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sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

QUE PAÍS É ESTE?



No apagar das luzes do ano legislativo, a Câmara aprovou por esmagadora maioria o pacote de medidas anticrime e anticorrupção, menina dos olhos do ex-juiz da Lava-Jato e hoje ministro da Justiça e Segurança Pública. Lamentavelmente, foram retiradas do texto a Legitima defesa — que propunha a alteração do Código Penal para permitir “reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la” se o excesso em ações de autoridades públicas decorresse “de escusável medo, surpresa ou violenta emoção” —, a prisão após segunda instância — que dispensa explicações — e o plea bargain — confissão dos suspeitos de terem praticado crimes em troca de uma pena menor, sem necessidade de julgamento.

Como se vê, os efeitos detergentes promovidos pelo eleitorado no ano passado foram insuficientes. Prova disso é que o todo poderoso presidente da Câmara, Rodrigo Maia, citado como Botafogo nas planilhas do departamento de propinas da Odebrecht, que raramente vota, passou a presidência da sessão de ontem da Câmara ao deputado Marcos Pereira para votar a favor de um destaque que institui o juiz de garantias ao processo penal — que, em tese, “fiscaliza” a legalidade da investigação.

O fato é que, desde sempre, vimos dando a Herodes acesso à chave do berçário. Veja, por exemplo, a institucionalização do mensalão pelos punguistas do parlamento, sempre prontos a bater a carteira dos "contribuintes". A despeito de faltar dinheiro para tudo, do papel higiênico nas repartições ao giz nas escolas, passando pela saúde e segurança públicas, os nobilíssimos congressistas aprovaram o relatório preliminar que aumenta para R$ 3,8 bilhões o fundo eleitoral em 2020.

Para inflar os recursos das campanhas municipais, o Congresso prevê cortes em saúde, educação e infraestrutura. O Executivo desejava destinar R$ 2 bilhões para custear as disputas locais, mas presidentes e líderes de partidos que representam a maioria dos deputados e senadores articularam a elevação do valor do fundo em R$ 1,8 bilhão. O novo montante irá ainda à votação do relatório final na Comissão Mista do Orçamento, após o que o plenário do Congresso analisará a proposta em sessão prevista para o dia 17 de dezembro. Se mantido esse valor, o fundo será mais que o dobro em relação a 2018, quando foram distribuídos R$ 1,7 bilhão aos candidatos. O dinheiro sai do caixa da União (ou seja, do nosso bolso, pois o governo não gera recursos, apenas os administra).


"Nas democracias, as eleições precisam ser financiadas, e o financiamento privado está vedado. É preciso construir no financiamento público, mas tem de se verificar o valor e de onde virá o recurso para que a sociedade compreenda com o mínimo de desgaste possível para o Congresso", disse Botafogo. Se o Congresso não recuar, Jair Bolsonaro dificilmente vetará esse trecho do projeto, pois ele foi escrito (marotamente) de tal forma que seria preciso barrar todos os recursos para o financiamento das campanhas em vez de um veto parcial. E viva o povo brasileiro!

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Do jeito que as coisas vão, ainda vamos acabar com um problemão. É o que acontece quando a ciência dos “especialistas” diz uma coisa, e a vida real diz outra — no caso, como se ouve há onze meses, “o extremismo neoliberal” do governo em geral e do ministro Paulo Guedes em especial está “destruindo os sonhos” da população e arruinando a economia brasileira, provavelmente para sempre.

Só que está dando o contrário a cada vez que um dado oficial do desempenho da atividade econômica é divulgado: o que tinha de ser ruim, quando a gente vai ver, é bom. Acabou de acontecer com o resultado do PIB, que cresceu 0,6% no terceiro trimestre deste ano, o maior avanço desde o primeiro trimestre do ano passado. Para piorar, o desemprego também está caindo.

A solução para os “especialistas” é dizer que os números foram “uma surpresa”, ou “atípicos”, ou alguma bobagem desse tipo. Ou seja: nós estávamos certos, mas a realidade está errada. Outra saída é dizer que os níveis e crescimento “tendem a não se sustentar”. É muito usado também, no caso da queda do desemprego, dizer que está aumentando o “trabalho informal”, como se ganhar a vida por conta própria não fosse trabalhar.

Em relação às vendas de Natal, que estão com cara de bombar, a desculpa é que o “Natal é temporário”. Enfim, todo e qualquer avanço é condenado como “lento demais” — sem que ninguém consiga dizer em que outro lugar do mundo o ritmo de crescimento está na velocidade desejada pelos analistas.

Quer perder o seu tempo? Continue lendo e ouvindo quem lhe diz que essa “situação aí” está muito difícil.

Alguém precisa avisar a uma parte dos nossos comunicadores sociais que houve uma eleição para presidente da República um ano atrás, que um dos lados presentes no turno final ganhou, e que, em consequência desse fato, adquiriu o direito de fazer nomeações para cargos da administração federal que não exijam aprovação dos demais poderes, passagem por concurso público e outras exigências legais.

Ministros, por exemplo, mandarins do segundo escalão e mais uma infinidade de cargos da máquina estatal, podem ser escolhidos pelos vencedores das eleições segundo os critérios que acharem mais acertados — mesmo porque é isso, justamente, que os eleitores esperam que seja feito pelo candidato em que votaram. Nenhum desses fatos, porém, parece estar claro até agora para uma porção de gente boa nesse país.

Temos assim, a cada vez que alguém é nomeado para alguma função no bonde da União, um coro escandalizado de protestos – fulano de tal, escolhido para o cargo tal, “é de direita”. Ah, não diga — e daí? Esperavam o que? Que fosse de esquerda? Um não serve porque é contra as drogas e não gosta de rock. Outro, porque acha que a proclamação da República foi um golpe militar, ou é contra o aborto, o feriado da “Consciência Negra", o aumento das reservas indígenas, ou acha que a agricultura precisa de fertilizantes e defensivos químicos para produzir alguma coisa.

Mas são pessoas assim, e não o seu contrário, que a maioria dos eleitores quer ver no governo. Essa maioria pensa como elas. Imagina que estão corretas. Acha que deveriam ter sido nomeadas exatamente pelas razões que seus críticos invocam para dizer que não deveriam. Ou é isso, ou então vai ser preciso chamar aquela menina sueca para o Ministério do Ambiente.

Com J.R. Guzzo.

quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

TEMPOS ESTRANHOS




TEMPOS ESTRANHOS SÃO ESSES EM QUE VIVEMOS, QUANDO VELHOS E JOVENS SÃO ENSINADOS NA ESCOLA DA FALSIDADE. E O ÚNICO HOMEM QUE SE ATREVE A DIZER A VERDADE É CHAMADO DE UMA SÓ VEZ UM LOUCO E INSENSATO.”

O epigrama acima, atribuído a Platão, tem servido de inspiração para o vice-decano do STF demonstrar sua insatisfação com tudo e todos, mostrando-se, inclusive, irritado com uma advogada que, durante sustentação oral, dirigiu-se aos supremos togados usando o "desrespeitoso" pronome "vocês" — que na verdade é a forma sincopada de "vossas mercês": "Presidente", disse o primo de Fernando Collor e luminar do saber jurídico, "novamente um advogado se dirige aos integrantes do tribunal como 'vocês'! Há de se observar a liturgia". Faltam apenas 18 meses para a aposentadoria compulsória de sua excelência, que talvez ainda aproveite o tempo que lhe resta para propor a adoção daquelas ridículas perucas brancas, de crina de cavalo, que os juízes do Reino Unido usavam aboliram há mais de 10 anos por achá-las antiquadas e inadequadas ao tempos atuais (estranhos ou não).

Atribui-se a Aristóteles a divisão do Estado em três poderes independentes, e a Montesquieu a tripartição e as devidas atribuições do modelo mais aceito atualmente. A ideia era não deixar em uma única mão as tarefas de legislar, administrar e julgar, já que a concentração de poder tende a gerar abusos, e um poder que se serve em vez de servir é um poder que não serve. No Brasil contemporâneo, no entanto, nem o quarto poder escapa, já que parte da imprensa foi aparelhada pelos petralhas esquerdopatas, que não veem — ou fingem não ver — que o comunismo e o socialismo não produziram bons resultados em nenhum país do mundo, como comprovam a desgraça que se abateu sobre a Pérola do Caribe sob o jugo da Dinastia Castro, a calamidade que tomou conta da Venezuela sob a égide do Maduro que não cai do galho, as diferenças gritantes entre a Coreia do Sul e a do Norte.

Em Hong Kong, a ilha-­problema onde os jovens tomaram as ruas e há meses exigem, em última instância, voz ativa sobre seu destino, a única eleição mais ou menos livre permitida à população resultou em fragorosa — e aparentemente inesperada — derrota de Pequim. No mesmo dia, um consórcio de jornais publicou um relatório devastador sobre os campos de detenção na província de Xinjiang, no noroeste do país, onde 1 milhão de chineses da minoria muçulmana uigur foram internados a pretexto de combater o extremismo religioso. E por aí segue a procissão de exemplos.

