Até onde a vista alcança, nada positivo no cenário político merece ser comentado nesta sexta-feira, véspera de Carnaval. O que é ruim. Falta de notícias é boa notícia, dizem, mas excesso de más notícias gera desalento. E basta ligar o rádio ou a TV num noticiário qualquer para se sentir na antessala do inferno. Segue um exemplo estalando de fresco:
Ontem, em encontro com jornalistas, Bolsonaro
disse que é possível uma mudança na idade mínima para aposentadoria das
mulheres na proposta de reforma da Previdência. Já desconfiado em relação à
capacidade do governo em articular uma base de apoio para aprovar o texto
reforma sem muitas alterações, o mercado se surpreendeu ao ouvir do próprio
Presidente que pontos centrais da proposta, como a idade mínima, podem virar
letra morta. A percepção de que o governo “queimou a largada” e cedeu antes
mesmo de barganhar com o Congresso derrubou o Ibovespa — com máxima de 97.528,01 pontos e mínima de 95.364,39
pontos, o índice encerrou fevereiro aos 95.584,35 pontos, queda de 1,77%). O pior é que ele não precisava ter feito esse
comentário, até porque ninguém estava pressionando nesse ponto da idade mínima. Como
diria o Irmão Carmelo (Jô Soares) ao sacristão Batista (Eliezer Motta) no humorístico Planeta
dos Homens, veiculado pela Globo entre 1976 e 1982, “cala a boca, Batista”.
Observação: Pensando melhor, o fato de ser sexta-feira gorda pode ser um refrigério para quem liga o rádio ou a TV — a menos que o dito-cujo não goste de Carnaval, pois, nesse caso, troca-se 6 por ½ dúzia. Mas vamos adiante, que o tempo ruge e a Sapucaí é grande.
Após o golpe militar de 1964, Sérgio Marcus Rangel Porto, mais conhecido como Stanislaw Ponte Preta, concebeu uma enciclopédia das estultices que pinçou do cotidiano e a batizou de FEBEAPÁ. Estivesse vivo, o festejado cronista, escritor, radialista, comentarista, teatrólogo, jornalista, humorista, ex-funcionário do Banco do Brasil e compositor brasileiro — que morreu em 1968, aos 45 anos — certamente nos brindaria com uma edição revista e atualizada do seu Festival de Besteiras que Assola o País. Material não falta; ontem mesmo eu publiquei alguns “instantâneos” do cenário político, dos quais destaco a “valiosa contribuição” (entre aspas para sugerir as ironias de estilo) do ministro da Educação ao besteirol que assola o governo federal.
A propósito: não sei onde o presidente foi recrutar o ministro Ricardo Vélez Rodríguez, ou a ministra Damares Alves — ou por que diabos precisamos de um Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, mas isso é outra conversa. Quando mais não seja, esse cenário estapafúrdio me dá a impressão de que, com a possível exceção de Moro, Guedes e Lorenzoni, somente os oito ministros militares são minimamente capazes de juntar lé com cré. Os restantes cometem erros em demasia para os cargos que ocupam. E por cometer erros em demasia para o cargo, Dilma foi apeada da Presidência. Que tomem tento, portanto, os conspícuos membros dessa distintíssima barafunda.
Mas já falei mais do que pretendia. Passo a palavra para Josias de Souza, com cujas opiniões eu nem sempre concordo, mas que é dono de uma sensatez admirável, sobretudo num contexto em que emular o Circo Marambaia parece ser a regra geral.
Descobriu-se, afinal, a serventia da passagem de Ricardo Vélez Rodríguez pelo Ministério da Educação. O personagem consolida-se como um extraordinário protagonista de tríades. Já se sabia que há no mundo três coisas absolutamente seguras: o nascer do Sol, a morte e a próxima trapalhada de Vélez. Descobre-se agora que há também no universo três coisas irrecuperáveis: a pedra atirada, o sexo adiado e o tempo perdido com as trapalhadas de Vélez.
Sob Ricardo Vélez, as coisas não são mais certas ou erradas no Ministério da Educação — elas passam desapercebidas ou pegam muito mal. O ofício com o pedido do ministro para que os estudantes fossem filmados cantando o hino nacional depois de ouvir a mensagem contendo o bordão da campanha de Jair Bolsonaro pegou mal, muito mal. Vélez alegou que a distração o induzira a erro. E enviou um segundo ofício sem o "Brasil acima de todos, Deus acima de tudo."
A coisa continuou pegando mal, muito mal. Instado pelo Ministério Público a prestar esclarecimentos, Vélez mandou dizer que desistiu também da filmagem dos garotos. Alheio às maravilhas da informática, o ministro alega que não teria onde guardar tantos vídeos. De recuo em recuo, Vélez revelou-se dono de notável autossuficiência. Ele mesmo idealiza a bobagem, ele mesmo deita a tolice sobre o papel, ele mesmo providencia a retirada da baboseira de cena.
Restou a sensação de que Ricardo Vélez se auto impôs a missão de denunciar os erros da pasta da Educação cometendo-os. Faltou explicar o que seria feito com as filmagens que mandou cancelar. Supõe-se que serviriam de matéria-prima para uma campanha institucional sobre patriotismo.
Bom Carnaval a todos.