Jair Bolsonaro vem numa escalada de falta de compostura que beira a insanidade. O episódio da última sexta-feira, em que ele destratou jornalistas, demonstrando falta de educação e preconceitos, é próprio de quem se sente acuado, e de fato o presidente está acuado, tanto pela queda de sua popularidade quanto pelas limitações que as instituições democráticas lhe impõem, sem mencionar as denúncias contra seu primogênito, que envolvem toda uma família ampliada que, pelas acusações do MP-RJ, vivia às custas do Erário público.
Bolsonaro anda
também cercado de fantasmas, desde as alucinações de que querem vê-lo morto
para tomarem-lhe a presidência, até o impeachment político. O delírio
persecutório que revela assiduamente pode fazer parte de uma personalidade
paranoica, agravado pelo atentado contra sua vida, bastante real.
Mas o impeachment já está colocado e, como é um instrumento sobretudo político, será acionado, ou não, quando as forças políticas no Congresso desejarem. Motivos, o capitão já deu de sobra, e a falta de decoro é apenas mais um — e não será o último. A despeito de todos os aspectos negativos, talvez não fosse uma má ideia restabelecer a hierarquia nesta Banânia: sai o capitão, entra o general.
A investigação contra Zero
Dois certamente está abalando a já desequilibrada personalidade do
presidente, embora a punição dificilmente venha a acontecer em razão direta das
denúncias do Ministério Público. Mas podem atingir Bolsonaro no correr das investigações.
O próprio Bolsonaro,
demonstrando o quanto o assunto o incomoda, já disse que surgirão diálogos que
sugerirão que ele tem ligações com milicianos do Rio de Janeiro. O ex-ministro Bebianno, acusado indiretamente de
desejar ser seu vice para substituí-lo em caso de morte, disse claramente que
as ligações do presidente com milicianos serão demonstradas nas investigações.
A punição ao senador Flávio
Bolsonaro, se houver, não virá através do Congresso. David Alcolumbre já disse que nenhuma denúncia poderá ser analisada
no Conselho de Ética porque, se algo aconteceu, foi quando Flávio era deputado estadual.
Uma possível condenação vai depender de denúncia do
Ministério Público, com argumentos fortes o bastante para convencer o Senado a
permitir a punição, mas acho que essa autorização não será dada. No entanto,
politicamente a situação é muito ruim para a família Bolsonaro, e essa investigação ainda vai bater em situações
delicadas, apesar de, concretamente, ser difícil condenar o senador — a não ser
que a coisa evolua de tal maneira que se chegue a uma situação de impeachment.
Rodrigo Maia,
disse que Bolsonaro não tem motivos
para se preocupar com um processo de impeachment, mas sobre outro assunto. O
presidente passou dias sugerindo que vetará a proposta de fundo eleitoral de R$
2 bilhões aprovado pelo Congresso para a campanha municipal do próximo ano. Fez
até uma enquete populista com apoiadores, na porta do Alvorada, perguntando,
como se fosse um animador de auditório, quem achava que devia vetar o projeto.
Foi aplaudido quando disse que não aprovaria dinheiro para fazerem campanha
eleitoral.
Bolsonaro jogou o Congresso contra a opinião pública dizendo que, numa
comparação absurda, com uma verba dessas o ministro da Infraestrutura faria
várias obras necessárias para o país. Em uma live nas redes sociais, afirmou
ainda que aguardava parecer jurídico para saber se poderia vetar o Fundão
Eleitoral, com receio de sofrer um impeachment como retaliação política. Mais
uma tentativa de jogar seus seguidores contra o Congresso. Sua relação com os parlamentares, que havia entrado em módulo
de pacificação, voltou a ficar conturbada. A simples ameaça de vetar o Fundo
Eleitoral acirrou os ânimos no Congresso, que promete derrubar o veto —
inclusive porque a proposta de R$ 2 bilhões veio no Orçamento enviado pelo
Palácio do Planalto.
Os problemas da família Bolsonaro
com a Justiça, porém, servirão certamente de instrumento para tentativas de
constranger o Palácio do Planalto. E isso não é paranoia do presidente, é
apenas a baixa política, que sempre foi o terreno das manobras de Bolsonaro.
Com Merval Pereira
Com Merval Pereira