DO CONGRESSO A
PODRIDÃO AFLORA,
ENQUANTO NAS RUAS O
POVO CHORA.
DE COMO ESTÁ A
SITUAÇÃO NÃO SE GOSTA,
MAS NINGUÉM
FAZ NADA PRA MUDAR ESSA BOSTA.
Essa quadrinha (de minha humilde autoria) resume o cenário
político nacional, mas míseras quatro linhas não justificam uma postagem. Vejamos então o que diz Roberto Pompeu de Toledo em mais um texto lapidar, publicado na
edição desta semana da revista Veja, mas não sem antes destacar que:
Em seu discurso na ONU, nosso intrépido presidente passou cerca de 30 minutos reafirmando sua oposição a iniciativas internacionais que se oponham à soberania brasileira na Amazônia e rechaçando “tentativas de instrumentalizar a questão ambiental e políticas indigenistas” em prol de interesses externos. Ele aproveitou também para criticar a imprensa internacional pela publicação do que classificou como informações “sensacionalistas” sobre os incêndios na floresta e disse que é “falácia” afirmar que Amazônia é patrimônio da humanidade.
Aqui entre nós, pode-se gostar ou não do capitão, mas não dá para discordar de muita coisa que ele disse. Talvez pudesse ter explorado melhor a questão ambiental e deixado as críticas ácidas a Cuba e Venezuela para outra oportunidade, mas Bolsonaro é Bolsonaro e não vai mudar sua natureza ao sabor de opiniões deste ou daquele analista político, governo estrangeiro ou seja lá o que for. O presidente francês rebateu as críticas do brasileiro, mas eu estou sem paciência e disposição para tomar partido em bate-boca de cortiço, de modo que faço minhas as palavras de Guilherme Fiuza:
O discurso de Bolsonaro na ONU decepcionou a intelectualidade mundial. Não teve a genialidade da Dilma, a honestidade do Lula, o biquinho do Macron, os suspiros da Bachelet, não salvou as girafas da Amazônia, não demitiu Sergio Moro e ainda disse que a verdade liberta. Não dá.
Vamos em frente.
Em seu discurso na ONU, nosso intrépido presidente passou cerca de 30 minutos reafirmando sua oposição a iniciativas internacionais que se oponham à soberania brasileira na Amazônia e rechaçando “tentativas de instrumentalizar a questão ambiental e políticas indigenistas” em prol de interesses externos. Ele aproveitou também para criticar a imprensa internacional pela publicação do que classificou como informações “sensacionalistas” sobre os incêndios na floresta e disse que é “falácia” afirmar que Amazônia é patrimônio da humanidade.
Aqui entre nós, pode-se gostar ou não do capitão, mas não dá para discordar de muita coisa que ele disse. Talvez pudesse ter explorado melhor a questão ambiental e deixado as críticas ácidas a Cuba e Venezuela para outra oportunidade, mas Bolsonaro é Bolsonaro e não vai mudar sua natureza ao sabor de opiniões deste ou daquele analista político, governo estrangeiro ou seja lá o que for. O presidente francês rebateu as críticas do brasileiro, mas eu estou sem paciência e disposição para tomar partido em bate-boca de cortiço, de modo que faço minhas as palavras de Guilherme Fiuza:
O discurso de Bolsonaro na ONU decepcionou a intelectualidade mundial. Não teve a genialidade da Dilma, a honestidade do Lula, o biquinho do Macron, os suspiros da Bachelet, não salvou as girafas da Amazônia, não demitiu Sergio Moro e ainda disse que a verdade liberta. Não dá.
Vamos em frente.
ESTADISTA:
PRECISA-SE. MAS TERÁ EFEITO NUM PÚBLICO ENFEITIÇADO POR RASGOS
ANTIDEMOCRÁTICOS?
Bem agora que começávamos a considerar Rodrigo Maia uma âncora de competência e sensatez nestes tempos sombrios,
talvez até uma esperança de estadista na aridez da quadra política brasileira,
ele conduz a Câmara na aprovação de um projeto que contém safadas modificações
na lei eleitoral. Entre outras belezas, sob o ponto de vista dos políticos, o
projeto afrouxa os controles sobre o uso dos fundos partidários e permite seu
emprego até para pagar a advogados de envolvidos em corrupção.
