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sexta-feira, 27 de setembro de 2019

A CORRUPÇÃO INSTITUCIONALIZADA E A APROVAÇÃO DE AUGUSTO ARAS




ATUALIZAÇÃO: Não tive como acompanhar integralmente o lamentável espetáculo circense protagonizado pelo pleno do STF na tarde de ontem, mas vi o suficiente para me dar conta de que não perdi grande coisa. No final, o supremo conciliador adiou a sessão, dada a importância do voto de todos os ministros (não sei se anjinho barroco primo de Collor não participou da função ou teve de sair mais cedo, como, aliás, já fez em outros julgamentos importantes).

Dos trechos reprisados pelos telejornais, ficou claro que o alinhamento entre os ministros Fachin, Fux Barroso não bastou para neutralizar a ação perversa do trio calafrio, ora reforçado por Cármen Lucia e Alexandre de Moraes (o ex-advogado do PCC que até lustrou a calva para proferir um voto ainda mais brilhante). E um aparte da única membra egressa da magistratura me levou a lucubrar se não teria sido inspirado nessa senhora o dito popular segundo o qual "em barriga de criança e cabeça de juiz não se pode confiar".

Observação: Saliento que não se trata de enxovalhar magistrados que julgam em desacordo com minhas convicções e enaltecer quem decide a favor, mas sim de repudiar enfaticamente o nítido propósito da banda podre de libertar Lula, o sórdido, e voltar o tempo até a era pré-lava-jato, quando poderosos roubavam livre, impune e descaradamente.

Nos jornais da noite, analistas, juristas e palpiteiros de plantão emitiram pareceres tão contraditórios que eu achei prudente esperar a poeira baixar para avaliar as dimensões do estrago e especular o que nos reserva a sessão da próxima quarta-feira. Não obstante, pareceu-me claro que a banda garantista dos togados supremos (ou banda podre, se preferirem) continua pavimentando a estrada dos tijolos vermelhos. Também ficou claro que os magníficos do Circo Marambaia preferem usurpar as funções dos congressistas e legislar, em vez de, como lhes caberia fazer, simplesmente interpretar a Constituição.

Dias atrás, sonhei que fortes lufadas de vento sopraram as chamas das queimadas na Amazônia legal até o DF, carbonizando o Congresso, a Praça dos Três Poderes, o STF, o Palácio do Planalto e adjacências — e numa quarta-feira, ainda por cima, quando o circo supremo está armado e os parlamentares se dignam de aparecer na Câmara e no Senado. Quando acordei, achei que fosse um pesadelo. Agora, porém, acho que foi mais um sonho que não se realizou. Enfim, bola pra frente.   

Num país que arrecada anualmente quase 3 trilhões em impostos, faltar dinheiro até para o giz das escolas públicas e a gaze das unidades do SUS seria um mistério digno das histórias de Sherlock Holmes, não o fato de ser público e notório que a rapinagem do Erário, institucionalizada para perpetuar o lulopetralhismo no poder, seja de causar inveja aos 40 ladrões da história de Ali Babá.

Mas a roubalheira nem sempre é sub-reptícia: deputados federais e senadores trabalham 3 dias por semana e ganham mais de R$ 100 mil por mês (somando os gordos salários às malandragens disfarçadas de “auxílios” ou “verbas adicionais”). Enquanto isso, na outra ponta da corda, boa parte da população que ainda tem emprego e recebe salário mínimo (R$ 998) não conseguiria juntar R$ 100 mil numa única vida, mesmo que trabalhasse 7 dias por semana em dois empregos.

Graças ao ritmo indolente dos parlamentares e às picuinhas de certo senador amapaense que acontece de ser o presidente do Senado, a reforma da Previdência vai consumir um ano legislativo inteiro até ser aprovada, de onde se conclui que a semana de três dias, no Congresso, não é uma questão trabalhista, mas um caso de polícia — e como tal deve ser tratado.

Dito isso, voltemos o foco para a aprovação de Augusto Aras, começando por dizer que o resultado da sabatina foi surpreendente, na medida em que apenas 10 dos 78 senadores que se dignaram de votar não sucumbiram ao canto da sereia, ou melhor, do bagre ensaboado travestido de procurador, que, segundo o próprio, agirá com total independência (e poderia fazê-lo se quisesse, pois tem emprego garantido pelos próximos dois anos). Porém, colocando a coisa em perspectiva, nota-se que a maioria dos senadores que o aprovou Aras fê-lo para destilar potes de fel contra o Ministério Público, a Lava-Jato, o Judiciário em geral e o STF em especial.

Não se conhece o teor das conversas reservadas que o então candidato a PGR manteve com 74 senadores durante o périplo de beija-mão, nem tampouco o que ele prometeu a Bolsonaro nos vários encontros que tiveram a portas fechadas, antes de depois da indicação. Mas ficou claro, durante a sabatina, que Aras parecia pisar em ovos, tamanho o cuidado de dizer exatamente o que suas excelências queriam ouvir. Suas ponderações, contra ou a favor fosse do que fosse, sempre continham um "mas", um "porém", um "entretanto" ou outra conjunção adversativa, depois da qual vinha inevitavelmente o contraponto. Segundo Josias de Souza, o sabatinado foi tão escorregadio que deu a impressão de ser a favor de tudo ou absolutamente contra qualquer outra coisa, desde que o Senado avalizasse sua indicação.

JFK dizia que a fórmula do fracasso é tentar agradar a todos ao mesmo tempo. Mas o presidente americano não conhecia nosso novo procurador-geral — que José Nêumanne alcunhou de "ensaboador-geral", num trocadilho inspirado no ex-procurador Geraldo Brindeiro, que ganhou o apelido nada enaltecedor de "engavetador-geral" (cuja obviedade dispensa explicações).

Aras compareceu à CCJ do Senado imbuído da certeza de que jogava um jogo jogado e, para não estragar o placar, adotou um timbre ensaiado. Observou-se durante a sabatina uma cena inusitada: Renan Calheiros fez rasgados elogios à indicação feita por Jair Bolsonaro. Como também é público e notório, o abigeatário senador alagoano é freguês de caderneta da Lava-Jato e convive no Senado com Flávio Bolsonaro, investigado pelo MP/RJ por suspeita de peculato e lavagem de dinheiro, e interessa a ambos aplicar um sedativo no aparato investigatório do Estado.

Resta torcer para que Aras perceba que, uma vez aprovado, não deve satisfações a ninguém, exceto à Constituição e à sociedade brasileira. Isso, porém, só sua atuação à frente da PGR poderá responder.

quarta-feira, 25 de setembro de 2019

EDIÇÃO EXTRAORDINÁRIA: JULGAMENTO IMPORTANTE NO STF



Quase ao mesmo tempo em que Lula termina de cumprir um terço da pena a que foi condenado pelo STJ no caso do tríplex, o plenário do Supremo julga hoje (acompanhe ao vivo) um caso semelhante àquele em que a 2ª turma anulou a condenação de Aldemir Bendine. A decisão, como todos se lembram, baseou-se numa tese estapafúrdia suscitada pela defesa do réu, segundo a qual suas alegações finais deveriam ter sido aparentadas antes das do delator, que também é réu no processo.

RelembrandoNo mês passado, por 3 votos a 1, a 2ª turma derrubou uma decisão de Moro que havia condenado Bendine a 11 anos de reclusão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Foi a primeira vez que o Supremo anulou uma condenação de Moro, impondo uma das maiores derrotas da Lava-Jato até hoje, e também a primeira vez que a ministra Cármen Lúcia discordou de Fachin em julgamentos cruciais da Lava-Jato julgados na turma. Cármen se alinhou aos ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, mas ressaltou que o seu voto naquela ocasião considerou as peculiaridades do caso específico de Bendine, que foi obrigado entregar seus memoriais ao mesmo tempo que os delatores, embora houvesse solicitado prazo diferenciado. Com base na decisão que beneficiou Bendine, a defesa de Lula pediu à Corte que anule suas condenações, bem como uma ação que ainda não foi julgada na 13ª Vara Federal do Paraná, além de pedir que a alma mais honesta da galáxia seja posta em liberdade.

Agasalhar esse entendimento é absurdo, seja porque não há previsão legal que o ampare, seja porque em praticamente todas as ações criminais (originárias ou não da Lava-Jato) sempre foi dado às defesas o mesmíssimo prazo para as alegações finais, fossem os acusados delatores ou não — e jamais alguém, antes da defesa de Bendine, se insurgiu contra isso.

Se no plenário a maioria dos decisores acompanhar o entendimento da 2ª Turma, tanto os julgamentos de Lula quanto de vários outros condenados podem ser anulados e recomeçados do zero.

O TRF-4 deve julgar em breve o recurso de Lula contra a condenação no processo referente ao sítio de Atibaia, no qual juíza substituta Gabriela Hardt condenou o petralha a 12 anos e 11 meses de prisão. O desembargador João Pedro Gebran entregou seu voto no último dia 11, e o revisor Leandro Paulsen também já concluiu o seu, restando agora o presidente, Victor Luiz dos Santos Laus, marcar a data do julgamento.

