quarta-feira, 11 de janeiro de 2023

TERRORISMO À BRASILEIRA — O RESCALDO


Ainda sobre os atos terroristas de domingo, o ex-decano do STF Marco Aurélio Mello disse à colunista Malu Gaspar que "falhou todo mundo, começando pelo próprio STF", que descondenou Lula e sepultou a Lava-Jato ao declarar a suspeição ex-juiz Sergio Moro. Com efeito, a normalização da candidatura de Lula e sua vitória foram episódios lamentáveis de uma história política repleta de bizarrices.  

 

Na avaliação de alguns ministros das cortes superiores ouvidos pela coluna, a ação dos vândalos complicou ainda mais a situação de Bolsonaro, que já era alvo dos inquéritos das fake news e das milícias digitais — com base nos quais a AGU pediu a prisão do ex-secretário de segurança pública do Distrito Federal, Anderson Torres. Segundo o portal Metrópoles, Alexandre de Moraes não só determinou a quebra de sigilo telefônico e de dados dos vândalos como estendeu a medida a todos que tiveram contato com eles (visando descobrir quem financiou as ações terroristas). 

 

No despacho em que determinou o afastamento de Ibaneis Rocha do governo do DF, o magistrado pontou que "a democracia brasileira não irá mais suportar a ignóbil politica de apaziguamento, cujo fracasso foi amplamente demonstrado na tentativa de acordo do então primeiro-ministro inglês Neville Chamberlain com Adolf Hitler", referindo-se a uma passagem de setembro de 1938, na qual o então primeiro-ministro da Inglaterra defendia a tese do "apaziguamento" com Hitler e orquestrou uma negociação que entregou parte da Tchecoslováquia aos alemães, que tomaram o resto em março de 1939. No ano seguinte, Winston Churchill, um dos principais responsáveis pela vitória aliada contra o terror nazista, rebaixou Chamberlain a cultor da ideia de apaziguar com quem merece enfrentamento.

 

Moraes anotou em seu despacho que "a democracia brasileira não será abalada, muito menos destruída, por criminosos terroristas", mas ela já foi abalada; para impedir que seja destruída, é preciso assegurar a punição dos criminosos — todos eles, começando pelo ex-presidente.

 

Ao comparar os protestos de agora com os do passado, Bolsonaro — que, encastelado em Orlando, na Flórida (EUA), baixou ao hospital devido a dores abdominais — buscou uma falsa equivalência: nos atos do passado, a polícia estava presente para conter os invasores, o que não se viu no último domingo. 

 

Observação: Bolsonaro fez da Presidência sua Disneylândia particular e acabou fugindo para os domínios Mickey Mouse: de acordo com o jornalista Leandro Mazzini, o ex-presidente deve sair de Orlando diretamente para a Itália, de modo a minimizar o risco de ser preso no Brasil. Seus propósitos ficaram tão evidentes que o PL suspendeu o pagamento do salário de "presidente de honra do PL" até que o capitão retorne ao Brasil. Mas isso pode demorar: A Embaixada italiana no DF já recebeu pedidos de cidadania dele, de Michelle e da filha Laura — os filhos Flávio, Carlos e Eduardo não devem deixar o Brasil enquanto tiverem mandatos parlamentares.

 

Antes de embarcar para os EUA, Bolsonaro publicou no Facebook que passou dois meses buscando uma “alternativa” para impedir a posse de Lula, mas admitiu que não teve apoio para dar o golpe. Fala-se que o ex-presidente foi aconselhado a deixar o país — inclusive pelo ministro Dias Toffoli —, e que uma eventual fuga para a Itália dificultaria a execução de eventual pena, já que o acordo de Cooperação Judiciária em Matéria Penal entre o Brasil e aquele país "não compreende a execução de medidas restritivas da liberdade pessoal nem a execução de condenações". 

 

Na segunda-feira 10, a senadora Soraya Thronicke disse que conseguiu 31 assinaturas para instalar a "CPI dos Atos Antidemocráticos" — a julgar pelos resultados práticos da CPI da Pandemia... À noite, na reunião com Lula no Palácio do Planalto, governadores e representantes dos 26 estados e do DF prestaram solidariedade ao governo federal. Após determinação do ministro Alexandre de Moraes — momentaneamente promovido a herói nacional — os acampamentos bolsonaristas começaram a ser desmontados, e a AGU, sob nova direção, deve pedir o bloqueio de bens de empresas suspeitas de financiar as manifestações golpistas no DF.

 

Falando em "herói nacional", no manhã do último domingo, Serio Moro tuitou que Lula "está mais preocupado em reprimir protestos e a opinião divergente do que em apresentar resultados". Depois que o caos se instaurou em Brasília, o senador eleito pelo Paraná publicou que os manifestantes haviam passado dos limites democráticos e precisavam se retirar dos prédios. Nas redes, suas opiniões contraditórias viralizaram. Houve até quem o acusasse de conivência com os terroristas — como o ministro de Relações Institucionais — no programa Roda Viva levado ao ar na última segunda-feira, Alexandre Padilha disse que o ex-juiz e ex-ministro "passou pano" para Bolsonaro ao não repudiar de forma veemente os atos terroristas.

 

Por último, mas não menos importante, o atentado terrorista de domingo — que não foi contra Lula, mas contra a democracia (ou o "Estado Democrático de Direito", como alguns preferem dizer) — levou água ao moinho do petista. A uma, porque o primeiro escalão da República repudiou a ação dos atentados; a duas, porque Arthur Lira, que era unha e carne com Bolsonaro, disse que "os Três Poderes estão mais unidos do que nunca a favor da democracia”; a três, porque a intervenção na segurança do DF estabelece uma função ao governo que, em condições normais de temperatura e pressão, não seria sua atribuição, além de permitir a Lula associar a depredação a seu antecessor. 

 

Sobrando tempo e dando jeito, assistam ao vídeo a seguir: