Na noite da última quinta-feira,
José
Serra entregou sua carta de demissão ao presidente
Michel Temer, que, pego de surpresa, tentou convencê-lo a optar por
uma licença. Mas o ministro foi irredutível. Segundo ele, o pedido se deve a
uma “
instabilidade segmentar vertebral e
estenose foraminal” ― um problema na coluna cervical ― e requer um
tratamento intensivo de quatro meses, durante os quais ele não poderia fazer os
longos voos internacionais, indispensáveis ao exercício das funções de
chanceler, sob pena de lesão na medula.
Assim, a “equipe de notáveis” do governo abre mais uma vaga a ser preenchida.
Fala-se que a pasta será mantida sob o controle do PSDB, e o principal cotado ―
até o momento ― é o líder do governo no Senado Federal,
Aloysio Nunes Ferreira.
Serra
reassumirá suas funções no Senado, na vaga ocupada hoje pelo suplente
José Aníbal, e assim terá mais tempo
para dedicar também à sua defesa, já que ele é um dos mais de 100 citados na
Delação do Fim do Mundo.
Observação:
Com a aprovação de Alexandre
Moraes para substituir Teori
Zavascki no Supremo, restou a Temer
escolher um novo ministro da Justiça e
Segurança Pública. Meio que a contragosto e a despeito das críticas
públicas do vice-presidente da Câmara, o presidente convidou o deputado
Osmar Serraglio, que não só aceitou o
cargo como se comprometeu a “manter distância” da Lava-Jato. Resta ainda
definir que ocupará a secretaria nacional da Segurança Pública, hoje sob o
comando do Ministério da Justiça. Fala-se no criminalista Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, amigo de Temer, que chegou a ser cotado para comandar o próprio Ministério
quando o PMDB chegou ao poder, mas acabou sendo descartado devido a declarações
que deu com críticas
à Lava-Jato.
Falando em delações e que tais,
Eliseu
Padilha, o todo-poderoso ministro-chefe da Casa Civil e amigo pessoal de
Michel Temer,
pediu afastamento do governo na última quinta-feira
(23), a pretexto de fazer uma cirurgia de retirada de próstata. O pedido se deu
um dia após
as declarações do ex-assessor especial da Presidência da
República José Yunes, de que teria intermediado o recebimento e a entrega
de um envelope ao ministro, em setembro de 2014 (pouco antes da eleição
presidencial na qual a chapa
Dilma-Temer
foi reeleita), pelo doleiro
Lúcio Funaro,
apontado pela Lava-Jato como operador do ex-presidente da Câmara,
Eduardo Cunha.
A matéria de capa da revista
Veja
com a informação de que
Yunes afirma
ter sido “mula” de
Padilha também
alimentou, no início da noite da quinta-feira, as teorias de que o ministro
estaria sendo “rifado”. Fontes próximas a
Yunes
e
Temer disseram ter sido “surpreendidas”
com as declarações do ex-assessor, enquanto auxiliares de
Padilha afirmaram, em caráter reservado, que a declaração de
Yunes parecia ser uma estratégia de
“fogo amigo” para tirar o ministro da Casa-Civil. Para
O ANTAGONISTA, é mais do
que evidente que a manobra foi combinada com o presidente:
Yunes entrega
Padilha,
que deixa o governo para tratar da saúde e não vota mais, sacrificando-se em
benefício de
Temer.
Volto a lembrar que o
time de
notáveis ― prometido por
Temer quando
assumiu interinamente a presidência com o afastamento da
mulher sapiens, em maio do ano passado ―, revelou-se
um notável time de enrolados com a Justiça.
Tanto que seu ministério teve sucessivas baixas desde então, fechando o ano
passado com a média uma por mês. Agora, com a confirmação de
Moreira Franco para a Secretaria Geral da Presidência da Banânia e
a saída de
Serra e de
Padilha, o primeiro escalão do governo ainda
conta com quatro integrantes citados na Lava-Jato (dentre os quais o próprio
Michel Temer), sem prejuízo de outros
nomes que podem surgir depois do Carnaval, por conta da recém-homologada
delação dos
77 da Odebrecht.