Isso significa que Lula pode ser condenado novamente antes mesmo que os trâmites burocráticos para a progressão da pena sejam cumpridos, ou que seja mandado para casa e volte a cumprir a pena no regime fechado logo em seguida — a não ser que nesse meio tempo uma nova decisão do STF modifique a jurisprudência em vigor sobre o cumprimento provisório da pena após condenação em segunda instância.

Como salientou o juiz federal Marcelo Bretas, responsável pelas ações da Lava-Jato no RJ, “no processo criminal brasileiro sempre houve delatores e delatados, réus confessos que depõem contra corréus”. A interpretação inusitada da 2ª Turma, que equipara delatores a auxiliares da acusação, não encontra respaldo na nossa legislação penal. Tanto é assim que o TRF-4 e o STJ referendaram a decisão do então juiz Sérgio Moro, debalde os esperneio da defesa.

Por se tratar de um entendimento sui generis e sem precedentes, o ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no Supremo, decidiu submeter ao plenário o HC do ex-gerente da Petrobras Marcio de Almeida Ferreira, cuja defesa argumenta que o réu sofreu grave constrangimento por não poder apresentar as alegações finais após a manifestação dos réus colaboradores.

A depender vontade do ministro Dias Toffoli, atual mestre de cerimônias do circo supremo, o imbróglio em questão ficaria ad kalendas græcas  (as calendas eram o primeiro dia do mês romano, quando as pessoas habitualmente realizavam seus pagamentos, e como elas não existiam no calendário grego, referir-se às "calendas gregas" é o mesmo que dizer "no dia de São Nunca").

Comenta-se que os ministros buscam uma forma de delimitar os efeitos da decisão que beneficiou o ex-presidente da Petrobras, sendo uma delas anular apenas sentenças em que o condenado pediu mais prazo e teve a solicitação negada pelo juiz, como ocorreu no caso específico de Bendine, evitando que centenas de investigados, réus e condenados se livrem da cadeia.

Segundo o jornal GGN, a maioria dos ministros tende a manter a regra adotada no julgamento de Bendine, mas limitando-a para evitar um “efeito cascata” sobre outras sentenças da Lava-Jato. No caso de Lula, por exemplo, a decisão da corte não deverá ter impacto sobre o processo do triplex, pois o molusco abjeto já foi condenado em 3 instâncias, mas poderia beneficiá-lo no caso sítio de Atibaia, que está em grau de recurso perante o TRF-4. Como dito, o fator limitante deve ser o de exigir que o réu tenha reclamado do rito processual (a questão das alegações finais) desde a primeira instância.

A conferir.

domingo, 15 de setembro de 2019

ARAS, DIREIS, OUVIR ESTRELAS


Na esteira do que comentei no post da última quarta-feira, transcrevo a seguir a opinião sempre ácida — mas nem por isso menos divertida — do impagável Josias de Souza:

Augusto Aras, o indicado de Jair Bolsonaro para o posto de procurador-geral da República, iniciou uma peregrinação pelo Senado. Nos próximos dias, irá de gabinete em gabinete para pavimentar a aprovação do seu nome. A chance de o Senado rejeitar sua indicação é muito próxima de zero. Assim, não há muito o que bolsonaristas decepcionados e procuradores revoltados possam fazer além de lidar com a nova realidade.

No momento, o que mais preocupa é a atmosfera de instabilidade que se observa no Ministério Público Federal. A insatisfação vaza para fora do ambiente fechado dos gabinetes. Começa a se manifestar ao ar livre. Prudentemente, Aras evita entrar em bolas divididas. Assimilou em silêncio a enxurrada de críticas de colegas nas redes sociais. Não respondeu nem mesmo à nota oficial em que a Associação Nacional dos Procuradores da República classificou sua indicação como "retrocesso democrático e institucional".

O esperneio é livre e até compreensível. Ao ignorar a lista tríplice dos procuradores, Bolsonaro rompeu uma tradição de 16 anos. Mas é preciso ressaltar que o presidente não violou o texto constitucional. Esse jogo está jogado. Confirmando-se a aprovação de Aras no Senado, como parece muito provável, a bola terá que ser colocada no meio de campo. Vai começar uma nova partida.

A margem de manobra de Augusto Aras é grande, mas não é infinita. Se ele tentar fazer algo que se pareça com gol de mão, a corporação reagirá. Se a revolta com sua chegada serve para alguma coisa, é para mostrar que não parece haver disposição na Procuradoria para o convívio com um novo Geraldo Brindeiro, o engavetador-geral da era FHC.

Que assim seja.

Sobrando tempo, ouça também este comentário de Josias.

sexta-feira, 13 de setembro de 2019

E AGORA, VERDEVALDO???



Chega de Glenn Greenwald", escreveu Diogo Mainardi na Crusoé. "Agora só falta a PF prender o hacker que lhe repassou as mensagens roubadas da Lava-Jato. Verdevaldo sabe que o hacker será preso e que seus cúmplices e financiadores também devem acabar na cadeia. Sim, a festa vai terminar. E depois vem a parte aborrecida: limpar o salão.”

Para quem chegou de Marte neste minuto, um relatório enviado pelo Coaf (hoje rebatizado de Unidade de Inteligência Financeira) ao Ministério Público do Rio aponta “movimentações atípicas” de R$ 2,5 milhões na conta do deputado David Miranda, maridão de Verdevaldo das Couves — o bem-amado, idolatrado, salve, salve, editor do abominável The Intercept, que desde junho vem divulgando a conta-gotas supostas mensagens comprometedoras trocadas pelo ex-juiz da Lava-Jato e hoje ministro da Justiça, Sérgio Moro, e integrantes da força-tarefa, notadamente seu coordenador em Curitiba, Deltan Dallagnol.

Se você acha mesmo que Verdevaldo, o Interpret e seus replicadores são paladinos da justiça, pense outra vez. Como Lula, o malacafento, eles não passam de santos com pés de barro. Greenwald posa de quintessência da moralidade, mas nunca foi flor que se cheire. Um mês antes das eleições americanas de 2016, ele publicou com um colega uma matéria no Intercept, com o título “EXCLUSIVO: NOVO VAZAMENTO DE E-MAILS REVELA RELAÇÃO PRÓXIMA DA CAMPANHA DE CLINTON COM A IMPRENSA”, que expunha o conteúdo de mensagens trocadas entre a equipe da candidata democrata Hillary Clinton e jornalistas.

Entre as táticas usadas para manipular a imprensa, era citado o oferecimento de bebidas e comida para jornalistas em reuniões para transmitir informações e sugestões de entrevistados para os programas de televisão. A fonte dos dados, segundo o site panfletário de Verdevaldo, identificava-se como Guccifer 2.0 — um nome já conhecido. Mutatis mutandis, o mesmo padrão se repetiria mais adiante aqui no Brasil.

Ao divulgar as supostas conversas entre Sergio Moro e os procuradores da Lava-Jato, o editor ignominioso também não se importou com a forma como o material fora obtido nem com o óbvio direcionamento dos alvos: somente juízes e investigadores envolvidos em decisões desfavoráveis aos acusados pela Lava-Jato tiveram seus dados vazados. Ao ser perguntado por Crusoé sobre essa seletividade, o coveiro de reputações respondeu: “Qualquer sugestão de que eu me oponho à Lava-Jato é totalmente ridícula”.

Os métodos de Verdevaldo se encaixam naquilo que é conhecido como “jornalismo ativista”, “jornalismo de oposição” ou “jornalismo de choque”. A prática usa as premissas que regem a profissão — como a preservação da fonte e a busca do interesse público — para atingir apenas rivais. Seu sobrenome até deu origem a um verbo em inglês: “greenwalding”. Em 2016, o termo entrou no site Urban Adicionar, em que os leitores elencam acepções para as palavras e votam nas melhores. Uma das mais populares é: “pinçar um conteúdo e tirá-lo do contexto com o objetivo de difamar alguém”.

Seus alvos são todos aqueles que, em sua visão de mundo, abusam de sua condição de poder. Trata-se de um grupo eclético, que inclui o Partido Democrata, as elites, o jornal The Washington Post, a Globo, os ricos (embora seja financiado por um bilionário), o FBI, a CIA, Israel, o Reino Unido, o ex-procurador especial dos Estados Unidos Robert Mueller, o presidente brasileiro Jair Bolsonaro e a operação Lava-Jato (quando o alvo é o PT). Seu gosto pelo enfrentamento, destilado quase diariamente em sua conta do Twitter (que conta com mais de 1 milhão de seguidores), aflorou ainda em 2005, quando o sacripanta criou um blog e começou a criticar a presença militar americana no Iraque

No ano seguinte, ainda na condição de advogado constitucionalista e blogueiro, Verdevaldo publicou o livro Como um patriota deveria atuar. O título fazia referência ao Patriot Act, criado pelo presidente George W. Bush como resposta aos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001. A obra tornou-se um best-seller. Nos anos seguintes, escreveu mais quatro livros, e o sucesso editorial lhe abriu as portas para a autoria de colunas no site americano Salon e, mais tarde, no jornal inglês The Guardian.

