Causa espécie o fato de muitos que defendem este governo se
comportarem nas redes sociais como petistas de sinal trocado, deixando claro que
o radicalismo e o fanatismo desbragados continuam criando versões que calam os
fatos nas tribunas da Web. Parece que a ficha não caiu, que esse povo não se
deu conta de que a disputa eleitoral terminou, que o treino acabou e que o jogo
começou.
Como se não bastasse, o próprio Presidente dá sinais de que continua
em campanha, e, para piorar, em vez usar da sua autoridade para evitar
conflitos e cabeçadas entre os auxiliares recém-empossados, encarrega-se pessoalmente de dar início
aos rebosteios, levando seus comandados a atuar como barreira de contenção.
Durma-se com um barulho desses!
Bolsonaro foi
eleito para fazer contraponto à corrupção metastática que avançou
implacavelmente nos 13 anos e fumaça de gestões lulopetistas. Depois que o
nosso “esclarecidíssimo” eleitorado fulminou as demais opções (nenhuma delas valia grande coisa,
verdade seja dita), não restou alternativa aos cidadãos de bem senão votar no
deputado-capitão para evitar o retorno do PT
no melhor estilo PCC, ou seja, com o
prisioneiro mais famoso desta republiqueta de merda comandando remotamente se poste-fantoche,
que acabou derrotado por uma diferença de quase 11 milhões de votos. Mas não é bom é ver os sentimentos maiores que insuflaram as velas
da candidatura de Bolsonaro — sobretudo
o nacionalismo e o patriotismo — serem rebaixados a questões familiares
constrangedoras.
Não há como não ficar apreensivo diante da ingerência da prole
real no governo federal, como se viu no lamentável episódio que resultou na exoneração
do coordenador de campanha, advogado e pau-pra-toda-obra, Gustavo Bebianno. Escolher seus ministros e demiti-los a qualquer
tempo é prerrogativa do Presidente, naturalmente, mas o que não é aceitável é transformar uma questão de somenos numa aula magna sobre as misérias políticas
do governo. E, cá entre nós, sustentar que a troca de mensagens de áudio não foi uma “conversa” é insultar nossa
inteligência, sobretudo por quem usa o WhatsApp como uma espécie Diário
Oficial Informal.
Apoiar Bolsonaro
no comando desta nau de insensatos é fundamental. Torcer contra e sabotar projetos
importantes, como a PEC da
Previdência e o pacote de medidas anticrime e anticorrupção, é
coisa da escória inconformada com a derrota do ventríloquo e seu boneco nas urnas,
de quem não se poderia esperar comportamento diferente, mais civilizado e
focado no bem da Nação. Mas daí aplaudir as asnices do governo vai uma longo
distância. Apenas para citar um exemplo recente, o Ministério da Educação enviou a todas as escolas do País um email
pedindo que “as crianças sejam
perfiladas para cantar o hino nacional, que o momento seja gravado em vídeo e
enviado para o governo, e que seja lida para elas uma carta do ministro Ricardo
Vélez Rodriguez, que termina com o slogan da campanha de Jair Bolsonaro:
“Brasil acima de tudo. Deus acima de todos.” Tem cabimento um despautério
desses?
Para além do manifesto despreparo e do “estilo despojado” de Bolsonaro — que beira o ridículo quando ele se deixa fotografar, numa
reunião de cúpula sobre a reforma da previdência, vestindo uma camiseta pirata do Palmeiras calçando
chinelos Rider —, a constante preocupação com supostas conspirações
orquestradas por adversários reais e imaginários gera um clima de desconfiança
e incerteza sobre seu processo mental e sua sistemática atuação em relação aos
filhos. Talvez a imagem tosca que ele transmite seja uma construção planejada e
conscientemente administrada, mas
daí a ter um compromisso deliberado com o mau gosto...
Como bem salientou Dora
Kramer em sua coluna na revista Veja, a
possibilidade de qualquer um dos “príncipes herdeiros” se sentir tão poderoso
que possa investir contra os superministros da Economia e da Justiça (os
pilares de razoável seriedade da administração) é a hipótese de o Presidente
inviabilizar-se por falta de sustentação de conteúdo consistente no governo. Tanto
Paulo Guedes quanto Sérgio Moro não devem nada a
ninguém e podem sair no momento que lhes for conveniente — por menos, quando
houve um estremecimento em torno de declarações sobre o IOF, Guedes se
recolheu, e Moro tampouco se aliou a
disputas perdidas.
Se os filhos de Bolsonaro
fizerem investidas com as quais não podem se confrontar, muito menos
administrar, porão a perder o governo do pai, a chance única de poder e o sonho
que jamais sonharam ver realizado. E que mais tem a perder com isso é o Brasil.