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quarta-feira, 1 de julho de 2020

O MITO, O MITÔMANO E O CIRCO DA VERGONHA NACIONAL


Tudo muda o tempo todo no mundo, diz Lulu Santos em “Como um Onda”. Peço venia ao cantor e compositor carioca para discordar. Nem tudo muda. A incompetência chapada do eleitorado tupiniquim, por exemplo, tornou-se cláusula pétrea nesta pobre nação. Daí a qualidade de nossos governantes e representantes — gente que, salvo raríssimas exceções, elege-se para roubar e rouba para se eternizar no poder. E um poder que se serve em vez de servir não serve.

Está mais que na hora de virar o jogo. Não deveria ser assim. Mas é. Diz-se que o Brasil não merece mais um impeachment presidencial em tão pouco tempo. Talvez não. Mas será que merece um governo como esse?

Parece que ninguém aprendeu nada com os dois impeachments anteriores, nem com os aziagos 13 anos, 4 meses e 12 dias sob jugo do abjeto lulopetismo — oito sob a batuta de um picareta e os demais com esse mesmo picareta nos bastidores, manipulando uma “gerentona” incompetente, pernóstica e arrogante, que antes de entrar para a política levou à breca duas lojinhas do tipo R$1,99, e isso nos anos 1990, quando a paridade entre o real e o dólar favorecia enormemente esse tipo de comércio.

Fosse o Brasil um país sério e essa senhora estaria dividindo a cela com seu criador e mentor (que cumpriu míseros 580 dias dos mais de 25 anos de prisão a que foi condenado, graças ao compadrio de uma corte suprema eivada de militantes fantasiados de ministros togados).

Foi por essas e outras que avalizamos o contrato de locação do atual inquilino do Palácio do Planalto, e que agora vemos com pesar a transformação de seu governo num misto de mercado persa e espetáculo circense, onde a população faz o pepel de palhaço. Claro que o momento está longe de ser o ideal para outro impeachment abrilhantar a história da nossa “frágil democracia”, mas se o preço a pagar para evitá-lo é uma viagem de volta aos tempos do autoritarismo, melhor que se lasque o presidente do que nós.

Falando no general da banda, fica cada vez mais difícil dar fé ao que dizem o capitão caverna e sua entourage, notadamente para tentar justificar o injustificável e defender o indefensável. Segundo Merval Pereira, “o silêncio eloquente do presidente sobre a prisão de seu amigo de longuíssima data Fabrício Queiroz explicita a gravidade da situação”. E eu não poderia concordar mais.

A depender do que os investigadores encontrarem nos celulares e documentos apreendidos em Atibaia, a situação pode levar a crise institucional a um desfecho que se prevê desde os primeiros escândalos deste governo. O caminho para o impeachment parece ser inevitável, já está marcado no GPS político; só não se sabe a velocidade em que isso se dará. Que a vaca foi pro brejo, disso ninguém duvida. A questão agora é calcular a distância do brejo e a velocidade da vaca.

Entre tantos episódios lamentáveis protagonizados por alguém que já reconheceu publicamente não ter nascido para presidente, mas para militar — e que nem para isso prestou, pois teve a carreira abortada por indisciplina e insubordinação —, o penúltimo foi de uma bizarrice a toda prova. A propósito, escreveu Josias de Souza em sua coluna:

Na definição do poeta gaúcho Mário Quintana, ‘a mentira é uma verdade que se esqueceu de acontecer.’ No caso do título de doutor que Carlos Alberto Decotelli dizia ter obtido na Universidade Nacional de Rosário, na Argentina, a mentira esqueceu que o doutorado só vira uma verdade quando acontece a apresentação da devida tese. Pilhado, o novo ministro da Educação desprezou a saída mais simples e preferiu executar acrobacias acadêmicas que esticam a mentira.” 