No final de 2012, Gleen recebeu de Edward Snowden, um hacker que havia trabalhado na NSA, documentos que mostravam como as agências americanas vigiavam cidadãos nos Estados Unidos e no resto do planeta, inclusive no Brasil. O material foi publicado por diversos veículos do mundo, mas rendeu a Verdevaldo o Prêmio Pulitzer de jornalismo em 2014 — ou pelo menos é isso que seus baba-ovos nas redes sociais afirmam, tentando lhe emprestar credibilidade.

Na verdade, a equipe liderada por Gleen Greenwald e Laura Poitras conquistou para o The Guardian US e para o The Washington Post o prêmio na categoria “Serviço Público” de 2014 — na qual o premiado é sempre o jornal que publicou a reportagem (ou a série de reportagens). Ainda que assim não fosse, é bom lembrar que a lista de “ganhadores do Pulitzer” inclui Walter Duranty, que ocultou deliberadamente os crimes do stalinismo, incluindo o genocídio de ucranianos pela fome, e Janet Cooke, autora de uma reportagem inventada sobre uma criança de oito anos viciada em heroína, que teve de devolver o prêmio depois que a farsa foi descoberta.

Observação: Escreveu Políbio Braga: “Boa parte da mídia tradicional e da mídia amestrada a serviço do lulopetismo atribuírem ao dono do site The Intercept a conquista do Pulitzer. Com a ajuda do influenciador Glauco Fonseca, um dos articulistas deste blog [blog do Políbio], o editor investigou e constatou que em 2014, e não em 2013, como os aliados de Glenn informam, quem levou o Pulitzer foi o jornal inglês The Guardian. Glenn atuou como um dos repórteres do caso Snowden, mas o prêmio não foi atribuído a ele. Clique no site do Pulitzer para checar.”

Quem tiver interesse em conhecer o verdadeiro estofo do caráter de Verdevaldo pode encontrar informações relevantes numa reportagem de Eric Wempel, publicada em 27 de junho de 2013 no jornal The Washington Post. Dentre outras coisas, a matéria informa que “o escritório do cartório do condado de Nova York mostra que Greenwald tem US$ 126.000 em sentenças abertas e contra ele datando de 2000, incluindo US$ 21.000 do Departamento de Impostos do Estado e da Secretaria da Fazenda. Também fala de um penhor de US $ 85.000”.

Gleen se envolveu com gente do submundo e do ramo da pornografia. Tornou-se inimigo de Peter Haas — dono de uma companhia de produtos pornográficos —, a quem chamou de little bitch (putinha) no Post. Ao se juntar a Snowden, entrou para a lista negra do governo EUA e bateu de frente com o australiano Julian Assange, dono do site WikiLeaks. Após ganhar notoriedade, deixou o Guardian e passou ser bancado pelo bilionário francês de origem iraniana Pierre Omidyar, que oferece auxílio financeiro a jornalistas que enfrentam processos por causa de suas reportagens.

Diferentemente de outros bilionários realmente engajados em causas humanitárias e ambientalistas, o franco-iraniano “faz caridade” com uma desavergonhada pegada de ativismo político. Em 2017, quando doou US$ 100 milhões para combater "Fake News" através do jornalismo investigativo, Omidyar divulgou um comunicado em que se comprometia a aplacar o “déficit global de confiança” nas instituições. Dentre os eventos listados para fundamentar tal preocupação figuravam a eleição de Donald Trump e — vejam só — o impeachment da ex-presidanta Dilma Rousseff.

Para ter mais liberdade para divulgar seu material (os contratos assinados para as colunas no Salon e no Guardian estabeleciam que o gringo publicaria sem ter de se submeter a um editor), Verdevaldo criou o site The Intercept, que em 2013 recebeu meio milhão de dólares de Omidyar, que também custeou os salários da equipe durante os primeiros anos do site. Entre 2014 e 2017, o pasquineiro difamador recebeu US$ 1,6 milhão da First Look Media — empresa do grupo de Omidyar. Seu salário em 2015, segundo matéria do jornalista Charles Davis publicada na Columbia Journalism Review, chegou a US$ 518 mil ao ano, ou US$ 43 mil dólares por mês.

Três anos depois da divulgação dos materiais de Snowden, o panfleto digital de Verdevaldo ganhou os holofotes com a divulgação dos emails da campanha de Hillary Clinton, juntamente com o WikiLeaks — cujo dono foi forçado a deixar a embaixada do Equador, em Londres, onde estava refugiado desde 2012, para evitar ser extraditado ou para a Suécia, onde é acusado de estupro, ou para os EUA, onde é acusado de espionagem.

Com Snowden e Assange, o paladino dos bocós forma um trio sempre disposto a defender Vladimir Putin. Dos três ativistas, ele é o que tem a língua mais afiada. Para cada abuso ou crime cometido a mando de Putin, cria uma história para relativizar o fato ou afirma que as evidências não são suficientes para culpar Moscou. Quando um ex-espião russo e sua filha foram envenenados com Novichok na Inglaterra, no ano passado, disse que os cientistas britânicos mentiram quando disseram que a substância havia sido produzida na Rússia.

Além de preservar o presidente russo, Gleen é simpático a grupos terroristas muçulmanos, como o Estado Islâmico, a Al-Qaeda, o Hamas e o Hezbollah, que considera como "as democracias do Oriente" — só para lembrar: em 1983, membros do Hezbollah explodiram dois caminhões-bomba no Líbano e mataram 307 militares que estavam no país como força de paz. Desses, 241 eram americanos. Mas o Brasil entrou em sua vida por questões pessoais. Em 2005, ele conheceu o jovem David Miranda, então com 20 anos, com quem se casou tempos depois. O hoje deputado, que deixou a escola aos 13 anos, tornou-se mundialmente conhecido por ter sido interrogado por nove horas no aeroporto de Heathrow, em Londres), após ser pego transportando documentos de Snowden para Greenwald.

Em 2016, David se elegeu vereador no Rio de Janeiro pelo PSOL. No ano passado, tentou a Câmara dos Deputados, mas conseguiu apenas tornar-se primeiro suplente da bancada do PSOL. Deu sorte: quando Jean Wyllys se autoexilou na Espanha, alegando ameaças de morte, passou de suplente a titular em seu lugar, o que comprova, mais uma vez, quão bem servidos estamos de representantes no Congresso — que Deus nos livre e guarde.

O alegre casal alegre compartilha uma casa perto da favela da Rocinha e a mesma visão de mundo; "Lutamos contra os governos mais poderosos do mundo e a CIA, a NSA, o Reino Unido… Estávamos sendo ameaçados o tempo todo”, disse o farsante em entrevista ao site Agência Pública, dois dias depois da divulgação das mensagens roubadas do celular de Deltan Dallagnol e que seu site espúrio teria recebido de “fonte anônima”.  Na mesma entrevista, atacou veículos de imprensa brasileiros, afirmando que a “grande mídia” estava trabalhando para a Lava-Jato. Não é um argumento muito diferente do que usou contra a imprensa americana, mas com sinal trocado. Ele diz que os veículos do seu país estavam a serviço dos Democratas, em 2016. “Quando a grande mídia transforma Moro e a força-tarefa em deuses ou super-heróis, torna-se inevitável o que aconteceu. Os jornalistas pararam de investigar e questionar a Lava-Jato e simplesmente ficaram aplaudindo, apoiando e ajudando”, disse ele. “A Globo foi para a força-tarefa uma aliada, amiga, parceira, sócia. Assim como a força-tarefa da Lava-Jato foi o mesmo para a Globo.”

No dia seguinte, a Globo emitiu um comunicado revelando que, apesar dos ataques, Verdevaldo lhe havia proposto uma pareceria para divulgar as mensagens roubadas. O D. Quixote dos pobres e a emissora já tinham trabalhado juntos em 2013, na publicação dos documentos de Snowden, mas, em conversa na redação do Fantástico, o assassino de reputações se negou a dar informações sobre o conteúdo e a origem do material que dizia possuir. Em outras palavras, ele queria fechar a parceria sem que a Globo soubesse antes o que tinha em mãos e por isso a conversa não foi adiante.

Uma vez publicadas as matérias no Intercept, prossegue o comunicado da Globo, um representante do site ainda procurou a emissora para oferecer uma entrevista. Também não deu certo. Na sequência, Glenn passou a atacar a Globo. “O comportamento de Greenwald nos episódios aqui narrados permite ao público julgar o caráter dele”, resume a nota.