Maia teve atuação
decisiva na aprovação da reforma da Previdência e destacou-se pela altivez em
face das estripulias do governo Bolsonaro.
Mas sua atuação no projeto, aprovado pela Câmara na surdina no dia 3, derrubado
pelo Senado na última terça, 17, e teimosamente ressuscitado pela Câmara, ainda
que com modificações, no dia seguinte, ameaça fazê-lo retroagir da condição de
esperança de estadista para exemplo da rapidez com que um político pode
malversar o capital de prestígio acumulado.
Estadista é o político que se alimenta do espírito da
história e, ao persegui-lo, põe-se acima dos partidos e das facções. Tancredo Neves foi um, com atuação
determinante em dois momentos críticos da história brasileira — a renúncia de Jânio e a transição da ditadura militar
para a democracia. Também demonstraram sê-lo, em momentos de teste, Ulysses Guimarães e Teotônio Vilela. Talvez seja demais exigir
personagens equivalentes numa era de Bolsonaros
e Trumps. O momento é dos bufões,
especialistas em performances em que a graça está na ignorância, na mentira e
no insulto.
Rodrigo Maia
vinha se constituindo em exceção pela rara virtude, na política de hoje, do
discurso com começo, meio e fim. A aprovação do projeto eleitoral expôs-lhe o
rabo preso com um tipo de política — mesquinha, subterrânea, mafiosa,
tediosamente repetitiva — que faz o sucesso dos bufões nas urnas, ao se
arvorarem em seus inimigos.
Sendo a bufonaria um fenômeno mundial, não espanta que os
bufões compartilhem uma alma comum. Matteo
Salvini, agora afastado do governo por uma manobra parlamentar, mas ainda o
político mais popular da Itália, desafia o Estado laico como fazem Bolsonaro e seus ministros mais
queridos. No momento mesmo em que, na Câmara dos Deputados, ainda como homem
forte do governo, ouvia o primeiro-ministro Giuseppe Conte repreendê-lo pelo uso dos símbolos religiosos, puxou
um rosário do bolso e, velhaco como são os canastrões da farsa, beijou-o. Salvini, parceiro da família Bolsonaro, defendia até outro dia a
causa da independência da Itália do Norte e entoava canção em que os
napolitanos eram descritos como tão sujos que até os cães os evitam.
Bolsonaro, em
tecla similar, queixou-se de "governadores de paraíba" — o desprezo,
ao contrário do que depois quis dar a entender, não era aos governadores, mas
aos governados, meros "paraíbas". Trump, que lhes dobra as apostas, já chamou os mexicanos de
estupradores, países da América Central de "shithole countries" (países de merda), e conclamou
quatro deputadas oposicionistas de origem latino-americana, árabe e africana a
voltar a seus países "quebrados e infestados de crimes". (Eduardo Bolsonaro e o nominal chanceler
Ernesto Araújo curvam-se ao
presidente americano sem se dar conta de que o Brasil e os brasileiros ocupam,
em sua mente racista, o mesmo escaninho.) À trupe se juntou, nos últimos dias,
o "brexista" Boris Johnson,
cuja bufonaria vai do cabelo em desvario à má-criação de esticar as pernas
sobre a mesa num encontro com o francês Macron.
Estadista: precisa-se. Mas terá ele algum efeito junto a um
público enfeitiçado por rasgos antidemocráticos e retórica escatológica? À
falta de estadista na política, o papel tem sido representado no Brasil pelo
decano do Supremo, Celso de Mello.
Na despedida da procuradora-geral Raquel
Dodge, que será substituída por um candidato a soldado do bolsonarismo, ele
afirmou: "O Ministério Público não
serve a governos, não serve a pessoas, não serve a grupos ideológicos, não se
subordina a partidos políticos. O Ministério Público não se curva à onipotência
do poder, não importa a elevadíssima posição que autoridades possam ostentar na
hierarquia da República".
O estadista apresenta dois defeitos, ao gosto em voga: é
sereno e é racional. Costuma-se dizer que vivemos a "era do
espetáculo". Fomos além, na verdade. Vivemos a era do estardalhaço — ideal
para o triunfo dos bufões.