O plenário do STF
ficou de discutir na
tarde de ontem a decisão monocrática do ministro-relator da Lava-Jato, que agasalhou
a tese esposada pela defesa do ex-presidiário Lula sobre a incompetência
da 13ª Vara Federal do Paraná para
julgar os processos sobre o tríplex no
Guarujá e o sítio em Atibaia — além
outras duas ações que estavam em fase de instrução quando o ministro Luís Edson Fachin anulou todos os atos
processuais e determinou
a remessa dos autos para a Justiça Federal do DF. Considerando a
relevância do tema, a grandiloquência de alguns togados supremos (casos
clássicos de irremediável paixão pelo
som da própria voz), e o fato de o julgamento sobre o
caso ser precedido pela discussão sobre a abertura da CPI da
Covid no Senado (por decisão monocrática do ministro Luís Roberto Barroso), é possível que o
julgamento não seja concluído numa única sessão — note o leitor que estou
redigindo este texto na manhã de quarta-feira, e a abertura dos trabalhos no
plenário virtual está prevista para as 14h.
Atualização (quarta, 16h45): Por maioria, o plenário manteve a decisão do ministro Barroso, que proferiu brevemente seu voto. Depois disso, o presidente da Corte, ministro Luiz Fux, perguntou aos pares se eles concordavam com a decisão. Apenas o decano divergiu da forma como foi procedido o julgamento e preferiu não se manifestar sobre o mérito; os demais acompanharam a posição do relator. Neste momento a corte se encontra em recesso. (Quinta, 7h00): Quanto ao agravo contra a decisão de Fachin que anulou as condenações de Lula, o presidente Luiz Fux fatiou o julgamento em três partes e, graças à parlapatice de alguns magistrados (notadamente Gilmar Mendes, o “rei do Judiciário”, Marco Aurélio, o “novo decano”, e Lewandowski, o “militante petista que vestiu a toga por cima da farda”), discutiu-se apenas se o caso deveria ser levado ao plenário e decidiu-se por 9 votos a 2 (vencidos Lewandowski e Marco Aurélio) que o julgamento cabe ao colegiado. A sessão foi longa e cansativa, sobretudo por conta das repetições desnecessárias do professor Lewandowski, que lecionou sobre como deve proceder um militante petista, e Mendes, que ensinou como deve agir quem quer cometer o pecado da "soberba" — que deixou de figurar na lista dos pecados mortais devido a mudanças promovidas pelo papa Bento XVI, mas enfim... Por outro lado, valeu a pena ver Fux se esforçar para manter o controle diante das patacoadas de Lewandowski e Marco Aurélio e ouvir os votos de Barroso e (surpreendentemente) da nem sempre corrente Rosa Weber. As demais fatias da pizza serão degustadas na tarde de hoje, digo, as demais etapas do julgamento serão vencidas na tarde de hoje (caso o imprevisto não tenha voto decisivo na assembleia dos acontecimentos, naturalmente).
No caso específico do ex-presidente corrupto, os ministros
julgarão um agravo regimental interposto pela PGR
contra a decisão monocrática de Fachin no pedido de habeas corpus apresentado pela defesa de Lula. Se o apelo
for rejeitado, as duas condenações permanecerão anuladas, e o ex-presidiário,
de olho na disputa presidencial de 2022, continuará vendendo aos eleitores
menos esclarecidos a narrativa estapafúrdia em que posa de vítima da “maior
mentira jurídica já contada na história deste país” e gritando aos
quatro ventos que a Justiça finalmente reconheceu o que seus advogados vinham
dizendo desde sempre: “o presidente
Lula é inocente”. Demais disso, o plenário se deburçará sobre e aquestão da suspeição de
Sergio Moro no caso do tríplex, que foi reconhecida
pela 2ª Turma no final do mês passado (se restar confirmado que Moro não era o juiz competente para
julgar Lula, o habeas corpus que
questiona sua imparcialidade no caso do tríplex perde o objeto, ou seja, deixa de fazer sentido).
