quarta-feira, 25 de março de 2020

NOTÍCIA BOA É NOTÍCIA RUIM



Em números redondos, o Coronavírus já infectou 350 mil pessoas mundo afora e causou 15 mil óbitos. Mas mais de 100 mil que contraíram o vírus já se recuperaram e milhões dos que foram infectados não apresentaram sintomas e, portanto, não integraram as estatísticas. Segundo dados do Ministério da Saúde (atualizados na noite de ontem), o Brasil registra 2.201 casos confirmados da doença e 46 mortes em decorrência dela. No Japão, os Jogos Olímpicos de Tóquio, que deveriam ocorrer daqui a quatro meses foram adiados para o ano que vem.

Na China, após dois meses de quarentena, o primeiro epicentro da Covid-19 — a província de Hubei, que tem quase 70 milhões de habitantes — reabre suas portas ao restante do país nesta quarta-feira, e a capital Wuhan, onde foram detectados os primeiros casos, retirará seu bloqueio no dia 8 do mês que vem. Salvo engano de minha parte, isso deixa claro que o país mais populoso do planeta (cujo governo ocultou a informação num primeiro momento, retardando a adoção de medidas que poderiam ter evitado, senão minimizado, a pandemia) já debelou o vírus até nas regiões mais afetadas pela doença. 

Há boas e más notícias — mais más do que boas, infelizmente. A imprensa reserva a primeira página às desgraças e as alardeia em caixa alta, mas resume os fatos positivos em notas de rodapé. Ecoa ad nauseam as estultices bolsonarianas, mas silencia sobre eventuais medidas acertadas do governo (não falo especificamente do presidente, mas do governo federal como um todo), como se a ideia fosse, como acreditam alguns teóricos da conspiração, apear, a qualquer custo, o capitão da presidência.

Não sei isso tem algum fundo de verdade, mas sei que Bolsonaro esteve "balança mas não cai" entre abril e maio do ano passado, conforme o próprio presidente do STF — a quem o impagável José Nêumanne gosta de se referir como "advogadozinho do PT" — reconheceu numa entrevista concedida à revista Veja em setembro do ano passado. Toffoli disse que sua atuação foi fundamental para pôr panos quentes numa insatisfação que se avolumava, envolvendo setores político e empresarial e militares próximos a Bolsonaro. No Congresso, a reforma da Previdência não avançava, e o Executivo acusava os deputados de querer trocar votos por cargos e verbas públicas. O impasse aumentou quando um grupo de parlamentares resolveu desengavetar um projeto que previa a implantação do parlamentarismo — se aprovado, o presidente se tornaria uma figura decorativa, sem poder (ou um "banana", nas palavras do próprio Bolsonaro).

Jornalistas em geral (e em particular os da Folha, Carta Capital, Veja et caterva) são flagrantemente “de esquerda”. Basta ver a presteza com que replicaram as mensagens hackeadas do Telegram de membros do alto escalão do governo e procuradores da Lava-Jato, após pinçar as que tinham mais potencial para servir a seus propósitos nefastos — a libertação de um ex-presidente corrupto, condenado em duas ações criminais e réu em mais oito processos, que então puxava cadeia numa cela VIP em Curitiba, pouco importando se para isso fosse preciso retirar frases do contexto e fazer montagens que garantissem o efeito bombástico desejado, numa estapafúrdia inversão de valores que pugna pela soltura do bandido e subsequente punição do xerife que o pôs no xadrez.

O epicentro dessa merdeira, Verdevaldo das Couves, que se traveste de jornalista ilibado, laureado com um Prêmio Pulitzer, mas que, na real, nunca foi flor de se cheirar.  A despeito de sua participação no esquema criminoso, o editor do site panfletário The Intercept foi prontamente blindado de investigações pela ação do ministro mais laxante da nossa Suprema Corte, a pretexto do “sigilo da fonte” garantido por lei a jornalistas.

Observação: Quem tiver interesse em conhecer o verdadeiro estofo do caráter desse sujeito pode encontrar informações relevantes numa reportagem de Eric Wempel, publicada em 27 de junho de 2013 no jornal The Washington Post. Dentre outras coisas, a matéria informa que “o escritório do cartório do condado de Nova York mostra que Glenn Greenwald tem US$ 126.000 em sentenças abertas e contra ele datando de 2000, incluindo US$ 21.000 do Departamento de Impostos do Estado e da Secretaria da Fazenda” e de um penhor de US$ 85.000.

