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sábado, 6 de abril de 2019

AS QUASE DECISÕES DE BOLSONARO, A LENTIDÃO NO STF E O REsp DE LULA NO STJ



Numa sexta-feira de quase decisões, Bolsonaro quase exonerou o ministro da Educação — segundo o presidente, “a aliança pode ir para a gaveta” na próxima segunda-feira” — e quase acabou com o horário de verão. Se nada mudar, ambas as decisões serão tomadas em caráter definitivo na semana que vem (e já não era sem tempo). O capitão também quase desidratou (ainda mais) a reforma da previdência mostrando as cartas antes que os adversários pagassem pra ver. Sobre o projeto de capitalização, que Paulo Guedes vem defendendo com unhas e dentes, Bolsonaro disse candidamente que "não é essencial no momento". Vélez, por seu turno, disse que não deixa o cargo, e o ministério de Minas e Energia, que foi pego de surpresa pela decisão sobre o horário de verão. E essa parece que já passou do quase, ou pelo menos foi isso que eu ouvi nos telejornais da noite de ontem.

O ex-ministro José Dirceu — considerado pela tigrada vermelha como “o guerreiro do povo brasileiro” — foi condenado duas vezes no âmbito da Lava-Jato, mas permanece solto graças à leniência do Judiciário, ao bom coração de certos ministros supremos e a dois diferentes recursos pendentes de julgamento. No caso mais antigo, a pena de 30 anos, 9 meses e 10 dias de prisão por corrupção, organização criminosa e lavagem de dinheiro foi ratificada pelo TRF-4 em meados de 2017, mas Dirceu foi solto por decisão da 2ª Turma do STF, que viu “plausibilidade jurídica” no recurso apresentado ao STJ. Assim, o petista só voltará para a cadeia quando e se esse apelo for negado. 

Em outra ação, o guerrilheiro de festim foi condenado a 8 anos de 10 meses por corrupção e lavagem de dinheiro, e a decisão foi ratificada pelo TRF-4 em novembro do ano passado. A corte já rejeitou os embargos infringentes da defesa, mas ainda cabem embargos de declaração, e somente depois que eles forem julgados é que serão considerados esgotados os recursos no âmbito da segunda instância (isso é Brasil, minha gente!).

Dirceu e seu rebento, que na última quarta-feira tirou do sério o ministro Paulo Guedes ao chamá-lo de tchutchuca, eram alvo de uma investigação no Supremo por corrupção e lavagem de dinheiro, mas o MPF apontou indícios de falsidade ideológica eleitoral (caixa 2) e o ministro Edson Fachin, respaldado na lamentável decisão suprema tomada por 6 votos a 5 no dia 14 do mês passado, determinou a remessa do caso à Justiça Eleitoral. Como se vê, a Operação Lava-Toga pode estar difícil de emplacar, a “Operação Esvazia-Gaveta” segue a todo vapor.

A uma corte constitucional, como é o caso do STF, cabe julgar a constitucionalidade de leis, mas ele também funciona também como suprema corte — ou seja, como a última instância de apelação —, além de investigar, processar e julgar deputados federais, senadores, ministros e outros políticos com direito a foro especial por prerrogativa de função. Mesmo contando com 222 servidores (em média) para cada um de seus 11 ministros, o Supremo não prima pela celeridade. E justiça tardia não é justiça. Em cinco anos de atividade, a despeito de ser constantemente bombardeada, a Lava-Jato produziu resultados impressionantes. Em contra partida, dos quase 200 casos que chegaram até o STF, 30% foram arquivados, tiveram denúncia rejeitada ou envolvidos absolvidos. Apenas 6 réus foram julgados e somente 2 restaram condenados sem prescrição.

Um bom exemplo de como as coisas caminham em nossa suprema corte é o ex-deputado Paulo Maluf, que em quase meio século de vida pública já figurou no topo da lista de políticos com mais processos judiciais. Em dezembro de 2017, quase duas décadas depois do início de um dos processos, o turco lalau foi condenado no STF a 7 anos, 9 meses e 10 dias de prisão, mas ficou preso por pouco mais de 3 meses, pois o ministro Dias Toffoli, atual presidente da corte, concedeu-lhe um habeas corpus de ofício, por razões humanitárias (o detento estaria à beira do desencarne), e o ex-deputado foi transferido para o Hospital Sírio Libanês e de lá para sua mansão nos Jardins (bairro nobre da capital paulista). Se ele realmente está morrendo, só se for de rir dos trouxas que acreditam na Justiça Brasileira.   