Talvez por isso o PT seja o partido dos trabalhadores que não trabalham, dos estudantes que não estudam e dos intelectuais que não pensam e do ex-presidente ladrão que se ufanava (quiçá ainda se orgulhe) de ter chegado onde chegou sem jamais ter lido um livro na vida.

Falando em ex-presidentes, dos que foram eleitos pelo voto popular desde a democratização — ou que assumiram o cargo devido a impedimento do titular da vez —, somente Fernando Henrique não foi processado. Collor e Dilma não só foram penabundados do cargo (por corrupção e incompetência, respectivamente) como são réus na Justiça Penal, e ainda continuam soltos graças à morosidade e a leniência do Judiciário. Lula e Temer colecionam processos e já foram presos, mas aguardam em liberdade a tramitação das ações/julgamento dos recursos. É surreal!

No caso de Lula, a coisa é ainda pior. Embora tenha sido condenado em dois processos — por três instâncias no caso do tríplex no Guarujá e por duas no do sítio em Atibaia —, o picareta foi agraciado por uma decisão sob medida da banda podre do STF, que, por 6 votos a 5, restabeleceu o império da impunidade ao proibir que criminosos condenados em segunda instância aguardassem presos o julgamento de seus recursos nas Cortes superiores. Assim, o troçulho de Garanhuns assomou do esgoto a céu aberto em que se transformou o cenário político nacional e brinca de palanque ambulante, com total complacência do TSE, que parece achar natural candidatos a candidatos ao Palácio do Planalto fazerem comícios três anos antes das próximas eleições. Com a bênção do Judiciário, o sacripanta vermelho está liberado para mostrar ao mundo que, no País do Carnaval, um corrupto juramentado pode ofender impunemente autoridades que não têm contas a acertar com a Justiça. Mas não vai escapar da lei da Ficha Limpa. Para o dono da alma viva mais honesta do Brasil, as chances de disputar uma eleição são menores que as de ser canonizado pelo Vaticano.

Tempos estranhos, diz o ministro Marco Aurélio. Bota estranho nisso!

O óbvio ululou na tarde de ontem, quando a montanha suprema pariu o rato da vez, incluindo a Unidade de Inteligência Financeira (UIF), antigo Coaf, e a Receita Federal na tese sobre o compartilhamento de dados fiscais sigilosos, para fins penais, com o Ministério Público e a Polícia Federal, dispensando prévio aval judicial. O único voto dissonante foi o do ministro Marco Aurélio — coberto com a suprema toga pelo então presidente Fernando Collor, seu primo, que foi impichado do Planalto e teve os direitos políticos cassados, mas elegeu-se senador graças ao esclarecidíssimo povo das Alagoas, terra de Renan Calheiros, de Arthur Lira e de muitas gentes boas (ficou estranho, mas rimou).

O apaniguado de Collor sempre teve predileção especial por ser voto vencido e foi a encarnação do “espírito de porco” até a ex-presidanta Dilma nomear desembargadora sua filha Letícia, em mais uma demonstração de como o nepotismo se perpetua. A partir daí, o campeão das causas perdidas abraçou cruzadas que atendem aos interesses petistas e aos de nababos da advocacia de Brasília, que, de olho no filão milionário que os corruptos representam, defendem incondicionalmente a mudança da jurisprudência que autoriza a prisão de condenados em segunda instância.

Enfim, o Supremo precisou de seis sessões para concluir que órgãos de investigação servem para investigar, que a liminar absurda do presidente da Corte era absurda e que tudo fica como antes no Quartel de Abrantes. Daí a morosidade da Justiça tupiniquim, maior responsável pela sensação de impunidade (bom seria se fosse só sensação) que fomenta a corrupção endêmica da classe política neste arremedo de república, onde processos movidos contra acusados que têm cacife para contratar criminalistas estrelados levam décadas para ser concluídos — isso quando a prescrição não frustra a pretensão punitiva do Estado. Mas isso já é outra conversa.

Enquanto isso, Senado e Câmara Federal se mobilizam para agilizar o rito das Casas e aprovar o mais rapidamente possível a prisão após segunda instância, corrigindo o supremo erro crasso que restituiu aos condenados a possibilidade de aguardar soltos a decisão de seus recursos aos tribunais superiores, como foi durante míseros (mas nefastos) sete anos das últimas oito décadas. A Câmara instalou uma comissão que visa tratar do assunto por meio de uma emenda à Constituição; no Senado, Simone Tebet, presidente da CCJ, agendou para a próxima terça-feira a votação de um projeto de lei que modifica o Código de Processo Penal, cuja tramitação é mais simples e rápida de aprovar do que a emenda constitucional que tramita na Câmara. Entretanto, ainda que os senadores o aprovem, é preciso pressão da sociedade para que o projeto não seja engavetado quando chegar à Câmara.

Enquanto isso, na Assembleia Legislativa de São Paulo, cenas de baixaria, com direito a pugilato explicito, chocam (ou divertem, dependendo do ponto de vista) os paulistas e os demais brasileiros. Confira no vídeo:



Antes de encerrar, um texto do impagável J.R. Guzzo sobre as supremas barbaridades que conspurcam este arremedo de banânia:

O planeta Terra seria um lugar perfeitamente insuportável se todo o mundo, sem nenhuma exceção, dissesse sempre a verdade, o tempo todo, para todas as outras pessoas que conhecesse. Já imaginou? É melhor não imaginar. O fato é que esta vida precisa ter os seus momentos de hipocrisia, para funcionar com um mínimo de paz — mas também é fato que as autoridades da nossa vida pública não precisavam exagerar. É a velha história: gente que manda não perde praticamente nenhuma oportunidade de ficar cega para os seus próprios desastres, mas nunca é surda, nem por um minuto, para qualquer erro que possa ser cometido pelos outros.

O hipócrita, felizmente, é um bicho que só morde de verdade quando consegue esconder que está sendo hipócrita — quando a sua hipocrisia fica na cara de todo mundo, como vive acontecendo, o mal que faz não leva a lugar nenhum. É o caso, neste preciso momento, do ministro Dias Toffoli, que acaba de compartilhar com o resto da nação suas preocupações com a má imagem que os investidores estrangeiros fariam do Brasil depois de uma declaração do ministro Paulo Guedes sobre o AI-5. Teria o ministro sugerido a ressurreição do “Ato”, que está morto há 40 anos — quatro vezes mais, aliás, que o tempo durante o qual esteve vivo? Não. Ele disse o seguinte: “Não se assustem se alguém pedir o AI-5”, no caso de haver baderna na rua, em vez de oposição na política.

É livre, obviamente, o julgamento de cada um sobre o que disse Guedes. O que não tem cabimento é imaginar que Toffoli está sendo aquilo que ele finge que é — um cidadão aflito com o futuro do investimento externo no Brasil. Se há alguém nesse País que assusta o investidor, de qualquer nacionalidade, é ele mesmo, em pessoa — junto com os seus parceiros de STF que proibiram a prisão de criminosos condenados em segunda instância. Isso sim é construir a imagem de uma nação sem lei.

Para encerrar: nos tempos de antanho, quando não havia essa absurda patrulha do "politicamente correto" e podia-se contar piadas de papagaio sem o risco de ser processado pela ave, uma anedota dizia que, numa entrevista de emprego, o entrevistador perguntou ao candidato se ele era casado. "Sim", foi a resposta. "Com quem?", perguntou o entrevistador. "Com uma mulher", respondeu o candidato. E o entrevistador, já irritado: "O senhor conhece alguém que seja casado com um homem?". "Sim", respondeu o sujeito. "Quem?", insistiu o entrevistador. "A minha mulher", disse, candidamente, o candidato.

Havendo tempo e jeito, assista ao vídeo a seguir:

quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

DE VOLTA AO SUPREMINHO



Quem dá asas a cobra assume o risco de vê-la voar. E é exatamente isso que a mídia vem fazendo com o picareta dos picaretas, ao conceder exagerada importância a seu retorno ao cenário político, por assim dizer — até porque, dele, o fiduma jamais se afastou, nem mesmo durante os 560 dias que amargou na sede da PF em Curitiba.

Melhor seria focar os holofotes em quem puxou a descarga, permitindo que o cagalhão vermelho assomasse no esgoto a céu aberto em que se transformou o cenário político tupiniquim, e espalhasse seu fedor para a patuleia ignara, que parece se alimentar disso como urubus de carniça.

Falando no que não presta, torno a frisar que tenho o maior respeito pelo Supremo Tribunal Federal como instituição, mas não pela maioria de seus membros, que, noves fora dois ou três togados, formam a pior composição de toda a história da Corte. A começar pelos que vestiram a toga sem despir a farda de militante petista — um dos quais, inclusive, preside atualmente o Tribunal.

Observação: Coberto pela suprema toga por Lula, em 2009, como retribuição pelos "bons serviços" prestados ao PT, a despeito de ter bombado duas vezes em concursos para juiz de primeira instância em São Paulo, ambas na fase preliminar, que testa conhecimentos gerais e noções elementares de Direito dos candidatos, Dias Toffoli é a prova provada da cabal da falta de noção do sacripanta de Garanhuns sobre a dimensão do cargo de ministro do STF, embora possa constituir (mais uma) prova cabal da conduta maquiavélica e velhaca do dito cujo, que visava aparelhar a mais alta Corte com a indicação de esbirros e apaniguados e lhes cobrar mais adiante pelo obséquio.

