A DICOTOMIA PETISTA
DO “NÓS X ELES”
Lula e o PT não criaram a corrupção, embora a
tenham institucionalizado e colocado a serviço de seu espúrio projeto de poder,
embrulhada em falácias populistas que, durante algum tempo, engambelaram até os
mais céticos. Na avaliação do sociólogo e cientista político Bolívar Lamounier, a era lulopetista
feriu a democracia brasileira muito mais profundamente do que se tem admitido,
não só com a corrupção sistêmica, cuja radioatividade está longe de terminar, e
as insanidades do governo Dilma, que
elevou para mais de 12 milhões o número de desempregados, mas também com o
culto sistemático da mentira, a falsificação ideológica da história e o uso
político de aberrações conceituais, que dividiram os brasileiros em “nós” e “eles”, fomentando a cizânia entre a esquerda e a direita e
culpando a mídia, as “zelites”, os “coxinhas”, o Judiciário e sabe Deus quem
mais por tudo que deu errado na sua imprestável administração.
Com efeito, desde sua fundação, há 36 anos, que o PT insiste em apresentar a história
brasileira como obra de uma elite pequena, coesa, gananciosa, em permanente
conspiração contra os trabalhadores e os pobres. Um país de verdade, onde todos
tenham oportunidade, só a partir de Lula.
Mas, ironicamente, o grande exemplo de país governado por uma elite
conspiratória foi o próprio PT que
nos ofereceu. Ao se associar umbilicalmente ao cartel das empreiteiras, Lula e seus acólitos conspiraram o quanto
puderam, com requintes de profissionalismo a toda prova. E mais: dividiram o
eleitorado de tal forma e tão passionalmente que as pessoas trocaram a
civilidade e o respeito mútuo por agressividade, ódio e repulsa pelos
adversários. Claro que as redes sociais também colaboraram, mas considerá-las a
única responsável por essa polarização seria o mesmo que culpar a arma pelo
homicídio e absolver quem a sacou, apontou e puxou o gatilho.
Anda difícil achar alguém que não tenha rompido uma antiga
amizade, deixado de falar com parentes ou virado a cara para colegas de
trabalho por conta de diferenças de “ideologia política” ― tema que o bom senso
recomenda evitar em happy-hours, festas familiares e reuniões corporativas. Por
outro lado, é preciso paciência de Jó
para aturar o proselitismo da militância petista e de seus apoiadores, que, a
despeito de todas as evidências em contrário, insistem em dogmatizar as bazófias
asininas do penta-réu chefe da ORCRIM
e aplaudir os discursos azoratados que ele não perde a oportunidade de
proferir, mesmo que isso signifique fazer de palanque o esquife da
ex-primeira-dama Marisa Letícia, numa demonstração de vileza e de
mau-caratismo à toda prova. No funeral da esposa, o pulha chegou ao cúmulo de
atribuir sua morte à tensão decorrente das acusações na Lava-Jato, e a insinuar
que o culpado seria Sergio Moro. E foi aplaudido pela patuleia
ignara ― veja a que ponto chega o descolamento da realidade dessa confraria de
“esquerdistas”.
Em plena era do pós-verdade, a mentira campeia solta e fatos
objetivos têm menos influência do que apelos emocionais e crenças pessoais. É o
mais desolador é que isso se verifica em todos os níveis, aí incluído o dos
políticos, cuja função é nos representar. A título de ilustração, em março do
ano passado, depois de Lula ser
conduzido coercitivamente para depor na PF,
Jandira Feghali gravou um vídeo para
“tranquilizar a militância” (confira neste link). Enquanto ela diz que o
molusco está “muito tranquilo”, vê-se ao fundo o dito-cujo falando ao celular ―
ué, ela agora tem celular? ― com a nefelibata da mandioca, e, em determinado
momento, ouve-se claramente ele esbravejar: “Eles
que enfiem no cu todo o processo”. Imagine o que ele diria se não estivesse
sereno!
Mas o que mais causa espécie é ver pessoas que reputamos esclarecidas
defenderem com unhas de dentes a “honestidade” desse um salafrário abjeto,
prestigiarem uma agremiação criminosa travestida de partido ― onde, se alguém
gritar pega ladrão, não fica um ― e prestarem vassalagem a uma ex-governante de
merda, que destruiu a Economia para ficar mais 4 anos na presidência, embora
nunca tenha sido capaz de gerenciar coisa alguma ― como comprova a falência de suas duas lojinhas de
badulaques importados, em meados dos anos 1990, justamente quando a
paridade entre o real e o dólar favorecia sobremaneira esse tipo de comércio.
