quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

A REDUNDÂNCIA E A VOLTA À TERCEIRA VIA

 

O VOTO NULO É INÚTIL APENAS PARA OS POLÍTICOS CORRUPTOS, POIS É A VOZ DO POVO TENTANDO SE MOBILIZAR CONTRA O SISTEMA.

Criei este Blog em 2006 para embasar a elaboração do volume Blogs & Sites da saudosa Coleção Guia Fácil Informática. Minha intenção era descontinuá-lo assim que o livro fosse publicado, mas mudei de ideia porque muitos leitores passaram a usá-lo como um canal de comunicação para tirar dúvidas e fazer consultas. Durante o reinado lulopetista, achei de compartilhar também aqui alguns pitacos sobre o cenário político tupiniquim que eu postava em outras paragens, e mais adiante oficializei a coisa e mudei o subtítulo do site para "um bate-papo informal sobre informática, política e outros assuntos".

Quando as postagens tratavam somente de informática, eu mantinha os comentários abertos a críticas, sugestões, elogios, dúvidas etc., e assim percebi que, embora não seja motel, o Blog tem frequência rotativa. Pelo fato de muitos leitores deixarem perguntas sobre assuntos que haviam sido discutidos dias ou semanas antes, ficou evidente, que eles só passavam por aqui ocasionalmente. E talvez por isso eu adquiri o (mau) hábito da redundância.

Repetições são aborrecidas, mas algumas situações as justificam. Há quem diga que a repetição é a mãe do aprendizado. Eu não sei até que ponto concordo com essa assertiva, mas acho que ela é válida quando evita que alguém bata a cabeça na parede achando que uma hora ela vai se abrir como uma porta, ou que alguém vote em políticos incompetentes ou corruptos achando que é melhor ficar com o diabo conhecido do que se arriscar com o desconhecido (isso faz sentido, mas só até certo ponto).

Passando ao mote desta postagem (lá vamos nós pelo caminho das redundâncias), o antipetismo e a facada foram determinantes para a vitória do ex-capitão que deixou o quartel pela porta dos fundos e aprovou dois míseros projetos em 28 anos de deputância. Pelo cenário que se delineia (ou que as pesquisas nos levam a imaginar que se delineia), teremos em outubro uma reprise do pleito plebiscitário de 2018. Naquela oportunidade, poderíamos ter experimentado dois ou três dos treze postulantes que se apresentaram no primeiro turno, mas a maioria do nosso eleitorado escalou os dois extremistas mais extremados para o embate final. Aliás, isso deixa claro que maus políticos não surgem em seus gabinetes por geração espontânea: se estão lá, é porque a récua de muares que atende por eleitorado votou neles. Mas sigamos adiante.

Em 2018, o resultado não poderia ser outro: para não vermos o país governado pelo patético bonifrate de um presidiário (que não soltava um peido sem pedir a bênção de seu amo e senhor), tapamos o nariz e apoiamo um dublê de mau militar e parlamentar medíocre, mas que seus baba-ovos viam como um "salvador da pátria". E acabou que a emenda ficou pior do que o soneto. 

A pandemia contribuiu para a gestão de Bolsonaro ser desastrosa, mas é bom lembrar que o primeiro caso de Covid no Brasil só foi descoberto depois do carnaval de 2020, quando o sultão do bananistão já contabilizava 14 meses de desgoverno

Por uma série de razões fáceis de explicar mas difíceis de entender, nem o STF nem o Congresso se dignaram de livrar o país desse anormal — talvez porque afastar 3 presidentes em pouco mais de 30 anos, além de ser vergonhoso, fragiliza nossa incipiente democracia (que apenas o ministro Barroso reputa “consolidada”). Mas convenhamos que só um idiota não demite o gerente que está afundando a empresa — pouco importa se por incompetência, inoperância ou improbidade — porque o prazo avençado foi de quatro anos e só se passaram três.

Um presidente investigado em seis inquéritos, alvo de 140 pedidos de impeachment e acusado pela CPI do Genocídio de cometer uma dezena de crimes comuns e de responsabilidade já teria cuspido do cargo em qualquer republiqueta terceiro-mundista que se desse ao respeito, mas a questão é que, apesar de ser republiqueta terceiro-mundista, o Brasil não se dá ao respeito. Não fosse assim, um ex-presidente corrupto, réu em 20 ações criminais e condenado mais de 25 anos de cana, não deixaria a cadeia após míseros 580 dias, não teria a ficha imunda lavada por um colegiado de togados em que cada qual age como se tivesse uma Constituição para chamar de sua e não seria recolocado no tabuleiro da sucessão presidencial nem — muito menos — seria tido e havido como o franco favorito do eleitorado.