Fato é que a suprema ala pró-crime vem desconstruindo tijolo a tijolo a imagem de último bastião das nossas esperanças, diante de um Legislativo eivado pela corrupção endêmica — institucionalizada e tornada suprapartidária por Lula e seu Partido dos Trabalhadores que não trabalham, dos estudantes que não estudam e dos intelectuais que não pensam — e de um Executivo comandado, durante 13 anos e fumaça, por esse mesmo picareta (a gerentona de araque não passou de uma deplorável testa-de-ferro, ainda que tenha se rebelado e ensaiado um voo solo que pôs a perder o projeto de poder de seu abominável criador e mentor). E novas decepções nos trouxeram a versão tupiniquim de Vlad Drakul, o (ex) vampiro do Jaburu, e, mais recentemente, o Capitão Caverna, cujo lema "Brasil acima de tudo, Deus acima de todos" recebeu o oportuno (e oportunista) adendo: "e Jair Bolsonaro e seus filhos acima de tudo isso".

Voltando ao STF, Dora Kramer resumiu de maneira irreprochável o que eu exporia com bem menos elegância e bem mais adjetivos. Confira o que a jornalista escreveu em sua coluna (na revista Veja) desta semana:

O Brasil abandonou a cerimônia em relação ao Supremo Tribunal Federal. É um fato que está nas ruas, nas mentes, nas bocas, em toda parte. Não aconteceu de graça ou de repente. A nossa Corte maior de Justiça vem abdicando de sua majestade há tempos, desde que começou a se dar ao desfrute de engajamentos e comportamentos outros para além dos restritos à interpretação fria, coerente e consistente da Constituição.

A ausência de reverência tem duas mãos. Se de um lado se derrubou na prática o lema de que decisão judicial não se discute para se estabelecer país afora um ambiente de amplo debate em relação a sentenças proferidas no âmbito do STF, de outro os ministros (salvo uma ou duas exceções) abriram espaço para contestações ao optar por exercer protagonismo na vida nacional nem sempre de modo educado e/ou apropriado.

Embora os magistrados se considerem intocáveis, não são mais invioláveis no crivo da opinião pública. Não falo aqui só dos questionamentos de especialistas publicados na imprensa. Basta sintonizar estações de rádio no dia seguinte a um julgamento polêmico no Supremo para ouvir, mesmo nos programas populares, críticas pesadas ou defesas apaixonadas da conduta dos magistrados.

Nunca se viu nada igual. Havia um certo acanhamento em comentar os votos, hoje substituído por absoluto desembaraço no julgamento dos julgadores. A questão não é a crítica, mas os termos em que é feita. Verdade seja dita, suas excelências é que abriram a temporada de contenciosos. Baixaram e continuam baixando a guarda.
  
Isso ocorreu, por exemplo, quando um juiz se aliou ao presidente do Senado para fazer um gol de mão no processo de impeachment de uma presidente da República. A dupla Ricardo Lewandowski-Renan Calheiros preservou os direitos políticos de Dilma Rousseff e foi desmoralizada pelo eleitorado de Minas Gerais, que lhe negou o mandato de senadora.

Nessa saraivada de tiros no pé, incluem-se as ironias e os insultos trocados entre os pares com transmissão ao vivo, as diatribes provocativas de Gilmar Mendes contra a Lava-Jato em votos que nada têm a ver com a operação, as mudanças de entendimento da Constituição sem justificativas a não ser uma circunstância política. Sem esquecer a censura a publicações, a abertura de inquérito à margem da lei e, para culminar, mais recentemente a atuação desastrosa de Dias Toffoli no caso do compartilhamento de dados dos órgãos de inteligência financeira com instâncias de investigações criminais.

O conjunto dessa obra já desperta no Congresso e no próprio STF uma preocupação com a imagem negativa, refletida em protestos públicos e na pressão para que andem os pedidos de impeachment (dezessete até agora) de ministros. Tanto que há pontes de diálogo nos dois ambientes para que se reduzam a temperatura e a intensidade das polêmicas produzidas no Supremo.

A ordem de baixar a poeira está sinalizada no adiamento do exame do pedido de suspeição de Sergio Moro nos processos de Lula para, se não às calendas gregas, ao menos até o Parlamento tomar uma decisão sobre a volta ou não da prisão em segunda instância.

terça-feira, 3 de dezembro de 2019

O INCRÍVEL HUCK



Muita gente que apoiou Bolsonaro para evitar a volta do PT se decepcionou com seu governo. Eu, inclusive. E não sem razão. Embora não alimentasse esperanças de que um obscuro membro do baixo-clero da Câmara Federal pudesse se tornar um estadista da noite para o dia, imaginei que sua postura antipetista e a nomeação do ex-juiz federal Sérgio Moro para a pasta da Justiça e Segurança Pública produziriam efeitos detergentes na corrupção, da mesma que a escolha do Posto Ipiranga reconduziria a Economia aos trilhos do crescimento.

Isso sem mencionar a promessa de acabar com a reeleição, que se tornou mais uma das muitas falácias de campanha que o candidato eleito largou no pé da rampa do Palácio do Planalto — para ficar no exemplo mais notório, cito a "carta-branca" prometida a Moro e o apoio incondicional a seu pacote de medidas anticrime e anticorrupção, que se tornaram letra morta depois que o "mito" abandonou o discurso original ("se for culpado, deve ser punido") para blindar seu primogênito no "Caso Queiroz".

Em 11 meses de governo, o indômito Capitão Caverna se indispôs com Deus e o mundo, vituperou ofensas gratuitas a torto e a direito e demitiu assessores que havia escolhido entre amigos de longa data, conquanto mantivesse no cargo Damares Alves, Abraham Weintraub, o laranjista pesselista Marcelo Álvaro Antônio e outras aberrações indicadas pelo ex-astrólogo e guru palaciano Olavo de Carvalho. Em vez de governar para todos e, na medida do possível, contribuir para baixar a fervura da dicotomia que o câncer vermelho fomentou com seu "nós contra eles", limita-se o presidente a jogar para a plateia, para o nicho que o enxerga como a patuleia desvairada enxerga o sumo pontífice da seita do inferno.

Às vésperas de completar um ano, este governo cravou com sua maior conquista a aprovação da PEC previdenciária, que só passou graças ao empenho do LegislativoBolsonaro não ajudou e ainda fez o que pode para atrapalhar sua tramitação, quiçá para tirar a castanha com a mão do gato, colhendo os frutos da emenda sem associar diretamente sua imagem a uma reforma repudiada pelos brasileiros menos afeitos a raciocinar, sempre abertos às aleivosias do presidiário mais ilustre do Brasil e da caterva de políticos filiados à organização criminosa que ele comenda.

Observação: Bolsonaro se revelou uma profícua usina de crises. Sua beligerância inata, combinada com uma inusitada vocação para ver conspirações e conspiradores em toda parte e impulsionada tanto pelos primeiros filhos quanto por um ministério eivado de apaniguados do retrocitado guru de araque lhe garantiu até mesmo uma denúncia ao Tribunal Penal Internacional, em Haia, por incitação ao genocídio de indígenas brasileiros (claro que há muita falácia por trás disso, mas o fato é que poderíamos dormir sem essa).

Candidatíssimo à reeleição que prometeu extinguir e em pé de guerra com o cancro vermelho, o intrépido capitão antecipa em dois anos a campanha eleitoral de 2022, que, por mal dos nossos pecados, deve se desenrolar sob a absurda polarização político-partidária que tanto mal tem feito ao país. Na avaliação de Dora Kramer, transitam pelo espaço eleitoral localizado entre o o presidente e o encantador de burros políticos identificados com correntes do centro à direita civilizada, entre os quais destacam-se o apresentador global Luciano Huck e o governador João Doria.

Em público, os artífices da construção daquilo que já esteve em moda chamar de terceira via dizem que é cedo para falar em nomes e assumir candidaturas, mas, nos bastidores, atuam com afinco e o fazem com base em um cenário com os prováveis concorrentes: Bolsonaro, Fernando Haddad — ou o bonifrate da vez —, João Amoêdo, Luciano Huck, João Doria e Ciro Gomes. Rodrigo Maia só entra na lista como possibilidade para vice. 

Os trabalhos do centro (chamemos assim, pois até os nitidamente de direita recusam constrangidos o título, mesmo se tidos como “civilizados”) se concentram em Doria e Huck, o primeiro praticamente assumido como candidato e o outro ainda encenando indecisão, embora já tenha dado o o.k. aos adeptos e nos bastidores esteja em plena construção da empreitada.

