Dias atrás, uma repórter da GloboNews e ex-integrante das “Meninas
do Jô” me fez lembrar do próprio Jô,
que costumava responder ele mesmo as perguntas que dirigia aos entrevistados. A questão
levantada por essa ex-menina (não só porque o “Programa do Jô” deixou de ir ao ar em dezembro de 2016, mas também porque
a dita-cuja já colheu 61 primaveras nos jardins da existência) foi sobre como
seria o cenário eleitoral em 2022. E sua resposta (dela, não do entrevistado) foi que Bolsonaro é
candidatíssimo à reeleição, que João Dória
e Luciano Huck provavelmente
concorrerão, e que, pela esquerda, tudo depende do “presidente Lula”. Confesso que me senti tentado a
ligar para 4002-2884 e deixar o mesmo recado (lapidar, diga-se) que o senador Cid Gomes deu a uma súcia de petistas,
em outubro do ano passado: Lula está preso, babaca. (relembre
no vídeo a seguir).
Especular sobre a sucessão presidencial quando
a gestão atual começou há pouco mais de 3 meses (se começou mal ou não, isso é
outra conversa) me parece um exercício de futurologia sem o menor sentido. Demais
disso, Bolsonaro afirmou mais de uma
vez ser contrário à reeleição — e que pretende propor sua extinção numa possível
reforma política. Semana passada, em entrevista ao jornalista Augusto Nunes no programa “Pingos nos Is”
da Jovem Pan, ele voltou a dizer que a reeleição é ruim para o Brasil porque “o prefeito, o governador, até o próprio
presidente se endivida, faz barbaridades, dá cambalhotas, faz acordo com quem
não interessa, para conseguir apoio político...". Na mesma oportunidade,
porém, ele disse: “a pressão está
muito forte para que, se eu tiver bem [em 2022], obviamente, me candidatar".
A contradição não chega a surpreender, não quando vem de
alguém a quem falta coerência e sobram ideias abiloladas, mas isso também é
outra conversa. O detalhe é que Bolsonaro
disse isso logo após o Datafolha e o Ibope indicarem que ele é o
presidente em primeiro mandato menos bem avaliado desde 1985. Pressão de quem, então, cara pálida?
Tenho comigo que Geraldo
Alckmin prestou um desserviço ao
país ao insistir em disputar a Presidência quando João Dória tinha chances reais de passar para o segundo turno — e,
por que não dizer, de vencer a eleição. Doria
não terá esse egun mal despachado a assombrá-lo em 2022, o que é um ponto a seu
favor. Quanto a Luciano Huck, acho
que o apresentador perdeu o bonde e a vez. É certo que teríamos votado no
próprio capeta para impedir a vitória do boneco de ventríloquo comandado pelo
presidiário de Curitiba (o que explica a vitória do capitão), mas isso se deu
num cenário bastante peculiar, que dificilmente se repetirá em 2022.
O ex-presidente Lula (e não “presidente Lula”, como disse a infante sexagenária) foi condenado a
12 anos e 1 mês de prisão em segunda instância (no
processo do tríplex no Guarujá) e começou a cumprir a pena no dia 7 de abril de 2018 (há um ano, portanto). Nesse entretempo, foi sentenciado a mais 12 anos 11 meses de prisão
pela juíza substituta Gabriela Hardt
(no caso do sítio em Atibaia). Além disso, os autos
do processo sobre o terreno do
Instituto Lula e a cobertura em São Bernardo do Campo estão conclusos para sentença — o
julgamento pode se dar a qualquer momento, a critério do juiz federal Antonio Bonat, que substitui Sérgio
Moro no comando da 13ª Vara Federal do Paraná. Aliás, Bonat já negou um pedido de suspeição da defesa do
ex-presidente contra o delegado federal Filipe
Hille Pace, que investiga Lula
no âmbito da Lava-Jato do Paraná. Para além desses processos, o petralha é réu em outros seis, sem mencionar que foi indiciado no início
do mês passado, juntamente com o pimpolho Luiz
Cláudio, pelos crimes de lavagem de dinheiro e tráfico de influência
(clique aqui para mais informações sobre a
capivara do eterno presidente de honra do PT),
Se ninguém botar jabuti em árvore, o REsp de Lula — que
dentre outros absurdos pleiteia a anulação do processo do tríplex e o envio do
caso à Justiça Eleitoral — será rejeitado pela 5ª Turma do STJ, como já o foi por uma decisão monocrática do ministro Félix Fisher, no final do ano passado. E
agora que o presidente do Supremo despautou
e adiou sine die o julgamento das ADCs que questionam a
constitucionalidade da prisão após condenação por um juízo colegiado, não há por
que o STJ continuar empurrando o
julgamento barriga. Se o que faltava a Fisher
para levar o caso em mesa era a manifestação do MPF sobre o pedido de remessa do processo à Justiça Eleitoral, agora não falta mais: o parecer (contrário
ao pedido) foi encaminhado na última terça-feira.
