Durante a abertura dos debates sobre as polêmicas medidas contra abuso de autoridade, na
manhã da última quinta-feira, Renan Calheiros
disse candidamente que defende a Lava-Jato
e considera “sagradas” as investigações força-tarefa, que contribuem para o fim
da grande chaga da impunidade”. Mas não explicou por que teria tentado aprovar
no Senado ― e em regime de urgência
― as medidas
anticorrupção avalizadas horas antes pela Câmara, que, por 450 votos a
1, aprovou uma versão espúria do relatório do deputado gaúcho Onyx Lorenzoni, um dos poucos
parlamentares aparentemente sintonizados com os anseios da nação. Felizmente,
dos 58 senadores presentes, apenas 14 apoiaram o presidente da Casa, e assim a
tramoia não prosperou.
Observação: Há quem diga que a exclusão da anistia à prática do caixa 2 eleitoral
do pacote tenha sido uma vitória, mas eu pergunto: até quando teremos de dar os
anéis para não perder os dedos? Afinal, deputados e senadores nada mais são que
servidores públicos eleitos para defender os direitos os interesses da população
que foram eleitos para representar, e não para legislar em causa própria nem ―
muito menos ― financiar suas campanhas com dinheiro público e se locupletar com
propinas, negociatas e outras práticas espúrias e bem pouco republicanas.
O fato é que Renan
e centenas de outros proxenetas do parlamento estão preocupados com a “delação
do fim do mundo”, como vem sendo chamado o acordo de leniência da Odebrecht ― que, combinado com a
colaboração premiada de mais de 77 executivos da empreiteira, deve atingir mais
de uma centena de políticos, dentre os quais o presidente Temer, os ex-presidentes Lula
e Dilma, ministros e ex-ministros de
Estado, governadores e ex-governadores, senadores, deputados, e por aí vai.
A boa notícia é que, por 8 votos a 3, o plenário do STF aceitou a denúncia contra Renan (por peculato), que agora é réu
em um dos 12 processos que tramitam contra ele naquela Corte (votaram a favor
do senador os ministros Ricardo Lewandowski,
Gilmar Mendes e Dias Toffoli).
Toffoli, vale
lembrar, por ocasião julgamento da ação que impede réus em ação penal de ocupar
cargos na linha sucessória da presidência da República, em novembro passado, pediu
vistas do processo depois que seis ministros já haviam votado pela proibição
(inclusive ele próprio), favorecendo Renan,
que, na qualidade de presidente do Senado, assume a presidência na ausência de Temer e de Rodrigo Maia. Ainda não há data prevista para o julgamento ser
retomado, até porque, como se sabe, as coisas no STF andam a passo de tartaruga.
Vale lembrar também que Toffoli
foi citado no acordo de delação de Leo
Pinheiro, suspenso por Rodrigo
Janot depois que a revista Veja
publicou a notícia. Segundo a reportagem, a proximidade entre o chefão da OAS e o ministro já era conhecida pela PF e havia sido revelada pela revista em
maio do ano passado, e que uma equipe de engenheiros da empreiteira teria
reparado infiltrações na mansão deste último (e arcado com o custo da obra).
Toffoli foi
indicado para o STF por Lula, depois de ter advogado para o PT nas campanhas do petralha de 1998,
2002 e 2006 e, mais adiante, chefiado Advocacia-Geral
da União. Por convicção ou gratidão, o ministro votou pela absolvição de Dirceu
no processo do mensalão (alegando “insuficiência de provas”) e, no comando do TSE,
deixou que ataques de Dilma a Aécio corressem soltos, embora
tenha cerceado o tucano quando este tentou revidar no debate do SBT e
dado à campanha de Dilma direito de resposta no site de VEJA
quando esta publicou o depoimento em que o doleiro Alberto Youssef disse
que Lula e Dilma sabiam de tudo do petrolão.
Toffoli e a grande-chefa-toura-sentada-ora-impichada
não se bicavam, o que explica os melhores desempenhos do ministro na Corte,
quando tentou impedir, sem sucesso, que Luis Roberto “Minha Posição” Barroso
atropelasse o regimento interno da Câmara e o Poder Legislativo,
anulando uma sessão e redefinindo arbitrariamente o rito de impeachment. Meses
atrás, Toffoli chegou ao cúmulo de “passar por cima” de duas instâncias do
Judiciário (TRF de SP e STJ) para conceder habeas corpus a Paulo
Bernardo, como bem pontuou o jornalista Reinaldo Azevedo nesta postagem.
Por último, mas não menos importante: em nota divulgada na
manhã da última sexta-feira, Cláudio
Lamachia, presidente nacional da OAB,
defendeu o imediato afastamento do senador de Renan da presidência do Senado. Veja o destaque a seguir:
“Com a decisão tomada pelo STF de tornar o presidente do Senado, Renan
Calheiros, réu em processo sobre peculato, é necessário que ele se afaste
imediatamente de suas funções de presidente do Senado e do Congresso Nacional,
para que possa bem exercer seu direito de defesa sem comprometer as
instituições que representa. Trata-se de zelo pelas instituições da República. Por
este motivo, é preciso que o senador seja julgado de acordo com os ritos e
procedimentos estabelecidos em lei, com acesso à ampla defesa e ao contraditório,
mas sem que isso comprometa o cotidiano e os atos praticados pelo Senado Federal.
Não se trata aqui de fazer juízo de valor quanto à culpabilidade, uma vez que o
processo que o investiga não está concluído”.
Renan vai
renunciar? Façam suas apostas.
Em tempo:
Em tempo:
O juiz Sérgio Moro
deve tirar 30 dias de férias em janeiro ― ao menos no começo do ano, os investigados
da Lava-Jato devem conseguir passar um mês sem sustos.
A popularidade do magistrado continua em alta: depois de
proferir uma palestra na Maison de France, no último dia 29, ele teve de posar
várias vezes para selfies com garçons, recepcionistas e a turma da cozinha que
trabalhou no evento.
Hoje, 4, devem ocorrer manifestações em defesa da Lava-Jato em pelo menos 221 cidades do
Brasil (segundo números do VemPraRua.net).
O Instituto
Ipsos fez uma pesquisa para
saber a opinião dos brasileiros sobre a força-tarefa e chegou à conclusão de
que 96% acham que ela tem de continuar, custe o que custar. É provável que, se
a pergunta fosse reformulada e feita tipo “você é a favor de Sergio Moro e contra os corruptos”, o
resultado ficasse ainda mais perto dos 100%.
Nesse entretempo, os “cabecinhas-pequenas”, movidos pelo sites-mortadela,
espalham alegremente (não seria desesperadamente?)
seu besteirol comuna, dizem que Moro
vai fugir do Brasil (não seria o Lula?),
que o juiz é responsável pelo crash da nossa economia (não seria a Dilma?), que a Lava-Jato é urdida e patrocinada pela C.I.A. ― ou com o “governo imperialista americano”, como preferem
os mais delirantes (não seria ignorantes?)
―, e por aí segue a cachoeira de asnices.
Enquanto ideias como essas grassarem e encontrarem ouvidos
que as escutem e mentes que as absorvam sem remissão, nosso pobre país não
passará de uma republiqueta de bananas.
A propósito: sabe como evitar que esses comunas morram afogados? É só atirar neles antes que caiam n’água.
Um ótimo domingo a todos.
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