O juiz auxiliar Marcelo Martins Evaristo da Silva, da 16.ª Vara de Fazenda Pública do Rio, negou a quebra dos sigilos bancário e fiscal de David Miranda. Segundo ele, a medida só deve ser adotada em “circunstâncias excepcionais”, já que pode produzir impacto negativo na imagem do investigado.

Ao determinar que o marido de Verdevaldo e os parças que entraram no radar do MP-RJ sejam ouvidos antes da adoção de qualquer iniciativa que viole o sigilo, o magistrado ponderou que eventual convite para prestar depoimento não afetará a investigação, já que as informações apuradas se referem a fatos ocorridos no passado e que estão nas mãos de instituições financeiras e da Receita Federal, “resguardadas, portanto, de quaisquer iniciativas dos interessados no sentido de sua inutilização ou distorção enquanto documentos dotados de força probante.” Miranda e Greenwald já alegam “retaliação” — Oh! Que surpresa! — e devem seguir nessa mesma linha quando se pronunciarem oficialmente.

Outro questionamento feito pelo juiz substituto diz respeito à decisão de Dias Toffoli, que, valendo-se de um pedido da defesa Flávio Bolsonaro, suspendeu por atacado todas as investigações que usaram dados de órgãos como o Coaf sem autorização judicial prévia (assunto que já foi comentado ad nauseam aqui no Blog). No pedido da quebra de sigilo do marido de Verdevaldo, o MP alegou que a decisão de Toffoli não valeria para casos de improbidade administrativa, que correm na esfera cível. Mas o conspícuo decisor refutou o argumento e afirmou que seria “inconcebível” impedir o uso dos dados para fins criminais e os autorizar livremente em ações de improbidade.

Valendo-se do mesmíssimo argumento usado pelas defesas de Flávio Bolsonaro e Fabrício Queiroz, David Miranda reclamou do vazamento do caso para a imprensa, que considera a “única ilegalidade” na história toda. A investigação corre sob sigilo de Justiça.

O mundo dá muitas voltas. Seria providencial que ao casal 20 versão século XXI fosse administrada uma dose cavalar do seu próprio remédio, até porque a diferença entre o remédio e o veneno está justamente na dosagem. E assim encerro esta postagem, mas não sem antes recomendar a leitura desta matéria, que detalha todo esse imbróglio envolvendo o casal 20 e uns. Se sobrar tempo, não deixe também de assistir a este vídeo.  

sábado, 7 de setembro de 2019

A POPULARIDADE DE UM GOVERNO IMPOPULAR



Contrariando as expectativas, mas fiel ao hábito de tomar decisões que causam "frisson" na mídia, Bolsonaro indicou com dez dias de antecedência o substituto de Raquel Dodge no comando da PGR — instituição cuja importância o capitão já comparou com a da Rainha no jogo de Xadrez.

Ainda é cedo para dizer qualquer coisa além do nome do subprocurador — Augusto Aras —, que ele não foi pinçado da "listra tríplice" do Ministério Público e que a indicação parece ter agradado mais aos petistas que à ala pró-Bolsonaro.

Segundo Josias de Souza, desconsidera-se o fato de que, para prevalecer no intrincado processo de escolha, Aras teve de assumir compromissos que tornam seu hipotético petismo um problema secundário. O que mais inquieta são as roldanas que o futuro procurador-geral traz implantadas na cintura. Aras gira conforme a conveniência, e tamanha maleabilidade política atiça os ânimos da corporação dos procuradores num instante em que atual chefe da Procuradoria-Geral enfrenta uma debandada: como eu comentei postagens atrás, o staff criminal da PGR exonerou-se de suas funções justamente porque farejou um odor de enxofre na movimentação da chefe em fim de mandato.

Produzir insensatez é a marca registrada deste governo. Tem sido assim há oito meses e assim será enquanto o capitão comandar esta nau de insensatos. Entre suas mais recentes estultices está o vai-e-vem  sobre o teto dos gastos — num dia, a revisão do teto é um imperativo matemático, na manhã seguinte, o recuo nas redes sociais. Outra é garantir que não vetaria senão o artigo que proíbe policiais de algemar presos, para logo depois admitir que as acolheria 9 das 10 sugestões apresentadas por Sérgio Moro. A partir daí, a quantidade de vetos foi aumentando na proporção direta da aproximação do vencimento do prazo. Num dia, o presidente disse que acolheria todos os dez vetos; no dia seguinte, o cesto de vetos saltou para "quase 20"; na última quinta-feira, vetou 36 artigos de 19 dispositivos da lei.

Observação: Bolsonaro diz que seguiu orientações do seu centrão, um bloco de ministros que inclui o ex-juiz da Lava-Jato. Quem quiser que acredite. Em verdade, o presidente evoluiu em cena com a orelha encostada no asfalto e os olhos grudados nas redes sociais. Notou que o passeio pelo lado obscuro da política pode sair caro. A desfaçatez tem um custo. Para que o capitão se reconcilie com seu discurso, falta tomar distância do filho 01, reacender as luzes do ex-Coaf e abandonar o papel de estorvo da PF e do Fisco.

Incoerências assim que sugerem que o presidente — que, durante a campanha, prometeu acabar com a reeleição — está mais preocupado com as urnas do que com os cofres públicos. Aclamado pelos bolsomínions, que aplaudem tudo que ele diz com a beatitude retardada dos idiotas, o capitão infla seu ego gigantesco e se vê como um César contemporâneo, a quem basta apontar o polegar para baixo para transformar adversários, desafetos e inimigos reais e imaginários em comida de leão.

A três longos anos da próxima disputa presidencial, Bolsonaro e Dória estão em plena campanha. Unidos pelas correntes do antipetismo explícito em 2018, eles assim permaneceram até algum tempo atrás, quando sinais de distanciamento assomaram no horizonte, sobretudo pela dificuldade de o tucano se colocar como candidato sem antagonizar o atual presidente. Em junho, fizeram lado a lado uma demonstração de flexão de braço durante evento na zona sul de São Paulo; dias atrás, trocaram farpas pelas redes sociais.

Bolsonaro chamou Doria de "ejaculação precoce"; Doria respondeu que foi criticado da mesma maneira pelo presidiário Lula quando derrotou Haddad na disputa pela prefeitura de Sampa em 2016. A primeira-dama de São Paulo, Bia Doria, disse que o capitão usa "expressões chulas, que ferem e desrespeitam a família brasileira e a importância do cargo que ocupa". Na mesma linha seguiu o ex-pesselista recém-convertido a tucano Alexandre Frota: O presidente é a broxada do ano e quer falar de ejaculação precoce? Ele fantasia muito, tipo masturbação política”, disse o deputado à Folha.

Bolsonaro, com ciúmes da popularidade de Sérgio Moro — a quem ofereceu o ministério da Justiça para agregar credibilidade à sua promessa de combater implacavelmente a corrupção e os corruptos —, passou a ver no ex-juiz da Lava-Jato uma ameaça a sua reeleição. Moro, por sua vez, vive um inusitado paradoxo: popularíssimo na sociedade, tornou-se impopular no gabinete do presidente da República, cujo prestígio declina. Segundo o Datafolha, a taxa de aprovação do ministro é 25 pontos maior do que a do chefe.

Governos em geral costumam ter um excesso de cabeças e carência de miolos; o de Bolsonaro em particular sofre do mesmo mal, só que opera com uma cabeça só. O capitão é o tipo de político que segue a teoria da palmeira única, que não aceita a ideia de dividir o gramado com outra palmeira, sobretudo se ela tem quase o dobro do seu prestígio. E da inveja para o medo é um pulinho que pode transformar neurose em realidade. Até outro dia, o sonho de Moro era fazer um bom trabalho no ministério e ganhar uma poltrona no STF. Escanteado pelo chefe, passa a enxergar na política sua melhor alternativa.

A mesma pesquisa que exibe a invejável popularidade do ministro da Justiça dá conta de que outros ministros de Estado suplantam o em popularidade. Paulo Guedes cravou 38% de aprovação, e Tarcísio de Freitas, 36%. No momento, além de ser um sub-Moro, Bolsonaro está empatado com o ministro das queimadas, Ricardo Salles (30%), e com o ministro do marxismo cultural, Abraham Weintraub (29%). Talvez fizesse um bem a si mesmo se esquecesse 2022 e se concentrasse no essencial, que é a recuperação da economia.

sexta-feira, 6 de setembro de 2019

PEC DA PREVIDÊNCIA, JUDICIÁRIO, PGR, RAQUEL DODGE, LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE, RENÚNCIA DE PROCURADORES EM BLOCO E O ORGULHO DE SER BRASILEIRO



Chamar este pobre país de "banânia" é elogiar, mas, convenhamos, seria deselegante (embora não totalmente impróprio) tratá-lo de "país de merda". Questões semânticas à parte, fato é que nossa "Pátria Amada, Brasil" perdeu em abril deste ano a 7ª posição no ranking das principais economias mundiais (que vinha mantendo desde 2005) e já nem figura mais entre as 29 nações mais ricas da lista do Business Insider. O "País do Futuro (que nunca chega)" tem os impostos, os juros, os automóveis, os pedágios, o combustível e a energia elétrica mais caros do mundo.