ATUALIZAÇÃO: 

Depois que piada a colombiana perdeu a graça — falo de Ricardo Vélez Rodríguez, que “comandou” o MEC por 3 meses e 18 dias —, Bolsonaro trocou o humor negro pela tragédia polonesa, e só se conformou em defenestrar o obelisco da grosseria porque sofreu pressão de todos os lados.

Para fechar com chave de ouro sua passagem pelo governo, Abraham Weintraub fez questão de causar mais constrangimentos (detalhes nesta postagem). E como que imbuído do propósito de confirmar a lei de Murphy —segundo a qual não há nada tão ruim que não possa piorar — o capitão trevoso escalou um mitômano para ocupar a vaga aberta com a saída pela esquerda do ministro sem educação — que caiu pra cima: como reconhecimento pelos "bons serviços prestados" ao MEC, a tragicomédia foi indicada para ocupar uma diretoria no Banco Mundial.

O substituto dessa aberração, professor Carlos Alberto Decotelli — um oficial da reserva da Marinha de 67 anos, evangélico, e que por pouco não se tornou o primeiro negro a ocupar um cargo na Esplanada dos Ministérios —, é tão mestre, doutor e pós-doutor quanto eu sou comendador.

A suspeita de que Decotelli não teria o título de doutor pela Universidade Nacional de Rosário foi confirmada pelo reitor da instituição argentina. O alegado curso de mestrado na FGV também teria sido um plágio, e o pós-doutorado na Alemanha, jamis existido.

Decotelli também teria sido responsável por um bizarro edital de licitação envolvendo a compra de 1,3 milhão de notebooks para a rede pública de ensino. Ao examinar o edital, a CGU apurou que 350 colégios receberiam mais de um computador por aluno, e que a Escola Municipal Laura de Queiroz, de Minas Gerais, que reúne 255 estudantes, seria agraciada com 30.030 aparelhos.

As explicações (?!) que o quase ministro deu à imprensa foram tão evasivas e inverossímeis quanto as do mafioso de comédia Fred qualquer coisa e as de seu ex-cliente Flávio Bolsonaro sobre rachadinha, lavagem de dinheiro, enriquecimento ilícito e que tais. Ou quanto o ramerrão do picareta dos picaretas, que, mesmo condenado a mais de 20 anos (em dois dos dez processos a que responde na Justiça penal), continua afirmando ser a alma viva mais honesta da galáxia.

Depois de muitas idas e vindas e outras tantas informações inconsistentes, o general da banda aceitou a demissão de Decotelli, posto que mantê-lo no cargo depois dessa lambança toda seria dar mais munição aos críticos contumazes de seu governo. Aliás, em que pesem todas as ressalvas que tenho em relação ao capitão das travas, esse imbróglio me leva a reconhecer que ele está coberto de razão ao reclamar da imprestabilidade das informações que lhe são prestadas pelo GSI do Gen. Augusto Heleno

Observação: Questionado, Heleno chamou os críticos de ‘desinformados’ e afirmou que não cabe ao GSI ou à Agência Brasileira de Inteligência examinar currículos de quem está para assumir algum ministério, e que essas informações são de responsabilidade de cada profissional. Na minha terra, isso se chama "tirar o seu da reta".
Voltando ao quase ministro, de pessoas acomodadas em poltronas desse relevo esperar-se-iam exemplos de conduta. Mas não. Damares Alves se apresentava como "mestre em educação, em direito constitucional e direito da família" sem ter nenhum título de mestrado. Espremida, declarou que sua qualificação é bíblica. Sob Michel Temer, uma antecessora de Damares na pasta, Luislinda Valois, incluíra no currículo um título inexistente: "Embaixadora da paz da ONU”. Sob Lula, a então ministra Dilma Rousseff (olha ela aí traveis) injetara no seu rol de méritos universitários dois anabolizantes: um mestrado pela Unicamp e a condição de "doutoranda" em economia monetária e financeira na mesma universidade. Era lorota. A ex-gerentona frequentara os cursos, mas, a exemplo de Decotelli, não apresentara as devidas dissertações.

