O presidente Michel Temer perdeu a primeira grande
chance de fazer um favor ao Brasil em agosto do ano passado, quando Dilma foi definitivamente expelida da
presidência. Mas não seria mesmo de se esperar a grandeza da renúncia de um
vice que não só articulou o impeachment da titular, mas também foi seu maior
beneficiário.
Num primeiro momento,
a troca de comando pareceu alvissareira. O novo presidente sabia até falar ― um
refrigério, considerando que passamos 13 anos ouvindo os garranchos verbais de
um semianalfabeto e as frases desconexas de uma aculturada exótica que jamais
foi capaz de juntar sujeito e predicado numa frase que fizesse sentido. Claro
que seria impossível consertar o país da noite para o dia, dada a magnitude da
crise parida pela anta vermelha. Mesmo assim, Temer conseguiu debelar a inflação
(que rodava pelos 10% quando ele assumiu e agora está em torno dos 3%), reduzir
de maneira “responsável” a taxa SELIC e aprovar a PEC dos gastos e a reforma
trabalhista, apenas para citar os exemplos mais notórios.
Por outro lado, o
prometido ministério de notáveis revelou-se uma notável agremiação de
apaniguados corruptos ― que foram caindo à razão de um por mês, entre maio e
dezembro do ano passado. No entanto, mesmo com a podridão aflorando no seu
entorno, Michel seguia adiante, conduzindo a nau dos insensatos pelas
águas revoltas da crise como um timoneiro experimentado. Sob seu comando,
dizia, o Brasil chegaria são e salvo às próximas eleições e seria entregue
fortalecido ao próximo dirigente. E a coisa até funcionou
durante um tempo, a despeito da impopularidade outorgada ao peemedebista pela pecha da ilegitimidade ― o que é uma bobagem,
pois quem queria Dilma presidente
votou na Chapa Dilma-Temer, e como
vice da anta, Michel era tanto seu substituto eventual quando o
primeiro nome na linha sucessória presidencial ― o que ele fez para ser promovido a
titular e o fato de seu governo ter degringolado já é outra conversa.
Dilma, sempre arrogante, intransigente e mouca à voz da razão, montou uma
arapuca para si mesma, mas levou de roldão tanto os inconsequentes que a
reconduziram ao Planalto, no pleito de 2014, quanto a parcela pensante dos
brasileiros. Num monumental estelionato eleitoral, essa calamidade em forma de
gente represou preços administrados, aumentou gastos com programas
eminentemente eleitoreiros e “pedalou” a mais não poder. Seu apetite eleitoral,
somado à irresponsabilidade fiscal, aumentou o inchaço da máquina pública e resultou
na falência do Estado ― para se ter uma ideia, durante seu segundo mandato,
enquanto a Casa Branca contava com 468 servidores, o Palácio do Planalto
contabilizava 4 487 funcionários.
A nefelibata da mandioca repetiu na presidência o que fez com duas lojinhas de quinquilharias
importadas, em meados da década de 90 (detalhes nesta postagem). Em setembro de 2015, nove meses depois do
início de sua segunda gestão, o Orçamento já acumulava um rombo de R$ 30 bilhões ― algo nunca visto em
toda a história deste país. Era o começo do fim: embora a justificativa oficial
tenha sido as pedaladas fiscais, a
deposição da petista foi resultado do conjunto da sua obra e da total falta de jogo de cintura no trato com o Congresso. E como
desgraça pouca é bobagem, a cada dia que passa o governo de Michel Miguel Elias Temer Luria fica
mais parecido com o de Dilma
Vana Rousseff.
Quando a delação de Joesley
Batista veio à lume, Temer
perdeu a segunda grande chance de renunciar. Chegou a pensar seriamente em
fazê-lo, mas foi demovido da ideia por Eliseu
Padilha, Moreira Franco e outros
assessores igualmente investigados ou suspeitos de práticas nada republicanas ―
que perderiam os cargos e o foro privilegiado caso o presidente renunciasse.
Assim, em seu primeiro pronunciamento à nação depois de o encontro
clandestino com o moedor de carne bilionário ter sido revelado pelo jornalista
Lauro Jardim, sua excelência afirmou enfaticamente que não renunciaria, e que o inquérito no STF seria o território onde surgiram as
explicações e restaria provada sua inocência. E o que fez desde então? Mentiu
descaradamente para justificar o injustificável, atacou seus acusadores e moveu
mundos e fundos (especialmente fundos)
para obstruir a denúncia.
Agora, enquanto Michelle ma belle promove uma verdadeira
liquidação de cargos e emendas para evitar evitar a
instauração do inquérito contra sua real pessoa, diversos órgãos do governo ― dentre os quais a Câmara
Federal ― estouram o teto de gastos. E não é para menos: sustentamos 30
ministérios com quase 100 mil cargos de confiança e comissionados ― cada senador
tem direito a 70 assessores. Bancamos aluguéis, passagens,
diárias, assistência médica, beleza e educação de ministros, parlamentares e
seus familiares. O funcionamento do Congresso custa a “bagatela” de R$ 28 milhões por dia! Pagamos até as
viagens de Dilma ― que só neste ano
torrou R$ 520 mil em viagens para
contestar o impeachment. E os demais ex-presidentes (Lula, Collor, FHC e Sarney) também têm suas viagens bancadas pelo Erário, além de
contarem com um séquito de assessores e automóveis com motorista, combustível e
manutenção bancados pelo suado dinheiro dos “contribuintes” (volto a essa
questão mais adiante).
Dias atrás, o governo anunciou um Plano de Demissão Voluntária de servidores. Em teoria, faz sentido;
basta circular pelos ministérios para ver que há pessoal em excesso. Na
prática, porém, os resultados serão inexpressivos. E o pior é que, enquanto sobram afilhados
de políticos ocupando cargos na estrutura pública, onde vagas são oferecidas em
troca da fidelidade na votação da denúncia por corrupção, faltam servidores em
áreas fundamentais ― como na Polícia
Rodoviária Federal. Isso sem mencionar que políticos aliados que não conseguiram se eleger
ganham polpudas remunerações nos altos escalões de estatais, de onde dão uma
banana para o teto salarial e morrem de ri da crise e dos trouxas que sustentam suas mordomias.
Enquanto Michel Temer
reedita os tempos sombrios em que Dilma
agonizava ― só que com juros de agiota e correção monetária da era Sarney ―, a
sociedade civil continua calada, pagando a conta de um governo que aumenta
escandalosamente os impostos sobre os combustíveis para cobrir o rombo no
Orçamento, mas torra R$ 2,5 bilhões com excesso de bagagem, carros oficiais e
serviços de copa e cozinha. Só com despesas relacionadas com carros oficiais foram gastos mais de R$ 1,6 bi ― mais que o triplo da verba
destinada ao Ministério do Meio Ambiente, por exemplo, que terá de se virar com
cerca de R$ 440 milhões neste ano.
Mexer nesse vespeiro não bastaria para cobrir o rombo de R$ 139 bilhões nas contas públicas, mas
seria uma alternativa ao aumento de impostos. Segundo o economista Gil Castelo Branco, do site Contas Abertas, o corte de despesa mostraria que o dinheiro
público não está descendo pelo ralo. Mas o governo age como um obeso mórbido, que precisa fazer uma
cirurgia bariátrica, mas opta por simplesmente tomar uma sauna ― e na saída, claro, festejar com uma cervejinha e uma travessa de batatas
fritas. Afinal, ninguém é de ferro.
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