Após
ter questionado o uso de máscaras de proteção, itens essenciais para
conter a propagação do vírus, o presidente disse que apenas citou um estudo
sobre o assunto (sem citar a fonte, ele afirmou que esta não é a sua opinião, e
sim são “dados de uma pesquisa”). Disse
ainda nosso indômito líder que o Brasil contratou 400 milhões de doses de
vacinas até janeiro do ano que vem e outros 178 milhões ainda estão em
negociação.
Em documento encaminhado ao Senado, o Ministério da
Saúde prevê
a entrega de cerca de 38 milhões de doses de vacinas este mês. Se o
Brasil tivesse encomendado vacinas no ano passado, como fizeram outros países,
ninguém precisaria, hoje, implorar pelo imunizante. O contrato a ser assinado
com a Pfizer prevê a entrega de
cerca de 8 milhões até junho, mais uns 32 milhões a partir de setembro, e quase
60 milhões no fim do ano, e outros 50 milhões em janeiro de 2022.
O descaso do governo federal com a efetivação de um
plano de vacinação para o país levou um grupo de 352 juristas,
intelectuais, artistas e ambientalistas a solicitar a abertura de uma
ação criminal contra Bolsonaro no STF, responsabilizando-o por “sabotar e frustrar” o processo de
imunização de modo a colocar em risco a saúde pública. Afora a postura
de Bolsonaro ante à
pandemia, os procuradores suscitam seus constantes questionamentos sobre a
lisura do sistema eleitoral brasileiro, com acusações de fraudes sem
apresentação se provas “que só
contribuem para agravar o quadro de instabilidade institucional”, bem como
a afirmação em clara afronta à
Constituição Federal de que as Forças Armadas são as responsáveis por
decidir se há democracia ou ditadura em um país.
O texto em reação à nota de Aras critica ainda indicação da PGR de que já vem adotando todas as providências
cabíveis desde o início da pandemia, entre as quais requisição ao
ministério da Saúde, de instauração de um inquérito epidemiológico e sanitário.
Diversos parlamentares sentiram o cheiro de ameaça na nota de Aras. Para o presidente nacional
do PDT, Carlos Lupi, a PGR deixou de ser procuradoria
geral de República e passou ao triste papel de advogada de defesa do presidente da
República”. Já o ministro Marco
Aurélio Mello, atual decano do STF, relembrou
uma declaração sua de 2017, na qual disse que “temia” pelo Brasil caso Bolsonaro fosse
eleito .
Bolsonaro está
anos-luz daquilo que se pode chamar de estadista, mas usa de sua influência
sobre apoiadores para fazer exatamente o contrário do que se esperaria de
qualquer pessoa normal em posição de liderança. Tanto suas ações quanto suas
omissões durante a pandemia chegam às raias do absurdo, e as consequências são
contabilizadas em óbitos. Sua postura inefável lhe garantiu o título de pior
líder mundial no combate ao coronavírus e o primeiro lugar no ranking
dos presidentes com maior número de
crimes de responsabilidade. Se permanecer no cargo até 2022, pode ser
difícil, para seus sucessores, quebrar esse recorde.
Bolsonaro fala o
que quer a respeito da cloroquina,
promove aglomerações, condena o uso da máscara. Encontra em Pazuello um ministro que aceita tudo
sem tugir nem mugir. “Nunca recomendei o
uso da cloroquina”, nega o general-interventor-esbirro, que nem é besta de
recomendar que se evitem aglomerações e se use máscara (o chefe não aceita
provocações). Segundo Marcelo Coelho,
mestre em sociologia pela USP e autor dos romances “Jantando com Melvin” e “Noturno”,
a balada clandestina corre solta, com Bolsonaro
cometendo barbaridades dentro da boate. Pazuello
fica do lado de fora. Intimidador, mas até certo ponto educado, ele é o
perfeito leão de chácara da esbórnia
em curso.