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segunda-feira, 20 de outubro de 2025

O TEMPO PERGUNTOU AO TEMPO QUANTO TEMPO O TEMPO TEM… (3ª PARTE)

THE UNIVERSE REMEMBERS EVERYTHING 


A maioria de nós acredita que o passado se foi, que nem mesmo Deus pode fazer com que o que foi não tenha sido. O futuro, por sua vez, é tido como incerto, embora uma parte dele dependa de leis naturais — daí ser possível prever a posição dos astros em qualquer data futura, o dia e a hora do próximo eclipse lunar e a maioria dos efeitos de uma reação física ou química.


Observação: Conforme comentou meu velho amigo Edward no primeiro capítulo desta sequência, a concepção de tempo varia profundamente entre as culturas. O povo Aymara, do altiplano andino, possui uma visão única: para eles, o passado (nayra, que significa "fronte" e "olho") está à frente, porque é conhecido e visível, enquanto o futuro (qhipa, "atrás") está às costas, por ser desconhecido e invisível. Já entre alguns povos indígenas do Brasil, como os Munduruku e os Pirahã, a experiência temporal é distinta. Sua concepção não é espacial como a dos Aymara, mas focada em um presente contínuo e expansivo. Eles valorizam intensamente a memória ancestral e o mundo imediato, vivendo de forma plena o momento, sem a mesma abstração linear de futuro que caracteriza o pensamento ocidental.

Ainda não conseguimos prever o que acontecerá na semana que vem — não porque o futuro seja intrinsecamente incerto, mas porque envolve variáveis com as quais nem os computadores mais poderosos conseguem lidar. Mas conhecer é prever, e isso torna possíveis todas as técnicas, da máquina a vapor ao computador.


CONTINUA DEPOIS DA POLÍTICA

A intentona bolsonarista não prosperou devido ao amadorismo acachapante do ex-presidente e seus capangas. A tramóia urdida pelo filho do pai nos EUA frutificou, mas não impediu a condenação do chefe e demais integrantes do núcleo crucial do golpe. Para piorar a situação dessa caterva, a “química que rolou” com a calopsita alaranjada reverteu a tendência de queda do molusco eneadáctilo, que por ora é tido como imbatível em 2026, independente de quem for o adversário.
Um presidente em viés de alta nas pesquisas não precisa calçar mocassim, mas tampouco deve exagerar no tamanho do salto. Discursando para uma plateia companheira, o xamã petista disse que não rolou apenas uma química entre eles, "pintou uma indústria petroquímica." Na mesma em que ele destilou confiança no Rio de Janeiro, o representante comercial americano Jamieson Greer e o secretário de Tesouro Scott Bessent disseram, numa entrevista em Washington, que o tarifaço contra o Brasil se deveu a afronta ao "estado de direito e aos direitos humanos", "censura" a big techs e "detenção ilegal" de americanos no Brasil.
O encontro de Mauro Vieira com o chefe da diplomacia americana Marco Rubio pavimentou o caminho para uma conversa entre Lula e Trump. A chance de melhoria das relações bilaterais é grande, pois pior do que está é difícil ficar. Mas nada justifica a exacerbação do otimismo.
O último político brasileiro que se entusiasmou com Trump foi Bolsonaro. Quando seu ídolo foi coroado pela segunda vez, o futuro hóspede da Papuda exultou: "Estou animado. Não vou nem tomar mais Viagra". Mas não demorou a se dar conta de que quem pula junto com Trump dá um salto mortal.
Lula olha para Trump do alto de um salto agulha de 15 cm, mas faria um bem a si mesmo se descesse para um discreto, compacto e seguro salto Anabela. Além disso, para quem está na bica de completar 80 anos, parecer sensual deveria ser a última das preocupações.

Não temos como prever tudo, mas sabemos quase tudo que é preciso para prever a evolução física do mundo, mesmo porque as leis da natureza são constantes. Na escala microfísica, o determinismo é universal; na escala física, o futuro é previsível, mas a conduta humana não obedece às leis universais.


Quando se trata do futuro, não estamos apenas no incerto, no imprevisível, mas também no indeterminado. Alguns futuros são contingentes. Talvez um dia possamos prever tudo do cosmos, ainda que não consigamos predizer o comportamento de nosso melhor amigo — ou mesmo o nosso.


O tempo nos apresenta três graus de ser: o superior é o passado (o que não pode não ser); o  intermediário é o presente (o que é, simplesmente); e o inferior é o futuro (que pode ser ou não ser). O presente é real, o passado, real e necessário, e o futuro, apenas possível — ou a diversidade dos possíveis, já que se trata menos de um ser do que de uma potência.


No que se refere ao tempo, talvez sejamos vítimas de uma confusão — frequente e quase inevitável. Como bem observou Santo Agostinho, ˝se ninguém me pergunta, eu sei, mas se me perguntam e quero explicar, já não sei mais˝. Temos apenas um conhecimento intuitivo, não conceitual, e esse conhecimento intuitivo não é direto, já que não temos acesso ao próprio tempo, apenas às coisas que estão no tempo e mudam com o tempo. 


Percebemos a mudança, não o tempo. É o que já assinalava David Hume: ˝Toda vez que não temos percepções sucessivas, não temos noção do tempo, mesmo se houvesse uma sucessão real nos objetos˝. O tempo não pode fazer sua aparição nem completamente só, nem acompanhado de um objeto constante e invariável, apenas se deixa descobrir por alguma sucessão perceptível de objetos mutáveis. O tempo passou porque agora não chove mais, porque eu dormi, porque o ponteiro do relógio se moveu, e por aí vai. É a razão pela qual temos a impressão — enganadora — de que, se as coisas parassem de mudar, o próprio tempo pararia. 


Em versos que todos os escolares franceses conhecem, o poeta Lamartine escreveu: ˝Ô temps! Suspends ton vol, et vous, heures propices. Suspendez votre cours, laissez-nous savourer les rapides delices des plus beaux de nos jours.˝ Mas o filósofo poderia responder ao poeta: “Que o tempo suspenda seu voo, admito! Mas… por quanto tempo?