A situação dos cidadãos de bem desta banânia (se é que ainda restam alguns) assemelha-se à do prisioneiro que, ao enjeitar uma sopa feita com água morna e pedregulhos, ouve do carcereiro: "o mangia la minestra o salta dalla finestra". Como a cela fica no topo de uma torre, pular da janela não é uma opção, de modo que o jeito é tomar a sopa intragável.

Sobre a perspectiva de um terceiro governo petista, prefiro não comentar. Sobre o candidato à reeleição, bom seria se ele fosse página virada o quanto antes. Daí ser imperativo quebrar essa maldita polarização e apoiar Sergio Moro, João Doria, Simone Tebet, Alessandro Vieira ou quem vier a ser o “candidato da terceira via” com chances reais de vencer a eleição. 

Até porque tão ruim (ou até pior) que a volta de Lula et caterva seria mais quatro anos sob o capitão-tormenta, que superou Dilma no quesito estelionato eleitoral e se sagrou o pior mandatário desde o golpe de Estado que, nos idos de 1889, destronou D. Pedro II e substituiu a monarquia constitucional parlamentarista pelo presidencialismo republicano. 

E viva o povo brasileiro!

VPN — EM RIO QUE TEM PIRANHA JACARÉ NADA DE COSTAS (CONTINUAÇÃO)

DINHEIRO SÓ NÃO TRAZ FELICIDADE PARA QUEM NÃO SABE O QUE FAZER COM ELE.

O termo "doxing" (ou “doxxing”) é a abreviatura de "dropping dox", sendo que "dox" remete a "documentos". Normalmente, o doxing consiste em uma ação mal-intencionada, usada contra pessoas de quem o hacker discorda ou não gosta, mediante a qual são revelados o nome real, endereços residencial e do local de trabalho, telefone, dados financeiros e outras que informações de identificação do desafeto. 

A prática em si é antiga, mas o termo surgiu pela primeira vez no universo hacker, onde a anonimidade era considerada sagrada nos anos 1990, e cruzou as fronteiras das comunidade, passando a designar a exposição de informações pessoais, tornando-se uma ferramenta na guerra ideológica.

Os ataques de doxing podem variar dos relativamente triviais, como assinaturas de email ou entregas de pizza fake, aos mais perigosos, como assediar um parente ou funcionário de um desafeto, roubar sua identidade, fazer ameaças ou outras formas de bullying cibernético. Celebridades, políticos e jornalistas estão entre os que mais sofrem esse tipo de assédio, que vai desde ataques online até ameaças à segurança e, em casos extremos, ameaças de morte.

No geral, as informações pessoais são reveladas intencionalmente, com o intuito de punir, intimidar ou humilhar a vítima, embora os cibercriminosos também se valham dessa estratégia. Independentemente da motivação, o principal objetivo é violar a privacidade, e isso pode não só colocar as vítimas em situações desconfortáveis como acarretar consequências graves.

Muitas pessoas usam o mesmo nome de usuário e senha para se logar nos mais diversos serviços. Com essa informação, criminosos podem ter uma noção dos interesses da vítima em potencial e de seus hábitos de navegação. Qualquer pessoa que possua um nome de domínio tem as suas informações armazenadas num registro publicamente disponível por meio de uma pesquisa WHOIS.

Se a pessoa que comprou o nome de domínio não ocultou suas informações privadas no momento da aquisição, seus dados pessoais ficam à disposição de quem se der ao trabalho de procurar. Se a vítima utilizar um email não seguro ou cair em um golpe de phishing, o invasor poderá descobrir emails confidenciais e publicá-los.

Vale destacar que, se suas contas em redes sociais forem públicas, qualquer pessoa poderá descobrir informações sobre você por meio de stalking cibernético. Usando essas informações, um cibercriminoso pode inclusive criar respostas para suas perguntas de segurança, o que, em tese, lhe permitiria invadir outras contas online.

Os criminosos podem descobrir seu endereço IP de diversas maneiras. Como esse endereço está vinculado à sua localização física, eles poderão se valer de engenharia social no seu provedor de serviços de Internet (ISP) para descobrir mais sobre você, ou mesmo tentar hackear a rede.

A partir de seu número de telefone fixo ou digital (um informação aparentemente banal), criminosos podem recorrer a serviços de pesquisa inversa, como o Whitepages, mediante os quais basta digitar o número do terminal para descobrir a identidade do proprietário. Esse tipo de serviço é cobrado, mas quem estiver disposto a pagar a taxa poderá descobrir informações pessoais sobre você usando pura e simplesmente seu número de telefone.

