quarta-feira, 3 de maio de 2023

O PAÍS DA VERGONHA

 

Ao retornar da Arábia Saudita em 2019, Bolsonaro disse que "se sentiu quase irmão" do príncipe Mohammed bin Salman (aquele que ordenou a execução de um jornalista nas dependências da embaixada saudita na Turquia). Ao longo dos três anos subsequentes, autoridades brasileiras visitaram aquele pais mais de 150 vezes, e a importação de produtos sauditas bateu recorde em 2022 (US$ 5,3 bilhões). Mas nada foi tão suspeito quanto a venda da refinaria Landulpho Alves para o fundo árabe Mubadala Capital, por metade do valor de mercado, semanas após o ministro Bento Albuquerque e seus acólitos protagonizarem o primeiro capitulo da série A Muamba das Arábias. 
 
Em entrevista à Jovem Pan, Bolsonaro se justificou: Eles têm dinheiro, pô". São joias caras, sim, caríssimas, até pela relação de amizade que eu tive com o mundo árabe". Em depoimento à PF, ele disse que só soube da apreensão das joias 14 meses depois do ocorrido, que buscou informações para evitar um suposto vexame diplomático caso os presentes fossem a leilão, e que tentou reaver o pacote destinado à esposa (aquele avaliado em R$ 16,5 milhões), mas "via ofício, não na mão grande".

Observação: Nessa trama (da qual até a Velhinha de Taubaté duvidaria), Bolsonaro passou quatro anos na Presidência totalmente alheio ao que acontecia à sua volta (nada muito diferente da falácia de velho Lula sobre o mensalão). Se alguém pressionou agentes federais visando liberar os tais bens presos na alfândega, foi sem seu conhecimento. Levou um ano até que ele fosse informado do que estava acontecendo.
 
Bolsonaro tentou vender uma imagem de simplicidade usando esferográficas Bic e relógios de plástico de R$ 30, deixando-se fotografar de chinelo de dedo, comendo pão com leite condensado e com as calças sujas de farofa. Durante sua abjeta passagem pelo Planalto, ele recebeu 19.470 presentes, mas nenhum deles fedeu tanto a propina quanto a muamba saudita. Segundo o jurista Walter Maierovitch, o ex-presidente confessou que cometeu peculato ao reconhecer publicamente que incorporou a seu acervo pessoal o estojo de joias que recebeu do governo saudita. 
 
A pena para este tipo de delito pode chegar a 12 anos de cadeia, mas não se pode perder de vista o fato de que vivemos numa republiqueta de bananas, onde sobram leis e falta vergonha na cara, onde todos são iguais perante a lei, mas alguns são mais iguais que os outros, onde o chefe do Executivo de turno foi guindado ao Planalto (pela 3ª vez) a despeito de ter colecionado 26 processos e de ter sido condenado em dois deles, em 3 instâncias, a mais de 25 anos de reclusão.

Farejando as possíveis consequências do escândalo das joias, a cúpula do PL já se articula para salvar a pele de Michelle — cuja relação com o marido, segundo se comenta, não anda bem das pernas. Quanto ao "mito", o depoimento à PF está sob sigilo, mas alguns trechos que vazaram para a imprensa dão conta de que sua explicações foram ridículas. "Só um bolsominion muito tapado, muito imbecilizado, para acreditar que ele não sabia o que é que tinha naquele estojo e que ele pegou só para não criar um incidente diplomático. Ele sabia. Ele sabia de tudo", escreveu Altamiro Borges na revista eletrônica Crusoé.
 
Ao voltar dos EUA, Bolsonaro encontrou um ambiente muito diferente do que imaginava. Ele ainda conta com uma base significativa de apoiadores, mas seu futuro político é incerto e o poder abomina o vácuo. A extrema-direita precisa de um candidato, que pode ser Tarcísio, Zema, e até Mourão (Vade Retro!).

Atualização

Uma ação da PF autorizada pelo "ministro canalha" do STF resultou na prisão preventiva do tenente-coronel Mauro Cid Barbosa, esbirro de Bolsonaro. A suposta falsificação do certificado de vacinação do ex-presidente viabilizaria sua entrada nos EUA, e Micheque e filha Laura teriam sido vacinados em 2021. Segundo a colunista Malu Gaspar, o esquema de falsificação dos cartões de vacinação começou em Goiás, depois que um médico bolsonarista do município de Cabeceiras preencheu cartões de vacinação para o capetão, a primeira-dama, a filha do casal e o lambe-botas Mauro Cid

O fritador de hambúrgueres e quase embaixador em Washington foi imunizado em agosto de 2021, um mês depois de o arremedo de o arremedo de ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, vacinar seu irmão mais velho, o senador das rachadinhas Flávio Bolsonaro. Já o pitbull do clã furou a fila, mas negou tê-lo feito: "A única coisa que devo ter furado deve ter sido a mãe de quem divulga mais uma fake news de nível global e diária! A escória não vive sem mentir e manipular! Não tomei vacina alguma!". 

Segundo Ancelmo Gois, o vereador carioca que dava expediente em Brasília foi imunizado em 2021, no posto de saúde da Câmara de Vereadores do Rio. Jair Renan contraiu covid em 2020. Na ocasião, ele disse que se tratava de uma "gripezinha" (like father, like son), e que teria tomado cloroquina durante o período em que apresentou sintomas. Como se costuma dizer, vaso ruim é difícil de quebrar.

Triste Brasil.