Para evitar uma degradação ainda maior da sua já escassa popularidade,
Temer disse, no último dia 13, que “meras
citações”
não
bastam para provocar demissões, mas que
afastará temporariamente qualquer auxiliar que venha a ser denunciado
pela PGR (situação em que o direito a salários e ao foro privilegiado são
mantidos) e
definitivamente se e
quando o STF aceitar a denúncia (antes, portanto, da sentença condenatória,
caso o réu seja declarado culpado). Aparentemente, trata-se de uma medida
saneadora; na prática, porém, ela concede sobrevida aos delatados na Lava-Jato ―
mantido o atual ritmo de tramitação dos processos no Supremo (detalhes
nesta
postagem), não há a menor possibilidade de alguém ser denunciado antes
do final do mandato do presidente, em dezembro do ano que vem.
Para a oposição, a regra estabelecida por
Temer, visando amenizar um previsível desgaste futuro, pode não
funcionar depois que o conteúdo das delações e todos os seus detalhes forem
revelados. Mas, convenhamos, todo esse desgaste poderia ter sido evitado se o
presidente tivesse sido mais seletivo na escolha de seus “notáveis”:
Maurício Quintella, por exemplo, jamais
deveria ter sido nomeado ministro (dos Transportes), já que havia sido
condenado pela Justiça Federal de Alagoas em 2014. E o mesmo vale para
Blairo Maggi (da Agricultura), que réu
em um processo que trata do uso de dinheiro público para suposta compra de uma
vaga no Tribunal de Contas do Estado; para
Gilberto
Kassab (de Ciência, Tecnologia e Comunicações), réu em diversas ações de
improbidade administrativa na Justiça de São Paulo (além de citado na Lava-Jato);
José Serra (que, como dito nesta
matéria, acabou de se demitir do Ministério das Relações Exteriores), por ser
réu em um processo de improbidade administrativa na Justiça Federal do Distrito
Federal; e para
Eliseu Padilha
(também citado linhas atrás), que é réu desde 2014 em um processo de
improbidade administrativa na Justiça Federal do Rio Grande do Sul, além de
ser citado também na Lava-Jato.
Será que, como
Lula no Mensalão e
no Petrolão, nosso ilustre presidente também “não sabia de nada”? Conversa! Ele
sabia de tudo desde 2014 (e
Lula
também, mas isso já é outra história).
Temer e
Yunes são amigos desde a década de
60. No ano passado, essa amizade rendeu a este último a presidência do diretório
municipal do PMDB em Sampa e a chefia do gabinete adjunto de agenda do
presidente, de onde passou para assessoria especial da Presidência. Em dezembro,
porém, afirmando que seu nome havia sido “jogado no lamaçal de abjeta delação
por irresponsáveis denúncias” (leia-se a delação de
Cláudio Mello Filho, um dos
77
da Odebrecht), ele se afastou do governo, embora tenha mantido a direção do
PMDB ― e o comando do
Yacht Club de
Ilhabela, no litoral norte de São Paulo.
Temer vê com preocupação o
imbróglio que arrasta seu principal ministro para o olho do furacão da
Lava-Jato e coloca seus dois velhos amigos em rota de colisão. Ele sabia que
Yunes havia prestado depoimento ao
Ministério Público e também sobre a entrevista à
revista Veja ― onde
Yunes
afirma que
Padilha o usou como “mula”
na campanha de 2014. “Contei tudo ao presidente em 2014. “O presidente sabe que
é verdade isso. Ele não foi falar com o
Padilha.
Reagiu com aquela serenidade de sempre (risos). Eu decidi contar tudo a ele
porque, em 2014, quando aconteceu o episódio e eu entrei no Google e vi quem
era o
Funaro, fiquei espantado com o
“currículo” dele. Nunca havia conhecido o
Funaro”,
afirmou ele, segundo o jornal
O Globo.
Vamos continuar de olho nessa
Casa de Noca para ver que bicho dá.
Bom Carnaval a todos.
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