Como todos nós, o bardo francês confunde tempo com acontecimentos temporais. Mesmo que pudéssemos deter o curso dos acontecimentos, mesmo que as coisas pudessem se manter numa espécie de presente perpétuo, mesmo que o devir se detivesse, o tempo propriamente dito não se deteria. Talvez o futuro fosse semelhante ao presente, mas o tempo continuaria seu curso.


Os poetas não são os únicos a confundir a forma do tempo com seu conteúdo. O mesmo acontece com sociólogos, psicólogos e filósofos. Alguns sociólogos falam, por exemplo, em aceleração do tempo, quando na verdade há cada vez mais ações ou acontecimentos no mesmo lapso de tempo — ou talvez essa seja a impressão que temos, já que o tempo é a medida pela qual expressamos velocidade, e ele mesmo não pode ter velocidade — segue sempre segundo após segundo, por definição.


Em última análise, falar em velocidade do tempo é uma incoerência, já que pressupõe exprimir a variação do tempo em relação a si mesmo. Por outro lado, as equações relativísticas de Einstein demonstraram que o tempo é relativo: ele passa mais devagar para um observador em movimento em relação a outro, sem que exista um referencial privilegiado. Isso já foi detalhado em outras postagens, mas foge ao escopo desta abordagem.


Alguns historiadores afirmam que os gregos tinham uma concepção cíclica do tempo. É fato que eles — e outros povos antigos — previam o movimento dos astros, o retorno das estações e a repetição dos mesmos acontecimentos a intervalos regulares. Mas o fato de alguns acontecimentos serem cíclicos prova apenas que o tempo não o é. Se fosse, os eventos se confundiriam com seus precedentes. Afirmar que o mesmo acontecimento se repete a intervalos regulares, como a volta completa de um círculo, implica admitir que o mesmo momento ocorre em momentos diferentes, o que é contraditório; logo, esposar a tese do eterno retorno é tomar a repetição de eventos pela circularidade do próprio tempo.


Podemos dizer que o porvir é a parte do tempo que ainda não é presente, e que o futuro continua sendo futuro, ou seja, uma dimensão essencial e constitutiva da temporalidade tão real quanto o presente, mas que ainda não é, a parte do tempo que nunca atingimos, mas que representamos sempre. Essa distinção do tempo e de seu conteúdo nos oferece um meio indireto de definir o tempo: se suprimirmos tudo o que existe à nossa volta, restam o espaço que esses corpos ocupavam e tempo no qual ocorriam todos os acontecimentos. 


Nesse contexto, o espaço aparece como uma espécie de forma vazia, na qual se podem introduzir objetos tridimensionais. Se retirarmos o espaço, resta somente o tempo no qual e pelo qual pensamos, que aparece como uma espécie de forma vazia na qual se podem introduzir processos de uma dimensão: as mudanças que acontecem às coisas sensíveis (os corpos extensos no espaço) e aos pensamentos, o nosso. 


Em última análise, isso ilustra a distinção entre a forma do tempo e seu conteúdo. Os acontecimentos são sempre distintos, mas o tempo permanece o mesmo — como na concepção de Newton, segundo a qual ˝o tempo absoluto, verdadeiro e matemático, sem relação a nada de exterior, escoa uniformemente e se chama duração˝.


Essa é também a concepção de Kant, para quem o tempo era uma forma pura pela qual percebemos as coisas exteriores e nossos próprios pensamentos, um quadro a priori no qual se instalam a posteriori todos os fenômenos percebidos, estejam eles em nós ou fora de nós. Mas talvez o tempo não seja uma forma sem conteúdo: o que seria um tempo vazio, uma duração sem nada que dure? Absolutamente nada. Segundo a concepção de Leibniz, oposta nesse ponto à de Newton, sem acontecimentos não haveria tempo.. 


O tempo não é uma substância que existe por si mesma e que os diversos acontecimentos que nele se desenrolam, reais ou possíveis, vêm a preencher, e sim uma relação entre os acontecimentos existentes. E o mesmo se dá com o espaço, com a diferença de que o espaço e o tempo não definem o mesmo tipo de relações entre as coisas. 


O espaço é uma ordem de coexistências na qual os existentes que são compatíveis entre si podem estar, um em relação ao outro, numa relação espacial. Já o tempo é uma ordem de sucessão onde os existentes incompatíveis só podem coexistir sucessivamente, um antes do outro ou um depois do outro, mas não simultaneamente. Em suma, o tempo nada mais é que essa relação de incompatibilidade entre estados do mundo igualmente existentes.


Vale reforçar que isso não altera o que vimos no começo deste ensaio. O tempo pode existir sem os acontecimentos (como sustentou Newton) ou não existir independentemente deles (como postulou Leibniz). Mas é importante não confundir as propriedades do tempo em si com as dos acontecimentos temporais. Dado que o tempo é constante, unidimensional, unidirecional e imutável, o futuro como dimensão do tempo é sempre o mesmo.


Por outro lado — e tudo sempre tem mais que um lado num universo quadridimensional — não se deve confundir o tempo com seu conteúdo nem com a maneira como ele se nos apresenta. Mas isso é assunto para o capítulo final.


Continua…

quarta-feira, 29 de outubro de 2025

O TEMPO PERGUNTOU AO TEMPO QUANTO TEMPO O TEMPO TEM… (FINAL)

WE ARE ALL TIME TRAVELERS.

Se o futuro é uma possibilidade e o passado é uma lembrança, então o único estado de coisas que realmente existe é o presente. Mas como afirmar isso se a própria existência do tempo não é uma unanimidade entre os filósofos e cientistas?

Na visão do cosmólogo Carlo Rovelli, o tempo não é uma e linha reta pela qual as coisas fluem do passado para o futuro, mas uma variável resultante do aumento da entropia do cosmos ao longo dos últimos 13,8 bilhões de anos. 

