terça-feira, 25 de dezembro de 2018

OS INIMIGOS DO POVO



OS INIMIGOS DO POVO (1)

É um direito de Jair Bolsonaro espernear contra a imprensa. Mais do que isso: a ruptura é salutar. O PT sempre foi o partido dos jornalistas. Durante o petismo, a imprensa chapa-branca foi financiada com publicidade estatal e, como demonstrou a Lava-Jato, também com dinheiro de propina. Além de cortar o gasto com publicidade estatal, Bolsonaro pode enxotar todos os jornalistas do governo. Nem os assessores de imprensa devem ser da imprensa. Como disse Olavo de Carvalho no Twitter, “os jornalistas são os maiores inimigos do povo”. O ano está terminando com Lula na cadeia e a Editora Abril sucateada. Os velhos protagonistas da política e da imprensa foram abatidos. É preciso renovar tudo em 2019. Que Jair Bolsonaro continue a torpedear os jornalistas. E que os jornalistas saibam naufragar, mantendo um mínimo de hombridade.

OS INIMIGOS DO POVO (2)

Políticos de peso do Legislativo e do Executivo — do ex-presidente da Câmara ao ex-presidente da República — já foram investigados, indiciados, denunciados, tornados réus, condenados, presos. Mas nenhum membro do Judiciário foi implicado. Serão eles todos impolutos? Longe disso: em maio, a revista digital Crusoé revelou que Dias Toffoli, atual presidente do STF, recebia uma mesada de R$ 100 mil da mulher — dona de um escritório de advocacia que disputa causas milionárias nas altas cortes de Brasília. E o que aconteceu? Nada. Nem o ministro teve de se explicar, nem qualquer procedimento administrativo foi aberto para investigar o caso. Esse é apenas um dos muitos exemplos que dão conta de que investigar o Judiciário é tabu. Mas isso pode mudar.

Orlando Diniz, presidente da Federação do Comércio do estado do Rio de Janeiro, réu em cinco casos de corrupção e dois de lavagem de dinheiro e organização criminosa, foi preso preventivamente em fevereiro, mas acabou solto em junho, graças ao coração de ouro do ministro Gilmar Mendes. Todavia, as prosseguiram, e uma tabela produzida pela Receita Federal e anexada ao inquérito levantou suspeitas de que 44 bancas de advocacia, algumas delas detentoras de ligações estreitas com gabinetes de cortes superiores de Brasília, receberam R$ 118 milhões da Fecomércio entre 2012 e 2017. No acordo de colaboração que está em negociação na primeira instância, Diniz dará aos investigadores a oportunidade de finalmente deflagrar a Operação Lava-Toga e avançar sobre um bastião que a Lava-Jato até hoje não conseguiu explorar. O potencial é tamanho que se instalou um clima de pânico em Brasília.

A parte que preocupa ministros envolve pagamentos polpudos sob a rubrica de contratos de advocacia. Escritórios ligados a pelo menos dois membros do STJ receberam mais de R$ 13 milhões da Fecomércio no período em que a entidade protagonizou uma guerra de liminares no tribunal. Se seguir seu curso natural, o caso deve aterrissar em breve na PGR, a quem cabe investigar ministros de tribunais superiores, detentores do famigerado foro privilegiado.

Esmiuçando os pagamentos à Fecomércio, os investigadores chegaram também a parentes de ministros. Humberto Martins é pai do advogado Eduardo Martins, que, aos 31 anos, recebeu quase R$ 13 milhões da federação. Eduardo era o responsável por defender os interesses jurídicos da federação de Orlando Diniz em Brasília, mas, além de não frequentar as reuniões da entidade, emitiu duas notas fiscais (no valor de R$ 10 milhões) para tratar de processos no STJ nos quais sequer tinha procuração para atuar. O escritório do advogado Paulo Salomão, que é sobrinho do ministro Luís Felipe Salomão, também recebeu uma bolada. Nas notas fiscais descobertas pelos investigadores, o valor é de quase R$ 5 milhões; na declaração da Fecomércio ao Fisco, aparece o valor de R$ 500 mil. Mas o contrato que mais chamou atenção dos investigadores e que envolve as cifras mais impressionantes — nada menos que R$ 38 milhões — foi firmado entre a Fecomércio e o escritório de Cristiano Zanin Martins, que é genro de Roberto Teixeira, que é compadre do ex-presidente corrupto e tão enrolado na Justiça quanto ele, embora continue em liberdade.

A definição sobre a delação de Diniz deve ficar para depois do recesso. Quando da sua prisão, em fevereiro, o MPF já farejava algo de podre em suas relações com escritórios de advocacia; agora, com a delação, a investigação pode transformar o Judiciário no novo alvo da Lava-Jato — no interesse do próprio Judiciário e, consequentemente, do país.

Com Diogo Mainardi e Felipe Coutinho