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quarta-feira, 9 de outubro de 2019

AINDA SOBRE TORQUE E POTÊNCIA...

OPOSIÇÃO SEM CONTRAPROPOSTA NÃO É POLÍTICA, É MERO EXERCÍCIO DO ESPÍRITO DE PORCO.

É comum associarmos torque a arrancadas e potência a altas velocidades, embora ambas essas forças sejam produzidas pela transformação da energia calorífica da mistura ar-combustível em energia cinética, cresçam na razão direta do aumento do regime de giros do motor (RPM) e atuem em conjunto durante todo o tempo em o veículo é utilizado.

torque costuma "aparecer" bem antes do regime em que a potência máxima é alcançada (vide figura). Motores de grandes cilindradas tendem a gerar mais potência e curvas de torque mais “planas” (com força abundante em praticamente todas as faixas de rotação) do que os de menor cilindrada, que precisam ser mantidos em regimes de giro elevados para produzir força (daí ser preciso reduzir as marchas ao realizar ultrapassagens ou transpor longos trechos em aclive).

Por ser associada a velocidade e desempenho, a potência é usada como referência primária nos veículos leves. Já o torque é associado a força e, portanto, "fala mais alto" e em caminhões, ônibus e utilitários de grande porte. Um motor diesel de 12 litros, por exemplo, gera “módicos” 400 cavalos e incríveis 228 kgfm de torque a 1.200 RPM, ao passo que um Ford Mustang Shelby GT500 produz 770 cavalos, mas entrega “somente” 86,4 kgfm de torque a 7.000 RPM.

torque costuma se expresso em kgfm (quilogramas-força x metro), mas alguns manuais utilizam o Newton-metro1 Nm corresponde ao torque produzido por 1 Newton de força aplicada a 1 m de distância do ponto de rotação, e equivale a aproximadamente 0,10 kgfm. Já a potência pode ser expressa em cavalos-vapor (CV) ou em quilowatts (kW). O quilowatt é a unidade padrão do sistema nacional de unidades definida pela Organização Internacional para Normatização (ISO) e utilizado nas fichas técnicas das montadoras de origem alemã. Fabricantes ingleses e americanos preferem o horse power (HP) e os italianos e franceses, o CV.

ObservaçãoNo Brasil, a maioria das marcas (independentemente da origem) converte suas fichas técnicas para o cv, mas é bom ficar atento à equivalência real entre as medidas: 1 HP corresponde a 745,7 W ou 0,7457 kW e 1 CV, a 0,7355 kW.

A potência em HP é medida no eixo motor, com todos os acessórios necessários para ligá-lo e fazê-lo funcionar autonomamente. O BHP — de brake horse-power —, aferido segundo as (hoje obsoletas) normas americanas SAE J245 e J1995, permitia a retirada de filtro de ar, alternador, bomba de direção hidráulica e motor de partida, além de admitir o uso de coletores de escape dimensionados. Por dar uma ideia de maior potência, essa nomenclatura foi largamente utilizada pelas montadoras.

A diferença entre essa medidas tende a ser inexpressiva em motores de pouca potência  80 HP, por exemplo, representam 81,109 CV. Mas a coisa muda conforme a potência aumenta: os 430 kW do motor V8 do Mercedes AMG Coupé, também por exemplo, equivalem a 577 HP ou 585 CV. Para evitar enganos, converta a potência em kW para HP ou CV com o auxílio de uma calculadora ou recorra a um conversor de potências online (como o do WebCalc).

Para medir o torque, o motor é ligado a um dinamômetro e posto para funcionar com aceleração máxima, mas mantido em várias rotações — 1.000, 2.000, 3.000 etc. — por um freio hidráulico ou elétrico. Conhecido o valor do torque nos diversos regimes de giro, chega-se à potência multiplicando-o pela rotação.