Como se não bastasse, o "Gigante Adormecido" (deitado eternamente em berço esplêndido) tem os políticos mais corruptos do mundo e é presidido atualmente pelo chefe de governo mais irracional do mundo, que acontece de ser também o mais impopular entre todos os que ocuparam esse cargo desde a redemocratização do "País do Futebol". E com a recente alta do dólar, nosso povo sofrido já nem pode mais ir à Disney conhecer o Pateta. Felizmente, basta ir a Brasília ou entrar nas redes sociais para ver vários.

A coisa fica ainda pior quando se foca a Justiça nesta terra de ninguém. Além de cega, essa senhora é surda e, não raro, corrupta: sobram "causos" de venda de sentenças envolvendo não só juízes de primeira instância, mas desembargadores e ministros das Cortes superiores. Claro que daí até suas meritíssimas excelências serem processadas, jugadas, condenadas e encarceradas vai uma longa distância.

Observação: Entre uma miríade de exemplos notórios, relembro o caso do desembargador Ivan Athié, presidente da 1ª Turma do TRF-2, que em março passado mandou soltar o Vampiro do Jaburu e seu comparsa, coronel Lima (para detalhes da vida pregressa do "Limão", como o policial militar reformado gosta de ser tratado, clique aqui). Athié  ficou afastado do cargo durante sete anos, devido a uma ação no STJ por estelionato e formação de quadrilha (em 2004). Um inquérito contra ele, com as mesmas acusações, foi arquivado em 2008 pelo STJ a pedido do MPF, que alegou não ter encontrado provas de que o desembargador tivesse proferido sentenças em conluio com advogados. O magistrado retornou às atividades em 2011, depois que o STF trancou a ação contra ele.

Falando em patacoadas, a usina de crises de plantão no Planalto criou mais um "mal estar internacional" ao criticar a ex-presidente do Chile e atual comissária da ONU para direitos humanos, Michelle Bachelet. Em pronunciamento sobre o governo brasileiro, Bachelet afirmou que observou "uma redução do espaço cívico e democrático, caracterizado por ataques contra defensores dos direitos humanos, restrições ao trabalho da sociedade civil e ataques a instituições de ensino”, e que, "desde 2002, o Brasil é um dos cinco países do mundo com o maior número de assassinatos de ativistas de direitos humanos".

Fiel ao seu estilo "bateu, levou", Bolsonaro devolveu: “Ela está acusando que não estou punindo policiais que estão matando muita gente no Brasil. Essa é a acusação dela. Ela está defendendo direitos humanos de vagabundos. Ela critica dizendo que o Brasil está perdendo seu espaço democrático. Senhora Michelle Bachelet, se não fosse o pessoal do Pinochet derrotar a esquerda em 73, entre eles seu pai, hoje o Chile seria uma Cuba. Eu acho que não preciso falar mais nada para ela”.

Cá entre nós, eu acho que a repercussão midiática — como de praxe — foi muito além do comentário do capitão, talvez pelo fato de ele ter citado nominalmente o pai de Michelle, general Alberto Bachelet, que foi torturado e morto durante a ditadura de Augusto Pinochet. Mas remexer nos escaninhos da história chilena não é bem a minha praia, e não convém ao sapateiro ir além das chinelas.

Voltando ao cenário jurídico-político tupiniquim, os ex-governadores do Rio, Anthony Garotinho e Rosinha Mateus, presos dias atrás com outros três suspeitos de participar de um esquema de superfaturamentos em contratos celebrados entre a Prefeitura de Campos dos Goytacazes (município fluminense do qual ambos foram prefeitos) e a construtora Odebrecht, foram soltos depois de passarem uma única noite na cadeia, graças à pronta intervenção do desembargador Siro Darlan, que lhes concedeu o habeas corpus durante o plantão judiciário na 7ª Câmara Criminal do TJ-RJ.

Além de ter carreira marcada por decisões controversas e de grande repercussão, Darlan é alvo de inquérito no STJ, que apura a venda de sentenças no fórum da capital. Antes de ser nomeado desembargador, em 2004, ele comandou, por mais de uma década, a 1ª Vara da Infância e da Juventude do Rio. Muitas de suas decisões geraram polêmicas. Como desembargador, em 2013, concedeu habeas corpus a sete dos nove envolvidos na invasão ao Hotel Intercontinental, em São Conrado, em 2010, quando o bando, armado com fuzis, pistolas e granadas, manteve 35 reféns, entre funcionários e hóspedes, por três horas. Na ocasião, uma pessoa morreu e seis ficaram feridas. Entre os beneficiados estava Rogério 157, que assumiu o comando do tráfico na Rocinha após a prisão do traficante Nem.

Em dezembro do ano passado, O GLOBO publicou que Darlan é suspeito de soltar presos durante plantões judiciais em troca de propina. Em dois casos investigados, detentos teriam sido beneficiados por decisões do desembargador. Num deles, foi anexada a colaboração premiada de um dos envolvidos, que afirmou ter ouvido de um dos presos sobre o pagamento a um intermediário do magistrado: R$ 50 mil para ser solto. Inicialmente, segundo o delator, o lance foi de R$ 120 mil, mas caiu para menos da metade dividido em duas parcelas.

Passando às boas notícias — se é que ainda as temos neste país: A CCJ do Senado não só aprovou, por 18 votos contra 7, relatório do senador Tasso Jereissati sobre a PEC da Previdência, como rejeitou os oito destaques apresentados para alterar o parecer do relator. A PEC paralela também foi aprovada em votação simbólica e por unanimidade. O texto principal segue para o plenário do Senado e, se aprovado, será promulgado. O ganho fiscal chegará na R$ 962 bilhões, mais R$ 350 bilhões se a PEC paralela for aprovada na Câmara e os estados e municípios aderirem à proposta que altera as regras da aposentadoria.

Bolsonaro anunciou ontem que deve acolher integralmente as sugestões de vetos do ministro da Justiça ao texto da Lei de Abuso de Autoridade, aprovada a toque de caixa, dias atrás, pelo Congresso. Segundo o portal G1, o capitão efetivamente votou 36 trechos de 19 artigos. Apesar dos esforços de Verdevaldo da Couves, da imprensa marrom (ou seria vermelha?), dos corruptos que pululam no Congresso e da banda podre da alta cúpula do Judiciário, Sérgio Moro continua muito popular, com 25 pontos de aprovação acima do presidente.

Por outro lado, segue envolta em brumas a nomeação do próximo Procurador-Geral da República (o mandato da atual termina no próximo dia 17). Há uma pressão política dos presidentes da Câmara e do Senado para que Raquel Dodge seja reconduzida ao cargo, o que desagradou membros da força-tarefa da Lava-Jato que atuam no DF, onde as coisas andam muuuuuuito mais devagar do que em Curitiba — até hoje, nenhum político com foro privilegiado foi mandado para a cadeia pelos 11 togados supremos, sem mencionar que a delação de Leo Pinheiro, da OAS, está parada há mais de um ano e outros processos e delações estão embolorando nos escaninhos da PGR.

Atualização: no finalzinho da tarde de ontem, o Augusto Aras foi escolhido pelo presidente para suceder a Raquel Dodge no comando da PGR. O subprocurador baiano tem 60 anos de idade e foi apadrinhado pelo ex-deputado federal Alberto Fraga, que é um dos políticos mais próximos de Bolsonaro. Aras era bem contado, mas caiu na bolsa de apostas depois que a imprensa divulgou que ele já defendeu o MST (em discurso na Câmara, em 2008) e promoveu jantares para petistas. Pelo mesmo motivo, enfrentou resistências no PSL, mas procurou parlamentares da legenda que têm proximidade com o capitão para tentar reverter o quadro. Funcionou. Sua indicação ainda precisa ser chancelada pelo Senado, mas o que importa mesmo é saber se foi uma boa escolha, considerando que a Lava-Jato e o combate à corrupção dependem diretamente da PGR  que o o próprio Bolsonaro comparou recentemente à Rainha no jogo de Xadrez

Na última quarta-feira, os procuradores Raquel Branquinho, Maria Clara Noleto, Luana Vargas, Hebert Mesquita, Victor Riccely e Alessandro Oliveira, integrantes da força-tarefa da Lava-Jato em Brasília, pediram demissão em bloco, alegando divergências de posicionamento com Raquel Dodge. Em nota, o grupo afirmou que o desligamento se deve a uma “grave incompatibilidade de entendimento dos membros da equipe” com a manifestação enviada pela PGR ao STF no dia anterior, quando Dodge pediu arquivamento preliminar de trechos do acordo de colaboração de Léo Pinheiro em que foram citados Rodrigo Maia e Ticiano Dias Toffoli, irmão ministro supremo Dias Toffoli.

