sábado, 7 de julho de 2018

O BRASIL E O COMPLEXO DE VIRA-LATA (CONTINUAÇÃO)


PRA QUEM TOMOU DE 7 A 1 DA ALEMANHA, E EM CASA, PERDER POR 2 A 1 DA BÉLGICA FOI UMA VITÓRIA. MESMO COM UM GOL CONTRA.

Quem acompanha o noticiário político sabe que a 2ª Turma da nossa mais alta Corte, conhecida informalmente como “Jardim do Éden”, vira e mexe cospe na cara dos cidadãos de bem, soltando sistematicamente uma formidável leva de corrutos. 

A pretexto de uma estapafúrdia “cruzada” contra as prisões preventivas alongadas, o mentor intelectual do terceto fantástico, ministro Gilmar Mendes, concedeu, nos últimos meses, dezenas de habeas corpus a políticos e empresários corruptos, sobretudo ao ques haviam sido presos por determinação do juiz federal Marcelo Bretas, responsável pelos processos da força-tarefa no Rio de Janeiro.

Como laxante togado, Mendes é imbatível, mas Lewandowski e Toffoli têm seguido o mestre e emparedado Fachin, cujo voto, quando muito, é acompanhado pelo decano da Corte. Assim, as “bruxas da Lava-Jato” se tornaram inimigos dos cidadãos de bem e sonho de consumo para a mais fina flor da corrupção tupiniquim. Em conjunto, nas sessões da Turma, ou isoladamente, em decisões monocráticas, os três magistrados retro citados vêm posto em risco os avanços da maior e mais bem-sucedida operação anticorrupção da história deste pobre país.

Talvez não se possa acusar esses ministros de compactuar com a corrupção e a impunidade, ainda que essa seja a impressão que suas decisões nos passam. Mas, convenhamos, suas posições pessoais não poderiam se sobrepor à jurisprudência firmada pelo plenário da Corte.

No caso de José Dirceu, os três urubus togados tocaram afinados como numa sinfonia: na sessão extraordinária do último dia 26, Toffoli, relator do processo, determinou “de ofício” (ou seja, independentemente de pedido da defesa) a imediata libertação do guerrilheiro de araque, a pretexto da suposta “plausibilidade” de o STJ reformar a condenação do petralha. E foi prontamente acompanhado por Mendes e Lewandowski (o decano da Corte estava ausente e Fachin foi voto vencido).

Observação: Nunca é demais lembrar que Toffoli foi advogado do Sindicato dos Metalúrgicos de SBC, consultor jurídico da CUT, assessor jurídico do PT e do então ministro José Dirceu. Depois de atuar como advogado nas campanhas de Lula à presidência em 1998, 2002 e 2006 e como subchefe para assuntos jurídicos da Casa Civil da presidência da República, foi guindado ao cargo de Advogado Geral da União, que exerceu até 2009, quando, mais uma vez graças a Lula, ocupou a vaga aberta com a morte do ministro do STF Menezes Direito. Abrilhantam seu invejável currículo duas reprovações em concursos para juiz de primeiro grau em São Paulo, sempre na primeira fase — que testa conhecimentos gerais e noções básicas de Direito dos candidatos.

Na prática, o que estava em jogo na decisão de libertar Dirceu era a famigerada execução antecipada das penas após a condenação em segunda instância. Para quem não se lembra, em outubro de 2016, por 6 votos a 5, o plenário do Supremo concluiu que os condenados podem ser presos após se esgotarem todos os recursos na segunda instância — caso de Dirceu, de Lula, de Eduardo Cunha e de mais uma trupe de criminosos do colarinho branco que até então se valiam de toda sorte de chicanas para evitar a prisão até o trânsito em julgado da condenação ou a prescrição da pena, o que ocorresse antes (nem é preciso dizer o que ocorria na maioria dos casos).

Observação: Em 70 dos últimos 77 anos os criminosos eram presos após a condenação em primeira ou segunda instâncias — como sói acontecer na maioria das democracias do Planeta. A prisão após trânsito em julgado vigeu somente de 2009 a 2016, mas favoreceu uma miríade de condenados bem situados social e economicamente, capazes de arcar com os honorários milionários de criminalistas estrelados e assim postergar sua prisão até o advento da prescrição.

O principal argumento dos ministros “garantistas” é que, segundo a Constituição, ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença condenatória. Na prática, sobretudo numa Justiça abarrotada de processos e tradicionalmente sensível aos pleitos dos mais abastados, isso quer dizer o Dia de São Nunca. Os ministros “punitivistas”, por seu turno, afirmam que o cumprimento antecipado da pena não é antidemocrático nem restringe o direito de defesa dos condenados, que continuam podendo recorrer até as últimas instâncias das Justiça — conforme, aliás, acontece nos EUA, Canadá e Reino Unido, por exemplo, que prendem os condenados na segunda instância e, em alguns casos, até mesmo depois da sentença de primeiro grau.

Dos três ministros garantistas do “Jardim do Éden”, o que mais confronta os métodos da Lava-Jato é justamente Gilmar Mendes  que em 2016, quando o STF decidiu a favor das prisões em segunda instância, atuou como principal defensor da medida, e cujo voto foi decisivo para formar a maioria (apertadíssima) de 6 a 5. Por alguma razão incerta e não sabida, o ministro-deus passou a considerar injusto cumprimento antecipado da pena, e essa mudança de posição preocupa, porque uma nova votação poderia alterar novamente a jurisprudência da Corte.

A presidente Cármen Lúcia tem evitado pautar essa discussão, por entender que não faz sentido tornar a submeter o assunto ao plenário menos de 2 anos após a última votação. Mas não é o que pensa o ministro Marco Aurélio, por exemplo — que chegou ao Supremo por indicação do primo e então presidente Fernando Collor de Melo, hoje réu na Lava-Jato e pretenso postulante à presidência —, relator de ações diretas de constitucionalidade que visam restabelecer o status quo ante.

Daqui a dois meses, quando Toffoli e Cármen Lúcia “trocarem de lugar” (o primeiro assumirá a presidência e a segunda ocupará sua cadeira na 2ª Turma), teremos duas situações opostas. A mais alvissareira é que o Edson Fachin terá um opositor a menos em sua Turma. A preocupante é que Toffoli é Toffoli — uma vez na presidência, ele poderá pautar a rediscussão da prisão em segunda instância quando bem lhe aprouver, e uma eventual reversão na jurisprudência pode acarretar seriíssimos prejuízos ao combate à corrupção no Brasil.

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