O governador e o apresentador estão sentados numa hipotética gangorra, em que hoje Huck está em alta e Doria em baixa. Isso se depreende das conversas em que são listados os atributos de um e de outro. Sobre o governador só se ouvem pontos negativos: impaciência, deslealdade, discurso radical beirando a intolerância, inabilidade política. O único destaque positivo seria o fato de “ter” São Paulo. Nesse aspecto há quem lembre: Geraldo Alckmin e José Serra também “tinham” São Paulo e perderam duas presidenciais cada um.

A respeito do apresentador há ainda poucas certezas, várias dúvidas, mas muita esperança, o que acaba por contar a favor dele no balanço da gangorra. Entre seus ativos são citados obviamente a visibilidade proporcionada pelo programa na Rede Globo, a quantidade de seguidores em redes sociais na casa dos quase 50 milhões, o empenho em ganhar conteúdo em viagens no Brasil e no exterior para conhecer realidades, projetos e ações bem-sucedidas. Além disso, há o time composto de dois pilares importantes, Armínio Fraga na economia e Nizan Guanaes na comunicação, mais um grupo de aconselhamento formado por políticos experientes em cujo currículo está a arquitetura da candidatura Fernando Henrique Cardoso na qual o centro se expressou e depois, no governo, predominou.

Pesquisas internas também fazem os humores pender em favor de Huck. Doria aparece nelas com índices em torno de 5%, enquanto o apresentador chega a 16%, com bom grau de aceitação entre os mais pobres e, em âmbito regional, no Nordeste. Esses dois fatores o tornariam apto a entrar na base do PT. Um bom capital, mas ainda tido como insuficiente.

Há desafios a vencer, sendo o principal deles a capacidade de apresentar uma agenda que fale ao bolso, ao coração e ao bem-estar do eleitorado. Um discurso que se coadune com as demandas do mundo real, a fim de que a via alternativa não seja mera representação de equidistância artificial em relação aos extremos. Para isso, na avaliação dos operadores desse campo, é preciso fugir da lógica de acerto de contas com o passado, propor o que fazer daqui em diante entendendo que as pessoas querem emprego, renda e serviços adequados. No mínimo.

O candidato necessariamente terá de mostrar qualificação robusta, um dos motivos pelos quais ainda pairam dúvidas sobre a viabilidade eleitoral de Luciano Huck. E, pelo timing considerado mais adequado para martelos serem batidos em público, ele não terá chance de dirimi-las tão cedo. A ideia é que fique distante da eleição municipal de 2020 e estenda a definição oficial o máximo possível, a fim de não perder o holofote gigantesco da Globo. Quando seria isso? A partir do segundo semestre de 2021. Um tempo enorme, ainda mais se levado em conta nosso ritmo de montanha-russa na política. O quadro, portanto, senhoras e senhores, é o de hoje devendo ser visto (e talvez anotado) na perspectiva do ponto de partida.

domingo, 1 de dezembro de 2019

NUNCA ATRIBUA A MÁS INTENÇÕES O QUE É DEVIDAMENTE EXPLICADO PELA BURRICE




Se Bolsonaro recrutou boa parte de seu ministério em algum manicômio, como sugeriu recentemente o site Sensacionalista, não sou em quem vai dizer. Mas é impossível negar que, noves fora Paulo Guedes, Sérgio Moro e mais algumas honrosas exceções, o nível na Esplanada dos Ministérios deixa muito a desejar. Que o digam Damares Alves, , Ernesto Araújo, Ricardo Salles, Marcelo Álvaro Antonio e distintíssima companhia.

Felizmente, fomos poupados do vexame de ver zero três ser agraciado com o posto mais importante da diplomacia mundial simplesmente por ser filho do pai e por ter fritado hambúrgueres no estado norte-americano do Maine, 14 anos atrás, numa unidade da rede de fast food Popeyes, que é especializada em frango frito e não tem hambúrguer de carne bovina no menu.

ObservaçãoSabotado no Congresso, que ainda não aprovou seu pacote anticrime (e tudo indica que não aprovará), o ministro da Justiça tem provado competência no serviço em dados que mostram a redução de 22% dos assassinatos violentos nos primeiros meses de 2019 comparados com igual período no ano anterior. Enquanto é atacado por políticos assustados com a possibilidade de serem acusados na Lava-Jato, o ex-juiz paranaense deixa claro nos números da violência, com 8.663 vidas poupadas de brasileiros, que essa falácia de Lula e de Gleisi Hoffmann de que deve ser inocentado e ter sua condenação suspensa deveria ir direto para o lixo da História.

Abraham Weintraub assumiu a pasta da Educação depois que o Capitão Caverna finalmente defenestrou Ricardo Vélez Rodriguez, o teólogo, filósofo, ensaísta e professor colombiano naturalizado brasileiro que foi indicado para o posto por ninguém menos que o ex-astrólogo Olavo de Carvalho, tido e havido como guru do clã presidencial. Mas tem de ser demitido imediatamente. Sua errática gestão — se assim pode ser chamada — à frente de um dos mais importantes Ministérios já seria razão suficiente para sua substituição por quadros mais qualificados, e estes não faltam no País. Mas há outra razão, muito mais séria, que torna a sua permanência no cargo uma indignidade.

Não é de hoje que Weintraub se porta em desacordo com a decência que deve pautar a conduta de um servidor do primeiro escalão da República. O ministro já veio a público exibir cicatrizes para justificar seu baixo rendimento acadêmico e já dançou segurando um guarda-chuva para fazer troça de cidadãos críticos às suas políticas para a área de educação. Também já são bastante conhecidas suas discussões infantis no Twitter. Mas até para os padrões do bolsonarismo — que estabeleceu novo patamar de insalubridade nas redes sociais — o ministro cruzou a linha vermelha.

No feriado da República, Weintraub se pôs a defender a monarquia na rede social. A Constituição não o proíbe de ter a opinião que for sobre as formas de governo, mas, em se tratando de um ministro de Estado, manifestar predileção pela monarquia é, no mínimo, uma conduta inapropriada.

Weintraub foi além. Acometido por algo próximo de um “surto antirrepublicano”, classificou como “infâmia” a proclamação de 15 de Novembro de 1889 e passou a desfiar uma série de aleivosias contra personagens da história brasileira ligadas ao movimento republicano. Uma pessoa que acompanha suas postagens no Twitter comentou: “se voltarmos à monarquia, certamente você será nomeado o bobo da corte”. A resposta do ministro da Educação mal educado não se fez esperar:  Uma pena. Eu prefiro cuidar dos estábulos. Ficaria mais perto da égua sarnenta e desdentada da sua mãe”. Diante da agressividade da resposta de Weintraub, outro cidadão, em tom jocoso, disse “ter encontrado o seu bom senso na rua, que lhe mandou lembranças”. Mais uma vez, o ministro desceu ao rés do chão: “Quem (sic) bom. Agora continue procurando o seu pai”.

Não são palavras que se supõe proferidas por um ministro de Estado, mas por um grosseirão. É admissível que o ministro da Educação pudesse ter usado um canal público de comunicação, como hoje é o Twitter, em especial para este governo, para estabelecer um debate com a sociedade sobre os desafios que o regime republicano certamente tem de enfrentar passados 130 anos de sua vigência no País. Mas, para tanto, ele teria de ser outra pessoa.

Em outro momento de rara inspiração, Weintraub achou por bem classificar o marechal Deodoro da Fonseca como um “traidor” da Pátria e compará-lo ao ex-presidente Lula. Diante de uma estultice dessa natureza, na melhor hipótese, o ministro está absolutamente desinformado. Na pior, trata-se de alguém que se move por ressentimento, revanchismo e má-fé. Mas convém não atribuir a más intenções o que é devidamente explicado pela burrice. Enfim, seja como for, sua permanência à frente do Ministério da Educação é um enorme desserviço ao País.

Especula-se que Weintraub tenha sido escolhido para substituir Ricardo Vélez Rodríguez justamente para adotar esse comportamento, digamos, mais “combativo” à frente do Ministério da Educação. A ser verdade, esse modo de proceder pode muito bem ser mais uma fagulha a manter acesa a chama da militância bolsonarista nas redes sociais, mas chegará o momento em que o presidente da República precisará de uma rede de apoio muito mais ampla do que as chamadas “milícias virtuais”. Não será mantendo no cargo um ministro que avilta as tradições do Exército brasileiro e as mais comezinhas regras de conduta social que Bolsonaro atingirá o objetivo. Os brasileiros de bom senso, independentemente de suas predileções políticas, hão de estar estarrecidos com a mais recente explosão do ministro da Educação. Se ainda assim Abraham Weintraub não for substituído, o que mais pode vir?

Com O Estado (Editorial de 19/11/2019)

terça-feira, 26 de novembro de 2019

LULA-LIVRE, O PARTIDO DOS BOLSONAROS E OUTRAS VERGONHAS NACIONAIS


Jair Bolsonaro é a personificação da beligerância, mas não vem respondendo à altura aos ataques de Lula-Solto nem permitindo que seu pitbull o faça. Depois de levar uma carraspana do pai por criticar o STF, o duble de vereador carioca, assessor de comunicações palaciano e guardião das senhas das contas presidenciais nas redes sociais desativou as suas próprias. O motivo? O papai-presidente não quer aborrecer os togados supremos que blindaram seu primogênito das investigações no caso "caso Queiroz".

