Pelo calendário oficial, diz uma matéria publicada em O GLOBO na última quinta-feira, o mandato de Michel Temer termina no dia 31 de dezembro deste ano, mas, na vida real, seu governo morreu na noite de 17 de maio do ano passado, quando o terremoto provocado pelas revelações da delação da JBS abalou as estruturas de uma gestão à qual sempre faltou a legitimidade das urnas. A partir de então, sua excelência deixou de ser um presidente que se pretendia reformista para virar um político que usaria todos os meios junto ao Congresso para não cair.
Cinco dias antes de a bomba explodir, Temer comemorara seu primeiro ano de governo, e apesar da
popularidade esquelética (em abril de 2017, o Ibope lhe atribuía míseros 10% de aprovação), articulava um discurso em tom triunfante, exaltando a aprovação da PEC dos gastos públicos, a queda da inflação e a redução da Selic. Naquele cenário, a reforma da Previdência eram favas contadas ― ainda que o
texto original fosse relativamente atenuado, ninguém, nem mesmo a oposição, duvidava da força
de Temer para fazê-la passar no Congresso.
Mesmo que as ruas não lhe sorrissem, Temer era o senhor do Congresso. No discurso do dia 12 de maio do ano passado, disse estar seguro de que “ao completar nosso segundo ano de
governo, teremos um país reestruturado e muito mais feliz”. Mas o presidente que arriscou essa profecia foi o mesmo que meses antes recebera Joesley
Batista para a fatídica conversa a dois no Palácio do Jaburu, e quando o
diálogo veio a público, passou
a viver em função de três objetivos: não cair, não cair e não cair.
Especialista na arte de conhecer os desejos dos parlamentares, Temer negociou tudo o que podia para sepultar as duas denúncias do então
procurador-geral Rodrigo Janot.
Venceu a parada na Câmara e se manteve no cargo, mas seu governo, desde a noite de 17 de maio de 2017, virou um zumbi. A partir de então, seu capital político,
fortalecido pela liderança na articulação para depor sua predecessora, passou a
ter outra função: a
sobrevivência virou pauta única.
Presidente da Câmara por três vezes, Temer conhece o Legislativo como poucos. Sabia que precisava atuar
em dois campos para conseguir evitar que 342 deputados autorizassem o Supremo a processá-lo. O discurso da
continuidade era necessário, mas o mais importante era manter a base satisfeita
com a moeda típica da coalizão: cargos, emendas e obras nas bases dos
parlamentares. Dois ministros chegaram a sondar um cacique do PSDB com a ideia de derrubar o governo,
mas, abatidos pelas fortes acusações contra Aécio Neves, os tucanos mais graúdos resistiram e, com o tempo, o
partido rachou.
A estratégia da tropa de choque do Planalto foi atuar no
varejo e conquistar o coração do baixo clero. Todavia, vendo o governo nas cordas,
os parlamentares se aproveitaram para conseguir benesses na véspera do ano
eleitoral. Um ministro conta que, entre as demandas, houve quem solicitasse a
aprovação de uma obra de R$ 300 milhões.
Os ministros políticos pressionavam a área técnica pela liberação de emendas.
Em junho e julho foram empenhados R$ 4,2
bilhões, mais de 60% do previsto para o ano. O ritmo caiu em agosto para R$ 200 milhões, depois que, no dia 2
daquele mês, Temer venceu a primeira
batalha. Entre setembro e outubro, quando a segunda acusação foi rejeitada, o
governo empenhou mais R$ 900 milhões.
Para sepultar as denúncias, Temer empenhou capital político demais para exigir do
Congresso a aprovação da impopular reforma da Previdência. Houve até
articulações para tentar ressuscitar o tema, mas a intervenção do Rio o
sepultou em definitivo. Ainda se fala em suspender a medida por alguns dias para votar a PEC, mas isso é tão improvável quanto a alegada candidatura do peemedebista à reeleição em no pleito de outubro. Na vida real, o governo naufragou. Só as investigações é que não sucumbiram.
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