A dicotomia na política não foi criada por Lula ou pelo PT, mas é inegável que se tenha acentuado significativamente por
obra e graça do demiurgo nordestino e de seu espúrio partido. Nesse contexto de
nós contra eles, já não há adversários,
só inimigos, e as redes sociais fervilham com factoides, comentários e
interpretações que beiram o absurdo. Mas quanto mais “eles” festejam as
desventuras de “nós”― e vice-versa ―, mais são desmentidos pelo avanço das
investigações e contrariados pela situação que se inverte a cada instante.
Por mais constrangedora que seja a presença de Michel Temer no Planalto, defender a
anulação do impeachment e a volta de Dilma
é tão despropositado quanto apostar na vitória de Lula no pleito do ano que vem. Réu em 6 ações penais, condenado
numa delas a 9 anos e 6 meses de prisão, alvo de 3 denúncias e investigado em
outros tantos inquéritos, até mesmo o próprio petralha sabe que não tem chance,
notadamente depois do depoimento
avassalador de Palocci.
Há quem diga que Lula
deveria disputar as próximas eleições, pois sua derrota acachapante exorcizaria
o mito de pai do povo, salvador da pátria e outras bobagens
que assombram os menos esclarecidos como uma renca de eguns mal despachados. A
questão é que isso exigiria o sobrestamento de todas as acusações contra ele, e
mesmo nesta Banânia a Lei determina que bandido deve ser julgado pela Justiça,
não pelas urnas.
Não se deve menosprezar a capacidade de Lula de conquistar mentes menos informadas, mas é inegável que seu carisma
minguou ― como se viu na recente caravana pelo Nordeste ― região em que a
pobreza é mais acentuada e o eleitorado, mais facilmente manipulado. Para o cientista
político Cláudio Couto, o
ex-presidente voltou a ser o que era antes de 2002: “um candidato de piso alto
e teto baixo” ― o piso alto lhe dá um lugar no segundo turno; o teto baixo lhe
retira chances de vitória.
Tampouco se pode comparar o Brasil dos nossos dias com o de
2002. Naquela época, Lula contou com
marqueteiros de primeiro time para criar a imagem do “Lulinha Paz e Amor”; hoje, ele faz mais o gênero jararaca ― e tanto Duda
Mendonça quanto João Santana estão
temporariamente impossibilitados de auxiliá-lo. Em 2002, José Alencar ajudou a dispersar o receio de um governo norteado
pelas ideias radicais e inconsequentes da patuleia petista, e a Carta ao Povo Brasileiro ― idealizada,
vejam só, por Antonio Palocci ―
sugeria que o “candidato do povo” manteria compromissos internacionais,
contratos e metas de superávit primário ― o que foi fundamental para conquistar
o apoio de parte do empresariado e obter financiamento de campanha. Naquela
época, uma parte considerável da classe média (inclusive das regiões Sudeste e
Sul) decidiu dar um voto de confiança ao petista; hoje, sua rejeição é enorme.
Em 2005, quando o Mensalão veio a público, Lula abandonou os feridos no campo de
batalha e tratou de salvar o próprio rabo. Por incrível que pareça, acabou
convencendo a militância de que a bandalheira fora necessária, que o PT não era corrupto ― os outros é que
eram ―, e que ele precisava de apoio para governar e implementar seus programas
sociais, e blá, blá, blá. Uma falácia que dificilmente colaria nestes tempos de
Lava-Jato, com o deus pai da petelândia colecionando processos e, na falta de
opção melhor, batendo sempre na tecla da perseguição política das “zelites”, da
Globo, do MPF, do Judiciário e do diabo que o carregue.