Entrementes, Lula aposta na dicotomia para chegar vivo à próxima eleição. Durante os 580 dias que passou hospedado na PF em Curitiba, o picareta usou a sala VIP que lhe foi reservada como diretório político-partidário, comitê de campanha e palco para entrevistas, e continuou no comando absoluto do PT. Foi ele quem decidiu que Gleisi Hoffmann seria a presidente do partido e que o candidato à presidência da República seria Fernando Haddad. Agora, solto graças a uma manobra da facção pró-crime do STF, o salafrário vai baixar ordens com muito mais desenvoltura. Prova disso é que já resolveu que a disputa da prefeitura de São Paulo, se não tiver outro poste, sobrará para o mesmo Haddad.

Observação: Lula é mais que um chefe de partido, ele é o Deus de uma seita monoteísta.

Mesmo impedido de disputar eleições, o verme vermelho, solto, tem melhores condições de influenciar o cenário político e galvanizar a fatia do eleitorado que se identifica com a corrente de pensamento do PT e seus satélites. Daí serem preocupantes seus discursos, que fedem a ódio e revanchismo como fede a podre o bafo de um chacal.

Bolsonaro atribui à ditadura o erro de torturar demais e matar de menos. Em 2016, depois de ser conduzido coercitivamente à PF do Aeroporto de Congonhas para prestar depoimento, o mequetrefe pernambucano ensinou o caminho das pedras: “Se quiseram matar a jararaca, não bateram na cabeça. Bateram no rabo, e a jararaca está viva como sempre esteve”. Infelizmente, ninguém aprendeu a lição, embora seja público e notório que não se controla a hidrofobia acorrentando o cão raivoso, mas, sim, sacrificando o animal. Divorciado do “Lulinha Paz e Amor” e das diretrizes de seu primeiro mandato, o carcinoma maligno volta a dar sinais de metástase (prova disso é o périplo da caravana de Lula pelo Brasil). Da feita que nem rádio nem quimioterapia se provaram eficazes no tratamento, é imperativo extirpar o tumor para não perder o paciente.

Bolsonaro, que foi eleito graças ao discurso anti-Lula e anti-PT, tende a se beneficiar desse cenário inflamado, pois sua capacidade de produzir crises sem motivo e turbulências desnecessárias já vinha decepcionando a parcela da população que acreditou que o capitão caverna adquirisse maturidade no cargo (ou que seus auxiliares conseguiriam domá-lo). Só que o país nada tem a ganhar com essa nova declaração de guerra entre os extremistas extremados — nem, muito menos, com a antecipação da campanha presidencial de 2022, que pode atrapalhar a tramitação de propostas importantes, como as reformas fiscal e eleitoral.

A perspectiva de um retorno da esquerda ao poder ainda leva o eleitorado que transformou um obscuro deputado do baixo-clero no mais novo inquilino do Palácio do Planalto a tapar o nariz e seguir a seu lado, sobretudo porque tem vívida na memória a pior recessão econômica da história e os monumentais casos de corrupção gestados e paridos pelas administrações petistas. Talvez o cenário fosse menos desastroso se o centro político-ideológico não carecesse de um líder que representasse uma opção viável a essa estapafúrdia polarização. Embora houvesse diversos postulantes que poderíamos ter experimentado — como João Doria, Luciano Huck, João Amoedo, Ciro Gomes, Wilson Witzel, entre outros —, nenhum deles tinha envergadura eleitoral suficiente para canalizar e seduzir os brasileiros desgostosos com a limitação política da dobradinha Lula x Bolsonaro.

Em vez de governar o país, nosso brioso capitão vem se mostrando mais preocupado com questiúnculas familiares e pessoais, em fritar aliados, terminar amizades de longa data e, paradoxalmente, manter no ministério figurinhas carimbadas com a pecha do laranjal pesselista. Dias atrás, para dar mais uma "esnobada" na ONU, sua excelência resolveu não dar as caras na COP-25 (a cúpula do clima), marcada para dezembro em Madri. Ao que tudo indica, o Brasil será representado nessa efeméride pelos luminares Ernesto Araújo e Ricardo Salles (só faltava enviar também certo candidato a diplomata fritador de hambúrgueres).

Numa clara disputa por poder dinheiro do fundo partidário, Bolsonaro se desligou do oitavo partido a que foi filiado em 3 décadas na política e vem tentando criar uma sigla para chama de sua. O nome é "Aliança pelo Brasil" — porque, segundo O Sensacionalista, batizar a nascitura agremiação de PB (Partido dos Bolsonaros) pegaria mal. A prioridade do capitão, agora, é colher as 500 mil assinaturas necessárias ao registro do partido. As buscas têm sido feitas em perfis antipetistas nas redes sociais e até em hospícios (onde, dizem as más línguas, Bolsonaro recrutou Damares Alves, Abraham Weintraub e outros próceres que integram seu ministério.

José Simão sugere outros nomes para a agremiação do presidente: 1) PPL — Partido dos porras-loucas; 2) PSJ — Partido do Seu Jair; 3) PIROCAPartido das Ideias Reacionárias do Olavo de Carvalho; 4) PBPP — Partido Brasileiro da Piada Pronta; 5) PAL — Partido dos Amigos dos Laranjas; 6) PUM — Partido da União Miliciana. Escolha um deles ou sugira o seu, por que não?

segunda-feira, 25 de novembro de 2019

LULA LÁ



Coerência é artigo em falta nas prateleiras do presidente Bolsonaro, que, entre outras falas paradoxais, negou o golpe militar de 64, mas reconheceu que a ditadura errou por torturar demais e matar de menos. Hipocrisia à parte, assiste alguma razão ao nosso indômito capitão, sobretudo porque a "abertura" deu azo à volta de personae non gratae e a criação de partidos "de esquerda", como o Partido dos Trabalhadores que não trabalham, dos estudantes que não estudam e dos intelectuais que não pensam e seus execráveis satélites.

Em 1988, sob efeito da formidável ressaca resultante de duas décadas de repressão, nossa nova Carta Magna foi recheada benefícios sem que a fonte dos recursos que os sustentariam fosse apontada, e trouxe a reboque uma política pública de produção de leis, regras e regulamentos divorciadas do mundo real e escritas para fomentar o crime e favorecer os criminosos. E como nada nunca é tão ruim que não passa piorar, o STF guindou esta banânia à condição de única democracia no mundo com 13 Poderes: O Executivo, o Legislativo e 11 ministros supremos que muito falam, pouco fazem e raramente se entendem.

Saliento que tenho o maior respeito pelo Supremo como instituição, mas não por seus membros, sobretudo na composição atual, que é a pior de todos os tempos, como comprovam a distribuição de habeas corpus em massa, a anulação de sentenças em processos onde réus delatados não apresentaram suas razões finais depois dos delatores (não existe absolutamente nada na legislação brasileira que dê suporte a esse entendimento absurdo), a reversão da jurisprudência sobre a prisão em segunda instância e, mais recentemente, a proibição liminar e monocrática do compartilhamento de informações pela UIF e Receita Federal com o MP e a PF sem prévia autorização judicial. Pelo menos esse jabuti deve cair da árvore, mas o julgamento vem se arrastando e só será concluído antes do recesso do Judiciário se os ministros que ainda não votaram deixarem de lado a poesia e se pronunciem de maneira clara e concisa — restam 8 sessões até o encerramento do ano judiciário ainda há 9 magistrados a votar.

Contribuiu para o Supremo se tornar um ninho de cobras a cizânia fomentada pelo maior câncer que já presidiu esta banânia e, ao deixar o posto, fez eleger a mãe de todas as calamidades, visando manter sua poltrona aquecida até que ele próprio pudesse voltar a ocupá-la, e foi graças à facção pró-crime dos togados que esse abjeto carcinoma retornou à atividade depois de passar 580 dias preso na sala VIP da Superintendência da PF em Curitiba, embora sua breve reclusão jamais o impediu de explorar politicamente sua situação, nem de transformar a cela em escritório político, sede de comitê de campanha, sala de entrevistas e por aí afora. Com a cara de pau que Deus lhe deu e demônio lustrou, a autodeclarada alma viva mais honesta do Brasil afirmou candidamente que a cadeia o transformou "numa pessoa melhor".

Horas depois do voto de minerva do eminente ministro Dias Toffoli, o sevandija vermelho subiu num palanque improvisado por apoiadores e, no melhor estilho "encantador de burros", destilou seu ódio contra Jair Bolsonaro, Sérgio Moro, a Lava-Jato; no dia seguinte, já em São Bernardo do Campo — para onde voou num luxuoso jatinho da empresa da empresa Brisair Serviços Técnicos Aeronáutica, pertencente ao casal de apresentadores globais Luciano Huck e Angélica —, repetiu a dose defronte ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e, na sequência, saiu em caravana Brasil afora para espalhar seu veneno.