Ao que parece, depois que a 2ª Turma do Supremo, decisão de anular a sentença do então juiz Sérgio Moro no caso do ex-presidente petista do BC e da Petrobrás, Aldemir Bendine, e devolver os autos à primeira instância, a Lava-Jato resolveu partir para a guerra. Para entender melhor esse imbróglio, convém ouvir que entende do assunto:

quarta-feira, 4 de setembro de 2019

PONTOS A PONDERAR NESTA REPUBLIQUETA DE BANANAS

No Brasil, a exemplo de produtos perecíveis e promessas de campanha de políticos desavergonhados, as notícias também têm prazo de validade.

Cito como exemplo a promessa de campanha do nosso presidente, de que travaria uma cruzada contra a corrupção e os corruptos. Venceu. Azedou. Apodreceu. O capitão virou a casaca assim que o ex-Coaf levantou suspeitas de podridão nas entranhas do seu clã.

Não só por isso, mas também por isso, a estratégia que Bolsonaro vem adotando para afastar as investigações do cangote da primeira-família azedaram suas relações com Sérgio Moro, fiador da quimérica cruzada que, para o capitão, só vale quando é contra seus adversários.

As rusgas (tanto reais quanto fictícias) entre o Bolsonaro e seu ministro têm sido exploradas ad nauseam, a exemplo de todo tipo de desgraça que a mídia nos despeja gola abaixo — ou ouvidos adentro — dia sim, outro também. O assunto já deu no saco, mas parece que ninguém ainda se deu conta.

Ganha um Fusca quem flagrar um âncora de telejornal noticiando algo alvissareiro (futebol não vale, porque a vitória do time "x" é má notícia para o torcedor do time "y"). Quando não é rompimento de barreira, é queimada na Amazônia; quando não é rebelião em presídio, é gente inocente morta por bala perdida; quando não é terremoto, furação ou tsunami em alguma parte do planeta, é a guerra comercial entre EUA e China. E entre uma coisa e outra, dá-lhe violência!

Observação: Por falar mais do que deve sobre o que não deveria, Bolsonaro, sempre disposto a interferir em tudo para não se tornar um presidente-banana, promove questiúnculas irrelevantes à condição de problemas de dimensões siderais — e depois reclama da queda sistemática dos seus índices de aprovação popular. Se mantiver sua imensa boca fechada durante os dez dias em que ficará afastado por conta de uma quarta cirurgia no abdome — desta feita para corrigir uma hérnia incisional resultante das intervenções anteriores —, talvez as coisas avancem sem grandes sobressaltos.

A diarreia da vaza-jato perdeu o "encanto" inicial, mas ainda produz gases putrefactos. Na noite da última segunda-feira, Glenn Verdevaldo Greenwald cagou regras no Roda Viva da TV Cultura, ensinando a um bando de boçais o que é ser patriota. Vale a pena não assistir — eu, particularmente, não tive estômago para tanto, mas se você tomar uma dose cavalar de Plasil...

Ao sabor da última golfada expelida pelo site The Interpret, veículos de comunicação ditos isentos exploraram à saciedade uma troca de mensagens na qual procuradores da Lava-Jato teriam sido "desrespeitosos" em relação à morte da ex-primeira-dama, do irmão e do neto de Lula. Vale lembrar (mais uma vez) que o material hackeado e não autenticado carece de credibilidade, mas Verdevaldo das Couves e seus repetidores oficiais tratam-no como se fosse a quintessência da verdade.

Observação: Em relatório parcial da Spoofing, divulgado no fim de semana, a PF cita uma troca de mensagens entre Walter Delgatti Neto, o Vermelho, e Danilo Marques, outro preso na operação, que indica que ele pode ter vendido o material que roubou dos celulares das autoridades. No texto, Vermelho diz que “acabou a tempestade” e “veio a bonança”. A PF afirma ainda ter encontrado indícios de lavagem de dinheiro mediante uma transação de R$ 1,5 milhão em criptomoedas, o que eu até compreendo. Mas como é que dá para concluir que os cibercriminosos foram pagos pelo "serviço" ou pela venda do material roubado a partir de frases como "acabou a tempestade" e "veio a bonança"? Enfim, não vá o sapateiro além das chinelas; vai ver eu sou muito burro...

Não faz o menor sentido dar a uma conversa privada entre os membros da força-tarefa o mesmo destaque que teria um pronunciamento em rede nacional de rádio e televisão, por exemplo. Atire a primeira pedra quem, também por exemplo, nunca desancou o chefe numa conversa de alcova com a patroa, ou não se queixou da sogra numa conversa de boteco com um amigo. O que é dito em circunstâncias que tais morre ali, como o que acontece em Vegas fica em Vegas.

Mas não no Brasil, onde boa parte da imprensa — e, por que não dizer, a banda podre do Judiciário — tem verdadeira veneração pelo criminoso de Garanhuns. Curiosamente, porque disso ninguém fala, foi justamente Lula quem primeiro desrespeitou a memória da falecida esposa, transformando seu velório em comício e seu esquife em palanque — sobre o qual ele só faltou sapatear.

Dias atrás, em mais uma entrevista concedida a partir de sua cela VIP na Superintendência da PF em Curitiba, o picareta dos picaretas tornou a pôr em dúvida o atentado que quase matou o então candidato Jair Bolsonaro.

É nisso que dá medir os outros pela própria régua: duvidosa, mesmo, é a autoria dos tiros desfechados contra a caravana de Lula no Paraná, em março do ano passado, ou dos ataques à sede nacional do PT, em junho de 2016.

Observação: A Folha de S. Paulo perguntou ao Dr. Luiz Henrique Borsato, que operou Bolsonaro em Juiz de Fora, por que não houve sangramento abundante quando o político levou a facada. O esculápio explicou que, quando penetrou o abdome da vítima, a peixeira abriu uma ferida pequena, de mais ou menos 3 cm. Como não era uma grande lesão circunferencial, mas retilínea, a musculatura se contraiu e bloqueou a hemorragia externa. Havia sangue, claro, mas no interior da cavidade abdominal, e o volume pode ter chegado a dois litros. Entendeu, Lula?

Não bastasse a insegurança jurídica produzida por mais uma decisão absurda da segunda turma do STF — falo da condenação do ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobrás, Aldemir Bendine, que já estimulou outros condenados a pleitear isonomia de tratamento e levou uma banca de advocacia do RJ a retirar cinco propostas de delação da mesa de negociações com a Lava-Jato (um sinal inequívoco de que os causídicos querem esperar para ver que bicho vai dar) —, as incertezas resultantes da aprovação, no Congresso, da Lei de Abuso de Autoridade levaram a Promotoria de São Paulo a suspender por seis meses uma investigação sobre Rosemary Noronha, ex-chefe de gabinete da Presidência da República em Sampa e amiga íntima de... Lula.

Bolsonaro tem até amanhã para vetar essa excrescência, e já antecipou que o fará em relação a 19 ou 20 itens, dez dos quais sugeridos pelo ministro Sérgio Moro.

Antes de dedicar mais algumas linhas à Rose Noronha, transcrevo um texto que o jurista Modesto Carvalhosa postou em sua página no Facebook, sob o título O ENCADEAMENTO PERVERSO DA LEI SOBRE ABUSO DE AUTORIDADE:

O “instrumento legal” elaborado por Renan Calheiros para amedrontar, inibir e paralisar os agentes públicos no combate à corrupção e ao crime organizado é diabólico. Assim, a chamada Lei de Abuso de Autoridade, aprovada na calada da noite por “votação simbólica” sob a presidência do infame Rodrigo Maia, determina, no sinistro artigo 30, que será punido com prisão de até 4 anos, multa e perda do cargo qualquer agente público que der “inicio ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa SEM JUSTA CAUSA FUNDAMENTADA OU CONTRA QUEM SABE INOCENTE“. Consequência dessa “norma legal”: Se o delegado de polícia INDICIAR um corrupto e a promotoria ARQUIVAR o processo, o delegado pega 4 anos de cadeia, paga multa e perde o emprego público. Indiciou um inocente, sem justa causa. Mas se o promotor acolher o indiciamento e DENUNCIAR o corrupto e o juiz o ABSOLVER é a vez do promotor ir preso, pagar multa e ser expulso da promotoria. Denunciou um inocente, sem justa causa. Mas se o juiz CONDENAR o corrupto e o Tribunal de Justiça do seu Estado o ABSOLVER, será a vez do Juiz ficar encarcerado por 4 anos, pagar multa e ser demitido a bem do serviço público. Condenou um inocente, sem justa causa. E se os desembargadores CONFIRMAREM a sentença do juiz e o Superior Tribunal de Justiça, lá de Brasília, ABSOLVER o corrupto, serão agora os 3 ou 5 desembargadores da Turma Julgadora que serão presos, multados e excluídos da magistratura. Condenaram colegiadamente um inocente, sem justa causa. 
Toda essa cadeia de terror, que visa inibir qualquer indiciamento, denúncia ou condenação, beneficia não somente os corruptos, mas também as organizações criminosas, os traficantes, e todo e qualquer delinquente. Todo esse encadeamento inibitório de qualquer providência legal contra os criminosos vai ser regido pelo onipresente Supremo Tribunal Federal, cujos ministros “garantistas da impunidade”, que dominam aquela Corte, por decisão monocrática em cada caso, ou por votação do seu plenário, com repercussão geral, irá PUNIR os delegados, promotores e magistrados que OUSAREM indiciar, denunciar ou condenar qualquer corrupto ou membros das organizações criminosas. Esse é o sórdido “instrumento legal” construído por Renan Calheiros, para, finalmente, levar o Brasil ao domínio da corrupção e do crime organizado. Cabe ao Presidente Bolsonaro VETAR INTEGRALMENTE, ATÉ O PRÓXIMO DIA 7, essa criminosa lei de proteção dos bandidos. O povo brasileiro assim espera.