Ainda que não sirva de consolo, esse descolamento da
realidade ― ou tendência de negar incondicional e irracionalmente os fatos em sua
obviedade ― não é privilégio da patuleia tupiniquim. Na primeira entrevista
como presidente dos EUA, o parlapatão Donald
Trump disse que sua posse reuniu a maior plateia de todos os tempos,
ainda que a multidão fosse 70% menor do que na posse de Barack Obama, em 2009. Quando os jornais New York Times e Washington
Post publicaram fotos aéreas comparativas (vide imagem), Trump os chamou de mentirosos e
manipuladores. No dia seguinte à posse, a empresa de pesquisas YouGov mostrou as fotos a 1.388
americanos e perguntou qual posse era de quem. Entre os eleitores de Trump, 41% deram a resposta errada. E
quando os pesquisadores reformularam a pergunta para “em qual dessas duas fotos tem mais gente”, 15% insistiram que
havia mais pessoas na imagem vazia. Durma-se com um barulho desses!
Para entender melhor, vejamos alguns números: durante as
eleições americanas, o site BuzzFeed
monitorou o compartilhamento de notícias verdadeiras e falsas. As 20 Fake News mais bombadas tiveram 8,7 milhões de compartilhamentos,
enquanto as verdadeiras, 7,3 milhões.
No Brasil, esse quadro é ainda pior: no ano passado, o mesmo site analisou as
20 notícias que mais se destacaram nas redes sociais (10 verídicas e 10 falsas)
e constatou que os posts mentirosos foram bem mais compartilhados do que os
verdadeiros (3,9 milhões e 2,7 milhões de vezes, respectivamente).
Agora, a explicação: quando se depara com uma informação nova,
nossa mente tende a tomá-la por verdade. A desconfiança e possível refutação,
segundo o psicólogo Daniel Gilbert,
da Universidade de Harvard, só
acontece depois, porque desconfiar requer mais esforço cognitivo e, portanto,
gasta mais energia. Assim, quanto mais informações nosso cérebro recebe, mais
propenso ele se torna a aceitar cada uma delas. E como as redes sociais
compartilham informações em quantidade e velocidade vertiginosas (só no Facebook, há mais de 5 bilhões de compartilhamentos por dia),
a conclusão é óbvia. Para Márcio Moretto
Ribeiro, professor da USP e
criador do Monitor do Debate Político no
Meio Digital, as redes permitem que os usuários escolham suas próprias
versões dos fatos, e as pessoas tendem a compartilhar notícias que reforçam
suas ideias preconcebidas, sejam elas verdadeiras ou não (as informações são da
revista Superinteressante).
Por essas e outras, eu desisti de argumentar com a patuleia
abilolada. Limito-me divulgar os fatos e oferecer a minha interpretação. Deixei
de perder tempo com polêmicas que levam coisa alguma a lugar nenhum. Se leio
algo que me chama a atenção, além de verificar se a origem confiável, checo
também se a notícia foi divulgada por outras fontes fidedignas. Afinal, 13 anos
e fumaça de lulopetismo propiciaram a disseminação de uma quantidade
exorbitante de sites e blogs-mortadela,
especializados em espalhar a desinformação, e muitos continuam ativos e
operantes, mesmo depois de o governo atual lhes ter cortado o patrocínio.
Quanto a editoriais
e colunas, é preciso ter em mente que
eles expressam a opinião do jornal/revista ou do colunista, conforme o caso. Mas
opinar é uma coisa, vender gato por lebre é outra bem diferente. Ainda assim,
alguns tem a cara de pau de publicar como verdade qualquer coisa que provenha
do departamento de propaganda do Partido
dos Trambiqueiros, mesmo que seja capaz de enrubescer santo de pedra. Tem
quem afirma que Lula foi o melhor
presidente do Brasil, que Dilma fez
um excelente governo, que o impeachment foi um “golpe”, que Temer é um “traíra” sem legitimidade
para ocupar a presidência, que a aprovação da PEC do teto foi uma calamidade, que Previdência não está
falida, que a reforma da Legislação Trabalhista
vai prejudicar os trabalhadores, que privatização
é entreguismo, e por aí segue essa lamentável procissão de bobagens. Houve até
quem que afirmasse ― pasmem! ― que o nove-dedos teria sido indicado para o Prêmio Nobel... Vão sonhando. Quem sabe
um dia a academia sueca resolva laurear os que mais se destacam no campo da desfaçatez, do cinismo, da corrupção...
Enfim, o jeito é deixar pra lá. Depois de meia dúzia de
réplicas e tréplicas, se você perceber que o interlocutor continua impermeável
à argumentação, desencane, mude de assunto ― ou de interlocutor. Fuja dos haters, ou você acabará se tornando
igual a eles.
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