Mudando de um ponto a outro, deu no Estadão  que o presidente Bolsonaro (temos outro?) vem intensificando as negociações com o Centrão para, além de livrar-se de eventual processo de impeachment ou inquérito no STF, incluir no pacote a blindagem seu primogênito, alvo de investigações e sujeito a ter o mandato parlamentar cassado pela comissão de ética (?!) do Senado.

O desembargador Paulo Rangel, autor do voto decisivo que deu foro privilegiado ao Zero Dois, queria anular não só as provas contra o filho do presidente, mas também contra outras 94 pessoas investigadas na primeira instância pelo esquema de rachadinha, tais como o sócio do senador na loja de chocolates, sua senhora, a esposa de Queiroz e uma filha do casal, além de empresas, ex-assessores e familiares suspeitos de colaborarem para o esquema, que foram alvo de quebras de sigilo e buscas e apreensões determinadas no ano passado pelo juiz de primeira instância Flávio Itabaiana.

Em 2010, ao tomar posse como desembargador do Tribunal de Justiça do Rio, Rangel agradeceu efusivamente o apoio à sua candidatura por parte da primeira-dama Adriana Ancelmo (mulher do ex-governador Sergio Cabral) e do procurador-geral Claudio Lopes — ambos acabariam presos pela Lava-Jato na investigação sobre o megaesquema de corrupção montado pelo marido da dita-cuja.

Segundo o desembargador, Adriana gostou do seu currículo e de sua história de vida, passando a defender seu nome. “Sou grato a honraria que me foi deferida porque sei da pressão que se faz num processo eleitoral dessa envergadura.” O magistrado também citou o apoio do desembargador Luiz Zveiter, que é citado na delação de Cabral, homologada por Edson Fachin em fevereiro.

Em seu voto, o magistrado disse que agiu de acordo com sua consciência, considerou que Itabaiana não tinha competência para supervisionar a investigação e, por isso, com base na teoria dos “frutos da árvore envenenada” (isto é, os vícios da planta transmitem-se aos seus frutos), defendeu a anulação de todos seus atos no caso. Em nota divulgada pelo TJ-RJ, o desembargado disse ainda que a decisão do STF de 2018 (*) não se aplica ao senador, “que passou de deputado estadual para senador, sem nunca ficar sem mandato parlamentar, e, portanto, não poderia ter uma investigação na primeira instância”.

(*) Na ocasião, o Supremo definiu que só mantêm a prerrogativa de foro parlamentares cujos atos investigados tenham ocorrido durante o mandato e tenham relação com a função. Quando deixa o mandato, o caso desce para a primeira instância.

O voto de Rangel só não prevaleceu por causa da desembargadora Mônica Tolledo, que manteve válidos os atos do juiz de primeira instância, apesar de votar pela remessa do caso ao Órgão Especial. A relatora, Suimei Cavalieri, votou por manter o caso com o juiz, por entender que ele sempre teve competência e, portanto, legitimidade para autorizar as diligências e coletar as provas.

sexta-feira, 9 de outubro de 2020

BYE, BYE, MINISTRO CELSO DE MELLO; WELCOME... WHO?

 

Por volta das 17 horas de ontem, assim que o ministro Celso de Mello concluiu seu voto, ou melhor, reafirmou sua posição no sentido de que o presidente JaiBolsonaro deve prestar depoimento presencialmente no inquérito que investiga sua suposta interferência política na PF, o ministro Luiz Fux suspendeu a sessão.

“Queria dizer a vossa excelência que essa sessão de hoje deve se findar com a sua última palavra. Todos nós estamos aqui extremamente emocionados e ao mesmo tempo nos lamentando que essa será uma última lição”, disse Fux. “Agradeço as palavras amabilíssimas de vossa excelência e quero afirmar que o STF permanecerá eternamente nas minhas saudades”, respondeu Celso de Mello.