Sobre a  amiguinha de LulaAugusto Nunes publicou em 2013 um texto lapidar, do qual eu extraí o excerto a seguir: 

"A discrição nunca foi uma característica da personalidade de Rosemary Noronha. Quando servia ao ex-presidente em Brasília, ela era temida. Em nome da intimidade com o “chefe”, fazia valer suas vontades mesmo que isso significasse afrontar superiores ou humilhar subordinados. Nos eventos palacianos, a assessora dos cabelos vermelhos e dos vestidos e óculos sempre exuberantes colecionou tantos inimigos — a primeira-da­ma não a suportava — que acabou sendo transferida para São Paulo. Mas caiu para cima. Encarregada de comandar o gabinete de Lula de 2009 a 2012, Rose viveu dias de soberana e reinou até ser apanhada pela Polícia Federal ajudando uma quadrilha que vendia facilidades no governo. Ela usava a intimidade que tinha com Lula para abrir as portas de gabinetes restritos na Esplanada. Em troca, recebia pequenos agrados, inclusive em dinheiro. Foi demitida, banida do serviço público e indiciada por crimes de formação de quadrilha e corrupção. Um ano e meio após esse turbilhão de desgraças, no entanto, a fase ruim parece ter ficado no passado. Para que isso acontecesse, porém, Rosemary chegou ao extremo de ameaçar envolver o governo no escândalo."

Sem mais comentários!

quinta-feira, 29 de agosto de 2019

AINDA SOBRE A ESTAPAFÚRDIA ANULAÇÃO DA CONDENAÇÃO DE ALDEMIR BENDINE



A postagem de hoje foca a decisão estapafúrdia (mais uma) do STF, que na última terça-feira anulou o julgamento do ex-presidente do BB e da Petrobrás Aldemir Bendine, abrindo espaço para uma enxurrada de pedidos análogos, inclusive por parte da defesa de certo ex-presidente petralha — cuja soltura, de alguma maneira, qualquer que seja ela, parece ter se tornado prioridade zero para alguns membros da nossa mais alta Corte de Justiça. Como eu tive outros assuntos para tratar no dia de ontem, faltou-me tempo para estudar melhor o tema em tela e tecer considerações mais circunstanciadas (tenciono preencher as lacunas no post de amanhã, caso não aconteça nenhuma outra catástrofe). Dito isso, vamos em frente.

Quando era juiz de primeira instância, Moro condenou Bendine e vários outros réus usando o mesmo critério que ora foi contestado pela 2ª turma dos supremos togados (vencido o voto do relator, ministro Luís Edson Fachin, e ausente o decano Celso de Mello, que está se recuperando de uma pneumonia). Note que tanto o TRF-4 quanto o STJ já haviam referendado a decisão emanada da 13ª VF do Paraná, a despeito de a defesa sustentar que o réu deveria ter tido o direito de apresentar suas “alegações finais” depois dos delatores, réus como ele, pois estes teriam se transformado em “assistentes de acusação”, e a lei garante que a defesa tenha a palavra final, depois da acusação. 

Observação: Isso é balela: os réus continuam sendo réus, apenas obtêm determinadas vantagens (como uma pena mais branda) por terem colaborado com a Justiça. Demais disso, só agora, depois que a Lava-Jato estar ativa e operante por mais de 5 anos, e de ter produzido os resultados que produziu graças, em boa medida, às delações premiadas, é que o Supremo resolve, do nada, entender que as regras do jogo precisam ser mudadas? Para mim, isso fede a oportunismo barato.  

Moro rejeitou a tese da defesa por absoluta "falta de previsão legal, forma ou figura em Juízo”. Segundo ele, “a lei estabelece prazo comum para a apresentação de alegações finais, ainda que as defesas não sejam convergentes, e não cabe à Justiça estabelecer hierarquia entre acusados, todos com igual proteção da lei”. 

Aliás, todos os julgamentos de processos da Lava-Jato presididos por ele enquanto juiz da 13ª Vara Federal do Paraná certamente seguiram o mesmo critério, segundo o qual “o acusado colaborador não se despe de sua condição de acusado no processo, apenas opta, com legitimidade, por defender-se com a pretensão de colaborar com a Justiça". Acolher o requerimento da defesa de Aldemir Bendine seria o equivalente a estabelecer uma hierarquia entre os acusados, distinguindo-os entre colaboradores e não colaboradores, com a concessão de privilégios aos últimos por não terem colaborado. 

É no mínimo um absurdo anular uma sentença com base em filigrana processual sem base legal. A decisão da turma causou espécie, tanto porque não há na lei exigência que a sustente — uma vez que o instituto da delação premiada ainda é novo na nossa legislação penal —, quanto pelo fato de a ministra Cármen Lúcia não ter seguido o voto do relator, e, sim, se alinhado com Mendes e Lewandowski

Observação: Para que um processo seja anulado, o CPP exige demonstração cabal de prejuízo para a defesa do réu, e os doutos decisores da 2ª Turma, com exceção do relator e do enfermo, entenderam que o fato de dar o mesmo prazo para todos os réus, quando alguns eram delatores, feriu os direitos de Bendine.

Na avaliação dos procuradores da Lava-Jato, essa lamentável decisão abre brecha para outros casos, devendo, pois, ser questionada o quanto antes e pacificada pelo plenário da Corte. A PGR está providenciando um pedido nesse sentido, visando ao menos tentar minimizar um possível efeito cascata em outros julgamentos de réus sentenciados por corrupção e demais crimes.

A defesa de Lula entrou nesta quarta-feira com mais um pedido de habeas corpus STF para anular a sentença a 12 anos e 11 meses de prisão, imposta pela juíza Gabriela Hardt no processo do sítio de Atibaia e a condenação imposta por Moro, a 9 anos e 6 meses no caso do triplex (que depois viria a ser reduzida pelo STJ a 8 anos e 10 meses). Se você tem estômago forte, leia a entrevista que esse dejeto de camiranga concedeu à BBC um dia depois que a 2ª turma dos urubus proferiu sua esdrúxula decisão.

Raquel Dodge solicitou que o grupo de trabalho da Lava-Jato no STF discuta as alternativas jurídicas para um eventual recurso. A atual coordenadora das investigações penais na PGR, Raquel Branquinho, ficou de reunir o grupo para estudar o assunto. Uma das estratégias é levantar precedentes de outros julgamentos do STF para ver como os ministros se posicionaram contra esse mesmo argumento utilizado pela defesa de Bendine.

Dodge precisa esperar a 2ª Turma disponibilizar o acórdão do julgamento, para só então contestar os argumentos. A estratégia em análise seria ingressar com embargos de declaração — instrumento jurídico que não tem o condão de reverter o resultado do julgamento, mas é usado para elucidar pontos obscuros ou controversos da decisão. Assim, a PGR poderia tentar delimitar o alcance da decisão e evitar que ela atinja os demais processos da Lava-Jato (as defesas de Dirceu e Vaccari avaliam pedir anulação das condenações de seus clientes essa decisão absurda).  

terça-feira, 27 de agosto de 2019

SOBRE LULA E BOBÔ


No meio de tanta notícia ruim, salvou-se ao menos uma alma do purgatório: a 2ª Turma do STF rejeitou por unanimidade o pedido da defesa de Lula para anular atos de Sérgio Moro na ação envolvendo o Instituto Lula — o único dos três processos originários da Lava-Jato em Curitiba que ainda não foi julgado em primeira instância. Cristiano Zanin e companhia desistiram de outros dois recursos cujo conteúdo era o mesmo do pedido de suspeição de Moro tratado no habeas corpus cujo julgamento deve ser concluído hoje. Edson Fachin e Cármen Lucia votaram na primeira etapa; resta saber como se posicionará o decano Celso de Mello, já que os votos de Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski são fáceis de prever.

Agora uma notícia não tão boa, sobretudo pelo impacto no mercado financeiro: Em relatório conclusivo, a PF atribuiu ao presidente da Câmara os crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e caixa dois em investigações que envolvem a delação da Odebrecht no âmbito da Lava-Jato. Com isso o IBOVESPA, que estava se recuperando timidamente durante a manhã de ontem, voltou a despencar no final da tarde.