Se a maioria vote derrubar a liminar
concedida por Fachin, três dos
quatro processos de Lula voltarão à
situação anterior — entre eles o do sítio, que já teve a condenação confirmada em segunda instância. Caso isso
ocorra, o petralha volta a ser ficha-suja
e estará impedido de disputar pessoalmente a presidência em 2022 (para o gáudio de Bolsonaro, que,
em tese, teria mais chances se reeleger se enfrentasse novamente o patético
bonifrate do sumo pontífice da seita do inferno).
Vale ressaltar que a anulação do processo do tríplex decorreu
da decisão da 2ª Turma, que reconheceu
a parcialidade do ex-juiz Sergio Moro
(por 4 votos a 1, vencido o ministro Fachin).
Se a decisão de Fachin sobre a
incompetência da JF do Paraná for anulada
pelo plenário, o processo do tríplex volta à fase de instrução, mas em
Curitiba, sob a pena do juiz Luiz
Antônio Bonat. No entanto, ainda que reste confirmada a competência da JF do
DF, a ficha momentaneamente limpa de Lula voltaria a ser suja caso o juiz
que ficar responsável pelo processo sítio
em Atibaia receber a ação já na etapa de proferir a sentença — isso não se
aplica ao caso do tríplex porque o processo terá de ser retomado desde o início,
a menos que a decisão sobre a parcialidade de Moro seja revista. Como se vê, são como os elos de uma corrente, diferentes
entre si, mas interligados uns com os outros.
Observação: Segundo
Fachin, sua decisão se deveu ao fato
de o STF ter decidido que só devem
ser julgados em Curitiba processos oriundos da Lava-Jato que tenham a ver diretamente com o Petrolão. Na decisão de março, Fachin
disse que a conduta criminosa atribuída a Lula
“não era restrita à Petrobras, mas a
extensa gama de órgãos públicos em que era possível o alcance dos objetivos
políticos e financeiros espúrios”, razão pela qual “o caso não se amolda ao que veio sendo construído e já decidido no
âmbito do Plenário e da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal a respeito da
competência da 13ª Vara Federal de Curitiba, delimitada, como visto,
exclusivamente aos ilícitos praticados em detrimento da Petrobras”.
Mudando de um ponto a outro, a criação de narrativas estapafúrdias
com o intuito de acirrar uma militância radical, cega pelo fanatismo político-ideológico,
não é uma exclusividade do deus pai da Petelândia. O candidato que apoiamos
para evitar a volta do lulopetismo corrupto em 2018 nunca foi o presidente com
que sonhávamos, mas jamais imaginamos o pesadelo kafkiano que se tornaria esta banânia
sob a égide do bolsonarismo boçal. Em seu estelionato eleitoral, o dublê
de mau militar e parlamentar medíocre
desmanchou-se em promessas de campanha que jamais pretendeu cumprir ou que não
pode cumprir devido a circunstâncias adversas. Propor uma PEC para elidir da
Constituição o nefando instituto da
reeleição presidencial é um bom exemplo das falácias de palanque que se
encaixam no primeiro grupo. Aliás, Bolsonaro
jamais desceu do palanque; tudo que ele fez ou deixou de fazer desde a posse
teve como objetivo tornar realidade o sonho da reeleição, a despeito de ter
afirmado mais de uma vez que “não nasceu para ser presidente, nasceu para
ser militar”.
Observação: Ao
contrário do que muitos afirmam, Bolsonaro
não foi expulso do Exército, embora tenha sido excluído dos quadros da Escola
de Oficiais por indisciplina e
insubordinação. Segundo o coronel Carlos Alfredo Pellegrino, o hoje presidente tentava liderar
oficiais subalternos, mas não conseguia pela “falta de lógica, racionalidade e equilíbrio na apresentação de seus
argumentos”. No julgamento do STM,
foi acusado de ter “grave desvio de
personalidade”, mas a aversão dos fardados pela imprensa contribuiu de
maneira decisiva para sua absolvição das acusações. qualificado de “caso completamente fora do normal,
inclusive mau militar” pelo general Ernesto Geisel (o penúltimo presidente-ditador dos 21 anos de
ditadura militar).