Outro exemplo emblemático de morosidade nas cortes superiores é o recurso especial do criminoso Lula no caso do tríplex do Guarujá. O petralha foi condenado a 9 anos e 6 meses de prisão, pena que o TRF-4 aumentou a pena de 12 anos e 1 mês, e que o réu vem cumprindo há um ano na Superintendência da PF em Curitiba (ao custo de R$ 10 mil reais por mês). Só nesse caso (Lula é réu em outras 9 ações criminais), seus advogados ingressaram com mais de 80 recursos, apelos e chicanas protelatórias. 

Espera-se que o STJ julgue na próxima terça-feira o recurso especial do prisioneiro de Curitiba. O apelo já foi rejeitado monocraticamente pelo desembargador Felix Fisher — até porque o STJ não pode reexaminar provas em recurso especial. A defesa alega que as decisões do TRF-4 contrariaram diversos dispositivos de leis federais, como a impossibilidade de o processo ser julgado por um juiz que perdeu a isenção, que a corte se recusou a analisar novos documentos que comprovam a inocência do petista, que "foi vítima de excesso de acusação" e julgado por um juiz de exceção.

Segundo Fischer, o STJ não tem como analisar se o acórdão do TRF-4 deixou de apontar ato de ofício de Lula que caracterizasse a corrupção passiva. Com a mesma justificativa, o magistrado apontou que não pode examinar se a pena aplicada foi exagerada, se o direito ao contraditório e à ampla defesa foi cerceado e se o ex-juiz federal Sergio Moro, responsável pela instrução do processo do tríplex e sua sentença, agiu de forma parcial (clique aqui para ler a íntegra da decisão).

Na semana passada, Fisher pediu ao MPF que se manifestasse sobre o pedido da defesa para encaminhar essa ação à Justiça Eleitoral, mas o parecer assinado pela subprocuradora-geral da República Áurea Lustosa Pierre recomendou apenas que o julgamento do recurso no STJ fosse suspenso até que o Supremo termine de analisar uma ação que questiona a condução do processo de Lula naquela corte. O magistrado pediu um complemento ao MPF, abordando o pedido relacionado à Justiça Eleitoral. De acordo como o vento soprar, o recurso será julgado na próxima terça-feira 9. E ainda que não seja essa a data, o julgamento certamente ocorrerá antes de o Supremo se debruçar sobre as ações que questionam a constitucionalidade de prisão após condenação em segunda instância, já que na última quinta-feira, atendendo a um pedido da OAB, o presidente supremo Dias Toffoli retirou as ADCs da pauta e adiou o julgamento sine die.

Observação: Em dezembro do ano passado, ao pautar as ADCs, Toffoli acreditava que o STJ já teria decidido sobre o recurso especial de Lula no próximo dia 10, data em que as tais ações seriam julgadas no Supremo. Mas isso não aconteceu, talvez porque o STJ preferiu empurrar a coisa com a barriga até o supremo decidir se mantém ou não a possibilidade da prisão em segunda instância. Nas últimas semanas, Gilmar Mendes e seus pupilos procuraram colegas da 5ª Turma do STJ para lhes pedir que julgassem as decisões da Lava-Jato e não apenas as homologassem. Ao longo dos anos, o colegiado manteve a maioria das decisões do então juiz Sergio Moro e do TRF-4, responsáveis pelos casos da força-tarefa nas instâncias inferiores. Torçamos para que pelo menos isso continue assim.

sexta-feira, 1 de março de 2019

O MINISTRO DA EDUCAÇÃO, O CIRCO MARAMBAIA E O FEBEAPÁ 2019



Até onde a vista alcança, nada positivo no cenário político merece ser comentado nesta sexta-feira, véspera de Carnaval. O que é ruim. Falta de notícias é boa notícia, dizem, mas excesso de más notícias gera desalento. E basta ligar o rádio ou a TV num noticiário qualquer para se sentir na antessala do inferno. Segue um exemplo estalando de fresco:

Ontem, em encontro com jornalistas, Bolsonaro disse que é possível uma mudança na idade mínima para aposentadoria das mulheres na proposta de reforma da Previdência. Já desconfiado em relação à capacidade do governo em articular uma base de apoio para aprovar o texto reforma sem muitas alterações, o mercado se surpreendeu ao ouvir do próprio Presidente que pontos centrais da proposta, como a idade mínima, podem virar letra morta. A percepção de que o governo “queimou a largada” e cedeu antes mesmo de barganhar com o Congresso derrubou o Ibovespa — com máxima de 97.528,01 pontos e mínima de 95.364,39 pontos, o índice encerrou fevereiro aos 95.584,35 pontos, queda de 1,77%). O pior é que ele não precisava ter feito esse comentário, até porque ninguém estava pressionando nesse ponto da idade mínima. Como diria o Irmão Carmelo (Jô Soares) ao sacristão Batista (Eliezer Motta) no humorístico Planeta dos Homens, veiculado pela Globo entre 1976 e 1982, “cala a boca, Batista”.