Na capital de Pernambuco, seu estado de origem (num hotel de luxo da praia da Boa Viagem, o bairro mais chique da cidade, é claro), o cancro sifilítico petista levou ao delírio seus miquinhos amestrados com seguinte troçulho: “Eu não queria falar de política num festival cultural e eu queria assistir ao povo exaltar toda a sua ternura por esse país maravilhoso. Eu hoje sou um homem melhor do que aquele que entrou na cadeia, sou mais maduro, sou um homem que aprendi que nada derrota as pessoas que se amam nesse país. Nós não vendemos ódio, vendemos amor, paixão. É muito coração nessa história”.

Enfiado no fundo de um desses ônibus de luxo com vidro escuro para ninguém ver nada dentro, aprontava-se o morfético para partir rumo ao que, aparentemente, seria um compromisso de sua nova peregrinação pelo Brasil, com a qual imagina atrair as massas e voltar a ser o que foi um dia. Porém, em vez de ouvir o aplauso da multidão, ouviu o que tem ouvido sempre que sai à rua: “Lula, ladrão, teu lugar é na prisão”. Na verdade, não havia multidão nenhuma — só um grupo de gente vestida de verde e amarelo, mandando o ex-presidente para o raio que o parta. Sabe lá Deus — ou o Diabo? — onde estavam os milhares e milhões de “brasileiros do povo”, os “pobres”, os “desesperados” com o governo”, que deveriam ter aparecido para dar força ao ex-presidente. E isso no coração do Nordeste, onde Lula, com o apoio dos “institutos de pesquisa de opinião”, sempre diz que tem 120% de popularidade. Talvez seja melhor no interiorzão. Talvez não seja tão ruim da próxima vez. Quiçá o sofrido e inculto povo nordestino acorde e se dê conta de que precisa carregar Lula em triunfo. Mas ainda não rolou.

Pouco antes de ser preso, Lula teve uma das suas piores ideias — fazer uma “caravana” pelos estados do Sul. Acabou escorraçado de lá na base da pedrada. Precisa tomar cuidado para a história não começar de novo nas “caravanas” que tenciona fazer daqui por diante. Isso sem mencionar que, a caminho de novos e desconhecidos horizontes na política brasileira e mundial, pelo que se lê ou se ouve no noticiário, o safardana tem uma porção de obstáculos práticos pela frente. Há problemas com o Código Penal, com a lei eleitoral e com a não-capacidade do seu partido et caterva de aprovar leis no Congresso ou decidir votações na Câmara e no Senado. Será necessária uma assistência praticamente integral do STF para resolver encrencas que vão de seus próximos processos criminais à condição de político ficha suja — e, portanto, inelegível, pelo menos segundo o que está escrito hoje.

Como bem salientou J.R. GuzzoLula sabe que vai bombar nas próximas sondagens de “intenção de voto”, “popularidade”, “imagem”, etc. encomendadas aos Ibopes e Datafolhas por uma dessas confederações nacionais de alguma coisa que você encontra em qualquer esquina. Já deve saber, também, que os especialistas em algoritmos têm números imensos sobre a sua presença nas redes sociais. Nos últimos doze meses, apesar de todos os pesares a “tração” do presidente Jair Bolsonaro foi mais de 40 vezes maior que a dele. Nas 72 horas seguintes ao seu alvará de soltura, o chefe do quadrilhão vermelho teria passado à frente do inimigo, mas os números dos institutos são sempre uma revelação sobrenatural, e o próprio Lula já se acostumou há muito tempo a não colocar a mão no fogo, nem perto, em relação a eles. Quanto ao algoritmo que mede a capacidade de um agente digital propagar em ondas sua circulação na internet, o problema é o seguinte: estão falando muito de mim, mas estão falando bem ou mal? Essa vida é mesmo complicada.

domingo, 24 de novembro de 2019

PERGUNTAS QUE NÃO QUEREM CALAR



Em seu comentário no Jornal da Gazeta da última sexta-feira, o impagável José Nêumanne salientou que o atual presidente do STF — guindado a ministro em 2009 por indicação do maior câncer que se instalou no Palácio do Planalto desde a redemocratização deste arremedo de república de bananas — não teve QI suficiente para ser aprovado em 2 concursos para juiz de primeira instância em São Paulo, mas é extremamente hábil no uso de truques sujos para prolongar as benesses de sua monocracia de malandro. 

Para Nêumanne, o Maquiavel de Marília  não proferiu aquele voto abaixo da crítica por burrice, mas por esperteza. O que ele quis foi imitar o saudoso Chacrinha — conforme, aliás, eu havia mencionado numa postagem anterior —, que dizia não ter vindo para explicar, mas para confundir. Tudo isso faz parte de um plano, traçado desde julho, para conseguir vantagens com suas decisões monocráticas e adiar o máximo possível a votação em plenário para continuar gozando as benesses que vem usufruindo e continuará a fazê-lo com elas. Dando tempo e jeito, assista ao vídeo abaixo:


Merval Pereira, por sua vez, ponderou que a estupefação causada pelo voto cuja leitura Toffoli levou mais de quatro horas para concluir, na abertura do julgamento sobre o compartilhamento de dados entre os órgãos de persecução penal e os de investigação, foi provocada pela tentativa de voltar atrás sem deixar clara a mudança. De tão obscuro, voto teve de ser explicado mais tarde por uma nota oficial.

Pesquisas como a do economista Felipe de Mendonça Lopes, da FGV, mostram que, com o televisionamento ao vivo dos julgamentos, os votos ficaram maiores em média 26 páginas, o que aumenta o tempo de leitura em cerca de 50 minutos. O ministro Luis Roberto Barroso definiu bem o momento: “Seria preciso chamar um professor de javanês”, referindo-se ao livro “O Homem que Sabia Javanês”, de Lima Barreto, sobre um vigarista que, sem saber nada do idioma, se apresentou como professor  de javanês a um barão que colocara um anúncio em busca de alguém que lhe ensinasse a língua. A utilização de métodos econométricos dá a certeza de que a mudança de composição do plenário do Supremo não tem nada a ver com o aumento do tamanho dos votos, mas sim a transmissão ao vivo. Já houve quem propusesse o seu fim, mas parece uma decisão impossível de ser revista, devido à cobrança sempre maior da transparência das decisões, o que não necessariamente significa clareza.

Quanto à obscuridade da linguagem, Merval disse ter se lembrado de um ciclo de palestras que coordenou na ABL sobre a influência do barroco em nossa cultura. Um dos aspectos abordados pelo ex-ministro e presidente do Supremo, Nelson Jobim foi justamente o juridiquês, esse idioma parecido com o português, mas salteado com termos em latim, que nos acostumamos a ouvir durante a transmissão dos julgamentos pela televisão. Jobim criticou as transmissões, avaliando que, com elas, os votos ficaram mais longos. Mas ressaltou a vantagem da transparência do processo decisório do Supremo, não obstante o Brasil continue sendo o único país do mundo que transmite os julgamentos do STF ao vivo, em tempo real. De acordo com o jurista, o uso radical da linguagem mais culta e o excesso de erudição têm o objetivo de “transmitir potência no discurso”, e o formalismo da linguagem jurídica já virou piada, mas “ainda assim, insistimos em usar o juridiquês no Brasil”, pois “a ornamentação linguística” sinalizaria um jurista mais preparado. E definiu assim o falar empolado: “Comunicação sem clareza é uma forma eficaz de esconder ignorância no assunto sobre o qual se fala”. E, com efeito, falar difícil é fácil; o difícil é falar fácil.

A pergunta que não quer calar é: Por que não escolher os ministros supremos da mesma foram como se faz no STJ, a partir de uma lista tríplice criada pela plenário da Corte e submetida ao Presidente da República, que indica o seu preferido, que então é sabatinado na Comissão de Cidadania, Constituição e Justiça do Senado e, se aprovado, avalizado pelo plenário da Casa? Ou, melhor ainda, mediante um concurso para o qual poderiam se inscrever ministros do STJ e desembargadores dos Tribunais Regionais, por exemplo? Isso evitaria, ou pelo menos minimizaria, as indicações eminentemente políticas. Vale lembrar que Lula e Dilma concederam a toga suprema a nada menos que oito apaniguados, dos quais sete continuam ativos e operantes (a exceção fica por conta do falecido Teori Zavascki, que foi indicado pela anta vermelha para preencher a vaga aberta com a aposentadoria compulsória do ministro Cezar Peluso).

Outra pergunta que não quer calar: Por que Davi Alcolumbre, atual presidente do Senado e do Congresso Nacional, vem engavetando sistematicamente todos os pedidos de abertura de processos de impeachment contra ministros supremos (lista orgulhosamente encabeçada por Gilmar Mendes e Dias Toffoli)? Será que não há entre os 81 senadores 48 parlamentares dispostos a pressionar essa versão revista e atualizada de Renan Calheiros, só que com algumas arroubas a mais?  