Resumo da ópera: Torque é trabalho e potência é o tempo em que esse trabalho é realizado. O trabalho que um Fusca 1.3 de 46 HP realiza ao subir um aclive é o mesmo que faz um Maverick v8 de 257 HP ao subir a mesma ladeira. A diferença é que o carro mais potente fará o percurso em um tempo incomparavelmente menor. E o mesmo se aplica à aceleração. Submetidos a um teste de aceleração (de 0 a 100 km/h) os dois carros cumprirão a tarefa, mas o Maverick o fará em menos de 8s e Fusca, em letárgicos 38,8s.

quinta-feira, 29 de novembro de 2018

VEÍCULOS FLEX: MELHOR USAR GASOLINA OU ÁLCOOL? (Parte 16)


SUTOR, NE ULTRA CREPIDAM.

Como já foi dito ad nauseam nesta sequência (mas não me custa repetir em atenção a quem está chegando agora), os motores bicombustível que equipam nossos veículos Flex são dimensionados para funcionar tanto com etanol quanto com gasolina — ou com os dois combustíveis misturados em qualquer proporção.

Há quem recomende adicionar álcool à gasolina para aproveitar as propriedades solventes do etanol, que ajudam a evitar o acúmulo de resíduos carboníferos nos bicos injetores. Mas é bom lembrar que a gasolina servida nas bombas dos postos já vem “batizada” com 26% de álcool (para aumentar a octanagem e baratear o produto). Há também quem sugira encher o tanque apenas com gasolina a cada seis meses ou depois de rodar 5 mil quilômetros com álcool, o que ocorrer primeiro, como forma de evitar a formação de depósitos e melhoraria a performance do motor. 

A primeira dica até faz sentido, embora seja mais vantajoso usar gasolina aditivada. Quanto à segunda, o etanol é um combustível “limpo” e, portanto, dispensa aditivos — mesmo assim, alguns postos da bandeira Shell oferecem a versão aditivada. Mas abastecer ou não com gasolina de tempos e tempos, pura ou misturada ao etanol em qualquer proporção, fica a critério do usuário, que não deve ver nisso uma solução para conservar o motor mais limpo ou prolongar sua vida útil.

A partir dos gases resultantes da queima da mistura ar-combustível, um componente chamado sonda lambda identifica o combustível existente no tanque dos veículos Flex (ou a proporção entre o álcool e a gasolina) e informa a central do sistema de injeção, que ajusta o motor para o melhor desempenho. Portanto, pouco importa se você colocou “x” litros de etanol e completou o tanque com gasolina ou vice-versa, pois a sonda lambda reconhecerá a proporção exata de cada um deles e passará essa informação para o módulo da injeção.

No caso dos motores de 3 cilindros — veja mais detalhes nos capítulos em que eu tratei do downsizing —, a regrinha dos 70% pode ser ajustada para 75%, mas ninguém melhor do que o proprietário para acompanhar o consumo de seu veículo, tanque a tanque, e escolher o combustível (ou proporção) que achar mais conveniente. Mas convém ter em mente que o desempenho com álcool costuma ser superior, e que o aumento no consumo acaba sendo compensado pela diferença de preço entre o etanol e a gasolina.

Em viagens por rodovias com pouca oferta de combustível (ou seja, quando os postos ficarem muito distantes uns dos outros) é mais indicado abastecer com gasolina, que garante maior autonomia (mais quilômetros por litro e, consequentemente, por tanque). Em situações emergenciais, o álcool puro (96º GL) vendido em farmácias e drogarias pode ser usado sem problemas (além do preço, naturalmente, que é bem maior que o do etanol vendido nos postos). Mas jamais use o álcool comumente encontrado em supermercados (46º GL), pois ele contém 54% de água. Não acredita? Então experimente colocar um pouc num pires e aproximar um palito de fósforo aceso — em vez do álcool se inflamar, o fósforo é que se apagará.

Independentemente do combustível que você escolher para completar o tanque, o abastecimento deve ser interrompido assim que o bico da bomba desarmar pela primeira vez. Isso porque desde 1988, quando os veículos passaram a ser equipados com um filtro de carvão ativado (cânister) para minimizar a emissão de poluentes, que não se deve encher o tanque “até a boca” — aliás, isso nunca foi uma prática recomendável, pois sempre envolveu o risco de o combustível transbordar e manchar a pintura. Então, autorize o frentista a, quando muito, arredondar o valor. Do contrário, o excesso de combustível pode fluir pelo tubo localizado na parte superior do tanque e atingir o cânister, que foi projetado filtrar os vapores, mas não para entrar em contato com líquidos.

