sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

MAIS DESPAUTÉRIOS TOFFOLIANOS



Entre os diversos fatos estarrecedores dos últimos dias, resolvi focar a entrevista concedida por Dias Toffoli ao jornal O Estado e deixar a monumental camisa de onze varas em que se meteu o senador Flávio Bolsonaro para uma próxima oportunidade. Passando ao que interessa, é sempre bom lembrar que o atual presidente do STF, um verdadeiro obelisco do saber jurídico, foi guindado ao mais alto cargo da magistratura pelo ex-presidente petista ladrão, que nunca leu um livro na vida e, portanto, não se incomodou com o fato de seu então auxiliar ter levado bomba em dois concursos para juiz de primeira instância.

Na entrevista ao Estado, entre outras asnices o ministro afirmou que a Lava-Jato destruiu empresas, que o MP é pouco transparente e que isso jamais aconteceria nos Estados Unidos. Marcelo Odebrecht — que mais do que ninguém fala com absoluto conhecimento de causa —, porém, vê a coisa de outra maneira. Segundo ele declarou em entrevista ao Globo, a Lava-Jato foi o gatilho, mas a Odebrecht poderia ter saído dessa mais bem preparada para um novo ciclo de crescimento sobre bases até mais sustentáveis. "Nós não soubemos conduzir o processo da Lava-Jato; a Odebrecht quebrou por manipulações internas, não apenas pela Lava-Jato”. A informação que me davam [na cadeia] era que a empresa não estava pronta para um acordo [com a Justiça] (...) depois descobri que a informação que levavam para a empresa era que quem não estava disposto a colaborar era eu".

O comentário de Toffoli escancarou mais uma vez a cizânia que divide os togados supremos, com Marco Aurélio divergindo de seu eminente presidente: “De forma alguma [a Lava-Jato destrói empresas], ao contrário. Fortalece. E gera confiança. Gera segurança. Não deixa de ser um marco civilizatório. O ruim é quando se varre [a suspeita] para debaixo do tapete, aí é péssimo.” Como se vê, até um relógio quebrado marca a hora certa duas vezes por dia (para não dizer que até um burro velho e cego consegue eventualmente encontrar a cenoura).

Toffoli, instado comentar sobre a Lava-Jato, começou com os farisaicos elogios de praxe e, tão previsível quanto a chegada da primavera, disse que a operação colocou o combate à corrupção num patamar mais elevado, sobretudo por ter instalado na cadeia gente que parecia condenada à perpétua impunidade. Em seguida, estacionou na vírgula, sacou do coldre a adversativa e disparou a maluquice: “Mas a Lava-Jato destruiu empresas. Isso nunca aconteceu nos Estados Unidos ou na Alemanha”.

A cada novo pronunciamento, o Maquiavel de Marília mostra que mereceu a reprovação com louvor nas duas tentativas de ingresso na magistratura paulista. Pela sua ótica, o problema não está na roubalheira institucionalizada, mas no fato de a ladroagem ter sido descoberta. É como culpar pela internação de um paciente na UTI não a gravidade da doença, mas a competência do médico que a diagnosticou.

O palavrório permite deduzir que o ministro acompanha os escândalos protagonizados por corruptos no resto do mundo com a mesma atenção que dispensa à língua portuguesa. Ele ignora, por exemplo, que a condenação de executivos pilantras não livra da falência as empresas que controlam. Morreram de safadeza, por exemplo, os gigantes americanos Enron em 2001, WorldCom no ano seguinte e Lehman Brothers em 2008. Para escapar da bancarrota, a alemã Siemens pagou multas de dimensões amazônicas e disseminou pelo mundo inteiro o termo compliance — uma espécie de auditoria permanecente concentrada na prevenção de irregularidades.

Pelo jeito, Toffoli não sabe disso.  Mas o que é mesmo que Toffoli sabe?

Com Augusto Nunes