Bolsonaro travestiu-se
de defensor incondicional da Lava-Jato
e escalou Sergio Moro para avalizar essa
falácia. Só que ninguém sobrevive durante 28 anos no baixo clero da Câmara sem
esconder sabe Deus quantos esqueletos no armário do gabinete parlamentar, e
eguns mal despachados têm o mau hábito de voltar para assombrar... Enfim,
bastou virem a lume os indícios de rachadinha no gabinete do filho Zero Um na Alerj e as movimentações
financeiras suspeitas de seu ex-chefe de gabinete, Fabrício Queiroz. O mesmo Queiroz que era unha e carne com o ex-capitão do Bope Adriano da Nóbrega, suposto chefe do grupo de assassinos
profissionais Escritório do Crime e de
uma milícia no Rio, denunciado na Operação Intocáveis e fuzilado por policiais militares da Bahia em
fevereiro do ano passado (maldade sua achar que foi queima de arquivo).
O mesmo Queiroz que ficou desaparecido
durante mais de um ano até ser preso num imóvel em Atibaia (o fato de se tratar do mesmo município onde fica o folclórico
sítio de Lula é mera coincidência)
pertencente a Frederick Wassef,
dublê de mafioso de comédia e advogado de Zero
Um no inquérito das rachadinhas. Fred se
jactava de ser consultor jurídico da Famiglia
Bolsonaro e de ser próximo do Presidente. Com a prisão de Queiroz, tornou-se suspeito de ser o “Anjo” que vinha protegendo tanto o ex-assessor
quanto a esposa e outros familiares do dito-cujo, todos partícipes de um
esquema cujas peças iam aos poucos se encaixando,
mas aí a tropa de choque do Planalto entrou em cena e... Amanhã eu conto o
resto — ou não sobra tempo nem espaço para tecer mais alguns comentários sobre
o assunto do dia, da semana e, quiçá, do mês.
A folclórica, prosaica e quase inacreditável tropa de choque
de JB (falo não do famoso scotch,
mas sim do não menos famoso despresidente segundo o qual o Brasil “tem que deixar de ser um país de maricas
e enfrentar o vírus de peito aberto”) ultrapassou todos os limites da
desfaçatez ao argumentar que a CPI da
Covid não pode funcionar senão depois que todos estiverem vacinados. Não é
gozação, não. Essa torrente de cinismo brotou ao vivo e em cores da boca do líder
de Bolsonaro no Congresso, no bojo
de uma questão de ordem que esse senador apresentou durante a sessão virtual da
última terça-feira. “Enquanto não
tiver condição de funcionar com pessoas imunizadas, peço que a CPI não possa
funcionar presencialmente”, declarou o obelisco da desfaçatez. O
senador Randolfe Rodrigues, autor do pedido de CPI, devolveu de bate-pronto: “Na
velocidade que a vacinação está hoje no Brasil, só teremos pessoas adultas
imunizadas, em uma hipótese otimista, até dezembro ou janeiro do ano que vem.”
A esse ponto o governo chegou, pontua Josias de Souza com o humor ácido que se tornou sua marca registrada.
Num instante em que o brasileiro morre nas filas de UTI, diz o jornalista, a
escassez de vacinas, flagelo a ser investigado pela CPI, virou pretexto da tropa do capitão para matar o tempo. Em
minoria na comissão, o governismo adere
à política do isolamento social para tentar se reposicionar em cena.
Futuro integrante da CPI,
o senador amazonense Omar Azis fez
uma intervenção cirúrgica: “Os
senadores que não querem que instale a CPI agora, querem aguardar o momento
adequado. No momento adequado, teremos 500 mil mortes, 600 mil mortes no
Brasil, porque o que estou vendo é que estão querendo protelar.”
Hoje, a pilha de cadáveres, monumento que o vírus ergueu
para imortalizar a inépcia, a incompetência e a mais absoluta falta de
absolutamente do desgoverno Bolsonaro,
roça a marca de 360 mil. Se fosse um presidente lógico, sua alteza irreal chamaria
sua tropa para repetir uma de suas célebres frases: “O vírus tá aí. Vamos ter que enfrentá-lo, mas enfrentar como homem,
porra. Não como um moleque.”
Ou Bolsonaro
reage, ou a estratégia do governo no Senado vai acabar transformando sua tragicômica
gestão numa espécie de paródia de si mesma — uma pantomina estrelada pelos “maricas” da turma do 'fique em casa'.”