quinta-feira, 1 de fevereiro de 2024

EBÓ MAL FEITO, EGUN MAL DESPACHADO

 

Nem a Velhinha de Taubaté acreditaria na falácia vitimista dos bolsonaristas sobre o "episódio Carlos Bolsonaro", que só funciona com a parcela do eleitorado que pula, deita ou rala quando seu "mito" apita. Mas sem a vassalagem do antiprocurador-geral e o aparelhamento da PF, a tese de perseguição política é tudo que resta ao ex-presidente et catervaAo encostar a investigação sobre a "Abin paralela" no pitbull do clã, os investigadores deixam o pai do filho numa posição parecida com a do sujeito que despenca do alto de um edifício de dez pavimentos e, ao passar pelo sexto andar, suspira e diz: "Até aqui, tudo bem!". 
A visita dos rapazes da PF ao refúgio litorâneo onde Bolsonaro tira férias do ócio em companhia da prole é um prenúncio do que está por vir: depois de perscrutar a intimidade de Ramagem e de Zero Dois, os agentes devem invadir a praia do mito dos apatetados, a caminho de sua jugular, tocar a campainha do general Augusto Heleno, ex-superior hierárquico de Ramagem. 
Sempre que se apresenta como vítima de perseguição política, Bolsonaro fala com conhecimento de causa, pois perseguição é uma de suas especialidades. E o bom senso recomenda não discutir com especialistas. No caso da "Abin paralela", no entanto, o debate é até desnecessário: o próprio capetão assumiu a missão inconsciente de desvendar os próprios crimes cometendo-os com desleixo, Infelizmente, a PF chega a ele com quatro anos de atraso. Mas antes tarde do que nunca. 
Lula demorou a demitir o número 2 da Abin, e ainda resiste a trocar o diretor-geral do órgão, com quem tem intimidade. Qualquer semelhança com o caso de GDias não é mera coincidência.

Como se diz na Bahia, "ebó mal feito, egum mal despachado". Enquanto o povinho medíocre que o Criador colocou nesta banânia não aprender a votar, o continuaremos reféns de políticos que se elegem para roubar, roubam para se reeleger e são endeusados por quem os deveria fiscalizar, cobrar e defenestrar por mijar fora do penico. Até lá, arremedos de parlamentares seguirão dando cabriolas no Erário e, como bons discípulos de Maquiavel, ampliando seu poder a qualquer custo — como fizeram ao aumentar em quase 150% o valor do fundo eleitoral — descalabro que caberia a Lula vetar, mas ele não vetou por ser refém do condestável do Centrão e estar empenhado fortalecer o PT nas eleições municipais de outubro.  
 
Observação: O "fundão" — leia-se financiamento público de campanha — foi criado para mitigar a promiscuidade com empresas, prevenir escândalos de corrupção e reduzir o custo de eleger representantes e administradores públicos, mas o achaque ao bolso do contribuinte vem aumentando exponencialmente a cada eleição. O presidente do Senado e a bancada do Novo se uniram para derrubar o valor para cerca de R$ 2,6 bilhões, mas a proposta foi rejeitada por 355 votos a 101. 
 
No pacote bilionário de emendas parlamentares, a redução de R$ 5,5 bi imposta por Lula causou ranger de dentes e resultou em ameaças. O relator da PEC do Orçamento chegou a dizer que o veto será derrubado se o ministério do Planejamento não encontrar uma maneira de repor a diferença (mesmo com o veto, o saldo de emendas será de R$ 47,5 bi). Como se sabe, boa parte dessas emendas é desviada na forma de tratores, kits de robótica e maracutaias que tais, contribuindo para encher as burras dos congressistas corruptos e seus abjetos apaniguados. 
 
Já que falamos em egum mal despachado, José Dirceu de Oliveira e Silva ressurgiu das profundezas para "salvar o partido que ajudou a fundar de derrotas eleitorais em 2024 e 2026". Com o aval de D. Lula III, o ministro mais poderoso da primeira gestão petista vem atuando como eminência parda do PT e criticando Gleisi Hoffmann, que preside a sigla desde 2017 (para quem não se lembra, a ex-senadora rebaixada a deputada aparecia nas planilhas do propinoduto da Odebrecht como "coxa" e "amante").
 
Aos 77 anos e sem cargo formal no PT, o ex-guerrilheiro de festim pretende reassumir o papel que exerceu entre 2003 e 2005 e abandonou quando foi condenado no escândalo do Mensalão e na Operação Lava-Jato. Com o partido sob o domínio absoluto de Lula e sem hesitação em negociar com adversários, Dirceu personifica a busca pelo fim (no caso, o poder) sem se importar com os meios. A despeito das condenações pendentes, reiniciou o caminho de volta à ribalta com a escolha do filho Zeca como líder do PT na Câmara e com os acenos públicos do Maximus Pontifex da seita do inferno, que o elogiou como "agente e militante político da maior qualidade" e agradeceu pelo "legado no partido e solidariedade na prisão".
 
Na comemoração dos 43 da sigla, o palanque ambulante trombeteou: "Dirceu tem que colocar a cara para fora. A gente tem que construir outra narrativa na sociedade". Durante a campanha, temendo desgaste, sua excelência havia dito que "figuras históricas" não teriam espaço em seu terceiro governo — daí a volta de Dirceu à ribalta política se dar de forma gradual. Na cerimônia de posse do chefe, o "guerreiro do povo brasileiro" assistiu ao evento do gramado da Esplanada dos Ministérios. No fim daquele mês, durante encontro petista no Congresso com a presença do imperador da Câmara, os presentes evitaram posar para fotos com ele. 

Mas não há nada como o tempo para passar.