Segundo o metafísico J. M. E. McTaggart, é possível atestar a inexistência do tempo usando somente o pensamento lógico e um baralho de cartas

Grande Pirâmide de Gizé foi erguida no presente do faraó Queóps, que para nós significa 4,5 mil anos atrás. Se a realidade depende do ponto de vista do observador, então o presente não é uma data fixa no calendário, e um ponto de vista objetivo deve excluir o presente, o passado e o futuro. Esse mesmo raciocínio se aplica quando alguém diz "eu" — se esse pronome designa sempre a pessoa que fala, então ele não existe objetivamente, da mesma forma que "aqui" e "lá".

Se, assim como o espaço, que compreende apenas relações entre lugares (afastamento/proximidade), o tempo comporta somente relações entre acontecimentos mensuráveis (anterioridade/posterioridade), uma descrição objetiva do mundo não comporta presente, passado e futuro.

CONTINUA DEPOIS DA POLÍTICA

Lula já se definiu como "metamorfose ambulante" — talvez “metástase fosse uma definição mais adequada, mas isso é outra conversa. 

Na última quinta-feira, discursando num evento do PCdoB, o molusco ensinou que a esquerda precisa "acreditar que o deputado é importante", lançando uma profusão de candidatos ao Legislativo. Passados apenas quatro dias, fez exatamente o oposto do que lecionou ao nomear Boulos para um ministério palaciano.

Na prática, ele condenou o deputado a permanecer em seu governo até o final, tirando das urnas o maior puxador de votos da esquerda — que chegou à Câmara com pouco mais de 1 milhão de votos — 55 mil a mais que Carla Zambelli e 259 mil a mais que Eduardo Bolsonaro. 

No discurso da semana passada, Lula ensinou que PT, PCdoB, PDT, PSB e também o PSOL, partido de

Em tese, o macróbio não precisaria puxar o tapete do PSOL para usufruir das conexões sociais de Boulos. Sua incorporação à caravana da reeleição não estava condicionada à obtenção de uma poltrona de ministro, mas o gesto sinalizou para os partidos aliados que ele continua cultivando um tipo muito peculiar de parceria: “todos no mesmo barco e cada um por si”.

Se, à luz da Teoria da Relatividade, dois acontecimentos simultâneos deixam de sê-lo quando um observador está parado e o outro, em movimento, então nem o presente nem o futuro são absolutos, pois variam de acordo com a posição do observador. Uma mesa ou uma cadeira são reais do ponto de vista físico, já que são objetos formados por átomos, elétrons e quarks. Mas nem tudo o que existe no mundo segue as leis da física clássica. 

Mesmo que não existam no mundo real, o passado e o futuro nos parecem tão reais quanto a mesa ou a cadeira, já que o presente delimita o que deixou de ser real de um lado (o passado) e o que ainda não é real (o futuro). No entanto, a metáfora do “rio do tempo” (vide capítulos anteriores) rejeita o paralelismo entre o "aqui" e o "presente", posto que este não pode ser subjetivo no mesmo sentido que aquele. 

Quando estamos aqui e vamos a algum lugar, esse lugar passa a ser nosso "aqui", e o lugar de onde saímos, nosso "lá". Mas isso não se aplica ao "agora", já que o presente nos é imposto, o passado está fora do nosso alcance. Já avançar rumo ao que consideramos como futuro não só é possível como necessário, mas não depende de nós, e sim da realidade do tempo.

Explicando melhor: a decisão de ir a um lugar no espaço depende de cada um de nós, mas é o tempo que determina o que acontece antes e depois, organizando os fatos de forma irreversível. Isso significa que podemos nos mover pelo espaço, mas não podemos controlar o fato de o presente acontecer agora e depois virar passado, que acontece conforme a ordem do tempo. É por isso que temos a impressão de que o tempo se desloca em relação a nós, de que ele está sempre em movimento, queiramos ou não.

Como vimos nos capítulos anteriores, as metáforas do rio do tempo e do trem do tempo têm cada qual seus defensores e detratores. Os partidários da primeira acreditam no presente, e os partidários da segunda acham que o presente é apenas uma ilusão subjetiva. Mas não dá para dizer quem está certo: por um lado, o que acontece agora nunca aconteceu e, portanto, é objetivamente real; por outro, dizemos que uma coisa acontece agora porque somos contemporâneos dela, e o que se nos apresenta como passado ou futuro é tão objetivamente real quanto o que é presente para nós.

Na imagem do trem do tempo os acontecimentos estão ligados entre si por relações imutáveis de simultaneidade, anterioridade e posterioridade, mas a descrição realista do mundo é inexoravelmente atemporal. O Natal de 2024 aconteceu antes do Réveillon de 2025, que precedeu ao Carnaval, à Páscoa e ao Dia das Crianças. Isso era verdadeiro no passado, é verdadeiro agora e continuará sendo verdadeiro para sempre — tão atemporalmente verdadeiro quanto o fato de dois e dois serem quatro tanto hoje como ontem. Mas como pode haver tempo se nada muda? 

Não faz sentido falar em mudanças se não se pode distinguir o que é do que foi e do que será, se tudo é fixo, imutável, invariável. Para quem vê o mundo de fora — ou seja, do ponto de vista eternalista de um Deus onisciente, que abarca tudo num único olhar —, o tempo não existe: se não estamos no mundo e pensamos fora dele, não há que falar em passado, em futuro, e tampouco em tempo.

Por outro lado, pensar em mudanças nos leva a mergulhar de novo no rio do tempo e admitir que tudo muda o tempo todo: o que é futuro se torna presente, e o presente se torna passado. Mas se há presente no mundo, e se ele não é somente uma ilusão devida à nossa posição na história, então o passado não é real, já que o presente cessa tão logo se torna passado. E o futuro é ainda menos real, pois sequer chegou a ser real. No entanto, se há somente o presente, como explicar as mudança? 