Se você abastece sempre com etanol, a limpeza dos bicos injetores — que as oficinas estão sempre prontas a empurrar para faturar uns trocados a mais — costuma ser desnecessária. Portanto, muito cuidado com a conversa fiada dos adeptos da empurroterapia e picaretas da rebimboca da parfuzeta

Conforme a gente viu ao longo desta interminável sequência, a injeção eletrônica é capaz de prover a quantidade de mistura ar-combustível adequada a cada momento específico do funcionamento do motor. Os primeiros modelos eram do tipo monoponto, ou seja, contavam com um único bico injetor, mas os mais modernos são do tipo multiponto, isto é, têm um bico para cada cilindro (veja foto), garantindo um melhor aproveitamento do combustível. Em determinadas situações, a limpeza dos bicos — também chamada de “descarbonização” — e do TBI (corpo de borboleta) pode ser necessária, mas desde que como procedimento corretivo. Em outras palavras, “limpeza preventiva” quando o veículo não apresenta perda de potência ou aumento anormal no consumo é apenas um artifício usado por maus profissionais da reparação automotiva para tomar dinheiro dos incautos.

Amanhã a gente conclui.

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

VEÍCULOS FLEX: MELHOR USAR GASOLINA OU ÁLCOOL? (Parte 7)


VIVA COMO SE FOSSE MORRER AMANHÃ. APRENDA COMO SE FOSSE VIVER ETERNAMENTE.

Como vimos ao longo desta sequência, o grande atrativo dos veículos Flex é a possibilidade de abastecê-los com gasolina, etanol ou uma mistura de ambos em qualquer proporção. Usar álcool tende a ser mais vantajoso quando seu preço na bomba é igual ou inferior a 70% do preço da gasolina, mas há outras vantagens. Para citar um exemplo notório, sua octanagem é 20% superior à da gasolina comum, o que resulta em mais torque e potência. A título de ilustração, o motor 1.6 Flex que equipa o New Fiesta gera 127,6 cv no álcool e 125,2 cv na gasolina. No Prisma 1.4 Flex, essa diferença é um pouco maior — 97 cv contra 89 cv —, e no Corolla 2.0, maior ainda — 154 cv conta 143 cv (volto a esse assunto mais adiante).

Via de regra, o motor atinge sua potência máxima em regimes (rotações por minuto) elevados. Nos exemplos do parágrafo anterior, isso significa algo entre 6.000 rpm e 6.500 rpm. O torque máximo é obtido em regimes inferires, o que é positivo: mais força em baixas rotações proporciona melhor aceleração e, por tabela, favorece as retomadas de velocidade. Portanto, ao esquadrinhar a ficha técnica do seu veículo (ou do modelo que você tem em vista), observe o valor do torque máximo (expresso em kgfm ou Nm) e a faixa de rotação na qual ele surge. Quanto mais “plana” for a “curva de torque”, tanto melhor.

Devido ao poder calorífico menor que o da gasolina, o etanol requer uma mistura “mais rica” — ou seja, sua taxa estequiométrica (proporção entre o combustível e o ar que compõem a mistura) é de aproximadamente 8,4:1, o que corresponde, em números redondos, a oito partes de ar para uma de combustível. Na gasolina, a taxa é de 14,6:1 (catorze partes de ar para uma de combustível, também em números redondos).

Nos veículos carburados, a dosagem da mistura ar-combustivel pulverizada no coletor de admissão era estabelecida pelos giclês (ou gargulantes) do carburador, o que resultava numa relação estequiométrica invariável. Já a injeção eletrônica — que, como vimos, é a grande responsável pelo desenvolvimento dos motores bicombustível — faz ajustes em tempo real, estabelecendo quantidades e proporções de ar e combustível adequadas a cada momento específico. O etanol custa mais barato, mas rende menos e resulta numa autonomia enferior à da gasolina. Em outras palavras, gasta-se menos para abastecer, mas as paradas no posto são mais frequentes — o que pode ser um problema em viagens, sobretudo se os postos ficarem muito distantes entre si.

