SUTOR, NE
ULTRA CREPIDAM.
Como já foi
dito ad nauseam nesta sequência (mas não me custa repetir em atenção a quem está chegando agora), os motores bicombustível que equipam
nossos veículos Flex são dimensionados
para funcionar tanto com etanol quanto com gasolina — ou com os dois combustíveis misturados em qualquer proporção.
Há quem
recomende adicionar álcool à gasolina para aproveitar as propriedades solventes do etanol, que ajudam a evitar o acúmulo de resíduos carboníferos nos bicos injetores. Mas é bom lembrar que a
gasolina servida nas bombas dos postos já vem “batizada” com 26% de álcool (para aumentar a octanagem e baratear o produto). Há também quem sugira encher o tanque apenas com gasolina a cada seis meses ou depois de
rodar 5 mil quilômetros com álcool, o que ocorrer primeiro, como forma de evitar a
formação de depósitos e melhoraria a performance do motor.
A primeira dica
até faz sentido, embora seja mais vantajoso usar gasolina aditivada. Quanto à
segunda, o etanol é um combustível “limpo”
e, portanto, dispensa aditivos — mesmo assim, alguns postos da bandeira Shell
oferecem a versão aditivada. Mas abastecer ou não com gasolina de tempos e
tempos, pura ou misturada ao etanol em qualquer proporção, fica a critério do usuário, que não deve ver nisso uma solução para conservar o motor mais limpo ou prolongar sua
vida útil.
A partir dos gases resultantes da queima da mistura ar-combustível, um
componente chamado sonda lambda identifica
o combustível existente no tanque dos veículos Flex (ou a proporção entre o álcool e a gasolina) e informa a central do sistema de injeção, que ajusta o motor para o melhor
desempenho. Portanto, pouco importa se você colocou “x” litros de etanol e
completou o tanque com gasolina ou vice-versa, pois a sonda lambda reconhecerá a proporção exata de cada um deles e
passará essa informação para o módulo da injeção.
No caso dos motores
de 3 cilindros — veja mais detalhes nos capítulos em que eu tratei do downsizing —, a regrinha dos 70% pode
ser ajustada para 75%, mas ninguém melhor do que o proprietário para acompanhar o consumo
de seu veículo, tanque a tanque, e escolher o combustível (ou proporção) que
achar mais conveniente. Mas convém ter em mente que o desempenho com álcool costuma ser
superior, e que o aumento no consumo acaba sendo compensado pela diferença de preço entre o etanol e a gasolina.
Em viagens por rodovias com pouca oferta de combustível (ou seja, quando os postos ficarem muito distantes uns dos outros) é mais indicado abastecer com
gasolina, que garante maior autonomia (mais quilômetros por litro e, consequentemente, por tanque). Em
situações emergenciais, o álcool puro (96º GL) vendido em farmácias e drogarias pode
ser usado sem problemas (além do preço, naturalmente, que é bem maior que o do etanol vendido nos postos). Mas jamais use o álcool comumente
encontrado em supermercados (46º GL), pois ele contém 54% de água. Não
acredita? Então experimente colocar um pouc num pires e aproximar um palito de fósforo aceso — em vez do álcool se inflamar, o fósforo é que se apagará.
Independentemente
do combustível que você escolher para completar o tanque, o abastecimento deve
ser interrompido assim que o bico da bomba desarmar pela primeira vez. Isso porque
desde 1988, quando os veículos passaram a ser equipados com um filtro de carvão
ativado (cânister) para minimizar a emissão
de poluentes, que não se deve encher o tanque “até a boca” — aliás, isso nunca foi uma prática recomendável, pois sempre envolveu o risco de
o combustível transbordar e manchar a pintura. Então, autorize o frentista a, quando
muito, arredondar o valor. Do contrário, o excesso de
combustível pode fluir pelo tubo localizado na parte superior do tanque e atingir o
cânister, que foi projetado filtrar os vapores, mas não para entrar em contato
com líquidos.
Se você abastece sempre com etanol, a limpeza
dos bicos injetores — que as
oficinas estão sempre prontas a empurrar para faturar uns trocados a mais — costuma
ser desnecessária. Portanto, muito cuidado com a conversa fiada dos adeptos da empurroterapia e picaretas da rebimboca da parfuzeta.
Conforme a
gente viu ao longo desta interminável sequência, a injeção eletrônica é capaz de prover a quantidade de mistura ar-combustível adequada a cada momento específico
do funcionamento do motor. Os primeiros modelos eram do tipo monoponto, ou seja, contavam com um único bico injetor, mas os mais modernos são do tipo multiponto, isto é, têm um bico para cada cilindro (veja foto), garantindo um melhor
aproveitamento do combustível. Em
determinadas situações, a limpeza dos bicos — também chamada de “descarbonização” — e do TBI (corpo de borboleta) pode ser
necessária, mas desde que como procedimento
corretivo. Em outras palavras, “limpeza preventiva” quando o veículo não
apresenta perda de potência ou aumento anormal no consumo é apenas um artifício usado por maus profissionais da
reparação automotiva para tomar dinheiro dos incautos.
Amanhã a
gente conclui.