O termo packet sniffing (farejamento de pacote, numa tradução literal), associado ao doxing, remete à interceptação criminosa de dados na Internet, aí incluídos números de telefone, senhas, informações bancárias e até mensagens antigas de email. 

Os cibervigaristas fazem isso conectando-se a uma rede online, violando suas medidas de segurança e, por fim, capturando o fluxo de dados dentro e fora dela, daí ser recomendável usar uma VPN.

Continua...

quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

O ESPINHO DA RACHADINHA

O réu que preside a Câmara mantém trancados a sete chaves cento e tantos pedidos de impeachment em desfavor de Jair Bolsonaro, e o procurador-vassalo se faz de cego quando se trata de investigar os malfeitos de seu suserano (ou não cumpre seus deveres constitucionais por estar ocupado demais distribuindo polpudos contracheques a seus subordinados).

Há no Ministério Público Federal 1.145 procuradores. A pretexto de antecipar vantagens e quitar privilégios atrasados, Augusto Aras autorizou o pagamento de contracheques em dezembro que variaram de mais de R$ 100 mil a quase meio milhão de reais. Beneficiaram-se 720 procuradores. Um deles beliscou R$ 471 mil.

Não bastasse a arquitetura constitucional que o autoriza a “jogar parado”, o chefe do Ministério Público conta com a cumplicidade geral do Senado, que a aprovou sua renomeação e se furta a analisar pedidos de impeachment contra ele, do STF, que impediu a tramitação de representações no Conselho Superior do MPF, e da advocacia garantista por autodeclaração, que aplaudiu a recondução do dito-cujo ao cargo.

Dessa "inércia" e de "atos protelatórios” se fez governo irresponsável, inimputável e incontrolável. Aras vendeu "descriminalização da política" e entregou extinção da punibilidade da delinquência pública. Não denuncia ação política nenhuma — nem mesmo diante da abundância de provas da política de morte que afeta crianças na pandemia —, embora simule diligência por meio de "averiguações preliminares" e pedidos sigilosos que dificultam acusar o golpe.

Essa omissão holística tem numerosos exemplos desde 2019. Contra precedentes da própria PGR, o procurador não se opôs a iniciativas do presidente contra urnas eletrônicas, defendeu legalidade do "orçamento secreto" — maior engrenagem de compra de voto da história brasileira — e não questionou as ameaças de Bolsonaro a conselheiros da Anvisa — apenas anunciou "providências" para protegê-los.

Ainda mais gritantes foram suas posições em torno da CPI. Quando Bolsonaro tentou obstruir a instauração da comissão e pressionou o senador Jorge Kajuru a pedir o impeachment de ministros do STF, Aras não viu crime ou ilegalidade (apenas uma “perspectiva pessoal”). Instalada a CPI, recusou-se a investigar fatos e denúncias que foram surgindo no processo (como da Covaxin).

Contrariando a tradição da própria instituição que chefia, o taifeiro do capetão argumentou que seria preciso esperar o relatório final da CPI — e ministra Rosa Weber alertou-o de que ele não poderia ser só "espectador". Concluído o relatório (de 1.200 páginas) que imputa uma dezena de crimes ao mandatário, esperou 30 dias e pediu ao STF providências que não sabemos quais são, solicitou sigilo — e o STF aceitou — e abriu novo capítulo de "averiguações preliminares", como se a CPI fosse apenas uma pré-preliminar.

Nenhuma denúncia, nenhum inquérito sequer. Aras bloqueou quase tudo que pôde. Sobraram procedimentos heterodoxos que o STF, com advertências à paralisia do PGR, viu-se forçado a instaurar. Das 276 ações que o PGR propôs no período, apenas uma foi contra o governo, em tema inofensivo para Bolsonaro. A jornalista Renata Lo Prete foi cirúrgica na avaliação do descalabro: "Bolsonaro está disposto a delinquir na vacinação das crianças porque perdeu o medo. No momento, ninguém está com medo de parar na cadeia".

A ausência de medo se explica. Aras libera Bolsonaro, Bolsonaro libera subordinados, como Queiroga, e incita militantes, como a turba que ameaçou de morte conselheiros da Anvisa. Nessa bolsa de valores, cadeira no STF vale mais que vida de crianças. Soaria demagógico e hiperbólico, não estivéssemos falando de Jair Bolsonaro e Augusto Aras.