Observação: Na planilha de propinas da empreiteira, Rodrigo Maia que é identificado como Botafogo, teria recebido R$ 350 mil nas eleições de 2010 e 2014. No dia 23, o ministro Fachin concedeu prazo de 15 dias para a PGR decidir se oferece denúncia. O presidente da Câmara, um dos mais ferrenhos defensores da recondução de Raquel Dodge ao cargo de procuradora-geral da República, não conseguiu seduzir Jair Bolsonaro, e ainda virou matéria-prima para a chefe do MPF.

Mudando de um ponto a outro, Bolsonaro negou desavenças com Moro, mas reagiu quando questionado se o ministro teria carta branca: “Eu tenho poder de veto em qualquer coisa, senão eu não era presidente. Todos os ministros têm ingerência minha. Eu fui eleito para mudar”. Sobre essa postura do capitão, submeto ao leitor as seguintes considerações:

Com quase oito meses de governo, o capitão se divide entre o político que ostenta índices positivos de avaliação e aspira à reeleição e o que é criticado até por seus apoiadores. O comportamento combativo — sobretudo contra o PT e a corrupção — que lhe garantiu a vitória sobre o bonifrate manipulado por Lula parece não funcionar fora do palanque — e talvez por isso ele continue agindo como se estivesse em plena campanha.

Sem preparo para exercer o cargo nem consciência do tamanho da cadeira presidencial, o "mito" dispara os impropérios que lhe vêm à cabeça — da defesa extremada do filho 03 para assumir a embaixada no EUA à afirmação leviana de ONGs e governadores promovem queimadas na Amazônia para prejudicá-lo. Mas há uma estratégia por trás disso: manter sua usina de crises à todo vapor desvia o foco dos índices cambaleantes na economia e mantém inabalável a fé dos bolsomínions, o que pode lhe ser útil caso não seja abatido em seu voo de galinha e venha a disputar a reeleição em 2022.

Mas será seu governo tão ruim quanto dizem? Para responder essa pergunta é preciso ter em mente que a maioria das coisas só é ruim ou boa em comparação com outras da mesma natureza. Partindo dessa premissa, a questão passa a ser: será o atual governo pior do que foi o de Dilma Rousseff ou de Lula? E se comparando ao de Fernando Collor, então, ou ao de José Sarney?

Apesar dos pesares — e olha que não são poucos — e dos esforços da turminha do quanto pior melhor, é improvável que o governo Bolsonaro seja um desastre total, ou que o centroavante seja expulso de campo antes do final da partida. Improvável não significa impossível, mas como fará a oposição para reunir no Congresso três quintos dos parlamentares se na última vez que a Câmara votou uma questão essencial, a reforma da Previdência, deu 74% dos votos para o governo?

 Em outros governos, foram necessárias graves crises econômicas para que a população ficasse em pé de guerra contra o presidente. FHC, entre a reeleição e o início do segundo mandato, teve de lidar com a desvalorização cambial e se desgastou por completo com o apagão de 2001. Dilma perdeu capital político nos protestos de 2013 e desabou de vez com o ajuste fiscal fracassado do segundo mandato. Lula é um caso à parte, pois deixou o Palácio com a popularidade nos píncaros — o que lhe permitiu eleger e reeleger a gerentona de araque e, à sombra dela, continuar enchendo as burras a mais não poder — e acabou na cadeia.

Recente levantamento feito pelo Instituto FSB Pesquisa dá conta de que 45% dos entrevistados acreditam que o presidente deixará um legado positivo. Somente 8% disseram que sua gestão será ruim e 21% apostam que ela será péssima. Mas é bom lembrar que 15 milhões de brasileiros acreditam que a Terra é plana e que a Apollo 11 jamais pousou na Lua.

Independentemente de você ter votado ou não em Bolsonaro e dos motivos que o levaram a tal, seria esperar demais que ele se revelasse um estadista, considerando a maneira como encerrou sua carreira militar. Para quem não sabe ou não se lembra, em 1986, quando tinha 31 anos, o capitão publicou na revista VEJA um artigo em reclamava do soldo — que lhe rendeu 15 dias de prisão e um processo por indisciplina. No ano seguinte, também em protesto contra os baixos salários, planejou explodir bombas de baixa potência em quartéis e academias. O assunto foi resolvido discretamente e o insurreto foi absolvido de todas as acusações, mas sua carreira militar terminou ali.

Depois que deixou o Exército, aquele que viria a ser o 38º Presidente desta republiqueta de bananas resolveu tentar a sorte como vereador — na hipótese de não se eleger, seu plano B era aproveitar o curso de mergulho que fizera anos antes para trabalhar como limpador de casco de navio. Após dois anos na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, ele venceu a primeira das 7 eleições para deputado federal que disputou. No Congresso, respondeu a sete processos por quebra de decoro parlamentar, apresentou 172 projetos e foi relator em 73 deles, mas conseguiu aprovar somente dois. Passou os 27 anos seguintes como um membro do baixo-clero, sem destaque, sem poder e sem uma turma para chamar de sua. 

Em meados de 2014, então filiado ao fisiológico PP — cuja bancada de 40 deputados era adestrada para apoiar qualquer um com chance de vencer —, apresentou-se como opção para concorrer ao Planalto e lançou seu ultimato: “Ou o PP sai da latrina ou afunda de vez”. Graças à Lava-Jato, o PP afundou de vez; graças a sua pregação antipetista, foi reeleito como o deputado mais votado do Rio de Janeiro (saltando de 120,6 mil votos em 2010 para 464,5 mil em 2014). Em 2016, trocou o PP pelo PSC, depois namorou com o PEN (que virou Patriota para acolhê-lo), rompeu com a sigla ao descobrir que ela havia patrocinado uma ação no STF questionando a prisão em segunda instância (tema que interessava sobretudo a Lula e ao PT e feria de morte seu discurso antipetista) e acabou se filiando ao PSL. Em outubro passado, derrotou o esbirro de Lula por uma diferença significativa de votos, além de contribuir para que o PSL, até então nanico, elegesse 52 deputados federais, 4 senadores e 3 governadores.

Dora Kramer pondera que os presidentes que terminaram seus mandatos, falando da redemocratização para cá, tinham como traço comum uma espécie de freio interno que os impedia de ultrapassar (em público, ao menos) a linha que determina até onde pode ir um mandatário. O limite de Sarney era a transição democrática, o de FHC, a consciência de que o poder em si limita, e o de Lula, o apoio popular e/ou político. Mas fato é que os dois presidentes mandados de volta à planície antes de completado o tempo regulamentar não tinham ou não utilizavam essa ferramenta tão essencial ao exercício da governança. Ambos de personalidade impositiva, faziam o gênero “vão ter de me aguentar”. 

Má notícia para Bolsonaro, a quem tanto apraz ser do jeito que é, sem intenção de mudar. Disso sabemos, ninguém muda depois dos 60. Patente está também tratar-se de um caso de exibicionismo crônico, cujas causas aos meandros de sua mente pertencem. A dúvida, portanto, recai sobre aonde pensa chegar o presidente com essa pose de valentão old fashioned.

É certo que desperta identificação em setores ainda amplos. Verdade também que serve de distração à ausência de qualificação para o exercício do cargo e faz a festa dos ressentidos, tanto os que o aplaudem quanto aqueles que acreditam exercer oposição atuando na mesma sintonia de insultos e fantasias persecutórias. O dom de distrair, contudo, tende a desviar o autor de seus propósitos, levá-lo ao caminho da incoerência que resulta na quebra de princípios anteriormente defendidos. Daí para a perda de apoios importantes é questão de tempo. Acontece isso com Bolsonaro em seu afã de medir a República pela régua de seus interesses e convicções pessoais.

Quem o elegeu o fez na crença da prometida mudança de paradigmas vigentes nos governos do PT e até antes deles. Pois o que o presidente tem feito é justamente adotar e acirrar velhas práticas como o filhotismo, o mandonismo, o intervencionismo, o histrionismo e demais “ismos” incompatíveis com um ambiente de razoável modernidade e civilidade. Esbravejou contra o aparelhamento petista, mas tenta aparelhar o Estado quando interfere no funcionamento de órgãos de fiscalização. Condenou roubalheira e desmandos, mas atua para proteger os suspeitos que lhe são caros. Confronta até o eleitorado robusto representado pelo agronegócio quando suas diatribes contra ações de preservação do meio ambiente põem o sustentáculo da pauta de exportações sob o risco de retaliações.

A continuar com a agenda e a conduta regressivas, não irá a lugar nenhum, tantas são e serão as barreiras de contenção que encontrará num país que já percebeu as vantagens e se acostumou a viver nos parâmetros da institucionalidade. Se pensa formatar adiante novo arranjo de alianças, é tarde, pois esses parceiros potenciais já guardam distância e se organizam para tomar rumos próprios.