Motores à gasolina produzem melhores resultados com taxas de compressão em torno de 10:1, ao passo que o álcool (a exemplo das gasolinas premium) requer taxas mais elevadas — entre 11,5:1 e 14:1. Atualmente, os engenheiros precisam definir uma relação intermediária, que atenda às exigências dos dois combustíveis. Mas isso deve mudar com a tecnologia que vem sendo desenvolvida pela Nissan com vistas a uma taxa de compressão variável. Quando ela se tornar comercialmente viável, será possível explorar o melhor de cada combustível (mais detalhes nesta postagem).

Observação: Eu já disse, mas não custa repetir que a taxa de compressão corresponde ao número de vezes que a mistura ar-combustível é comprimida pelo movimento ascendente do pistão no ciclo de compressão, até ser inflamada pela centelha produzida pela vela de ignição (no ciclo de explosão), e que esse parêtro depende precipuamente do curso do pistão — para mais detalhes sobre o funcionamento do motor de quatro tempos (ciclo Otto), releia esta postagem.

Amanhã eu conto o resto.

terça-feira, 30 de outubro de 2018

AINDA SOBRE OS CARROS MODERNOS E A TECNOLOGIA EMBARCADA


PERGUNTAR O QUE NÃO PODE SER RESPONDIDO É PERDA DE TEMPO.

Depois de discorrer brevemente sobre as opções de transmissão (assunto das duas postagens anteriores), achei por bem alertar o leitor para o fato de que veículos com tecnologia embarcada, como os providos de injeção eletrônica, contam com um número considerável de componentes que podem ser danificados por uma simples lavagem do motor.

Antigamente, era comum o motor não “pegar” depois de lavado, devido ao acúmulo de água na tampa do distribuidor e nos conectores dos cabos das velas. Ainda que esse problema pudesse ser evitado mediante a simples proteção desses pontos com sacolinhas plásticas de supermercado, por exemplo, os funcionários dos postos e lava-rápidos achavam mais fácil secar tudo depois, com jatos de ar comprimido. Só que que o calor gerado pelo funcionamento do motor propiciava a formação de gotículas de água (condensação) no interior da tampa do distribuidor, umedecendo o carvão, o rotor, o platinado e o condensador, e impedindo o motor de religar depois do carro ficar parado por algumas horas (ou até a manhã seguinte, o que era mais comum).

Quem gosta de manter o carro sempre limpo pode se sentir incomodado em ver o motor sujo, mas é bom ter em mente que, em não havendo vazamentos de óleo e outros problemas afins, não há porque lavar o motor. Aliás, a maioria dos fabricantes não recomenda fazê-lo, pois a injeção eletrônica multiplicou o número de componentes elétricos e eletrônicos que podem ser facilmente danificados durante a lavagem, não tanto pela água em si, mas pela pressão da água. Além disso, a sujeira que se acumula no “cofre” e no bloco do motor pode ser removida com o auxílio de um pincel, um pano e ar comprimido. 

Observação: Mal comparando, o motor do carro está mais para um relógio resistente a água do que um modelo próprio para mergulho. Em outras palavras, pingos e respingos são suportados, mas o mesmo não se aplica a banhos de chuveiro nem, muito menos, de imersão — no caso do relógio, e a água em profusão e alta pressão, no caso do motor.

Caso queira mesmo lavar o motor do seu carro, leve o veículo a uma empresa especializada, que faça o serviço com vapor, e deixe o lava-rápido ou o posto para lavagens da carroceria e aspiração interna.

Se preferir fazer pessoalmente o trabalho, assegure-se, primeiro, de que o motor esteja desligado e frio; segundo, de que pontos vulneráveis (como caixa de fusíveis, alternador, bobina, módulo da injeção, bateria, enfim, tudo aquilo que estiver ligado a alguma coisa por um chicote elétrico) seja devidamente envolvido em saquinhos plásticos; terceiro, de não concentrar nesses pontos o jato da mangueira (ou da lavadora de pressão). 

Note que você pode remover a sujeira mais resiliente umedecendo-a com água e usando um pincel ou uma escovinha de cerdas duras (evite solventes ou produtos à base de querosene). Depois, é só bater água novamente (com moderação), secar, borrifar WD-40 e dar acabamento com um pano macio.

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