terça-feira, 16 de abril de 2019

CRUSOÉ E O ANTAGONISTA SOB CENSURA



A reportagem de capa da última edição da revista eletrônica Crusoé, que recebeu o título de “O amigo do amigo de meu pai”, apresenta informações sobre a deleção do empresário Marcelo Odebrecht, que cita o suposto apelido do presidente do STFDias Toffoli, nas planilhas da empreiteira envolvida em diversos escândalos de corrupção. 

Segundo O Antagonista, a matéria foi baseada em um documento que consta dos autos da Lava-Jato, no qual Marcelo Odebrecht, respondendo a um pedido de esclarecimento feito pela PF, fez a revelação que Crusoé trata em sua edição de número 50, publicada na última sexta-feira, 12. O ministro Alexandre de Moraes alegou “claro abuso no conteúdo da matéria veiculada” e ordenou que a Polícia Federal intime os responsáveis pela publicação da reportagem “para que prestem depoimentos no prazo de 72 horas”. Portanto, na avaliação de O Antagonista, “desde o fim da manhã desta segunda-feira, 15, Crusoé está sob censura”. 

Toffoli, no pedido para que a reportagem fosse objeto de apuração — alegando tratar de “mentiras” destinadas a atingir as “instituições brasileiras” — faz remissão à nota oficial divulgada pela PGR, dizendo não ter recebido, ainda, cópia do documento enviado à Lava-Jato por Marcelo Odebrecht e revelado por Crusoé. É justamente à nota de Raquel Dodge que Moraes se apega para ordenar a censura, alegando que a reportagem é “um típico exemplo de fake news”. Crusoé reitera o teor da reportagem, baseada em documentos, e registra o contorcionismo da decisão, que se apega a uma nota sobre um detalhe lateral e a utiliza para classificar como “fake news” uma informação absolutamente verídica, que consta dos autos da Lava-Jato. A revista salienta, ainda, que, embora tenha solicitado providências ao colega Alexandre de Moraes na sexta-feira, o ministro Dias Toffoli não respondeu às perguntas que lhe foram enviadas antes da publicação da reportagem agora censurada.

A decisão do ministro causou indignação instantânea nas redes sociais. Na manhã de ontem, quando a proibição veio a público, a tag #DitaToga era um dos assuntos mais comentados do Twitter brasileiro. O deputado Marcel van Hattem, líder do Novo na Câmara, considerou a decisão um cerceamento à liberdade de imprensa e uma ameaça a diretos consagrados pela Constituição: “É muito perigoso, depõe contra a Corte, contra os ministros, contra a democracia e contra o próprio combate à corrupção. Se o ministro não está envolvido, por que a censura? Quem não deve não teme. Ao silenciar o mensageiro, Toffoli piora a situação.” O líder da minoria no Senado, Randolfe Rodrigues, afirmou que recorrerá ao STF para derrubar o que a maioria dos parlamentares entende como sendo um ato de censura explícita.

A propósito desse lamentável episódio, o vice-presidente, general Hamilton Mourão, declarou: “Não tenho dúvida de que é censura, mas vai além da censura. No momento em que [a decisão], além de interditar a publicação, convoca os jornalistas a depor na Polícia Federal. [Significa que] Já estão respondendo a inquérito.” Na avaliação do general reformado, ao se sentir atingido, o ministro deveria ter acionado o MPF, não exigido a retirada conteúdo: “O camarada está sendo tudo, é julgador e investigador.” Mourão também criticou a manifestação da AGU, favorável ao inquérito aberto por Dias Toffoli sobre calúnias, fake news e ameaças contra magistrados. Segundo ele, haveria um acordo entre o Executivo e o Judiciário: “Tem um acordo nisso aí e não passa por mim. Se a AGU se manifestou favorável, tem um acordo aí.”

Para o jornalista José Nêumanne, o pecado da revista foi contar que o empreiteiro e corrupto confesso Marcelo Odebrecht disse que o “amigo do amigo do meu pai” relacionado no propinoduto da “empreiteira-corrupteira” é o citado ex-advogado-geral da União e do PT. A censura foi decretada contra um abuso, que foi cometido pelos dois ministros aqui citados ao substituir o “cala boca nunca mais” pregado por Cármen Lúcia, pelo “cala boca, gentalha” —, ou seja, nós. Na avaliação do jornalista, o parecer favorável — desnecessário e imerecido — emitido pelo advogado-geral da União, André Mendonça, ao inquérito inventado por Dias Toffoli para impedir críticas e ameaças a membros de altos tribunais, comprova que todo o clã Bolsonaro aderiu à blindagem destes. Afinal, o advogado-geral não tomaria uma atitude destas sem consultar o chefe. E a sabotagem do filho do presidente, Flávio, à instalação da CPI da Lava-Toga no Senado confirma que no triunvirato filial papai-hipotenusa apoia os três filhotes-catetos.

Deputados e senadores também estão aumentando o coro com críticas ao Supremo após a decisão do ministro Alexandre, como noticiou o site RENOVA.