quinta-feira, 28 de março de 2019

E LA NAVE VA — PARTE III


OGNI ARANCIA HA L'ALTRA METÀ

A imagem que ilustra este post não é da ante-sala do Inferno, mas bem que parece. Como também parecem brigas de criança as rusgas entre o Executivo e o Legislativo — pena que não dá para resolvê-las com umas boas (ainda que politicamente incorretas) palmadas. E enquanto o Planalto e a Câmara medem forças e o cenário político muda como imagens de caleidoscópio, escrever sobre o tema passa a ser como narrar por escrito uma partida de futebol: a gente nem terminou de descrever a defesa do goleiro do time A e o time B já contra-atacou e virou o placar.

Fato é, caro leitor, que a situação vai de mal a pior (para não dizer que estamos fodidos, e mal pagos). Ao cabo de 90 dias no poder, o presidente vê — porque é impossível que não veja — os principais pilares do seu governo derreterem como sorvete sob o sol do meio-dia e nau dos insensatos adernar perigosamente... e aí resolve ir com a primeira-dama ao cinema (em plena manhã de terça-feira) e levar a tiracolo a ministra Damares Alves (só faltou levar também certo ministro que não tem vocação nem para educador, nem para administrador para ver se, pelo menos, ele serve para segurar a vela). Em cartaz: Superação, o Milagre da FéAinda bem que não era TITANIC.

O superministro Paulo Guedes disse ontem no Senado que se, não tiver apoio, deixará o posto. Depois emendou que seria irresponsabilidade sair se Previdência não for aprovada, mas acrescentou que não pretende permanecer se não houver colaboração do Legislativo para conter os gastos públicos. “Se o presidente apoiar as coisas que podem resolver o Brasil, estarei aqui. Agora, se ou o presidente ou a Câmara, ninguém quer aquilo, eu vou ser obstáculo para os senhores? De forma alguma, voltarei para onde sempre estive”, disse Guedes.

No mesmo dia, o também superministro Sérgio Moro declarou que prefere desistir da tramitação de todo o pacote anticrime apresentado ao Congresso se os parlamentares retirarem do texto trechos que versam sobre corrupção. Somada à “não ida” de Guedes à CCJ da Câmara, já que o presidente da comissão ainda não designou o relator, o Ibovespa, que tinha cravado 100 mil pontos na semana passada, vem sofrendo queda atrás de queda, enquanto o dólar sobe feito rojão em noite de Réveillon (tudo bem que há questões internacionais colaborando para isso, mas aí já é outra conversa).

Pelo visto, o único consolo que resta a quem apoiou Bolsonaro contra o boneco de ventríloquo do criminoso de Curitiba é o PT não ter voltado ao poder, porque aí, sim, a porca torceria o rabo. Mas somente os bolsomínions — que não passam de militantes petistas com o sinal trocado — conseguem aplaudir as estultices bolsonaristas em vez de enxergar o festival de incompetências que assola o país. Não que Rodriga Maia não tenha culpa nesse cartório, mas não foi no Bolinha que votamos para presidente.

Ontem, numa demonstração de força e revanchismo à toda prova, a Câmara levou poucos minutos para aprovar em dois turnos uma PEC que engessa o Orçamento (tornando obrigatório o pagamento de despesas hoje passíveis de adiamento, como emendas de bancadas estaduais e investimentos em obras), que havia sido apresentada em 2015 e esquecida desde então. Foi a prova provada de que, em havendo vontade política, a reforma da Previdência e as medidas anticrime e anticorrupção poderiam se aprovadas enquanto o diabo pisca um olho. Mas o presidente não tem apoio, não tem articulador político, não tem partido, enfim, não tem porra nenhuma. E ainda se preocupa em comemorar o aniversário da revolução de 1964, que deu início ao regime de exceção que durou 21 anos. Nem  o núcleo do governo se entusiasmou com a ideia, preferindo recomendar cautela no tom para evitar ruídos desnecessários e polêmicas indesejadas, sobretudo quando os ânimos na política estão tão acirrados. 

Bolsonaro não teve sequer o apoio do zero três, já que o filhote contribuiu com seu voto de deputado federal para a "derrota" do governo (derrota entre aspas, porque a proposta ainda precisa ser aprovada pelo Senado e, se o for, só entrará em vigor na próxima legislatura, o que faz dela um problema para o próximo presidente), a exemplo os demais deputados do PSL (com exceção de 6, entre os quais a líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann).

Como dizem os evangélicos e assemelhados, “só com Jesus na causa”. Durma-se com um barulho desses!