E mais uma: Até quando nos submeteremos a preceitos constitucionais estabelecidos por uma assembleia constituinte, durante a "ressaca" dos 21 anos de ditadura militar, que resultaram numa Carta Magna onde a palavra “Direito” é mencionada 76 vezes, enquanto "Dever" surge em quatro oportunidades e "Produtividade” e “Eficiência” em duas e uma, respectivamente. Aliás, o que se poderia esperar de um país com 76 direitos, 4 deveres, 2 produtividades e 1 eficiência, senão uma política pública de produção de leis, regras e regulamentos divorciadas do mundo real e não raro escritas para fomentar o crime e favorecer os criminosos?

Eduardo Bolsonaro foi crucificado por dizer que bastariam um soldado e um cabo para fechar o Supremo (a questão é que, no contexto em que ele disse o que disse, só os muito hipócritas teriam classificariam a frase como provocação). Mais recentemente, votou a ser malhado por declarar, em entrevista à jornalista Leda Nagle, que  "[...] se a esquerda radicalizar a esse ponto, vamos precisar dar uma resposta, e essa resposta pode ser via um novo AI-5, pode ser via uma legislação aprovada via plebiscito, como ocorreu na Itália, mas alguma resposta vai ter que ser dada". Pode-se não concordar com o "radicalismo" do filho do presidente, mas não dá para negar que o que Lula vem fazendo desde que foi solto, graças à vergonhosa jabuticaba suprema que revogou a possibilidade da prisão após a condenação em segunda instância merece, sim, uma resposta à altura. A questão é que a família real-presidencial tem seus esqueletos no armário, tanto é que o próprio Jair Bolsonaro se fechou em copas depois que Dias Toffoli e Gilmar Mendes blindaram seu primogênito das investigações no caso Fabrício Queiroz, que fede feito gangrena e cujo fedor começou a se espalhar antes mesmo das eleições passadas.

Haveria muito mais a dizer, mas hoje é domingo, e domingo pede cachimbo. Portanto, o resto fica para amanhã.      

quinta-feira, 21 de novembro de 2019

O MAQUIAVEL DE MARÍLIA E O COAF


Depois de ser reprovado em dois concursos para magistratura, ambos na fase inicial, que testa conhecimentos gerais e noções básicas de Direito dos candidatos, o Maquiavel de Marília foi guindado por Lula ao STF, em retribuição aos valorosos serviços prestados ao PT, às campanhas de Lula, ao "cumpanhêro" José Dirceu, e por aí afora.

Na sessão plenária do último dia 7, o eminente magistrado levou horas para concluir a leitura do voto com o qual desempatou o placar de 5 a 5 sobre a prisão em segunda instância (alinhando-se, naturalmente, com a fação pró-crime do Supremo). E como não há nada tão ruim que não possa piorar, frisou, na abertura da sessão de ontem, que o processo sub-judice "nada tem a ver com Flávio Bolsonaro", embora não tenha feito qualquer referência ao fato de a liminar que decretou em meados deste ano ter suspendido quase 1000 investigações baseadas em dados fornecidos pelo Coaf, inclusive as que miram sua mulher e a mulher do colega e mentor Gilmar Mendes.

Depois das manifestações da PGR e da defesa do réu, Toffoli monopolizou o microfone por mais de 4 horas, que foi o tempo necessário para a leitora do voto que talvez tenha sido o mais longo de toda a história do tribunal. Além de se mostrar mais prolixo que o decano e o vice decano da Corte — casos clássicos de irremediável paixão pelo som da própria voz —, o ministro conseguiu superar até mesmo a enigmática Rosa Weber, que se notabilizou por perorar numa espécie de Dilmês Castiço que nem ela própria compreende.

Dado o grau de impenetrabilidade de suas considerações, Toffoli não foi capaz de dirimir as dúvidas de seus pares, mas o que mais me chamou a atenção em sua verborrágica diarreia foi ele dizer que seu voto alinhavava todos os elementos necessários à formação da tese (a decisão terá efeito vinculante e norteará as instâncias inferiores), e ainda que precedesse essa pérola com "a devida vênia dos que eventualmente divirjam", parecia não ter dúvidas de que poucos ousariam discordar de seu entendimento. Mas não foi bem essa a impressão que ficou no final da sessão, quando vários ministros buscaram esclarecimentos, e o mestre de cerimônias do supremo circo de horrores achou por bem suspender os trabalhos até a tarde desta quinta-feira. Vamos acompanhar e ver que bicho dá.   



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Então fica combinado assim: Dias Toffoli, presidente do STF, pediu e obteve cópias de todos os relatórios de inteligência financeira produzidos pelo antigo Coaf (hoje UIF) nos últimos três anos. Mas não os leu. Pediu para quê, então? Isso não ficou claro até agora. Talvez tenha pedido à falta do que fazer. Ou pedido para testar se sua autoridade seria desafiada – e ela não foi. Quem se arriscaria a cair em desgraça junto ao ministro mais supremo do Supremo?

Bem, com certeza estão em algum arquivo do gabinete de Toffoli informações sigilosas que envolvem cerca de 600 mil pessoas (412,5 mil físicas e 186,2 mil jurídicas), muitas delas expostas politicamente e com prerrogativa de função. E ele não as consultou!

Toffoli havia alegado que precisava entender o procedimento de elaboração e tramitação dos relatórios. Se fosse apenas isso, bastaria que um técnico lhe passasse um e-mail contando o que ele queria saber por curiosidade ou extrema necessidade.

Ao decretar o fim da investigação da Receita Federal sobre sua mulher, Roberta Rangel, e a mulher de seu parceiro Gilmar Mendes, Guiomar, o Maquiavel de Marília requereu, sem nenhuma justificativa racional, dados financeiros sigilosos de 19 mil 441 casos envolvendo 600 mil pessoas físicas e jurídicas. E passou a ser proprietário exclusivo dos segredos garantidos por lei de uma miríade de cidadãos indefesos perante seu poder absoluto e ilegítimo. Não foi eleito para isso e sequer passou num concurso público para juiz na primeira instância. Este é um óbvio motivo para seu impeachment, mas sua excelência está salvaguardado porque proibiu o MP-RJ de investigar o primogênito de Bolsonaro por práticas contábeis suspeitas na Alerj, da qual saiu para garantir foro privilegiado por 8 anos no Senado.

Imagine que não fosse o presidente do Supremo que tivesse pedido o que Toffoli pediu, recebeu, mas não acessou. Resistiu à tentação, digamos assim. Imagine que fosse o presidente da República, ou da Câmara dos Deputados, ou do Senado… A gritaria estaria grande. Já se falaria em impeachment. Que direito teria qualquer um deles de conhecer a vida contábil de tanta gente? E assim sem mais nem menos? Por muito pouco, quem hackeou conversas entre procuradores está preso.

Qualquer cidadão no gozo dos seus direitos pode protocolar no Senado um pedido de impeachment de Toffoli. Dará em nada. Como deram em nada até hoje dezenas de pedidos contra outros ministros. Todos foram arquivados. Mas… Nunca se sabe.

Onde fica o direito ao sigilo das pessoas? Nem o ministro mais supremo do Supremo pode violá-lo a qualquer pretexto ou sem nenhum.

A suprema tragédia deve julgar na sessão de hoje a liminar que paralisou as investigações com dados compartilhados pelo COAF sem autorização judicial. A princípio, o plenário ficaria dividido, mas é preciso levar em conta que se estará julgando uma decisão do próprio presidente.

Não há nenhuma explicação para Tofolli ter suspendido todas as investigações no Brasil. E agora descobriu-se que ele pediu e recebeu da Receita Federal processos de mais de 600 mil pessoas. A única explicação para isso é que informação é poder. Ele fez exatamente o que contestou ao suspender os processos. 

O STF está ganhando poderes que não são dele, e ganha porque há um vácuo de poder no pais; há um executivo disfuncional e a partir daí, o Tribunal passou a fazer um papel político de defesa do presidente e de contenção de danos dos próprios ministros que estariam sendo investigados. E um STF superpoderoso assim não funciona numa democracia. Mas votar contra isso é ir contra o presidente, contra a própria corporação. 

Se houver uma visão crítica das atitudes do presidente do STF, será uma reunião plenária muito confusa, conflituosa. Não sei o que irá funcionar: o corporativismo ou o sentido crítico dos ministros. A OCDE disse que em nenhum lugar do mundo se exige autorização judicial para investigações de lavagem de dinheiro e corrupção.

Com Ricardo NoblatJosé Nêumanne e Merval Pereira.

terça-feira, 19 de novembro de 2019

PRA QUEM GOSTA É UM PRATO CHEIO (TERCEIRA PARTE)



Cerca de 15 horas depois de uma das mais abjetas decisões plenárias do STF — cuja composição é hoje a pior de toda a história do tribunal —, Lula já destilava seu ópio para uma penca de militantes. Não foi encontrar os filhos — que tampouco se deram ao trabalho de esperá-lo na saída da prisão —, nem levar flores ao túmulo da ex-primeira dama ou visitar as sepulturas do irmão e do neto (falecimentos que ele explorou com maestria de dentro de sua sala VIP na superintendência da PF em Curitiba). Em vez disso, como o bom mau caráter que é, preferiu escarrar vitupérios contra Bolsonaro e os ministros Moro e Guedes e exortar sua récua de jumentos amestrados a reproduzir no Brasil o que a esquerda chilena vem fazendo no país vizinho.

