Se cada povo tem o governo que merece, um povo que volta às urnas após 3 décadas de jejum e designa Collor e Lula, em vez Mario Covas e Ulysses Guimarães, para disputar o segundo turno não pode reclamar de ter um maníaco na Presidência, um réu comandando a Câmara e um ex-presidiário liderando as pesquisas de intenções de voto.
Problemas que tais poderiam ser resolvidos facilmente se houvesse
na política uma maioria proba, que se valesse do mandato para tratar dos interesses do povo. Mas sabemos que não é assim. Como também
sabemos que maus políticos não brotam nos gabinetes por geração espontânea; se estão lá, é porque foram votados. Deu para entender ou quer que eu soletre?
Faltam 10 meses para as eleições, três para o fim do
troca-troca partidário e oito para o início (oficial) das campanhas. Só que Lula
está em campanha desde quando deixou a cadeia, e Bolsonaro,
que prometeu propor o fim da reeleição, jamais desceu do palanque. Mas a Justiça
Eleitoral finge que não vê. Aliás, dizem que a
Justiça é cega, mas, no Brasil, a impressão que se tem é que ela é paga
para não enxergar.
No que tange às famigeradas pesquisas de intenção de voto, se compararmos as campanhas eleitorais a um filme, os resultados dessas abordagens seriam um frame, um instantâneo do humor do eleitorado num determinado momento. Ou nem isso.
Às vésperas das eleições de 2018, todos os institutos davam de barato que Bolsonaro seria derrotado no segundo turno, fosse quem fosse o adversário, e que Dilma seria eleita senadora por Minas Gerais. Acabou que o psicopata derrotou a marionete do presidiário por uma diferença de quase 11 milhões de votos, e a gerantona de araque amargou um vergonhoso 4º lugar.
Em linhas gerais, Ibope (que agora atende por IPEC), Datafolha, Paraná
Pesquisas e assemelhados utilizam critérios científicos e dados
fornecidos pelo IBGE, TSE etc. para definir uma “amostra
da população que "represente fielmente todo o colégio eleitoral"
de um município, um Estado, ou, no caso de eleições presidenciais, do país como
um todo.
O objetivo é obter, a partir do menor número possível de
entrevistas, a eficiência pretendida, que corresponde geralmente a um nível de
confiança de 95%, com margem de erro de 2 a 3 pontos percentuais, para mais ou
para menos. Mas para isso seria preciso que as respostas de 2 mil entrevistados
refletissem a opinião de 158 milhões de eleitores.
Como dizia Magalhães Pinto, "a política
é como nuvens no céu; a gente olha e elas estão de um jeito, então olha de
novo e elas já mudaram". Se as eleições municipais fossem mesmo
uma prévia das gerais, o que aconteceu em 2020 deveria preocupar os bambambãs
das intenções de voto.
O apoio explícito do capetão e do ex-presidiário a seus respectivos
apadrinhados não
empolgou o eleitorado. Em São Paulo, Celso Russomano, respaldado
por Bolsonaro, largou na frente, mas não chegou ao segundo turno, e Jilmar
Tatto garantiu ao PT de Lula o pior despenho da história na
maior cidade do país. No Rio, Eduardo Paes obteve 65% dos votos válidos,
deixando no chinelo Marcelo Crivella, apoiado pelo "mito", e a
petista Benedita da Silva, candidata do picareta dos picaretas. Com
padrinhos assim, melhor ser pagão.
A disparidade dos resultados mina a credibilidade das
pesquisas, mesmo considerando que eles representam um frame no filme das
eleições. Afinal, quando um instituto aponta a vitória de Lula no
primeiro turno e outra diz que o petista e o atual mandatário estão
tecnicamente empatados, e que Sergio Moro aparece com 5% numa
pesquisa e com 15% em outra, alguma coisa deve estar errada.
Observação: Sob o sugestivo título "Parem as máquinas: pesquisa dá Bolsonaro na frente de Lula", Lauro Jardim publicou em O GLOBO que uma pesquisa divulgada também esta semana da Brasmarket Inteligência e Pesquisa (instituto do qual poucos ouviram falar) com resultados indiscutivelmente espantosos (Ou seriam inacreditáveis?). O tal instituto diz que realizou este mês 4,6 mil entrevistas telefônicas em todo o Brasil e a margem de confiança do resultado seria de 95%. Não se sabe para quais telefones os pesquisadores ligaram. Mas, indo contra tudo e contra todos, chegaram a resultados que só os bolsonaristas raiz levarão a sério: Bolsonaro, com 34,8%, fica à frente de Lula, que obteve 19% das preferências. Moro alcançou 7,8% e Ciro, 5,2%.
