Cerveja e
caipirinha são unanimidades nacionais, embora, de uns tempos a esta parte, os brasileiros
venham consumindo cada vez mais vinho ― aliás, há excelentes opções
nacionais, ainda que a preços não raro superiores ao das importadas, mas
isso já é outra história. O fato é que, segundo a
Organização Mundial da Saúde, a parcela da população brasileira que é chegada num “birinaite” (cerca de 60%) consome, em média, o equivalente a15 litros de álcool por ano.
No que concerne à
caipirinha, muitos acham que não
tem segredo: basta esmagar limão com açúcar, acrescentar gelo e cachaça,
mexer e pronto. Mas tudo tem sua ciência, e esse drinque não é exceção.
Comecemos pela origem, que remonta ao ano de 1918, época em que a gripe espanhola campeava solta. Dizem os estudiosos e curiosos
de plantão que alguém resolveu unir o útil ao agradável ao criar uma
receita de xarope, que levava limão, alho, mel e um pouco de cachaça ―
antigamente, era comum usar álcool para acelerar o efeito dos
medicamentos. Daí para “outro alguém” eliminar o alho e substituir o mel
por açúcar (para reduzir a acidez do limão) foi um pulo.
Hoje em dia, muita gente substitui o tradicional limão por outras frutas, como
abacaxi,
caju,
kiwi,
maracujá,
morango, e por aí afora, além de, em vez da tradicional cachaça, usar destilados “mais nobres”, como
gim,
rum,
saquê,
tequila,
uísque,
vodca, e assim por diante.
Outro detalhe que merece menção:
pinga,
cachaça e
aguardente
são termos largamente utilizados como sinônimos, embora aguardente seja
o nome que se dá a qualquer bebida obtida a partir da fermentação de
vegetais doces, e cachaça, à aguardente de
cana-de-açúcar. Já o termo
pinga é usado vulgarmente como sinônimo de
cachaça,
e sua origem remonta ao tempo dos engenhos (século XVI). Naquela época,
os escravos eram encarregados da destilação da aguardente, e como o
vapor condensava no teto pingava sobre eles... Enfim, interessa mesmo
dizer é que
toda cachaça é aguardente, mas nem toda aguardente é cachaça.
No que diz respeito à
receita perfeita de caipirinha,
bem, fazendo uma analogia com o futebol (outra preferência nacional), a
coisa é como a escalação da seleção ― ou seja, cada um tem a sua.
Importante mesmo é seguir algumas regrinhas básicas, dentre as quais:
― Embora o limão
galego e o
siciliano apresentem excelentes resultados, a receita tradicional leva mesmo o
tahiti.
Mas é importante escolher os de casca lisa e fina (que geralmente são
mais sumarentos) e evitar os “muito moles”, que provavelmente estão
“passados”.
―
Descascar ou não o limão é uma questão de preferência pessoal, até porque o amargor não provém da casca, mas da
columela (o “miolo branco da fruta). Então, o importante é cortar o limão ao meio, mas
não de forma transversal, como fazemos quando cortar laranjas para espremer, e sim
longitudinal
(ao comprido). Depois, deve-se cortar as metades pela metade, de modo a
facilitar a remoção da parte branca. Se preferir, corte o limão em
rodelas e remova o miolo de cada uma delas, que também fica bom.
― Segundo os especialistas, é importante
macerar a fruta no próprio copo (evite, pois, usar coqueteleiras). Coloque as quatro bandas da fruta
com a polpa virada para cima
(para não macerar demais a casca, que aí, sim, pode resultar num
indesejável gosto amargo), cobri-las com açúcar e então socá-las com o
pilão (mas soque apenas o suficiente para liberar o sumo, pois socar
demais irá fatalmente resultar em
amargor, mesmo que
você tenha tomado as precauções anteriores). Ah, procure usar copos
baixos e de boca larga, como os do tipo “Ilhabela”.
― Se você está de dieta, o melhor a fazer é não tomara caipirinha,
pois substituir o açúcar por adoçante, embora não haja problema algum
nisso, não fará grande diferença, já que
as calorias provêm mesmo é do álcool (como sabemos,
bebidas destiladas são extremamente calóricas; uma dose de cachaça chega facilmente a 150kcal).
―
Gelo é essencial ― caipirinha morna, ninguém
merece! Mas convém usar água mineral ou filtrada e colocar o gelo no
copo depois de macerar o limão com o açúcar (em cubos, mas você pode
adicionar um pouco de gelo picado, se quiser, já que ele derrete mais
rapidamente e “enfraquece” um pouco a bebida), e só então acrescentar a
cachaça ou o destilado de sua preferência.
― Se for para servir várias pessoas (como num churrasco com amigos,
por exemplo), o preparo individual se torna por demais trabalhoso. Nesse
caso, você pode adiantar o expediente preparando a bebida numa
coqueteleira, transferindo-a para uma jarra e completando com gelo. Mas o
resultado nunca fica igual.
― Já a escolha da cachaça também vai da preferência de cada um. O
importante é usar um produto de boa qualidade ― ou seja, fugir daquelas
cachaças “mata-pinguço”, que cheiram como o álcool que você usa para
abastecer o carro. E ao contrário do que muita gente pensa, pode-se
perfeitamente usar aquela
pinguinha de alambique, dita
“artesanal”. O problema é o “custo benefício”, já que uma aguardente
dessas pode custar tanto quanto ― ou até mais que ― um bom uísque.
Receitas mais “rebuscadas” podem agradar muita gente, mas convém ter
em mente que algumas combinações são mais bem-sucedidas do que outras.
Prefira misturar
hortelã com frutas cítricas ou ácidas, e
pimenta com as mais doces (
maracujá,
caju,
carambola). E tome cuidado para não abusar de ervas muito aromáticas, como
manjericão e
alecrim, que podem deixar o sabor do drinque “intenso” demais.
Vale lembrar que destilados como
cachaça,
vodca e
saquê, por exemplo, têm características distintas, e combinam melhor com determinadas frutas. A
pinga vai muito bem com
limão,
lima-da-pérsia e
jabuticaba, por exemplo. O
saquê deve ser reservado para frutas mais delicadas e menos ácidas, como
kiwi,
uva verde e
morango, também por exemplo. Já a
vodca é versátil e combina com quase tudo, com a possível exceção de frutas mais cremosas, como
mamão ou
banana ― mas quem é que vai fazer caipirinha de mamão ou banana?
Para concluir, confira as receitas abaixo:
- Macere a polpa de 1/2 maracujá azedo com dois talos de
capim-limão e açúcar. Complete com gelo e rum branco e decore com folhas
de capim-limão.
- Macere de 8 a 12 jabuticabas com casca e caroço (mas deixe
algumas inteiras). Complete com gelo e cachaça e mergulhe um picolé de
limão no copo.
- Congele 6 bagos de uva Itália (verde) e oito de uva niágara
(roxa). Macere 4 colheres (sopa) de graviola fresca (com as sementes)
com uma de açúcar. Junte as uvas congeladas e complete com gelo e
cachaça.
- Macere uma carambola fatiada e alguns pedaços de abacaxi com
açúcar. Acrescente 1 cravo da índia inteiro e folhas de manjericão (sem
amassar). Complete com gelo e vodca.
Consuma com moderação (se resistir).