Um ser consciente do estado do mundo, mas que não tivesse memória do passado nem imaginação do futuro, saberia tudo da realidade presente, mas nada veria mudar. Para dizer que uma coisa muda, é preciso poder dizer que ela não era o que passou a ser. Mas a memória do passado e a imaginação do futuro não são características do mundo, e sim da nossa consciência. Num mundo em que o presente é real, ele é o único a existir, e isso nos leva a outra negação do tempo.

A imagem do trem do tempo nos permite pensar a realidade das relações entre os acontecimentos sem presente, passado nem futuro, na medida em que implica uma visão eternalista que não exclui o tempo. Em contrapartida, a imagem do rio nos permite pensar a realidade do presente, mas exclui a realidade do passado e do porvir, impondo uma visão presentista que nos impede igualmente de pensar o tempo.

Ainda que o tempo não seja somente uma ilusão — o que se admite apenas por amor à argumentação —, é impossível encerrá-lo num conceito sem esbarrar em dificuldades insuperáveis ou em contradições. E mesmo que o presente não seja uma ilusão, é impossível dizer se ele existe fora de nós ou por nós, se depende do mundo ou de nossa consciência. Já o futuro é, dos três modos da temporalidade, aquele que tem menos existência, seja por ainda não ser, seja por mudar o tempo todo.

Vivemos necessariamente no presente. O passado e o futuro não existem, o que existe é um presente relativo ao passado — a memória —, um presente relativo ao presente — a percepção — e um presente relativo ao futuro — a expectativa. Para a consciência, porém, há somente o presente, pois o passado não é senão a memória presente do passado, e o futuro não é senão a imaginação presente do futuro.

Por esse prisma, o futuro não difere do passado ou do presente — que também mudam o tempo todo —, mas existe somente em nossa imaginação, pois varia em função do nosso presente, que é o hoje, não o ontem nem o amanhã. Por acharmos o futuro demasiado lento e ao apressarmos seu curso, esquecemo-nos do passado, mas, imprudentes que somos, não pensamos no único tempo que nos pertence, sonhamos com o que não existe mais e evitamos refletir sobre o único que subsiste. Assim, em vez de vivermos, esperamos viver.

Quando nos lembrarmos desse presente no futuro, ele será o passado que traremos de volta ao presente, ou seja, outro presente. Mas viver no presente exige inevitavelmente considerar o futuro — ou seja, ver a água do futuro fluir em torno de nós. Para estarmos aqui, devemos olhar adiante, para além de nós, e a todo instante ver e prever o porvir. Viver no presente é querer, é desejar, é esperar outra coisa que não é o presente, é projetar-se no futuro. Por isso sabemos que morreremos um dia, embora nos seja difícil imaginar isso, e por pensamos que a morte é somente o nada, a ausência de consciência, temos medo de partir desta vida demasiado cedo, quando ainda estamos vivos, de ficar do mundo enquanto ele continua a avançar sem nós, que continuamos a desejar no presente outro futuro, pois viver é estar voltado sempre para o futuro imediato de nossas intenções, ainda que distante das nossas aspirações.

Talvez a imagem do rio seja ilusória, mas é uma ilusão vital. O futuro é seguramente uma ilusão, já que existe apenas em função da nossa imaginação, em nossos temores, esperanças, medos e desejos. Até porque só o presente existe, e é nele que vivemos, mesmo que não seja ele que nos faça viver. Se nos ocupássemos somente do que o presente nos dá, não viveríamos: apenas sobreviveríamos sem finalidade, sem memória nem desejo, sem qualquer razão para viver. 

Estamos condenados a viver no presente, mas dele nos libertamos pela imaginação do futuro que não existe, mas que nos faz existir, dando sentido à nossa existência. Um futuro que não é mais o que era, que está sempre por se reinventar. 

Essa é a verdadeira definição da liberdade humana.

sexta-feira, 31 de outubro de 2025

DE VOLTA ÀS VIAGENS NO TEMPO — 51ª PARTE — SOBRE A SETA DO TEMPO

FUGIT IRREPARABILE TEMPUS.

A expressão arrow of time (flecha do tempo, numa tradução direta) foi cunhada pelo astrofísico britânico Arthur Eddington no final da década de 1920, mas a ideia de que o tempo é unidirecional remonta à Segunda Lei da Termodinâmica, proposta no século XIX, que trata da entropia — medida de desordem e aleatoriedade.

 

Em um sistema fechado, a entropia tende a aumentar com o passar do tempo. Quando um copo se quebra, por exemplo, seus cacos não se juntam espontaneamente. No entanto, a ideia de que a seta do tempo está intrinsecamente ligada à seta entrópica não é unanimidade entre físicos e cosmólogos. 


Alguns cientistas argumentam que, embora a entropia descreva fenômenos macroscópicos, em escalas microscópicas as interações fundamentais da física (como as equações da mecânica quântica e da relatividade geral) são majoritariamente simétricas no tempo. E mais: se pudéssemos reverter as velocidades de todas as partículas em um sistema, ele retornaria ao seu estado anterior. A unidirecionalidade do tempo emergiria apenas em sistemas complexos, com grande número de partículas. 


O fato de o Universo ter surgido de um estado de baixa entropia (Big Bang) pode explicar o aumento contínuo da desordem que observamos hoje e, consequentemente, a flecha do tempo. Mas o "porquê" dessa condição inicial permanece um mistério.

 

Nossa percepção é que o tempo flui do passado para o futuro. Nesse contexto, nossas lembranças pertencem ao passado, e nossas expectativas, ao futuro. Mas algumas teorias cosmológicas especulam sobre universos cíclicos, em que períodos de contração (grande colapso) sucedem à grande expansão. Nesses cenários, a seta do tempo poderia se inverter durante a fase de contração, o que significaria uma diminuição da entropia — lembrando que essas hipóteses são meramente teóricas.

