sábado, 13 de julho de 2019

EM VEZ DE PRESIDENCIALISMO DE COALIZÃO, COALIZÃO SEM PRESIDENCIALISMO



ATUALIZAÇÃO (09h05): Após a conclusão da votação no plenário, a comissão especial da Câmara voltou a se reunir, na noite desta sexta-feira, para votar a redação do texto para o segundo turno. Ao final de três horas e meia de debates, o texto foi aprovado pelo colegiado por 35 votos a 12, e agora segue para votação em 2º turno, prevista para 6 de agosto. O secretário de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, reviu a estimativa de economia com a reforma da Previdência para cerca de R$ 900 bilhões num período de dez anos. Quando o governo encaminhou o projeto da reforma para o Congresso, a economia prevista era de R$ 1,236 trilhão.

Por sua interpretação canhestra do presidencialismo de coalizão e aversão a dividir espaço com o Congresso, Bolsonaro recebeu o troco na última quarta-feira, quando o plenário da Câmara, numa inusitada “coalizão sem presidencialismo”, aprovou em primeiro turno, por surpreendentes 379 votos a 131, o texto-base da reforma da Previdência. Pena que a sessão de quinta não tenha sido tão produtiva e que o manancial de destaques tenha atrasado a votação em segundo turno. Mas isso é outra conversa. Interessa mesmo dizer é que o mérito foi de Rodrigo Maia, que, em discurso emocionado, dividiu a glória com seus pares e, nas entrelinhas, deixou claro que o governo mais estorvou do que ajudou. Ao final, puxou para a Câmara duas novas reformas: a tributária e a reorganização do serviço público, mantendo o protagonismo na reforma do Estado brasileiro.

Além de ser pessoalmente contrário à reforma previdenciária e de tê-la levado adiante por absoluta falta de alternativa, Bolsonaro jamais procurou montar uma base parlamentar ampla e firme, preferindo recorrer à via do conflito, do confronto e da tensão. Mas não é justo afirmar que ele não ajudou nadica de nada: só na primeira semana de julho, foram liberados R$ 2,5 bilhões em emendas parlamentares (a título de comparação, de janeiro a junho foi liberado R$ 1,7 bilhão) visando garantir uma “margem de segurança” para a aprovação da emenda. Afinal, políticos não são movidos a patriotismo, e nada como o velho “toma-lá-dá-cá” para agregar firmeza às convicções de suas excelências.

Observação: Vale lembrar que, a despeito de um relacionamento não promíscuo com o Congresso ser um ponto positivo do governo Bolsonaro, até mesmo a liberação das emendas parlamentares e de bancadas às vésperas de votações importantes faz parte do jogo democrático. O que é inadmissível é a compra de votos por baixo do pano, através da corrupção, como aconteceu nas gestões petistas, com o mensalão e o petrolão.

Embora Rodrigo Maia afirme que o Executivo deva retomar o “protagonismo” e anunciar medidas para fortalecer a economia, isso é o que ele menos quer: quanto mais ativo estiver o Congresso, mais argumentos terá o presidente da Câmara para dizer que, assim como a Previdência, medidas de interesse do país são “fruto do esforço de deputados e senadores, uma construção do Legislativo”.

Como se sabe, há muito que Maia acalenta o sonho de ser presidente da República — não fosse assim, não teria demonstrando tanto empenho em atuar como artífice da união em torno do substitutivo aprovado na Comissão Especial e, valendo-se da boa relação que tem com os partidos de oposição, manter o plenário numa, digamos, “desarmonia controlada”.

Ainda que o panorama atual seja desfavorável a Bolsonaro — com o Congresso comendo pelas beiradas, postulantes à sua sucessão mexendo-se desde já e índices de aprovação nanicos para um governante que, em tese, deveria estar em lua-de-mel com seus governados — desponta no horizonte um cenário diferente, a depender de a economia realmente deslanchar. Por essas e outras, em vez de reclamar que o Legislativo quer transformá-lo numa “rainha da Inglaterra”, o capitão deveria se acomodar no trono: dando tudo certo ou irremediavelmente errado, tanto o crédito quanto o débito cairão na sua conta. Portanto, melhor ele ir se acostumando com o trono de inspiração inglesa e torcer para que os êxitos obtidos pelo Parlamento lhe rendam frutos suculentos e saborosos.