Observação: Pensando melhor, o fato de ser sexta-feira gorda pode ser um refrigério para quem liga o rádio ou a TV — a menos que o dito-cujo não goste de Carnaval, pois, nesse caso, troca-se 6 por ½ dúzia. Mas vamos adiante, que o tempo ruge e a Sapucaí é grande.

Após o golpe militar de 1964, Sérgio Marcus Rangel Porto, mais conhecido como Stanislaw Ponte Preta, concebeu uma enciclopédia das estultices que pinçou do cotidiano e a batizou de FEBEAPÁ. Estivesse vivo, o festejado cronista, escritor, radialista, comentarista, teatrólogo, jornalista, humorista, ex-funcionário do Banco do Brasil e compositor brasileiro — que morreu em 1968, aos 45 anos — certamente nos brindaria com uma edição revista e atualizada do seu Festival de Besteiras que Assola o País. Material não falta; ontem mesmo eu publiquei alguns “instantâneos” do cenário político, dos quais destaco a “valiosa contribuição” (entre aspas para sugerir as ironias de estilo) do ministro da Educação ao besteirol que assola o governo federal.

A propósito: não sei onde o presidente foi recrutar o ministro Ricardo Vélez Rodríguez, ou a ministra Damares Alves — ou por que diabos precisamos de um Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, mas isso é outra conversa. Quando mais não seja, esse cenário estapafúrdio me dá a impressão de que, com a possível exceção de Moro, Guedes e Lorenzoni, somente os oito ministros militares são minimamente capazes de juntar lé com cré. Os restantes cometem erros em demasia para os cargos que ocupam. E por cometer erros em demasia para o cargo, Dilma foi apeada da Presidência. Que tomem tento, portanto, os conspícuos membros dessa distintíssima barafunda.

Mas já falei mais do que pretendia. Passo a palavra para Josias de Souza, com cujas opiniões eu nem sempre concordo, mas que é dono de uma sensatez admirável, sobretudo num contexto em que emular o Circo Marambaia parece ser a regra geral.

Descobriu-se, afinal, a serventia da passagem de Ricardo Vélez Rodríguez pelo Ministério da Educação. O personagem consolida-se como um extraordinário protagonista de tríades. Já se sabia que há no mundo três coisas absolutamente seguras: o nascer do Sol, a morte e a próxima trapalhada de Vélez. Descobre-se agora que há também no universo três coisas irrecuperáveis: a pedra atirada, o sexo adiado e o tempo perdido com as trapalhadas de Vélez.

Sob Ricardo Vélez, as coisas não são mais certas ou erradas no Ministério da Educação — elas passam desapercebidas ou pegam muito mal. O ofício com o pedido do ministro para que os estudantes fossem filmados cantando o hino nacional depois de ouvir a mensagem contendo o bordão da campanha de Jair Bolsonaro pegou mal, muito mal. Vélez alegou que a distração o induzira a erro. E enviou um segundo ofício sem o "Brasil acima de todos, Deus acima de tudo."

A coisa continuou pegando mal, muito mal. Instado pelo Ministério Público a prestar esclarecimentos, Vélez mandou dizer que desistiu também da filmagem dos garotos. Alheio às maravilhas da informática, o ministro alega que não teria onde guardar tantos vídeos. De recuo em recuo, Vélez revelou-se dono de notável autossuficiência. Ele mesmo idealiza a bobagem, ele mesmo deita a tolice sobre o papel, ele mesmo providencia a retirada da baboseira de cena.

Restou a sensação de que Ricardo Vélez se auto impôs a missão de denunciar os erros da pasta da Educação cometendo-os. Faltou explicar o que seria feito com as filmagens que mandou cancelar. Supõe-se que serviriam de matéria-prima para uma campanha institucional sobre patriotismo.

Bom Carnaval a todos.