 

Embora a Segunda Lei da Termodinâmica forneça uma explicação robusta para a direção observada do tempo, o debate em torno da natureza fundamental da seta do tempo e suas implicações cosmológicas continua sendo uma área vibrante de pesquisa — e um dos grandes mistérios da física. Uma equipe internacional liderada por físicos brasileiros demonstrou experimentalmente que o desenrolar contínuo do tempo do passado rumo ao futuro é um conceito relativo. Em seu artigo — ainda em revisão para publicação — os pesquisadores descrevem o experimento, detalham os resultados e explicam por que suas descobertas não violam a lei retromencionada.

 

A ideia de partículas emaranhadas (ou entrelaçadas) tornou-se conhecida graças aos esforços para transformá-las em qubits para computadores quânticos. Mas outra propriedade menos famosa das partículas subatômicas é o correlacionamento: quando correlacionadas, elas se ligam de modos que não ocorrem no mundo macroscópico. Os pesquisadores usaram esse correlacionamento para alterar a direção da seta do tempo. Após modificarem a temperatura dos núcleos em dois átomos de uma molécula de triclorometano (hidrogênio e carbono), deixando o núcleo de hidrogênio mais quente do que o de carbono, eles observaram que, quando os núcleos não estavam correlacionados, o calor fluía como esperado — do núcleo mais quente para o mais frio. No entanto, quando os núcleos estavam correlacionados, o núcleo quente ficou ainda mais quente, e o frio, ainda mais frio.


Como é a própria assimetria do fluxo de calor (ou seja, a entropia) que define a direção do tempo, a equipe concluiu que o experimento inverteu a seta do tempo — isto é, fez o tempo "correr para trás". Segundo os pesquisadores, esse resultado abre a possibilidade de controlar ou até mesmo inverter a seta do tempo, dependendo das condições iniciais. E não há violação da Segunda Lei da Termodinâmica porque ela pressupõe a ausência de correlações entre as partículas — exatamente o fator que permitiu a reversão observada.

 

Outros experimentos já demonstraram a reversão do fluxo temporal, alimentando novas discussões sobre a existência de uma fronteira a partir da qual o tempo deixa de fluir para o futuro. Embora não vejamos copos quebrados se desquebrando por aí, as leis fundamentais da física não pressupõem necessariamente uma única direção, já que as equações permanecem as mesmas, independentemente de o tempo avançar ou recuar.

 

Resumo da ópera: a seta do tempo é um conceito relativo, e se setas opostas podem emergir de sistemas quânticos abertos, então também seria possível — ao menos em tese — viajar para o futuro ou para o passado.


Continua...

quarta-feira, 9 de setembro de 2020

14.º ANIVERSÁRIO DO BLOG

A VIDA É COMO ANDAR DE BICICLETA; PARA SE MANTER EQUILIBRADO, É PRECISO SEGUIR EM FRENTE.

Nossa percepção da passagem do Tempo depende de diversas variáveis. Se você estiver a ponto de borrar as calças e ouvir de quem está no banheiro o tradicional “só um minuto!”, esse minuto pode ser um dos minutos mais longos de sua vida. 

Aliás, conta-se que um leigo pediu a Einstein que trocasse em miúdos sua famosa Teoria da Relatividade, e ouviu do físico alemão a seguinte explicação: “Coloque a mão na chama de um fogão por um minuto, e parece que foi uma hora. Sente-se junto daquela pessoa especial por uma hora, e vai parecer que foi só um minuto. Isto é relatividade.”

E o que tem isso a ver com o aniversário do Blog? Talvez nada. Ou muita coisa, pois “parece que foi ontem” que eu criei o meu para embasar a elaboração da edição Blogs & Websites da Coleção Guia Fácil Informática. A ideia era tirá-lo do ar assim que o livrinho chegasse às bancas, mas o estímulo de alguns leitores (que o viram como um canal de comunicação para tirar dúvidas e fazer consultas) levou-me a continuar, e cá estamos nós, 14 anos (ou 5.114 dias) e 5.580 postagens depois.

Nos primeiros aniversários, eu postei textos comemorativos, com retrospectivas, imagens rebuscas, enfim... Mais adiante, conforme o modelo foi se exaurindo (aos poucos, mas progressivamente), sobretudo depois que Twitter, Facebook, Instagram, WhatsApp e afins minaram o interesse dos internautas pelo formato blog. Prova disso é que hoje o número de seguidores deste humilde espaço mal chega a 5% do que alcançou nos tempos áureos. Mas como reclamar disso, se faz anos que eu mesmo não visito nem (muito menos) posto comentários em blogs parceiros? Quando só entre em um blog quando caio lá de pára-quedas, levado por uma busca no Google por um assunto qualquer? Acho que é sinal do tempos, sei lá... Falando em tempo...     

Segundo Einstein, Tempo e Espaço estão entrelaçados. O Tempo não é um valor universal, mas relativo, e varia conforme o ponto de vista de cada um. A questão é complicada, mas se torna compreensível quando imaginarmos o Tempo como uma espécie de caminho, e que se pode avançar por esse caminho mais depressa ou mais devagar. E até mesmo parar e, quiçá, voltar, como veremos mais adiante.

Se ficarmos absolutamente imóveis e observarmos o relógio, veremos que o ponteiro dos segundos continua avançando num ritmo constante, como um trem avança pelos trilhos. Mas a velocidade do “Trem do Tempo” pode variar. Em tese, basta a gente se movimentar para ela diminuir, já que, segundo a teoria de Einstein, o Tempo passa mais devagar para quem se move do que para quem está parado. O problema é que as velocidades que vivenciamos no dia a dia são ínfimas, donde essa diferença é imperceptível.

Se passássemos um ano (terrestre) viajando pelo espaço a 99% da velocidade da luz (cerca de 300 mil km/s ou 1,08 bilhão km/h), que a maior velocidade possível no universo, encontraríamos nossos parentes e amigos um ano mais velhos, mas teríamos envelhecido 51,4 dias (ou seja, menos de dois meses). Do nosso ponto de vista, o Tempo passou mais depressa para eles, ao passo que, do deles, passou mais devagar para nós.