Tocante, ainda que cheire a bolor, aos tempos da monarquia, a cortes inglesas onde, desde o século XVII, juízes e advogados usavam ridículas perucas — aliás, somente em 2007 que o lorde Phillips of Worth Matravers aboliu esse estapafúrdio adereço em casos civis ou de família, depois que uma pesquisa realizada em 2003 indicou que mais de dois terços dos entrevistados queriam eliminá-los por serem anacrônicos, desconfortáveis e caros: uma peruca que chegava à altura dos ombros custava £ 4,6 mil (cerca de R$ 30 mil).

O vice-decano Marco Aurélio havia enviado seu voto favorável ao depoimento por escrito e afirmado que a decisão pela oitiva não presencial seria “uma deferência ao presidente”. Pelo visto, o agora já quase decano da Corte terá de se ratificar sua posição. Quanto aos demais magistrados, o próximo a votar será o ministro Alexandre de Moraes, mas ainda não foi determinada a data em que a votação será retomada. 

No mais, parece que a nomeação Kássio Nunes Marques, que Bolsonaro escolheu para ocupar a vaga do decano na Corte (com o nítido propósito de blindar sua família e garantir-lhe a reeleição), subiu no telhado. 

Há fortes indícios de que o desembargador piauiense anabolizou seu currículo, a exemplo do que fez antes dele o professor Carlos Alberto Decotelli, dublê de oficial da reserva da Marinha e pastor evangélico de 67 anos que chegou a bordo um currículo invejável, mas tão falso quanto um Rolex de camelô. Como o lobo perde o pelo mas não larga o vício, tão logo a nomeação foi revogada o mitômano incorrigível adicionou a seu currículo fajuto a informação de que foi ministro da Educação entre os dias 25 e 30 de junho do ano de 2020.

Voltando ao desembargador tubaína, há quem diga que a nomeação já não se sustenta, pois as revelações colocam em xeque sua “reputação ilibada”, mas também há quem afirme que os possíveis “erros” no currículo não seriam, por si só, motivo suficiente para impedir sua posse.

Para o jurista Miguel Reale Júnior, a aprovação e nomeação do dito-cujo é inconstitucional. Segundo ele, o saber jurídico desaparece com o plágio e as afirmações de pós doutorado inexistente. Não há artigos, livros, capítulos de livros publicados pelo desembargador, e a reputação ilibada enfrenta o pior vício que a vida acadêmica pode ter: o plágio.

Roberto Dias, professor de Direito Constitucional da PUC-SP, avalia que as inconsistências no currículo do indicado podem colocar em xeque requisitos constitucionais para que ele assuma a cadeira, mas ressalta que a questão deve ser avaliada pelo Senado. "Este é um ponto que deve ser avaliado pelos senadores e, caso comprovado plágio, isso pode afetar a reputação ilibada”, diz o docente. 

A sabatina do candidato do capitão cloroquina foi marcada para 21 de outubro.

sábado, 26 de setembro de 2020

O DEDO PODRE DO ELEITORADO TUPINIQUIM

 


A vida é feita de escolhas, e hoje eu escolhi sair”, disse Nelson Teich em 15 de maio, ao comunicar que terminava ali sua passagem relâmpago pelo Ministério da Saúde, após de ter assumido o posto em 16 de abril, um dia depois de Bolsonaro ter empurrado para fora da pasta o ortopedista Luiz Henrique Mandetta. A questão é que toda escolha tem consequências e, como bem disse o Conselheiro Acácio, o problema com as consequências é que elas sempre vêm depois.

Tanto Mandetta quanto Teich eram avessos ao uso da cloroquina — que não tem eficácia comprovada contra o Sars-CoV-2, ou pelo menos é o que afirma a maioria dos virologistas, infectologistas, epidemiologistas e epidemiologistas. A questão é que Bolsonaro pensa diferente, e é Bolsonaro quem tem na mão a caneta Bic que tudo pode — inclusive nomear um general para comandar interinamente o ministério da Saúde durante a mais severa pandemia viral da história recente desta republiqueta de almanaque.

