“O Brasil é dirigido
por um bando de maluco” (sic), afirmou Lula em recente entrevista a dois veículos de comunicação
“cumpanhêros”. “Pelo menos não é um
bando de cachaceiros, né?”, replicou Bolsonaro, que em seguida emendou: “Olha eu acho que o Lula, primeiro, não deveria falar. Falou besteira.
Maluco? Quem era o time dele? Grande parte está preso ou está sendo processado.
Tinha um plano de poder onde, nos finalmentes, nos roubaria a nossa liberdade,
ok? Eu acho um equívoco, um erro da Justiça ter dado direito a dar uma
entrevista. Presidiário tem que cumprir sua pena”. O capitão já disse
muita bobagem nestes cento e poucos dias de governo, mas esse comentário o
redimiu, como esclarecer uma plateia eivada de esquerdopatas que “Lula está preso, babacas!” fez subir no
meu conceito o político sobralense Cid
Gomes, irmão candidato derrotado Ciro
Gomes, que é “cearense” de Pindamonhangaba (para quem não percebeu minha
ironia, Pindamonhangaba é um munício paulista).
Já que o nome do criminoso mais emblemático desta banânia
veio à baila, o togado supremo Ricardo
Lewandowski, sempre disposto a prestar vassalagem àquele que o nomeou para
o ápice da carreira, foi quem autorizou o petralha a dar entrevista aos
jornais FOLHA DE S.PAULO e EL PAÍS. Também foi ele, segundo José Nêumanne, que tornou presencial o julgamento de um habeas corpus impetrado em favor de
seu ex-patrão, depois que a 5ª Turma do STJ reduziu sua pena de 12 anos e 1 mês para 8 anos, 10 meses
e 20 dias. Outras fontes apontam Gilmar
Mendes como mentor intelectual de mais essa maracutaia perversa, mas
isso é de somenos: o que importa mesmo é o objetivo, qual seja aumentar as
chances de o recurso de Lula ser
acolhido, já que no plenário virtual a rejeição era quase certa. Aliás, outro
pedido similar, protocolado por 29
advogados piauienses sem qualquer relação com a defesa de Lula, foi negado na última sexta-feira
pelo ministro Edson Fachin. Não
custa lembrar que o nordeste é
tradicionalmente pró-Lula e que
o Piauí ocupa o terceiro lugar no ranking
dos estados mais miseráveis deste
país, atrás somente do Maranhão (feudo
do clã Sarney) e de Alagoas (feudo dos Collor de Mello e dos Calheiros).
Falando nas peculiaridades do cenário político tupiniquim, VEJA desta semana dá conta de que
toda quarta-feira às 8 horas o plenário da Câmara dos Deputados se converte em
igreja. O culto de 27 de março, por exemplo, começou com aleluias e glórias ao
senhor, enquanto a deputada e cantora gospel capixaba Lauriete Rodrigues, ex-mulher do ex-senador Magno Malta, puxava o louvor com seu
violão. Na sequência, o deputado e pastor pernambucano Francisco Eurico da Silva, capelão da
bancada evangélica, fez a pregação do dia, antes de ter início a votação para a
escolha do novo líder da Frente
Parlamentar Evangélica, composta hoje de 120 deputados ativos — um recorde
desde a sua fundação, em 2002, e maior, muito maior, do que qualquer partido
político no Congresso Nacional. Ainda segundo a reportagem, não há nem nunca
houve votação para o posto de líder da frente religiosa: após discussões por
vezes ásperas, o deputado amazonense Silas
Câmara foi sagrado por aclamação. A despeito de diferenças e divisões
na frente, a unidade de ação da bancada, nesta legislatura, vem amparada por
uma convicção renovada na força política que o eleitorado evangélico demonstrou
ao sustentar a eleição de Jair
Bolsonaro — que vem dando repetidas mostras de alinhamento com o setor —
dias atrás, ele matou no nascedouro a ideia de um novo imposto que incidiria
também sobre as igrejas.
Cortejados pelos mais diversos partidos, os evangélicos têm
ambições que não raro transcendem as vantagens tributárias, alvarás de templos
e concessões de rádio. Silas Câmara surgiu
como um nome de compromisso entre candidatos de ramos rivais da Assembleia de Deus, e foi por isso que
ganhou, deixando claro que a lealdade desses deputados não está com caciques
políticos, mas com pastores e bispos. Não é de hoje que se nota o interesse desses religiosos pela
política partidária. Em meados da década de 1980, ávidos por recursos públicos,
barganhas e alianças com candidatos e partidos e governantes, eles participaram
dos debates da Assembleia Nacional Constituinte e ajudaram Sarney a ampliar o mandato de
quatro para cinco anos em troca de concessões de emissoras e rádio e verbas
públicas; no segundo turno das eleições de 1989, apoiaram Collor, e de lá para cá a
instrumentalização recíproca entre esses grupos tem se intensificado, como
compravam a transformação de templos em comitês eleitorais e a fundação de
partidos por igrejas.