Observação: Havia falhas na teoria de Einstein, visto que ele a desenvolveu no início do século passado, quando o Universo era considerado uma esfera de volume constante. Em 1929, o astrônomo norte-americano Edwin Hubble demonstrou que o Universo se expandia, e o físico alemão reconheceu ter cometido "seu maior erro".

A velocidade do Tempo é inversamente proporcional à nossa. Conforme aceleramos nossa hipotética espaçonave, o Tempo reduz a sua na mesma proporção, até parar totalmente quando atingimos a velocidade da luz.  

Conforme a Teoria de Einstein e estudos anteriores de diversos cientistas, nada pode viajar mais rápido do que a da luz no vácuo. A explicação, em linhas gerais, é que o Tempo avança a toda velocidade em relação a um corpo parado, e tende a diminuir, em relação a esse corpo, conforme ele acelera. A 180 km/h, 30 segundos correspondem na verdade a 29,99999999999952 segundos. Daí os relógios internos dos satélites atrasarem 0,007 segundo por dia devido à velocidade com que orbitam a Terra (14.000 km/h, em média), mas adiantam 0,0045 segundo por dia devido à gravidade, que é menor a 20.000 km de altitude. Não fosse a teoria de Einstein, não seriam feitas as devidas compensações, e assim a precisão dos sistemas GPS ficaria comprometida (à razão de 10 km/dia).

Voltando à percepção pessoal da passagem do Tempo, ensina a psicóloga Claudia Hammond que, numa situação de medo extremo, nossa mente “vê” o Tempo passar como uma cena exibida em slow-motion. O registro feito por nosso cérebro é flexível e leva em conta emoções, expectativas, o quanto as tarefas exigiam de nós num determinado período, e até os nossos sentidos (um evento auditivo, por exemplo, parece durar mais que um efeito visual). 

É por isso que a maioria das pessoas se lembra mais nitidamente daquilo que viveu entre os 15 e os 25 anos — época da vida que se têm mais experiências novas, e coisas novas tendem a ter um tratamento especial do Tempo Mental, que parece perceber episódios assim como mais duradouros. Pela mesma razão, conforme envelhecemos, os últimos 10 anos parecem ter passado bem mais rapidamente do que as décadas anteriores.

Observação: Enquanto nos deslocamos de casa para o trabalho, por exemplo, temos a impressão de que a viagem demora uma eternidade, mas a sensação é bem outra quando pensamos nisso na hora do almoço ou no meio da tarde.

No que tange à possibilidade de retroceder no Tempo, bem, assumindo que o Tempo passa mais devagar para quem viaja a velocidades maiores, chegando mesmo a parar quando se alcança a velocidade da luz, conclui-se que “o relógio andaria para trás” se essa velocidade fosse superada. Todavia, segundo a Teoria da Relatividade Especial de Einstein, é impossível deslocar um objeto a uma velocidade superior à da luz porque, de forma simples e resumida, a única coisa capaz de mover uma partícula com massa é outra força que viaje a essa velocidade. Como nossa hipotética partícula ganharia massa à medida que sua velocidade aumentasse, quando ela estivesse próxima à velocidade da luz sua massa seria infinita, exigindo uma força igualmente infinita para fazê-la ultrapassar a velocidade da luz.

A famosa equação de Einstein tem uma parte “menos lembrada”, que descreve como a massa de um objeto muda quando há movimento envolvido: E = mc² (isto é, energia é igual a massa multiplicada pelo quadrado da velocidade da luz). Na verdade, a equação completa é E²=(mc²)²+(pc)², sendo a parte final a que descreve como a massa do objeto muda quando há movimento envolvido. 

Uma descoberta anunciada em 2011 ameaçou anular tudo o que se sabia até então sobre a velocidade da luz, a Teoria da Relatividade e a física moderna. Isso se deu quando físicos europeus conduziram um experimento chamado Oscillation Project with Emulsion-Tracking Apparatus (Opera, na sigla em inglês) para estudar o fenômeno da oscilação de neutrinos. Diferentemente das partículas de luz, os neutrinos são partículas que possuem uma quantidade desprezível de massa e portanto, à luz da Teoria da Relatividade Especial de Einstein, deveriam viajar a uma velocidade menor que a da luz. No entanto, o experimento detectou neutrinos se movimentando a uma velocidade superior à da luz, o que poderia revolucionar a Física moderna. 

Mas tudo não passou de um mal entendido provocado por um relógio digital, cujo cabo estava mal conectado. Quando o problema foi identificado e o cabo, devidamente conectado, ficou comprovado que os neutrinos estavam viajando a uma velocidade inferior à da luz. A ironia dessa história é que toda a Física moderna foi questionada por conta de um cabo de fibra ótica solto, que levou a passagem do Tempo a ser registrada de maneira incorreta.

Como todos nós, os cientistas cometem erros, mas eles aprendem com os próprios erros, ao contrário da maioria dos eleitores tupiniquins, para quem insistir indefinidamente no mesmo erro acabará produzindo um acerto

Claro que existe o Teorema do Macaco Infinito, segundo o qual um milhão de macacos, datilografando aleatoriamente em um milhão de máquinas de escrever, produziriam, em um milhão de anos, a obra completa de Shakespeare. Mas isso é conversa para outra hora.

Voltando ao aniversário do Blog, o mote de minhas postagens sempre foi a TI, tendo a segurança digital como carro-chefe. Houve postagens sem qualquer relação com informática, mas elas foram poucas e eventuais. 

A primeira vez que tratei de política foi em agosto de 2007, devido ao MENSALÃO. Depois, seguiram-se algumas matérias esparsas, geralmente às vésperas das eleições e/ou logo após os pleitos. Até que a tramitação do impeachment da anta vermelha, em 2016, me levou a replicar aqui os textos que publicava na minha comunidade de política na Rede .Link (rede essa que um belo dia, sem aviso prévio, o webmaster simplesmente tirou do ar, depois tomou Doril). 