ObservaçãoLula não visitou os túmulos dos parentes mortos durante a temporada na cadeia porque “eles foram cremados”. A família do irmão Vavá informa: o corpo de Genival Inácio da Silva foi sepultado no Cemitério Pauliceia, em S. Bernardo do Campo. Alguém se surpreende com mais essa mentira vinda da que nasceu para mentir?

O placar de 6 votos a 5 pelo restabelecimento da jurisprudência nefasta que autoriza a prisão somente após o processo transitar em julgado — o que equivale a dizer "no dia de São Nunca" — foi alcançado no último dia 7 com o voto de minerva do Maquiavel de Marília, mas o cenário havia sido delineado na sessão do dia 27 de outubro, quando a ministra Rosa Weber, talvez por pura incompetência, talvez por gratidão a quem forneceu a toga que hoje lhe recobre os ombros — embora Rosa tenha sido indicada por Dilma, em 2011 a calamidade travestida de gente não dava um peido sem a devida aprovação de seu criador e mentor —, mudou o entendimento que mantinha até então e se aliou à fação pró-crime da nossa mais alta corte de injustiça.

Chegou-se a imaginar que o supremo mestre de picadeiro oferecesse uma terceira via, ou que votasse com a ala punitivista, mas, como o escorpião da fábula, o artrópode de toga não foi capaz de agir contra sua natureza e ficou do lado de Lula — responsável por sua nomeação para a Suprema Corte.

Em seu voto, cuja leitura demorou cerca de 3 horas, Antonio Maquiavel Dias Toffoli perorou absurdos com “lenda da impunidade” antes de concluir alegremente que a prisão após o trânsito em julgado não é o desejo de um juiz, mas a vontade do povo brasileiro (não foram exatamente essas suas palavras, mas o sentido foi exatamente esse). Ao final, como quem jogava migalhas aos cães, disse que a Corte não se oporia no caso de o Congresso alterar o CPP e "legalizar" a prisão após a condenação em segunda instância.

Acaba anão quem cuida de coisas pequenas, se deixa envolver por questões menores em detrimento da grandiosidade das decisões e confunde grandeza de espírito de espírito com espírito de grandeza, dizia Ulysses Guimarães. Toffoli preferiu entrar para a história como o presidente do STF que, para favorecer o PT e seu eterno presidente de honra, martelou o derradeiro prego no esquife da maior operação anticorrupção da história deste país, sobretudo porque defecou sobre a Constituição e usou como papel higiênico as páginas que restaram pautando esse julgamento num momento em que Lava-Jato está particularmente fragilizada devido à Vaza-Jato de Verdevaldo das Couves (esse, sim, deveria passar uns bons anos atrás das grades, de preferência num presídio comum, em cela apinhada de estupradores e assassinos contumazes) e ao clima nada alvissareiro para Deltan Dallagnol na suprema usina de injustiças.

E così la nave va. 

segunda-feira, 18 de novembro de 2019

HONESTIDADE PRA INGLÊS VER



Manifestações aconteceram ontem em São Paulo, Rio e Brasília, marcadas por declarações em defesa do presidente Jair Bolsonaro e do ministro Sérgio Moro. Em Sampa, do alto dos carros de som, representantes de grupos como Movimento Direita Digital, Movimento República de Curitiba e Movimento Conservador puxavam coros como “Fora Gilmar!”, “Mito” (em referência a Bolsonaro) e “Moro presente”. Também defenderam a volta de Lula para a prisão. Ao lado do carro de som localizado na altura do Masp, foi inflado um boneco com os rostos de Gilmar, Lula e José Dirceu. Neste ponto da Paulista, manifestantes citaram o “guru” bolsonarista Olavo de Carvalho e também dirigiram ataques ao presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli. No outro ponto, uma enorme bandeira tinha inscrição de “Impeachment Gilmar”. Algumas pessoas jogaram tomates em cartazes que representavam ministros da Corte. Os atos foram encerrados por volta das 17h, sem registro de incidentes.

Em Brasília, segundo a PM, o ato reuniu entre 800 e 1 mil pessoas. Pela manhã, a chuva comprometeu a manifestação, mas à tarde, o grupo voltou a se concentrar em frente ao Congresso Nacional, por volta das 17 horas. Vestindo verde e amarelo, os manifestantes carregavam faixas com dizeres como “juiz que solta ladrão é inimigo da nação”, “Gilmar Mendes, impeachment já”, “fora corruPTos” e “prisão em segunda instância já”. Dois carros de som conduziram os manifestantes até o Palácio do Supremo. Boa parte vestia camisetas com foto do ministro Sérgio Moro e a frase “caçador de corruptos”. Os manifestantes rezaram o “Pai Nosso” e carregaram uma bandeira gigante com as cores verde e amarela. Por volta das 19h, encerraram o ato cantando o Hino à Bandeira Nacional.

No Rio, Gilmar foi chamado de "inimigo número um do Brasil". As manifestação pedindo o impeachment do semideus togado ocorreu pela manhã, na praia de Copacabana. Organizado pelo Movimento Nas Ruas, Movimento Conservador e Movimento Brasil Conservador, o evento contou com dois carros de som, mas o número de participantes foi pequeno (talvez em virtude do feriado prolongado, talvez devido ao desalento da população com essa situação de merda). Os gatos pingados que compareceram vestiam verde e amarelo e repetiam slogans coo “Gilmar Mendes vai cair” e “Fora Gilmar Mendes”. A maritaca de Diamantino também foi chamada de “inimigo número um do Brasil”, e o ato tinha um boneco inflável gigante do ex-presidente Lula, com os dizeres “cafetão de Gilmar”.


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Depois de passar 11 anos no exército — e 15 dias na cadeia em 1986, por ter escrito um artigo publicado na revista Veja sob o título “O salário está baixo” —, o então capitão Jair Messias Bolsonaro reformou-se e ingressou na vida pública como vereador. Ficou dois anos na Câmara Municipal antes de vencer a primeira das 7 eleições para deputado federal que disputou, passou por 8 partidos (PDC, PPR, PPB, PTB, PFL, PP, PSC e PSL) e, se conseguir criar a sua própria legenda, a "Aliança pelo Brasil" será sua nona sigla em 3 décadas de vida pública.

O partido ainda nem veio à luz e já está, por assim dizer, enlameado: o primeiro-filho Flávio encaminhou pedido de desfiliação ao PSL. Guiando-se pelos passos do pai, levará para dentro da nova legenda o rastro pegajoso do inquérito em que é acusado de peculato e dinheiro, juntamente com a assombração do PM Fabrício Queiroz e seus vínculos com a milícia carioca.

Para inglês ver, esse novo partido "é o sonho e a inspiração de pessoas leais ao presidente Jair Bolsonaro de unir o país com aliados em ideais e intenções patrióticas", e tem como objetivo "o resgate de um país massacrado pela corrupção e pela degradação moral contra as boas práticas e os bons costumes". Balela! Se a preocupação do capitão fosse com a corrupção — representada, no caso, pelo "laranjal do PSL" —, por que, então, Marcelo Álvaro Antônio continua ministro do Turismo?

Não se pode levar a sério essa lorota de "um país massacrado pela corrupção e pela degradação moral", e o tal "sonho e inspiração de pessoas leais ao presidente Jair Bolsonaro" cheira a uma iniciativa personalista. Portanto, o nome mais adequado para a legenda seria PC — não de Partido Comunista, mas de Partido do Capitão.

A aposta do presidente é lamentável e desnecessária. É lamentável porque já existem 32 partidos no Brasil, e todos têm em comum o fato de serem execrados pela sociedade. Se Bolsonaro for bem sucedido, haverá 33 legendas no caldeirão. A iniciativa é desnecessária porque o capitão aposta que terá o mesmo êxito que obteve em 2018. Isso só vai acontecer se houver no Brasil desemprego baixo e geladeira cheia. Nessa hipótese, Bolsonaro se reelegeria por qualquer partido. Mas não será perdendo tempo com a criação de uma legenda hipoteticamente nova que atingirá a prosperidade.

Há partidos demais no Brasil, e o que Bolsonaro quer criar está sendo usado para possibilitar sua saída e a de familiares e devotos do PSL de Bivar no meio de uma briga pelo controle dos bilhões dos fundões públicos. Para combater crime nas organizações partidárias não se deve fundar nova legenda, mas extinguir os fundões públicos que financiam sua organização e suas campanhas e pôr para funcionar cláusula de barreiras o mais breve possível.

As organizações partidárias não representam os eleitores, assim como os sindicatos não representam os trabalhadores. Trata-se, em ambos os casos, de empresas sustentadas com dinheiro público e que têm como finalidade precípua encher as burras de seus donos. Os partidos só deixarão de ser organizações criminosas quando a fonte de recursos em seus cofres secar e for adotada a medida profilática da cláusula de barreiras para deter a proliferação das legendas para uso privado. Ninguém espere que a futura sigla cumpra esse papel.

Com Josias de Souza e José Nêumanne.