Para quem faltou às aulas de história, vale lembrar que a Igreja
foi a instituição mais poderosa da idade Média — quando a riqueza era medida
pela quantidade de terras, o Papa e o cardinalato controlavam quase dois terços
das terras da Europa ocidental. Seu poder da no mundo medieval é exaltado pelas
grandes catedrais construídas nos séculos XII e XIII em várias regiões da
Europa, todas ricamente decoradas com ouro maciço e pedras preciosas em
profusão. Ainda assim, os batinas falam em caridade e em voto de pobreza, como
que escarnecendo dos fiéis, que contribuem para multiplicar a riqueza da
organização com o pagamento do dízimo e outros óbolos compulsórios,
enquanto quase metade da população mundial vive
abaixo da linha de pobreza.
Fechando o foco para nossa republiqueta de bananas, até o
fim do Império o catolicismo era a religião oficial do Estado e tutelada por
ele, o que limitava sua liberdade de ação. Com a constituição republicana, ela
passou a ter um poder imenso. Para a Constituinte de 1934, foi criada a Liga
Eleitoral Católica, que elegeu diversos representantes da própria igreja — que,
por seu turno, legislaram em causa própria para conseguir uma série de
privilégios. Em essência, esse descalabro foi preservado pela malfadada
Constituição Cidadã, ainda que com outra formulação. Nas últimas décadas, sobretudo
a partir dos anos 1980, o pluralismo religioso passou a vigorar de fato no
Brasil, e a Igreja Católica se viu obrigada a competir no mercado religioso.
Mas isso é outra conversa.
A lei proíbe as igrejas de dar apoio eleitoral, mas a Universal apoiou Collor para presidente em
1989, Marcelo Crivella e Celso Russomano nas eleições para
prefeito do Rio e de Sampa, respectivamente, em 2016, sem falar em um
sem-número de candidatos a cargos legislativos. Não é de hoje que ela funciona
como comitê, conforme ficou claro nas últimas eleições
presidenciais.
Pode-se mesmo afirmar que Bolsonaro deve sua vitória mais ao apoio dos evangélicos do que a
sua postura antipetista. Declaradamente católico, o capitão é o primeiro
presidente eleito com a retórica evangélica pentecostal. Antes dele, houve dois
presidentes protestantes — Café Filho
(presbiteriano) e Ernesto Geisel
(luterano), mas nenhum deles chegou ao poder pelo voto direto e tampouco falava
de religião. Bolsonaro há tempos
cortejava os evangélicos com gestos de forte simbolismo; em 2016, por exemplo,
foi batizado nas águas do Rio Jordão pelo pastor (e presidente nacional do PSC)
Everaldo, da Assembleia de Deus.
Sendo católico e muito identificado com os evangélicos, o presidente conseguiu
unir os dois polos; se fosse só evangélico, talvez não tivesse conseguido
tantos votos dos católicos, e vice-versa.
Os evangélicos frequentam mais seus templos do que os
fiéis de outras religiões, chegam a doar seis vezes mais do que os católicos em
dízimo e costumam buscar orientação de seus líderes para temas cotidianos, aí
incluída a política. Esse manancial não passou despercebido pela oposição, mas o
o fato é que a esquerda não soube explorá-lo. Gleisi “Crazy” Hoffmann, presidente nacional do PT, no mês passado usou uma linguagem
marcadamente religiosa para criticar as propostas de Paulo Guedes ao dizer que a reforma previdenciária era um “pecado”
e que Jesus foi crucificado porque “confrontou o templo, um sistema de
dominação e exploração dos pobres”, mas suas declarações repercutiram mal entre
pentecostais e neopentecostais.
Diz-se que Deus, em sua infinita sabedoria, criou o amor e a
fé, e o diabo, invejoso, o casamento e as religiões. Há muito que a exploração
da fé se tornou um negócio como outro qualquer. Balzac dizia que “por trás de
toda grande fortuna há sempre um crime”, e no Vaticano a coisa parece não
ser muito diferente. Basta relembrar a morte súbita de João Paulo I em 1978, 33 dias após
ter sido escolhido para ocupar o Trono de Pedro, que vagou com a morte de Paulo VI. Esse episódio foi retratado
na parte final da trilogia de “O
Poderoso Chefão”, na qual Francis
Ford Coppola capturou magistralmente a essência da Máfia Siciliana descrita no
imperdível best seller do escritor ítalo americano Mario Gianluigi Puzo.
Em tempo: Se você
acha que a história do chazinho envenenado não passa de teoria da conspiração,
lembre-se: A VERDADE NÃO ESTÁ NEM
AÍ PARA O QUE VOCÊ ACREDITA.