O anúncio oficial da demissão de Gustavo Bebianno demorou mas chegou. No início da noite de ontem, num briefing marcado inicialmente para as 17 horas, mas adiado por duas vezes, o porta-voz da Presidência comunicou oficialmente o desligamento do ministro, com os agradecimentos de praxe por sua dedicação à frente da pasta e votos de sucesso
na nova jornada Perguntado sobre o motivo da demissão, Rêgo Barros respondeu que a decisão do Presidente se deveu a “razões de foro íntimo”, e confirmou a informação de que o substituto será o general da reserva do Exército Floriano Peixoto Neto — o oitavo militar a se tornar ministro deste
governo. Em tese, a demissão de Bebianno encerra a crise. Na prática, porém, a teoria
costuma ser outra. Demais disso, ninguém está conseguindo prejudicar mais o trabalho do governo do que os três filhos do presidente. Para além das intenções de cada um, o que eles vêm fazendo está sabotando o país. Ou Bolsonaro os cala, ou vira um banana completo. Volto a esse assunto na próxima postagem.
Nada como olhar com cuidado cada uma das partes de alguma coisa para se ter uma ideia mais exata do todo. A máquina pública brasileira, como revelam quase todos os dias fatos trazidos à luz do sol, transformou-se durante os treze anos e meio dos governos de Lula e de Dilma no maior pesqueiro privado do mundo para o desfrute de ladrões do erário — era chegar na beira da água, jogar o anzol e sair com uma refinaria para a Petrobras, uma hidroelétrica no Xingu ou mesmo um Trem-Bala, se você fosse uma empreiteira de obras amiga íntima do presidente da República como as Odebrecht, as OAS, as Andrade Gutierrez.
Também podiam rolar duas dúzias de ambulâncias, lanchas para
o Ministério da Pesca ou o patrocínio de um show de axé no interior do
Nordeste. Roubaram sangue humano dos hospitais, leite das crianças nas escolas
e sondas para encontrar petróleo no fundo do mar. Houve quadrilhas operando à
toda na venda de livros didáticos para o Ministério da Educação, na entrega de
recursos da “reforma agrária” para mais de 30.000 mortos (sem contar 1.000
políticos eleitos), ou na compra, com dinheiro dos fundos de pensão das
estatais, de ações de empresas falidas. Pense, em resumo, numa insânia jamais
cometida na história mundial da corrupção; haverá precedentes nos governos Lula-Dilma.
Muita gente não tem mais paciência, nem tempo, para ficar
olhando de perto cada episódio da roubalheira desesperada dos três governos e
meio do PT. Muito justo, até porque
a tarefa seria impossível. Mas de tempos em tempos vale a pena ver de novo —
ou, mais exatamente, vale a pena separar alguma ladroagem especialmente
depravada de todas as milhares que o cardápio Lula-Dilma oferece, e fazer uma espécie de análise clínica mais
demorada da patologia que existe ali dentro. Ajuda, como dito no começo, para o
melhor entendimento do todo.
A esquerda, no comando do arrastão mental que se pratica
todo dia no Brasil, tenta passar ao público a alucinação de que o conjunto
completo da corrupção no país se resume, no fundo, às sentenças que condenaram Lula (25 anos de cadeia no lombo, pela
última conta) por recebimento de propina e lavagem de dinheiro. Como, no seu
entender, “não há provas definitivas” da culpa do ex-presidente, não há,
realmente, corrupção alguma. Aí dá curto circuito. Quando você olha a rapina
parte por parte, e faz a soma de tudo, tem certeza de que está vendo um
avestruz. O PT diz que você está
vendo uma galinha.
Considere, por exemplo, uma das últimas demonstrações de
demência praticadas pelo governo com o seu dinheiro e trazida a público, ainda
outro dia, pelo novo ministro da Saúde. Dá para fazer ideia, aí, de onde foram
amarrar o nosso burro. Segundo o ministro, o Brasil gasta por ano 1,4 bilhão de
reais para cuidar da saúde dos índios. Esqueça se é muito ou pouco; pode até
ser uma miséria, e talvez o governo devesse gastar o dobro, ou o triplo, ou
quanto quiserem, nesse serviço. O que realmente acaba com qualquer discussão é
que 650 milhões desse 1,4 bilhão vão direto para as ONGs a quem as autoridades
entregam a tarefa de cuidar da saúde indígena. Cereja do bolo: desses 650,
quase 500 — isso mesmo, quase 500 — vão
para uma única ONG. Que tal? Os outros 700 milhões da verba total são
consumidos com as despesas para a existência material do próprio programa:
aluguel de helicópteros e carros para transporte de pessoal, gasto com isso,
gasto com aquilo.
Sabe-se muito bem, em suma, de onde o dinheiro sai: do seu
bolso, a cada tostão de imposto que você paga. Sabe-se, também, para onde vai:
para o bem estar dos 13.000 agentes das ONGs envolvidas no esquema. Sabe-se
definitivamente, enfim, para onde essa montanha de dinheiro não vai: para os
índios propriamente ditos. Seus índices de saúde são os piores de toda a
população brasileira. Não recebem remédios. Não têm acesso regular a exames
clínicos. As taxas de mortalidade infantil entre eles são três vezes superiores
à média nacional.
Muito bem: multiplique agora essa calamidade por 1.000, ou
por 10.000, ou sabe-se lá por quantas partes mais, e veja a dimensão delirante
a que chegou o “todo” na transferência de recursos públicos para interesses
privados neste país nos últimos anos. É a grande lição do manual de instruções
que os governos petistas deixaram como herança. Invente uma “política pública”
qualquer. Diga que ela é “social”. Pronto: é só correr para o abraço. Roubaram
até remédio de índio, e exigem que o seu líder seja Prêmio Nobel da Paz. É onde estamos.
Com J.R. Guzzo.