terça-feira, 24 de setembro de 2019

NA POLÍTICA NÃO HÁ INOCENTES, TODOS SÃO CULPADOS



Deputados e senadores se elegem para roubar e roubam para se reeleger. Sua única preocupação não é o longo braço da lei — que no Brasil é engessado pela legislação que favorece o criminoso em detrimento do cidadão de bem —, mas o custo eleitoral de seus atos. Daí a tentativa de interromper esse círculo vicioso ter causado "desentendimento" entre Câmara e Senado e colocado o chefe do Executivo em mais uma sinuca de bico.

Eleito por um partido nanico, sem dinheiro nem tempo de rádio e TV, pregando a volta da moralidade, Bolsonaro ora se vê forçado a ir contra a instalação não de uma, mas de duas Comissões Parlamentares de Inquérito. No Senado, seu enroladíssimo primogênito vem atuando de maneira assertiva e acintosa contra a criação da CPI da Lava-Toga; na Câmara, a líder do governo, deputada Joice Hasselmann, tenta barrar a CPI da Lava-Jato, alegando que os deputados foram ludibriados para assinar o requerimento.   

Além do apoio de 1/3 dos deputados, instalar uma CPI na Câmara exige que haja um fato determinado, orçamento e prazo (início e fim). A CPI da Lava-Jato contabilizou 174 adesões — 4 além do mínimo necessário — e atende, pelo menos segundo a oposição, os demais requisitos. O presidente da Câmara parece não estar convencido quanto ao fato determinado, que na sua visão é, no mínimo, subjetivo. Mas o pedido de CPI não deixa de ser mais uma carta na manga para Maia usar em proveito próprio em seu toma-lá-dá-cá com o Executivo.

Houve um tempo em que tudo acabava em pizza. Agora, tudo acaba no STF — o que não é tão diferente quanto a princípio pode parecer. O presidente do Senado vem rejeitando sistematicamente os pedidos de instalação da CPI da Lava-Toga e engavetando os de abertura de processos de impeachment contra membros da Suprema Corte, o que levou os parlamentares favoráveis à investigação dos togados a protocolar um questionamento no próprio STF. Como se isso já não fosse dar a Herodes a chave do berçário, quis o destino que o relator sorteado fosse ninguém menos que Gilmar Mendes. A menos que haja pressão popular expressiva, como a que levou Eduardo Cunha a acolher o pedido de impeachment contra Dilma, podemos tirar o cavalo da chuva.

No caso da CPI da Lava-Jato o requerimento é real, até porque o prazo para a retirada de assinaturas já expirou. Os propósitos da esquerda, ao propor a instalação dessa CPI, eram desgastar a imagem de Moro, da Lava-Jato e dos procuradores do Ministério Público, além de libertar Lulalalu e bombardear o governo — como se Bolsonaro não fosse perfeitamente capaz de fazer isso sem ajuda de ninguém. No entanto, a despeito de todo o trabalho de difamação feito pela imprensa militante contra Moro e a força-tarefa da Lava-Jato, a popularidade da operação e de seus atores não sofreu o menor abalo. Isso foi comprovado até mesmo pelo suspeitíssimo Datafolha, que integra o grupo Folha — que é cúmplice de Verdevaldo das Couves e parceiro do pseudo jornalismo do The Intercept Brasil, na honorável companhia da revista Veja, do portal UOL, da BandNews, do jornal El País et caterva (curiosamente, a Globo se negou a compactuar com a divulgação dos vazamentos criminosos da Vaza-Jato do assassino de reputações Glenn Greenwald, o podre, cuja vida pregressa demonstra que ele não é nem nunca foi flor que se cheire).

Há situações em que o feitiço vira contra o feiticeiro. As repercussões de uma investigação parlamentar contra a Lava-Jato, transmitida nacionalmente ao vivo e em cores, reforçaria o apoio da população de bem à operação. Noves fora os políticos desonestos (desculpem o pleonasmo), os empresários corruptos e a patuleia desvairada que ainda vê na mula encarcerada a quintessência da honestidade e o protótipo do governante probo, os demais brasileiros estão por conta do Bonifácio com tanta roubalheira e corrupção.

O vazamento espúrio do material criminoso entregue "graciosamente" a Verdevaldo por seus fornecedores pouco resultou além de fofocas, comprovando à saciedade que o "crime hediondo" de que foram acusados Sérgio Moro, Deltan Dallagnol e companhia foi combater a corrupção sistêmica e pôr na cadeia bandidos travestidos de executivos das maiores empreiteiras do país e políticos ímprobos de altíssimo coturno.

Por essas e outras, a CPI da Lava-Jato poderia reverter os motivos torpes que levaram seus igualmente torpes articuladores a propô-la, bem como elucidar pontos obscuros da Vaza-Jato, como quem foi o mentor intelectual dos hackeamentos, quem se beneficiou deles e quem os patrocinou. Se nem relógio trabalha de graça, muito menos os hackers de Verdevaldo e o próprio Verdevaldo.

Para concluir, mais um comentário impagável do impagável Josias de Souza:

O povo não gosta daquilo que não entende, e Bolsonaro decidiu caprichar na falta de nexo. Segundo a superstição vendida na campanha eleitoral, o capitão seria um político honestíssimo que, uma vez eleito, governaria longe de malfeitores. Como evidência de suas boas intenções, transferiu Sergio Moro da Lava-Jato para o Ministério da Justiça. Com a Polícia Federal sob seu comando, o ex-juiz faria um "juízo de consistência" sobre as denúncias, apressando providências saneadoras. Pois bem, submetido a mais uma oportunidade concreta de demonstrar que falava sério, o presidente decidiu tratar a golpes de barriga a encrenca que envolve seu líder no Senado, Fernando Bezerra, transformando em bobo o eleitor que votou nele imaginando que estava virando a página da corrupção. Virou. Só que para trás.