Bolsonaro soube antes de ser empossado que a rachadinha cairia sobre a cabeça de seu primogênito, e desde então vem se empenhando em esconder o escândalo debaixo do tapete. Com a ajuda de Bibo Pai, Bobi Filho realizou nos tribunais superiores o sonho de todo réu: travar o processo e matar provas.  Juridicamente, esquivou-se da sentença condenatória; politicamente, condenou-se junto com o pai ao convívio com a suspeição perpétua.

Amigo e ex-assessor de Jair Bolsonaro na campanha de 2018, Waldir Ferraz (vulgo Jacaré) declarou à revista Veja que a advogada Ana Cristina Valle, ex-mulher do capitão, chefiou um esquema de rachadinha que incluía os gabinetes do ex-marido, na Câmara Federal, de Zero Um, na Alerj, e de Zero Dois, na Câmara Municipal do Rio de Janeiro.

Exceto pelo fato de ter saltado de lábios amigos, a entrevista não injetou novidades no drama do presidente. Hoje, graças a investigações jornalísticas e do Ministério Público, sabe-se que Bolsonaro comanda uma organização familiar que explorou durante três décadas uma holding da rachadinha com sede no seu gabinete, em Brasília, e filiais nos mandatos dos filhos Flávio e Carlos, no Rio. 

Dos cinco filhos que Bolsonaro teve em três casamentos, somente a caçula Laura, que tem 11 anos — não é alvo de investigações. Afora o célebre caso de Zero Um e as rachadinhas, a PF e o Ministério Público apuram suspeitas contra Eduardo, Carlos e Renan Bolsonaro, que incluem tráfico de influência, contratação de funcionários fantasmas e envolvimento na organização de manifestações que pediram o fechamento de instituições como o Congresso e o Supremo.

Flávio tentou desqualificar a entrevista do amigo do pai, mas deu com os burros n’água porque a coisa foi gravada. Bolsonaro se irrita quando lhe perguntam sobre a origem do dinheiro depositado pelo operador Fabrício Queiroz na conta da primeira-dama — chegou mesmo a manifestar o desejo de "encher de porrada" a boca de um repórter. Há dois meses, disse que pretende participar de debates presidenciais, desde que não sejam abordados assuntos familiares — trata-se claramente de um pretexto para a fuga.

Há duas alternativas para Bolsonaro: ou providencia argumentos melhores ou abandona a pose de 2018, quando tripudiava da corrupção alheia. Se a entrevista do amigo Waldir serviu para alguma coisa foi para lembrar a Bolsonaro que ele entrou em 2022 com o espinho da rachadinha cravado no pé.

Com Josias de Souza

VPN — EM RIO QUE TEM PIRANHA JACARÉ NADA DE COSTAS

AOS 40, VOCÊ ESPERA PELOS 50, E AOS 50, PELOS 60. MAS OS 30 MARCAM O FIM DA JUVENTUDE E OS 40, O MOMENTO EM QUE VOCÊ PARA DE SE ENGANAR.

Já falamos sobre VPNs aqui no Blog, mas a relevância do tema recomenda revisitá-lo de tempos em tempos. Dito isso, começo por relembrar que as Virtual Private Network são redes virtuais privadas que criptografam os dados e redirecionam o tráfego através de servidores espalhados mundo afora, impedindo que os sites visitados registrem nosso endereço de IP (protocolo de internet). Em outras palavras, elas ajudam a nos proteger de tentativas locais de rastreamento e hacks.

A maioria das VPNs oferece diversas opções de localização, permitindo inclusive, contornar restrições geográficas — alguns provedores de conteúdo restringem o acesso em determinadas regiões, como é o caso da Netflix, que muda o cardápio de títulos conforme a localização geográfica dos assinantes —, o que ajuda também a contornar a censura de conteúdo imposta em alguns países (e a lista não para de crescer).

Observação: Governos e Provedores de Serviços de Internet que não primam pela lisura costumam monitorar a navegação dos internautas e, no caso dos ISPs, vender os históricos de navegação para agências de publicidade e marketing e publicidade.

Numa conexão "normal", o computador roteia a solicitação através do servido ISP, que então o conecta ao site; numa conexão VPN, o computador se conecta diretamente ao servidor da VPN, ignorando o servidor ISP. Guardadas as devidas diferenças, isso funciona mais ou menos como um firewall, que protege a conexão por meio de servidores privados e fluxos de dados criptografados.

