quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

DE VOLTA AO SUPREMINHO



Quem dá asas a cobra assume o risco de vê-la voar. E é exatamente isso que a mídia vem fazendo com o picareta dos picaretas, ao conceder exagerada importância a seu retorno ao cenário político, por assim dizer — até porque, dele, o fiduma jamais se afastou, nem mesmo durante os 560 dias que amargou na sede da PF em Curitiba.

Melhor seria focar os holofotes em quem puxou a descarga, permitindo que o cagalhão vermelho assomasse no esgoto a céu aberto em que se transformou o cenário político tupiniquim, e espalhasse seu fedor para a patuleia ignara, que parece se alimentar disso como urubus de carniça.

Falando no que não presta, torno a frisar que tenho o maior respeito pelo Supremo Tribunal Federal como instituição, mas não pela maioria de seus membros, que, noves fora dois ou três togados, formam a pior composição de toda a história da Corte. A começar pelos que vestiram a toga sem despir a farda de militante petista — um dos quais, inclusive, preside atualmente o Tribunal.

Observação: Coberto pela suprema toga por Lula, em 2009, como retribuição pelos "bons serviços" prestados ao PT, a despeito de ter bombado duas vezes em concursos para juiz de primeira instância em São Paulo, ambas na fase preliminar, que testa conhecimentos gerais e noções elementares de Direito dos candidatos, Dias Toffoli é a prova provada da cabal da falta de noção do sacripanta de Garanhuns sobre a dimensão do cargo de ministro do STF, embora possa constituir (mais uma) prova cabal da conduta maquiavélica e velhaca do dito cujo, que visava aparelhar a mais alta Corte com a indicação de esbirros e apaniguados e lhes cobrar mais adiante pelo obséquio.

Fato é que a suprema ala pró-crime vem desconstruindo tijolo a tijolo a imagem de último bastião das nossas esperanças, diante de um Legislativo eivado pela corrupção endêmica — institucionalizada e tornada suprapartidária por Lula e seu Partido dos Trabalhadores que não trabalham, dos estudantes que não estudam e dos intelectuais que não pensam — e de um Executivo comandado, durante 13 anos e fumaça, por esse mesmo picareta (a gerentona de araque não passou de uma deplorável testa-de-ferro, ainda que tenha se rebelado e ensaiado um voo solo que pôs a perder o projeto de poder de seu abominável criador e mentor). E novas decepções nos trouxeram a versão tupiniquim de Vlad Drakul, o (ex) vampiro do Jaburu, e, mais recentemente, o Capitão Caverna, cujo lema "Brasil acima de tudo, Deus acima de todos" recebeu o oportuno (e oportunista) adendo: "e Jair Bolsonaro e seus filhos acima de tudo isso".

Voltando ao STF, Dora Kramer resumiu de maneira irreprochável o que eu exporia com bem menos elegância e bem mais adjetivos. Confira o que a jornalista escreveu em sua coluna (na revista Veja) desta semana:

O Brasil abandonou a cerimônia em relação ao Supremo Tribunal Federal. É um fato que está nas ruas, nas mentes, nas bocas, em toda parte. Não aconteceu de graça ou de repente. A nossa Corte maior de Justiça vem abdicando de sua majestade há tempos, desde que começou a se dar ao desfrute de engajamentos e comportamentos outros para além dos restritos à interpretação fria, coerente e consistente da Constituição.

A ausência de reverência tem duas mãos. Se de um lado se derrubou na prática o lema de que decisão judicial não se discute para se estabelecer país afora um ambiente de amplo debate em relação a sentenças proferidas no âmbito do STF, de outro os ministros (salvo uma ou duas exceções) abriram espaço para contestações ao optar por exercer protagonismo na vida nacional nem sempre de modo educado e/ou apropriado.

Embora os magistrados se considerem intocáveis, não são mais invioláveis no crivo da opinião pública. Não falo aqui só dos questionamentos de especialistas publicados na imprensa. Basta sintonizar estações de rádio no dia seguinte a um julgamento polêmico no Supremo para ouvir, mesmo nos programas populares, críticas pesadas ou defesas apaixonadas da conduta dos magistrados.

Nunca se viu nada igual. Havia um certo acanhamento em comentar os votos, hoje substituído por absoluto desembaraço no julgamento dos julgadores. A questão não é a crítica, mas os termos em que é feita. Verdade seja dita, suas excelências é que abriram a temporada de contenciosos. Baixaram e continuam baixando a guarda.
  
Isso ocorreu, por exemplo, quando um juiz se aliou ao presidente do Senado para fazer um gol de mão no processo de impeachment de uma presidente da República. A dupla Ricardo Lewandowski-Renan Calheiros preservou os direitos políticos de Dilma Rousseff e foi desmoralizada pelo eleitorado de Minas Gerais, que lhe negou o mandato de senadora.

Nessa saraivada de tiros no pé, incluem-se as ironias e os insultos trocados entre os pares com transmissão ao vivo, as diatribes provocativas de Gilmar Mendes contra a Lava-Jato em votos que nada têm a ver com a operação, as mudanças de entendimento da Constituição sem justificativas a não ser uma circunstância política. Sem esquecer a censura a publicações, a abertura de inquérito à margem da lei e, para culminar, mais recentemente a atuação desastrosa de Dias Toffoli no caso do compartilhamento de dados dos órgãos de inteligência financeira com instâncias de investigações criminais.

O conjunto dessa obra já desperta no Congresso e no próprio STF uma preocupação com a imagem negativa, refletida em protestos públicos e na pressão para que andem os pedidos de impeachment (dezessete até agora) de ministros. Tanto que há pontes de diálogo nos dois ambientes para que se reduzam a temperatura e a intensidade das polêmicas produzidas no Supremo.

A ordem de baixar a poeira está sinalizada no adiamento do exame do pedido de suspeição de Sergio Moro nos processos de Lula para, se não às calendas gregas, ao menos até o Parlamento tomar uma decisão sobre a volta ou não da prisão em segunda instância.