"TODOS AMAM O PODER, MESMO QUE NÃO SAIBAM O QUE FAZER COM ELE".
Era uma vez um mau
militar que foi expelido da Escola de Oficiais do Exército por indisciplina e insubordinação (mas acabou
sendo absolvido
das acusações pelo STM). Que ingressou na vida pública
como vereador, foi deputado federal por sete mandatos e, em 28 anos no baixo
clero da Câmara, aprovou
dois míseros projetos e colecionou mais de trinta
ações criminais. E que foi alçado
à Presidência por uma esdrúxula conjunção de fatores — entres os quais a
facada que levou no ato de campanha de 7 de setembro de 2018.
Era uma vez um candidato improvável que, uma vez eleito, reconheceu (num raríssimo
rompante de lucidez) que não
nasceu para ser presidente, nasceu para ser militar, mas, a despeito da
promessa de campanha de
propor o fim da reeleição, cria uma nova crise a cada santo dia, visando mobilizando sua
base eleitoral e tirar o foco dos principais problemas do país
(decorrentes, em grande medida, de seu despreparo), enquanto articula sua cada vez
mais improvável reeleição.
Era um vez um presidente incompetente que, inconformado com os índices de reprovação a seu governo e rejeição a sua pessoa (64% dos entrevistados desaprovam sua gestão e 58% querem seu impeachment), passou a promover motociatas, vituperar contra o STF, pedir o impeachment de ministros da Corte e "esticar (ainda mais) a corda", ameaçando discursar nas manifestações marcadas para o próximo dia 7 — na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, pela manhã, e na Avenida Paulista, em São Paulo, na parte da tarde.
Observação: O STF deve ser o principal alvo desses pronunciamentos — que podem incluir também a defesa da "liberdade de se manifestar a favor da interpretação de que o artigo 142 da Constituição permite uma intervenção militar para garantir a lei, a ordem e os poderes da República". O objetivo dessas manifestações é mostrar força política e eleitoral, e a expectativa é que os atos contem com grande adesão popular (seria isso que o capitão quis dizer quando afirmou a apoiadores que eles teriam uma "fotografia para o mundo"), permitindo pressionar o presidente do Senado a dar andamento aos pedidos de impeachment de ministros do STF e o Congresso a aprovar pautas de interesse do governo.
Era uma vez um presidente que colocou o Brasil numa situação tão constrangedora quanto Jânio Quadros, o populista manguaceiro que se elegeu prometendo "varrer a corrupção", passou 206 dias mandando "bilhetinhos" para auxiliares e se preocupando com rinhas de galo e outras questiúnculas... E que, no dia 25 de agosto de 1961, "movido por forças terríveis", apresentou sua carta-renúncia e voou para a Base Aérea de Cumbica, levando consigo a faixa presidencial (que a essa altura não mais lhe pertencia) e a esperança de ser reconduzido ao cargo por aclamação popular, o que lhe permitiria governar sem ser "incomodado pelo Congresso". Era uma vez um ex-presidente que acabou num cargueiro, rumo ao exílio no Inglaterra. porque a manguaça o fez esquecer de combinar sua tramoia com o povo.
Bolsonaro não é dado a libações alcoólicas, ressalta André Gustavo Stumpf em artigo transcrito por Ricardo Noblat no portal Metrópoles, mas seu comportamento mercurial deve ter origem em algum problema que só a psiquiatria política poderá explicar. Ele alimenta o conflito para manter sua claque unida e garantir espaço no noticiário, mas seus maus bofes e declarações desastradas causam ruído, derrubam a bolsa de valores, provocam o aumento do dólar e frustram qualquer possibilidade de diálogo.
Bolsonaro produz fofoca, onda, espuma, mas governar, que é bom, néris de pitibiriba. O empresariado já está com um pé atrás; o investidor estrangeiro foge do mercado brasileiro; o botijão do gás de cozinha custa 10% do salário-mínimo e o do litro da gasolina beira os R$ 7.
O tradicional elenco de feira de horrores que deverá postular o Planalto em 2022 ainda não deu as caras. Há esforços de uma ala do PSDB para lançar o governador gaúcho Eduardo
Leite, mas o ex-presidente FHC
apoia o paulista João Doria. Fala-se, ainda, em Rodrigo
Pacheco e não se descarta Sérgio
Moro. O cearense de Pindamonhangaba Ciro
Gomes também é uma possibilidade (e outra tragédia anunciada).
Segundo as mais recentes pesquisas de intenções de voto, Lula
derrotaria Bolsonaro no segundo turno, mas simulações sem o molusco
abjeto dão conta de que o
capitão perderia de qualquer outro candidato no segundo turno.
E aí, então, era uma vez um capitão...