Retomando o que eu dizia na postagem anterior, nada menos
que 35 partidos estão inscritos na Justiça Eleitoral, mas contam-se nos
dedos de uma só mão os que têm identidade, programas definidos e uma linha
ideológica mais ou menos clara. A maioria vive do fundo partidário, de mercadejar apoio ao presidente da República e,
em anos eleitorais, de fazer coligações espúrias para vender a peso de ouro
seus preciosos segundo de exposição no horário político obrigatório. Em vez de discutir programas que atendam às necessidades do eleitorado, eles tramam conchavos baseados na conveniência e no
oportunismo, visando aumentar sua cota nos fundos partidários.
Os deputados federais são eleitos pelo sistema
proporcional — o que propicia situações em que nem sempre o candidato
mais votado é o que preenche a vaga, ou casos em que candidatos com
poucos votos conseguem um mandato na Câmara. Ao votar num candidato, o eleitor vota também no seu partido ou
coligação, e a apuração leva em conta o quociente
eleitoral — isto é, a divisão do número de votos válidos para o cargo pelo
número de cadeiras a serem preenchidas, que, na Câmara, varia de 8 a 70, conforme a população dos estados — e o quociente partidário — número de votos
obtidos pelo partido ou coligação dividido pelo quociente eleitoral. O resultado
é o número de cadeiras a que o partido ou aliança terá direito a preencher.
Os senadores também são eleitos pelo voto proporcional, mas são em menor número (81 senadores contra 512 deputados) e têm mandato de 8 anos que terminam
em anos “desencontrados”. Neste ano, 54 senadores (2/3 do total) terão de se
reeleger ou largar o osso; já a terça parte restante só terá de se preocupar com
isso em 2022 (volto a esse assunto mais adiante).
Para driblar o fim das doações empresariais — que foram proibidas pelo STF
em 2015 —, o Legislativo aprovou no
ano passado a criação do Fundo Especial
de Financiamento de Campanha,
que distribuirá mais de R$ 1,7 bilhão
de dinheiro público (seu, meu, nosso) para os partidos. Diferentemente do fundo eleitoral — de R$ 888 milhões, que serve para garantir
o financiamento dos partidos, mas também pode ser usado para financiar
campanhas nestas eleições —, o dinheiro desse "fundão" precisa ser restituído aos cofres públicos se não for integralmente utilizado. A
questão é que os partidos podem pode canalizar sua cota-parte como bem
entenderem, o que fortalece seus “caciques”
e aumenta as chances de elegerem uma bancada grande no Congresso, o que lhes garante mais dinheiro público para sustentar a legenda e financiar as próximas eleições.
Ao reduzir o tempo de campanha para apenas um mês e meio
(antigamente eram três), criar esse fundo e concentrar o dinheiro na mão dos
caciques, os parlamentares facilitaram sua permanência no poder, já que as
mudanças favorecem quem tem mandato e estrutura montada — ou seja,
os políticos tradicionais. Ainda que
uma boa parte desses políticos tenha sofrido desgastes com as investigações da
Lava-Jato, seus nomes têm um mercado eleitoral mais ou menos cativo e podem,
pelo mecanismo de transferência de votos, puxar correligionários e dificultar a entrada de novos parlamentares — que aparecem apenas às vésperas da eleição,
quando é muito difícil criar esse capital para enfrentar candidatos conhecidos.
Lamentavelmente, a importância da sucessão presidencial leva
uma parte considerável da população — aí incluídos eleitores politizados e
esclarecidos, que têm acesso à informação e sabem fazer uso dela — a dar menor importância aos candidatos à Câmara
Federal e ao Senado, até porque,
como vimos, vota-se de uma tacada só em presidente da República e vice, senadores,
deputado federal, governadores e deputado estadual — senadores, no plural, porque, também como
vimos, o mandato desses parlamentares é de oito ano e as eleições são
realizadas a cada quatro; quando a renovação é de 1/3 das cadeiras, vota-se num
único candidato, e quando é de 2/3, como neste ano, vota-se em dois candidatos. Esse
esquema estapafúrdio foi estabelecido pela Constituição
de 1946, e há um projeto no Senado
para alterá-lo, mas o texto ainda está em análise na CCJ e, se aprovado, passará a valer somente a partir das eleições de 2026.
Resta dizer que a “qualidade” dos nossos congressistas não
difere muito da dos políticos em geral. Às vésperas do (pouco merecido) recesso
de meio de ano, suas excelências aprovaram medidas que autorizam o aumento
salarial para o funcionalismo público, isenção de impostos transportadoras,
benefícios fiscais para empresas de refrigerantes e montadoras, enfim, uma pauta-bomba que dificultará
sobremaneira o trabalho do próximo presidente da República, seja ele quem for. Estima-se que só o aumento do funcionalismo terá um
impacto de R$ 6 bilhões — se o benefício for estendido aos militares, o
valor subirá para R$ 11 bilhões. A atuação dos maus políticos dificulta
o cumprimento da meta fiscal para o próximo ano, que já prevê um déficit de R$
139 bilhões (de acordo com o Valor, tramitam no Congresso 42 projetos com impacto fiscal).
De acordo
com levantamento feito pelo Estado,
mais da metade dos deputados federais tem histórico de propostas que
favorecem servidores públicos, embora a maioria dos brasileiros que
ainda tem emprego trabalhe no setor privado. Daí porque o eleitor precisa
estar atento aos interesses que seu candidato vai defender no Congresso. Com políticos perdulários, pagamos mais impostos para bancar gastos que privilegiam poucos e travam a
retomada do crescimento econômico.
Embora se diga que não precisamos de um
salvador da pátria, basta olharmos para o Congresso para ver que precisamos,
sim, e de muitos.
Continua no próximo capítulo.
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