O criminoso de Garanhuns é réu em 7 ações penais (ou em dez,
segundo ele próprio afirmou no discurso do último sábado). Foi condenado em
primeira instância 9 anos e meio de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro (no
caso envolvendo o tríplex no Guarujá, a que ele se referiu no mesmo discurso
como “meu apartamento”), teve a pena
aumentada para 12 anos e 1 mês na segunda instância e, depois de ver
naufragarem seus pedidos de habeas corpus,
foi alvo de um mandado expedido pelo juiz Sérgio
Moro por determinação do TRF-4.
E o que acontece?
Acontece que o farsante tripudiou da PF (ou passou a mão na bunda dos policiais, como bem definiu um
jornalista da Jovem Pan News), limpou
o rabo com a ordem de prisão (como disse outro jornalista de não me lembro qual
emissora), cagou na cabeça da Justiça (como estou dizendo eu) e, do alto de sua
empáfia, estabeleceu quando e onde se entregaria, não sem antes protagonizar um
dramalhão de deixar mortos de inveja os melhores novelistas mexicanos. O prazo
de 24 horas que lhe foi concedido por deferência ao cargo que ele um dia ocupou
expirou às 17 horas da última sexta-feira. Mesmo assim, o ex-presidente permaneceu
entocado na sede do sindicato dos metalúrgicos do ABC, juntamente com um bando
de comparsas que o estimulavam a esticar a corda ao máximo (na esperança de que
alguma instância do Judiciário relaxasse a prisão iminente do criminoso
condenado).
A pantomima seguiu noite adentro. Na manhã de sábado, após a
celebração de uma bizarra missa negra ― supostamente em homenagem ao 68º
aniversário natalício da ex-primeira dama vermelha, falecida em fevereiro do
ano passado ―, escancarou-se a agonia da seita do inferno, cujo sumo
pontífice está fadado a discursar nos próximos anos somente para pecadores
juramentados reunidos no pátio da cadeia. Como bem salientou Augusto Nunes, a exploração de cadáver
juntou no mesmo palanque um Lula
quebrado, os medonhos requebros de Dilma, Gleisi Hoffmann e seu sorriso de
Miss Simpatia da população carcerária e outras abjeções. Nenhum dos presentes,
incluindo os padres, seria capaz de recitar a segunda parte do credo. Deus deve
ser mesmo brasileiro. Só isso explica o motivo de a pequena multidão não ter
sido fulminada por algum dos raios bíblicos que, em outros séculos, dizimavam
concentrações de pecadores irrecuperáveis.
O demiurgo discursou para os militontos como se realmente precisasse convencê-los, a despeito de
essa patuleia ser incapaz de vislumbrar um único ato espúrio na sua “prodigiosa
biografia” ― como também é incapaz de encontrar o próprio rabo usando as duas
mãos e uma lanterna. Já para as pessoas racionais que tiveram paciência para
ouvir o ramerrão do petista com um mínimo de atenção, o amontoado de mentiras
que permeou sua conversa mole para boi
dormir foi um verdadeiro insulto, sobretudo quando ele reafirmou seu orgulho
de ser o único presidente do Brasil sem
um diploma universitário ― esquecendo-se de que divide essa “honra” com Café Filho. Ou quando disse que o
Brasil foi “o último país a ter uma
universidade” ― na verdade, a Escola
de Cirurgia da Bahia, criada em 1808, passou formalmente à condição de
universidade em 1937, enquanto que a primeira universidade de Angola data de 1962, a da Etiópia, de 1950, e a da Arábia Saudita, de 1956.
O molusco parlapatão também vomitou seu inconformismo com o Power Point canhestro de Deltan Dallagnol, que, segundo ele,
teria dito que o Partido dos Trabalhadores
é uma organização criminosa criada para
roubar o Brasil. Na verdade, o que Dallagnol
disse foi: “O que nós vemos é um partido
político, o PT, buscando arrecadar
recursos para se perpetuar no poder” e
“Não se julga aqui a adequação de sua [do PT]
posição de mundo, de sua ideologia, mas se avalia se a agremiação se envolveu,
por meio de seus diversos prepostos, em crimes específicos”.
Em momento algum Dallagnol
proferiu a frase que lhe foi atribuída, como também jamais disse ― nem ele nem
qualquer outro procurador da Lava-Jato ―
que “não precisava de provas [para
denunciar Lula] porque tinha
convicções”. Isso é mais uma balela em defesa da tese abilolada de que o
petralha teria sido condenado sem provas.
A frase atribuída ao procurador é na verdade uma interpretação de outras que
foram ditas na entrevista coletiva que sucedeu a apresentação da denúncia contra
Lula (assista aos vídeos que acompanham esta reportagem para
conferir o conteúdo na íntegra). A propósito, a denúncia do MPF não citou o PT como uma organização criminosa; na ocasião, foi dito apenas que existia uma organização criminosa da qual Lula
seria o chefe e que incluía diretores da Petrobras e políticos de diversos
partidos.
Lula desafiou
procuradores e seus “asseclas”, o juiz federal Sérgio Moro e os
desembargadores do TRF-4 para “um debate sobre as provas” que embasaram as
investigações que
levaram à sua
condenação. Rosnou
que o MPF e a PF mentiram ao atribuírem a ele o tríplex no condomínio Solaris, pivô de sua sentença a 12 anos e um mês de
prisão, que não os perdoa por darem à sociedade a ideia de que ele, Lula, é ladrão, e por permitirem que
fossem feitos “pixulecos”
no Brasil inteiro, que passou a chamá-lo e a seus cúmplices de “petralhas”.
A pantomima de quase uma hora (cuja transcrição você pode
acessar a partir deste link) começou com uma longa
saudação a políticos, sindicalistas e artistas que estavam no carro de som. O parlapatão
incorrigível chegou mesmo a desejar sucesso a alguns políticos que já se
declararam candidatos na eleição de 2018 ― se não foi efeito do marafo, certamente
foi uma “revelação divina” de que sua trajetória política está próxima do final.
Relembrou episódios das greves de 1979 e 1980 para dizer que “mais importante do que vencer é consolidar
visões políticas”, e daí partiu para um impiedoso ataque à imprensa, no qual criticou emissoras de
televisão, jornais, revistas e rádios do interior, chegando a citar
nominalmente as redes Bandeirantes, Record e Globo, o jornal “O Globo”
e a revista “Veja” (talvez porque
ninguém tenha lido para ele os editorias de Época e IstoÉ). Na
sequência, voltou a se declarar inocente e a criticar duramente o Ministério Público e o Judiciário, reafirmou que não está
acima da Justiça, mas que acredita “numa
Justiça justa, que decide com base na prova concreta”, reforçando a ideia
de que tanto os procuradores do MPF
quanto os juízes não promoveram julgamentos técnicos, mas sim politizados e
destinados a agradar a opinião pública. Como se não bastasse, defendeu a “regulamentação da mídia”
(logo ele, que combateu o regime militar) e
exortou suas milícias paramilitares a espalhar o terror pelo país.
O besteirol foi encerrado depois que o demiurgo disse que se
entregaria, mas que ninguém seria
capaz de prender suas ideias. “Eu vou lá
[para a prisão] com a crença de que vão descobrir o que tenho dito todo dia.
Eles não sabem que o problema deste país não se chama Lula, chama-se vocês, a consciência do povo. Não adianta tentar
evitar que eu ande por este país. Porque tem milhões de Boulos, de Manuelas e Dilmas para andar por mim. [...] Meu
coração baterá pelo coração de vocês. São milhões de corações...”
Depois de incitar os militontos a fazerem protestos e ocupações
pelo país, tomar as ruas e queimar pneus para defender seu legado, Lula reafirmou que provará sua inocência
― o que me parece um tanto falacioso, pois o sevandija já foi condenado por
nada menos que 9 magistrados (sem contar os que rejeitaram seu pedido de habeas
corpus ao STF) e é réu em outras 6
ações criminais (que estão em diferentes fases processais), isso sem mencionar
as investigações em curso, que podem virar denúncias e resultar em mais processos
contra ele.
O PT de Lula deixou a roupagem “paz & amor” ― conferida por Duda Mendonça, que aboliu o lema “A luta continua, companheiros” porque
luta lembra baderna ― para se tornar um partido não mais de greve e piquete,
mas de confundir o Estado consigo próprio, de hegemonia absoluta conquistada na
força, de adoração absoluta e incondicional ao líder. É preciso
ter em mente que o que ocorreu neste final de semana, mais do que a prisão de
um ex-presidente da República, foi a prisão de um criminoso julgado e condenado por ter cometido ilegalidades durante
e após o exercício do cargo.