Voltando a Bolsonaro, fazer como na fábula d’O Velho, o Menino e o Burro não é jornalismo, é perseguição. Como presidente, o capitão é uma lástima, e provavelmente continuará sendo até deixar a presidência. Mas era a única alternativa à volta do PT ao poder central, encarnado numa patética marionete manipulada pelo criminoso de Garanhuns.

Como diz um velho ditado, cada povo tem o governo que merece, e a responsabilidade por levar ao segundo turno justamente os representantes dos dois extremos do espectro político-ideológico cabe ao esclarecidíssmo eleitorado tupiniquim, que eliminou no primeiro escrutínio, juntamente com o abominável elenco de feira de horrores que postulava a presidência, as duas ou três opções que poderíamos ter testado.

É difícil dizer como estaríamos nesta crise se o presidente fosse João Amoedo, Henrique Meirelles ou Álvaro Dias, mas salta aos olhos que qualquer um deles tem mais estofo e envergadura para presidir esta banânia do que nosso tosco capitão. Não obstante, Bolsonaro, para além de sua falta de qualificação e de seu passado, digamos, um tanto obscuro, foi a opção de 55,13% dos eleitores que não votaram em branco nem anularam o voto ou se abstiveram de comparecer às urnas. 

Em que pese a profusão de asnices que disse, fez e, pelo visto, continuará dizendo e fazendo até o final de seu mandato, Bolsonaro não cometeu, salvo melhor juízo e com a devida venia de quem pense de outro modo, “crime de responsabilidade” que justifique um pedido de impeachment. Sem mencionar que, no atual cenário, um processo dessa natureza serviria apenas para intensificar ainda mais a tormenta de proporções épicas que estamos atravessando e da qual não sabemos quando nem se sairemos.

Por outro lado, esperar que o capitão caverna mude sua postura beligerante, tome consciência da dimensão e das responsabilidades do cargo que ocupa e se torne um estadista da noite para o dia seria o mesmo que acreditar no coelho da Páscoa ou na fada do dente. Como o escorpião da fábula, Bolsonaro é incapaz de ir contra sua natureza, embora devesse se esforçar para não falar antes de pensar no que vai dizer e manter seus pit-bulls na coleira. 

Dias atrás, zero três, o folclórico fritador de hambúrgueres que aspirava à embaixada do Brasil nos EUA e que classificou o protesto de semanas atrás como “panelaço meia-boca”, abriu a própria para culpar a ditadura chinesa pela pandemia da Covid-19. Não que não assista razão ao deputado, ao menos em parte: tanto a ditadura soviética de 1986, responsável pelo acidente nuclear de Chernobyl, quanto a chinesa de 2020, que demorou a compartilhar a informação sobre o vírus mutante assassino, tentaram esconder o problema, o que potencializou o estrago. 

Mesmo que o Coronavírus seja o Chernobyl do comunismo chinês, pandemias têm inúmeras causas e fatores, e a ditadura chinesa foi só uma delas. Demais disso, convenhamos: além de não ser o melhor momento para apontar culpados, faltou a Eduardo Bolsonaro um mínimo de diplomacia, sobretudo por ser ele filho do presidente da República e a China, nosso maior parceiro comercial (no ano passado, exportamos para os chineses US$ 65 bilhões importamos deles US$ 35 bi, o que equivale dizer 29% de tudo o que o Brasil exporta no mundo e 20% de tudo o que importa).

Isso sem mencionar que a China foi o único país a nos oferecer ajuda numa questão emergencial e que está sendo negociada pelo ministro da Saúde: o fornecimento de equipamentos hospitalares, como respiradores artificiais e máscaras, usados na prevenção e no tratamento. Os primeiros testes rápidos para detecção do Coronavírus — no contexto da promessa de garantir até 10 milhões deles nas próximas semanas — serão fornecidos por uma empresa daquele país.

Dada extensão deste texto, o resto fica para a próxima postagem. Antes de encerrar, recomendo a leitura deste artigo — do qual destaquei e resumi um trecho que abona minha opinião sobre a falta de isenção e imparcialidade da imprensa:

A caminho da redação, uma repórter se deparou com um acidente. Depois de conversar com um bombeiro e com um dos motoristas envolvidos, sobre que a batida havia ocorrido por falta de sinalização no cruzamento e que ninguém estava ferido.  Conversou com o bombeiro responsável e com uma das vítimas. Tudo bem, todos vivos. A repórter e ligou para a redação comunicando o ocorrido e foi transferida para o chefe, a quem relatou o episódio. A certa altura, o chefe de redação lhe perguntou se alguém havia morrido. Ela responde que não, que estavam todos bem. ‘Então venha já para a redação’, berrou o chefe ao telefone. E completou: ‘Notícia boa’ é notícia ruim”.