Num primeiro momento, eu não vi razão para modificar o título ou a descrição do Blog, mas em 2017, às vésperas do 11.º aniversário do site acabei incluindo a menção à política.

Para encerrar essa conversa, reitero meus sinceros agradecimentos a todos os leitores, em especial àqueles que me acompanham desde os tempos imemoriais da saudosa Coleção Guia Fácil Informática (que, pelos motivos expostos no início desta postagem, foi a pedra fundamental deste humilde espaço).

Por hoje é só, pessoal. Amanhã voltamos à “vida normal”

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

DE VOLTA ÀS VIAGENS NO TEMPO

ASSIM COMO AS ÁGUAS DO MAR E DO RIO SE ENFRENTAM BRAVAMENTE NA FOZ, O NOVO E O VELHO TEMPO SE CHOCAM E SE MISTURAM.

Nossos ancestrais começaram a contar o tempo quando identificaram padrões no ciclo do dia e da noite, nas fases da Lua e nas mudanças das estações. Os primeiros calendários surgiram milênios antes da era cristã, e o Calendário Gregoriano, adotado atualmente pela maioria dos países, foi instituído em 1582, sucedendo ao modelo implementado por Júlio César em 46 a.C.

Embora o hoje seja o amanhã de ontem e o ontem de amanhã, o tempo não flui da mesma maneira para todos. De acordo com a Teoria da Relatividade — principal sustentáculos da física moderna —, tudo no Universo é relativo, exceto a velocidade da luz, que é constante e absoluta porque o tempo é relativo — ou seja, quanto mais depressa o observador se move, mais devagar o tempo passa para ele em relação a quem está parado. 

Não percebemos os efeitos da dilatação do tempo no dia a dia porque as velocidades que experimentamos são muito pequenas. Mas os relógios dos satélites que orbitam a Terra a 14.000 km/h atrasam 7 microssegundos/dia em razão da velocidade e adiantam 45 microssegundos/dia devido à gravidade — que é menor a 20.000 km de altitude. Se fosse possível acelerar uma espaçonave a 80% da velocidade da luz, 5 horas corresponderiam a 8 horas e 19 minutos pelo tempo terrestre. A 99,999999999% da velocidade da luz, a partida e a chegada seriam praticamente simultâneas, embora o tempo continuasse passando normalmente na Terra, como ilustra o paradoxo dos gêmeos

 

Observação: Até o século XVII, acreditava-se que a luz era "instantânea". Isso mudou em 1676, quando o astrônomo Ole Romer observou um atraso de 22 minutos nos eclipses das luas de Júpiter e estimou a velocidade da luz em 225.000.000 m/s — o valor correto, de 299.792.458 m/s, só foi determinado em 1926 pelo físico alemão Albert Michelson, que passou 25 anos aperfeiçoando o interferômetro. 

Considerando que o tempo "congela" quando o observador alcança a velocidade da luz, e retrocede a uma velocidade superluminal, os tripulantes da nossa hipotética nave desembarcariam quase instantaneamente em algum ponto no futuro ou no passado do calendário terrestre. Ainda que alguns astrofísicos sustentem que o tempo não para nem retrocede, apenas se dilata conforme a velocidade do observador aumenta, o conceito de tempo negativo deixou de ser mera ficção científica depois que pesquisadores da Universidade de Toronto, no Canadá, demonstraram sua existência física tangível. 

Mas nem tudo que é matematicamente possível é passível de ser comprovado na prática com a tecnologia de que dispomos atualmente. A sonda Parker Solar Probe — o objeto mais veloz lançado pelo homem até agora — atingiu respeitáveis 692.000 km/h no final do ano passado. Essa velocidade permite ir da Terra à Lua em menos de meia hora, mas uma viagem a Proxima Centauri, que fica a 4,2 anos-luz de nós (cerca 40 trilhões de quilômetros), demoraria cerca de 7.000 anos. 

Observação: Outro problema é que a massa relativística de um objeto aumenta conforme sua velocidade cresce e tende ao infinito quando ele se aproxima da velocidade da luz, exigindo uma quantidade igualmente infinita de energia para continuar acelerando. 

Se a velocidade da luz no vácuo é a própria velocidade do tecido do espaço-tempo e o limite universal segundo a física moderna, então jamais colheremos o fruto mais ambicionado da "árvore da relatividade de Einstein", certo? Talvez não. Basta lembrar que viagem que Cabral fez em 44 dias em 1500 hoje é feita por ar em cerca de 10 horas (o saudoso supersônico Concorde voou de Nova Iorque a Londres em 2 horas, 52 minutos e 59 segundos em 1996, mas foi aposentado por motivos de segurança em 2003).

Como veremos nos próximos capítulos, teorias inovadoras sugerem que viagens superluminais podem migrar da ficção para a realidade, se não nesta década ou na próxima, talvez no final do século. Se isso se confirmar, as próximas gerações poderão tomar um cafezinho com D. Pedro II, fazer uma excursão pela Roma Antiga ou mesmo conferir ao vivo e em cores se foi realmente um meteoro que extinguiu os dinossauros. 

Se a viagem tripulada à Lua — que Júlio Verne "profetizou" com riqueza de detalhes em 1865 — se tornou realidade, por que não as viagens no tempo, já que as equações de Einstein as admitem em cenários específicos?
 
Continua...

segunda-feira, 8 de setembro de 2025

DE VOLTA ÀS VIAGENS NO TEMPO — 45ª PARTE — SETAS DO TEMPO: DA SIMETRIA QUÂNTICA À DESORDEM CÓSMICA

SE NÃO FOSSE A LUZ, NÃO EXISTIRIA SOMBRA.