Observação: Como reconhecimento pelo excelente trabalho prestado pelo general Pazuello em seus quatro meses de interinidade — com destaque para a transformação da pasta em cabide de farda —, o capitão cloroquina tornou permanente a solução que muitos não admitiam sequer como temporária: no último dia 16, a poderosa Bic entrou em ação, e o estrelado especializado em logística foi efetivado ministro da Saúde, a despeito de não ter sequer um certificado de auxiliar de enfermagem, mesmo que obtido num curso por correspondência, para pendurar no gabinete.

A pergunta que não cala não é "o que faz um general de quatro estrelas (agora reformado) no comando da Saúde?", mas "o que faz um dublê de mau militar e parlamentar medíocre no Palácio do Planalto?"

Não bastasse o único projeto de governo do Messias que não miracula ser a própria reeleição e a despeito de ele reconhecer que não nasceu para ser presidente, nasceu para ser militar, sua insolência e seus três filhos políticos (Jair Renan ainda não entrou formalmente para o time) são investigados por uma vasta gama de práticas nada republicanas.

Para ficar num singelo exemplo, um levantamento feito pela revista Época apurou que supostos funcionários fantasmas do clã presidencial receberam R$ 29,5 milhões em salários do total de R$ 105,5 milhões pagos entre 1991 e 2019 — em valores corrigidos pela inflação do período.  De acordo com a reportagem, 28% do total pago a 286 servidores (a expensas do Erário, portanto) foram depositados na conta de funcionários com indícios de que não trabalharam de fato nos cargos, até porque exerciam outas atividades. Nathália Queiroz, filha do ex-assessor Fabrício Queiroz, recebeu R$ 1,3 milhão, embora trabalhasse como personal trainer. E o mesmo valor recebeu a mãe dela, que era cabeleireira. 

São 17 pessoas ligadas ao gabinete de Flávio, 10 ao de Carlos, 3 ao do então deputado federal Jair Bolsonaro, e outros 9 que passaram por diferentes gabinetes da família.

O reduto eleitoral do clã Bolsonaro é o Rio de Janeiro, estado onde o afastamento do governador Wilson Witzel nos leva a uma estatística surreal: nos últimos 4 anos, 6 governadores ou ex-governadores foram afastados e 5 foram presos. Apenas o atual (ainda) não foi detido. Sérgio Cabral, condenado a mais de 200 anos de prisão em regime fechado, permanece atrás das grades. Os demais recorrem em liberdade.

Na ex-Cidade Maravilhosa, o alcaide de turno, Marcelo Crivella, sobrinho do Bispo Macedo, dono da Universal, foi declarado inelegível pelos próximos 6 anos, por abuso de poder político e conduta vedada a agente público. A decisão foi tomada por unanimidade, na última quinta-feira, pelo TRE-RJ.

Escolher entre Crivella e Marcelo Freixo (na eleição municipal de 2016) talvez tenha sido para os cariocas uma decisão quase tão difícil quanto a do pleito presidencial de 2018 foi para os brasileiros "de bem" (detesto essa expressão, mas enfim...). A questão é que antes do segundo turno houve o primeiro, foi no primeiro que o dedo podre do eleitor eliminou todos os demais postulantes (não se discute que a maioria parecia fazer parte do cast de um circo de horrores, mas poder-se-ia ter escolhido um par menos ruim).

Não sei se Bolsonaro tem dedo podre, mas imagino que os armários do gabinete que ele ocupou na Câmara Federal durante 27 anos estejam abarrotados de esqueletos. Certeza, mesmo, a gente tem de que a todo-poderosa Bic não está nas melhores mãos, considerando as nomeações que ela assinou para preencher as pastas da Esplanada dos Ministérios. 