Desde o momento em que os pré-candidatos fizeram seus primeiros movimentos no tabuleiro da sucessão presidencial, a maioria dos jornais, revistas e emissoras de rádio e televisão, em vez de se ater aos fatos, passaram a publicar versões alternativas, porque o jornalista “a” ou o editor “b” é militante do partido “x” ou simpatizando do candidato “y”. E assim será até outubro do ano que vem, porque o que era para ser uma eleição virou uma luta entre o bem o mal, e a mídia, em vez de reportar os fatos, se dedica a torcer, a distorcer e a trabalhar por um lado na campanha, convencida de ter a “superioridade moral”.
Não é função da imprensa disputar eleições (nem muito menos
perdê-las), mas alguns órgãos de comunicação se arriscam a fazê-lo e acabam
surrados pelo candidato que declararam “inimigo” e pelo despreparo dos
eleitores, incapazes, em sua maioria, de reconhecer um populista demagogo,
mesmo que ele lhes morda o rabo.
Jornalistas passam meses fazendo uma operação contínua
contra o candidato "a" em prol do candidato "b" e, no dia
da apuração, veem que todo esse esforço foi em vão, pois o povo está cagando
para o que a mídia publica quando fica como arquibancada em jogo de futebol,
xingando o juiz de ladrão e o técnico de burro — o que não muda em nada o
resultado do placar.
Inventou-se como estratégia, desde 2018, que o
presidiário Lula era não só candidato, mas o candidato
favorito para ganhar a eleição, embora ele sequer pudesse disputá-la,
pois estava cumprindo a pena em Curitiba. Mas os “institutos de pesquisa”
garantiam que ele tinha “120% dos votos”, que havia “avançado mais 50 pontos”,
que ganhava de todos os outros candidatos... E a imprensa, em peso, reproduzia
essa fábula em suas manchetes, alimentando a ficção de que “a ONU” iria
obrigar o Brasil a aceitar a candidatura. Chegaram mesmo a convocar o STF para
julgar essa aberração.
Saiu Lula, entrou Haddad. Sete dias
antes do pleito, uma das "pesquisas" deu o fantoche do presidiário
com “22%”, numa “ascensão” que o levaria inexoravelmente à vitória. Para não
deixar dúvidas, todos os meios de comunicação repetiram até o dia da eleição
que, segundo "todas as pesquisas", o dublê de mau militar e
parlamentar medíocre "perderia de todos os outros candidatos"
no segundo turno. E deu-se exatamente o contrário.
Desde o início da campanha, os mais potentes cérebros da
análise política do Brasil deram como fato científico que a candidatura
de Bolsonaro iria “derreter” assim que começasse o horário
eleitoral obrigatório na TV. A despeito dos poucos segundos a que tinha direito,
o candidato do nanico PSL venceu o pleito, enquanto Geraldo Alkmin,
dono do maior tempo de TV, mal chegou a 5% dos votos.
Até 2016, era no programa eleitoral obrigatório que tudo se
decidia numa campanha; hoje, a televisão, em seu conjunto, deixou de existir
como um fator de importância numa eleição brasileira. Os “institutos de
pesquisa” tampouco são capazes de mudar coisa alguma, como se viu da derrota
de Dilma Rousseff — vendida como aquela que seria “a senadora
mais votada do Brasil”, mas que acabou em quarto lugar.
A internet, o Facebook, o Twitter e
o restante do arsenal nuclear que a tecnologia eletrônica despeja a cada
momento sobre o universo das comunicações mudaram a política no Brasil em 2018,
e há muitos anos vêm transformando a imprensa num animal cada vez mais
diferente de tudo o que possa ter sido. E não há sinais de que essa história
venha a tomar um novo rumo.
Ninguém tem ouvido histórias de veículos que triplicaram seus leitores ou sua audiência nos últimos anos; pelo contrário: salta aos olhos que o método que vem sendo utilizado está dando errado. E como poderia dar certo se os resultados são um desastre? Em momentos como este, é uma tragédia que a imprensa brasileira venha demonstrando, no conjunto daquilo que publica em seus veículos, uma inteligência inferior à inteligência média dos seus leitores, ouvintes e espectadores. Desse jeito, torna-se cada vez mais inútil para eles.
Ninguém vai chegar a lugar nenhum assim. O aviso das eleições está aí.