sábado, 30 de dezembro de 2023

PRESENTE DE GREGO

Karl Marx ensinou que a história sempre se repete, primeiro como farsa e depois como tragédia. Está cada vez mais difícil diferenciar farsa de tragédia no Brasil, mas a mim me parece que a gestão Bolsonaro foi uma farsa e a volta Lula, uma tragédia. Parte da culpa por essa desdita cabe à polarização, mas o grande vilão é o eleitorado apedeuta, incapaz de encontrar a própria bunda usando as duas mãos e uma lanterna (como bem observaram Pelé e Figueiredo). 

A tal "frente ampla" foi um embuste — nem a finada Velhinha de Taubaté acreditaria que ideologias tão antagônicas pudessem conviver pacificamente. Se funcionou, foi porque o pior mandatário desde Tomé de Souza empregou cada minuto de sua aziaga passagem pelo Planalto para vituperar o STF, pregar contra o sistema eleitoral, sabotar o combate à Covid e articular seu tão sonhado autogolpe. Mas isso é passado.

A despeito de Lula et caterva remarem contra a meta de déficit zero, Fernando Haddad melhorou a percepção sobre uma série de indicadores que afetam o bolso dos brasileiros. Como não há mal que sempre dure nem bem que nunca termine, os números sugerem que 2024 não será tão alvissareiro nesse aspecto quanto o primeiro ano do terceiro reinado do redentor dos miseráveis que escapou do Mensalão e tropeçou no Petrolão — que só não foi pior que o de seu antecessor porque superar a imprestabilidade do pária internacional não é tarefa fácil. 

Passados 14 meses da eleição mais disputada desde a redemocratização, Banânia continua dividida entre bolsonaristas e lulopetistasÉ forçoso reconhecer que nem a inelegibilidade nem a eventual prisão do messias que não miracula interromperão a metástase do "bolsonarismo boçal"  assim como as condenações e a prisão de ex-tudo (ex-retirante, ex-metalúrgico, ex-sindicalista, ex-presidiário e ex-corrupto) não extirparam o câncer do "lulopetismo corrupto".

A maneira como o governo vai lidar com o fantasma do “pibinho” é uma das grandes incógnitas do próximo ano. Para construir maiorias num Congresso controlado por Arthur Lira, o chefe do Executivo precisou negociar uma "aliança" com o MDB, com o PSD e com o próprio condestável do Centrão. Além de abrir espaço na Esplanada dos Ministérios para Republicanos e Progressistas (partidos venais que apoiaram o desgoverno anterior), o Sun Tzu de Atibaia, que nega o "toma lá dá cá", entregou o comando da CEF a um afilhado político do imperador da Câmara.

D. Lula III e a rainha consorte Janja — a primeira-dama que ocupa o cargo de primeira-ministra informal — dedicaram boa parte de 2023 a um périplo por 26 países, mas as tentativas do estadista de fancaria de mediar os conflitos no Leste Europeu e no Oriente Médio não lograram êxito. Resta saber o que resultará das negociações entre os presidentes da Venezuela e da Guiana (lembrando que Lula é admirador confesso de Nicolás Maduro, a quem recebeu, com pompa e circunstância no Palácio do Planalto). 
 
Segundo a mais recente pesquisa Datafolha, a aprovação do governo federal está anos-luz distante dos 80% que o demiurgo de Garanhuns ostentava em 2011, quando passou faixa para sua pupila. E ele ainda precisa precisa lidar com força da oposição nas ruas e no Congresso. Situações como essa, especialmente em ano eleitoral, tendem a alimentar ideias mirabolantes, causar ansiedade e apreen­são e acabar num belo presente de grego — ou seja, tudo que o Brasil definitivamente não precisa em 2024.