Nossos antepassados começaram a contar o tempo quando perceberam padrões no amanhecer, no anoitecer, nas fases da Lua e nas mudanças sazonais. Há cerca de 5.000 anos, os egípcios criaram um calendário baseado na observação da estrela Sirius. Mais ou menos na mesma época, os sumérios dividiram o ano em 12 meses de 30 dias. Em 1582, o papa Gregório XIII substituiu o calendário solar que Júlio César implementou em 46 a.C. pelo modelo hoje adotado oficialmente por 189 dos 193 países-membros da ONU.

CONTINUA DEPOIS DA POLÍTICA

Pelo andar da carruagem, Bolsonaro e outros 7 integrantes do núcleo crucial do golpe conhecerão suas penas na próxima sexta-feira. Até lá, haja antiácido, plasil e pantoprazol, pois o assunto continuará em destaque nos telejornais, assim como as manobras dos parlamentares bolsonaristas para pautar uma proposta de anistia que contemple também — e principalmente — o ex-presidente e seus asseclas de alto coturno.

Se a anistia fosse um filme, ele se chamaria "O Exterminador do Futuro". Na saga original, Schwarzenegger é enviado ao passado para matar a mãe de um líder revolucionário que incomoda o governo no presente — se o inimigo não nascer no passado, o problema deixa de existir no futuro. A proposta de anistia dos bolsonaristas segue a mesma lógica: enviar para o arquivo morto os inquéritos sobre fake news e milícias digitais, usados por Xandão como incubadoras, daria cabo de todos os problemas criminais de Bolsonaro et caterva. 

A proposta perdoaria todos aqueles que "tenham sido ou estejam sendo ou, ainda, eventualmente, possam vir a ser investigados, processados ou condenados" por crimes variados, inclui desde o complô golpista de Bolsonaro ao atentado à soberania nacional do filho Eduardo, passando pelo custeio de acampamentos de quartel e pelo quebra-quebra de 8 de janeiro.

A falta de limites do bolsonarismo ultrapassou todos os limites. Inclusive os do Centrão, pois o projeto apaga "todas as inelegibilidades já declaradas ou que venham a ser declaradas pela Justiça Eleitoral contra os anistiados. Bolsonaro, dodói e entristecido, voltaria a ser um presidenciável "imbrochável", estalando de novo. Tarcísio de Freitas, afilhado político do xamã golpista, estendeu a mão para a facção pró-anistia, mas descobriu que o bolsonarismo quer o braço, o tronco, a alma... 

A sorte é que o absurdo deve ser barrado — sob pena de todos os malfeitores se reunirem e mandarem um novo Schwarzenegger voltar 525 anos no tempo, aguardar na praia pela chegada da primeira caravela e exterminar Cabral e sua trupe.

Embora os relógios de sol e clepsidras tenham evoluído para sofisticados modelos atômicos, a ciência ainda não consegue explicar plenamente o que é o tempo. No século XVII, Isaac Newton comparou-o a uma flecha disparada de um arco, viajando em linha reta e velocidade constante. No  seu entender, a velocidade da luz podia variar, mas o tempo era constante e imutável em qualquer ponto do Universo.

Em 1905, Albert Einstein propôs que o tempo e o espaço são partes de uma única estrutura — o espaço-tempo. Segundo ele, com exceção da velocidade da luz, tudo é relativo no Universo, e a passagem do tempo varia conforme a velocidade do observador e a intensidade do campo gravitacional ao qual ele está submetido. Isso foi comprovado experimentalmente nos anos 1970, quando pesquisadores colocaram quatro relógios atômicos a bordo de aviões que deram a volta ao mundo, primeiro para o leste, depois para o oeste, e observaram um atraso de 59 nanossegundos e um avanço de 273 nanossegundos, respectivamente, em comparação com o padrão do Observatório Naval dos EUA.

De acordo com o astrônomo britânico Arthur Eddington, a "seta do tempo" aponta para o futuro quando a entropia aumenta e para o passado quando ela diminui. Até onde se sabe, a entropia só aumenta — ou seja, estruturas ordenadas perdem sua ordem, vasos de porcelana viram cacos e, por aí vai —, exceto nos sistemas quânticos, onde ela permanece constante quando tudo é deixado ao acaso. 

ObservaçãoOutra teoria sugere que o Universo “puxa” o tempo conforme se expande, e como o tempo e o espaço formam uma estrutura única, eventual reversão da expansão cósmica faria com que o espaço se contraísse e o tempo retrocedesse.

Ainda que as leis da física clássica sejam simétricas no tempo, os fenômenos termodinâmicos que observamos no cotidiano não são. Mas essa aparente contradição é resolvida quando se considera que o Universo começou num estado de entropia extremamente baixa, mas que vem aumentando sua desordem desde então. Mais que as próprias leis da física, esse ponto de partida incomum pode ser o verdadeiro responsável por termos uma seta do tempo. E como ninguém jamais viu os cacos de um vaso quebrado se rearranjarem espontaneamente, a experiência cotidiana reforça a ideia de que essa seta aponta somente para o futuro.

Se a seta do tempo aponta sempre da entropia menor (passado) para a maior (futuro), mesmo nos sistemas quânticos inicialmente ordenados, conclui-se que a entropia cresce até atingir um estado total de desordem. No entanto, segundo o físico John von Neumanna entropia de um sistema quântico não pode mudar, e se ela permanece sempre a mesma, não é possível saber se o tempo está correndo para frente ou para trás.


Essas considerações são irrelevantes ao lidar com sistemas quânticos elementares — como o átomo de hidrogênio, com um único elétron —, mas tornam-se cruciais quando se estuda sistemas com muitas partículas. Nestes casos, é preciso conciliar a teoria quântica com a termodinâmica, o que pode ser tão complicado quanto unificar a Relatividade e a Mecânica Quântica e combinar a gravidade com as outras três forças fundamentais da natureza. Por outro lado, talvez isso também seja apenas uma questão de tempo. 


Continua...