Para não espichar demais este texto, fiquemos no exemplo do MEC, que começou mal com o bisonho Ricardo Vélez, piorou com dublê de poço de incompetência e obelisco da beligerância Abraham Weintraub, virou piada com o professor, mestre, doutor, pós-doutor e o escambau Carlos Alberto Decotelli (que se demitiu antes que a imprensa descobrisse que ele foi reprovado no teste do pezinho e bombou no jardim da infância) e agora atinge seu ápice com o ministro-pastor (mais um) Mílton Ribeiro.

O atual ministro da Educação declarou recentemente que "a homossexualidade é fruto de famílias desajustadas“. Segundo o luminar, "o adolescente que muitas vezes opta por andar no caminho do homossexualismo (sic) faz isso porque não tem a atenção do pai, não tem a atenção da mãe; não questões de valores e princípios".

Por hoje chega. Amanhã tem mais.

sábado, 15 de agosto de 2020

FIRME COMO GELATINA

 

A despeito de o ministro Félix Fischer, do STJ, ter determinado o retorno de Fabrício Queiroz à cadeia, revogando, assim, a liminar do presidente da Corte, ministro João Otávio Noronha — a quem Jair Bolsonaro se refere como “um caso de amor à primeira vista” —, o mandado de prisão contra Queiroz não havia sido cumprido até o início da noite de ontem. O motivo da demora, alvo de questionamento por parte da imprensa e de especulação pelos comentaristas políticos, veio à tona horas mais tarde, quando o semideus togado Gilmar Ferreira Mendes restabeleceu o status quo ante. “Diante do exposto, defiro a medida liminar para suspender a ordem de prisão decretada em desfavor dos pacientes, se por outro motivo não estiverem presos”, decidiu o poderoso laxante. Tem horas que eu sinto saudades do velho Janot. Enfim, vamos à postagem do dia.

O presidente-cloroquina foi eleito pelo Washington Post o pior líder do planeta no combate à Covid-19 — pior até mesmo que Donald Trump —, cuja avaliação negativa, nos primeiros 3 meses de mandato, superou a de todos os presidentes em início de primeiro mandato desde 1990 e, ao final do primeiro ano, foi a pior entre os presidentes eleitos desde 1994. Agora, parece que ele descobriu que o dinheiro compra tudo, de amor verdadeiro a popularidade. Graças à prorrogação do “coronavoucher” de R$ 600 reais, sua aprovação aumentou 7% na comparação com o resultado da pesquisa Datafolha de junho, enquanto a rejeição caiu 10 pontos percentuais.

Detalhe: o Nordeste — tradicional reduto de Lula, Ciro e outros populistas de esquerda, onde a periculosidade da récua de muares com título de eleitor ombreia com a de uma capela de chimpanzés num stand de tiro — foi a região que mais contribuiu para o aumento da pontuação no quesito “ótimo e bom”.  

O fato de o Brasil ter se tornado um país de analfabetos funcionais é sopa no mel para políticos sevandijas e corruptos. Povo esclarecido não votaria nessa gentalha e tampouco se sujeitaria a trabalhar 5 meses por ano para pagar impostos (que somaram R$ 1.537 trilhão em 2019) sem receber a devida contrapartida. Aliás, enquanto o país contabiliza 12,3 milhões de desempregados — e quem ainda tem emprego abre mão de até 75% do salário para não ir pro olho da rua —, os ministros do STF aprovaram um aumento orçamentário de R$ 712,46 milhões para 2021 (que não inclui o reajuste no salário dos magistrados, que atualmente é de R$ 39,2 mil).

A educação no Brasil está horrível, disse Bolsonaro a um grupo de apoiadores. E nem poderia ser diferente depois de três meses sob Ricardo Vélez Rodriguez, outros catorze sob Abraham Weintraub (que foi agraciado pela Câmara Legislativa do DF com o título de persona non grata), cinco dias sob Carlos Alberto Decotelli e acéfalo desde a demissão deste último do ministro-fantasia (Milton Ribeiro, atual responsável pela pasta, testou positivo para a Covid-19 assim que tomou passe, e só começou a cumprir agendas presenciais na última semana).