Voltando à resposta que a repórter da GloboNews deu a si mesma, segue um texto de Josias de Souza (os grifos são meus):
“Lula tornou-se
para o PT um personagem paradoxal. Preso há um ano, ele continua sendo a única
liderança nacional do partido. Mas seu pesadelo criminal transformou-o num líder sem futuro. Hoje, Lula está inelegível até 2038,
quando completará 92 anos. Ou seja, do ponto de vista estritamente eleitoral, é um passado que não passa para o
partido que fundou. Para que Lula
voltasse a ser candidato, como gostaria, seria necessário que a sentença que o
condenou a 12 anos e um mês de cadeia fosse anulada nos tribunais superiores. Mas nem os mais fanáticos
adeptos do bordão 'Lula Livre' acreditam nessa possibilidade.
O petismo
agarra-se a uma tênue esperança dos advogados de que a sentença seja pelo menos
reduzida no julgamento de recurso no STJ
— uma eventual redução da pena permitiria à defesa reivindicar uma progressão
de regime prisional. Com sorte, Lula
ganharia uma transferência do regime fechado para o semiaberto. Com muita
sorte, iria para a prisão domiciliar. Seria um alívio para o preso, não para o PT. No momento, o grande desafio do
petismo é o de se reinventar na oposição.
Por ora, o partido repete o modelo de
oposição agressiva que adotava no passado. Com uma diferença: o PT já não se encaixa no papel de virgem
no bordel. Os adversários agora sabem o que os petistas fizeram nos verões
passados, quando manusearam a chave do cofre. De resto, ser do contra sem dizer
o que colocaria no lugar de projetos como a reforma da Previdência não estimula
o eleitor a recolocar o PT na fila
de alternativas caso Bolsonaro
mantenha o país no caminho do brejo.
O bordão 'Lula Livre' logo será um assunto chato até para o PT, se é que já não é. Ainda que se
materializasse, o sonho de liberdade seria seguido de novos pesadelos. Há mais
uma condenação de primeira instância. Há também meia dúzia de processos por
julgar. Adepto da teoria da palmeira única, Lula jamais permitiu que brotassem outras lideranças no gramado do PT. Seu egocentrismo condenou o partido
a administrar a decomposição do seu único líder rendido aos interesses dele.”
ATUALIZAÇÃO: Como eu disse linhas atrás, existe a possibilidade de a 5ª Turma do STJ julgar o recurso de Lula nesta quinta-feira (ou no próximo
dia 23, já que Judiciário, trabalho e Semana Santa não se misturam). Em
tese, o relator, ministro Felix Fisher, ainda não levou o assunto em mesa porque aguardava a manifestação do MPF — que foi encaminhada na última
terça e é contrária ao pedido da defesa de levar o caso do tríplex do Guarujá para a Justiça
Eleitoral. O colegiado, conhecido por manter as decisões das instâncias
inferiores nos processos da Lava-Jato,
é formado por cinco ministros, um dos quais (Joel Ilan Paciornik) se deu por impedido de participar desse
julgamento. Fisher já havia negado o
apelo monocraticamente, mas a defesa do petralha argumenta é que o recurso
expõe dezoito teses jurídicas compatíveis com a jurisprudência do STJ que deveriam ser enfrentadas por
todos os ministros da turma. Possíveis resultados são:
1) O apelo ser negado e a
condenação ser mantida (caso em que Lula seguirá cumprindo a pena em regime
fechado);
2) O reconhecimento de que as decisões
inferiores desrespeitaram alguma lei federal — como o Código Penal ou o Código
de Processo Penal —, o que levaria à declaração de nulidade do processo, que voltaria à instância em que a falha foi detectada (a
defesa alega que a ação não poderia ter sido julgada pelo juiz Sergio Moro; que o magistrado foi
parcial; que foi negada a produção de provas periciais, e por aí afora);
3) O reconhecimento da
competência da Justiça Eleitoral para analisar ação, o que também levaria
à anulação de todos os atos processuais na esfera da Justiça Federal — inclusive da ordem de
prisão;
4) A redução da pena (que a
defesa considera exagerada) ou a absolvição do réu quanto ao crime de lavagem
de dinheiro — em qualquer dos casos, a redução da pena abriria espaço para que o condenado
a cumprisse em regime semiaberto ou em prisão domiciliar;
Façam suas apostas (e cruzem os
dedos).