Imaginar que o MEC pudesse vencer tais adversidades seria o mesmo que acreditar que a Saúde, sob intervenção militar desde a demissão do oncologista Nelson Teich, há exatos 3 meses, obtivesse um sucesso estrondoso no combate à Covid-19. Enfim, há quem acredite na Fada do Dente, no Coelho da Páscoa, na inocência do criminoso Lula...   

O candidato Bolsonaro fingiu ser contra a corrupção porque isso lhe renderia votos, e convidou Paulo Guedes para ser seu “Posto Ipiranga” de olho no apoio do empresariado e do mercado financeiro. Em 27 anos como deputado do baixo clero, o Messias que não miracula jamais foi liberal ou a favor de privatizações. Sua prioridade é salvar o rabo dos filhos, o próprio rabo, e conquistar a tão sonhada reeleição (não necessariamente nessa ordem) que ele esconjurou durante a campanha por mero pragmatismo.

Política, dizia Magalhães Pinto, é como nuvem: você olha e ela está de um jeito; olha de novo e ela já mudou. Guedes tornou-se protagonista de um filme parecido com aquele em que o prestígio de Moro morreu no final. Bolsonaro reduz o pé-direito do Posto Ipiranga ameaçando trocar o rigor fiscal do teto de gastos pela gastança de um populismo que mira a reeleição. Enquanto os superpoderes de Moro foram diminuindo na proporção direta do crescimento da deterioração ética da família Bolsonaro, a força que Guedes presumia ter é debilitada pelo desejo do capitão de fortalecer sua popularidade às custas do déficit público.

O superministro já viu como esse tipo de encrenca termina. A franqueza com que expôs publicamente seu próprio calcanhar de vidro foi uma tentativa vã de mudar o final do filme no replay. Mas ao dizer que Bolsonaro será conduzido a “uma zona de impeachment” se der ouvidos a quem o aconselha a furar o teto, e sobretudo por ter dito isso ao lado de Rodrigo Maia, que é senhor do destino de mais de 50 pedidos de impeachment contra o chefe do Executivo, e com quem este mantém desde sempre um relacionamento conturbado, Guedes cutucou a onça com vara curta. Bolsonaro sabe que não é o momento para fechar o Posto Ipiranga, mas acredita que, se o fizer, os tumultos no mercado financeiro serão passageiros, pois o substituto (fala-se no presidente do BC, Roberto Campos Neto) terá a garantia de que os compromissos do governo com o ajuste fiscal serão mantidos.

A impressão que se tem é de que a cúpula da República resolveu dançar a coreografia da enganação. Bolsonaro diz que quer a responsabilidade fiscal, as privatizações e a reforma administrativa, Guedes finge que acredita e Maia e Alcolumbre posam para a foto ao lado dos dançarinos. Mas o mais curioso é os atores partirem do pressuposto de que a plateia deve acreditar neles. Menos de 24 horas depois desse balé no Alvorada, o “mito” posou para novas fotos, dessa vez ao lado do ministro Rogério Marinho, chamado por Guedes de "fura-teto", enquanto Maia disse em entrevista que que o presidente precisa ser convencido a enviar ao Congresso a reforma administrativa, e que a saída de mais alguns assessores de Guedes faria bem ao Ministério da Economia.

Quem quiser que acredite que está tudo normal em Brasília, mas é bom ter em mente que o fato de ser compartilhada por muita gente não transforma uma ilusão em realidade. A cadeira de Guedes está tão firme quanto estava a poltrona de Moro. Cabe ao Posto Ipiranga decidir até que ponto deseja conviver com os parafusos frouxos. Está entendido que, para o presidente, ele deixou de ser insubstituível.