Na conexão VPN, todos os dados que enviamos e recebemos são criptografados. Quando fazermos uma compra online, por exemplo, as informações do cartão de crédito precisam ser passadas à loja; quando acessamos nosso provedor de webmail, nossas credenciais de login são enviadas ao servidor para autenticação. Assim, se alguém tentar interceptar esses dados, a criptografia os manterá seguros (ou mais seguros do que eles estariam se trafegassem sem criptografia).

Um endereço IP com VPN e um tráfego criptografado não bastam para impedir o restreamento, embora o dificultem sobremaneira. Mas é bom ter em mente que, para além do endereço IP, outras técnicas de rastreamento incluem o doxing, uso de malwareengenharia social e por aí vai. Para quem realmente se importa com privacidade, o ideal é usar uma VPN combinada com um navegador anônimo, como o TOR, e tomar muito cuidado com o que faz online, especialmente no que tante ao compartilhamento de informações.

Continua...

terça-feira, 25 de janeiro de 2022

DURMA-SE COM UM BARULHO DESSES!


Quando o Congresso Constituinte transformou o Ministério Público numa entidade independente, imaginou-se que o país havia sido presenteado com uma instituição forte. Passados 34 anos, o brasileiro constata que foi condenado a conviver com mais uma corporação viciada em privilégios.

Há no MPF 1.145 procuradores. Desse total, 720 (62,8%) receberam supersalários em dezembro. Foi uma farra: 491 procuradores ganharam mais de R$ 100 mil, 158 receberam mais de R$ 200 mil, 53 beliscaram mais de R$ 300 mil e 18 felizardos foram agraciados com cifras superiores a R$ 400 mil. Um único procurador levou R$ 446 mil, e outro, quase meio milhão (R$ 471 mil).

Nesse Natal custeado pelo contribuinte, coube a Augusto Aras o papel de Papai Noel. Ele autorizou, entre outras regalias, o pagamento de abono de férias de 2022, além de liberar o pagamento de um benefício extrassalarial chamado “licença-prêmio” (a cada cinco anos de trabalho, o sujeito ganha um descanso remunerado de três meses, que pode ser convertido em dinheiro).

Em condições normais, seria apenas mais um escândalo. Numa época de pandemia, tornou-se um escárnio especialmente revoltante, porque o desemprego, a redução de jornada e a poda de salários converteram-se fenômenos ainda mais triviais na iniciativa privada. 

Em nota, a PGR o absurdo de "dívidas da União para com membros do Ministério Público" e atribuiu os desembolsos a uma "sobra orçamentária" para ficar com a cara de coisa feita dentro da lei.

Recomenda-se a Aras que evite repetir esse tipo de argumento no balcão de uma lanchonete de rodoviária. Ali, trabalhadores que aguardam pelo transporte teriam dificuldades para compreender como procuradores recebem contracheques de mais de R$ 400 mil num país em que metade da população rala para obter menos de três salários-mínimos, convivendo com a sobra do mês no fim do salário.

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Bolsonaro escreveu num grupo de WhatsApp que utiliza para se comunicar com auxiliaresque Abraham Weintraub "não está para colaborar, mas para tumultuar". 

O tumulto sempre foi uma especialidade do personagem, mas o capitão não se importava quando o ex-ministro usava seus dotes para convulsionar o setor educacional. Agora, abespinha-se porque foi enfeitiçado pelo feitiço de Weintraub.

Após insinuar que Bolsonaro recebeu informações privilegiadas sobre a rachadinha que explodiria na cabeça de Bobi FilhoWeintraub disse que Bibo Pai substituiu os "conservadores" do governo por "essa turma do Centrão". E foi ecoado pelo ex-chanceler Ernesto Araújo.

Bolsonaro já não precisa de inimigos. Ex-ministros como Weintraub se encarregam de mostrar quem é o presidente.

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Segundo Diogo Mainardi, desde o primeiro dia de mandato que Bolsonaro só pensa numa coisa: escapar da cadeia. Seus atos, que podem parecer incoerentes, sempre foram ditados pelo pavor de ser preso: o golpe na PF, a escolha de Augusto Aras, o chute em Sergio Moro, o cafezinho com Gilmar Mendes, a pizza com Dias Toffoli, a sabotagem da Lava-Jato, o conluio com mensaleiros e quadrilheiros. Em meados do ano, com seu derretimento nas pesquisas e nas redes sociais, o sociopata deve pular fora da disputa presidencial e se candidatar a senador, em busca de blindagem.

Com Josias de Souza e O Antagonista

segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

SE TEM COURO DE JACARÉ, BOCA DE JACARÉ E RABO DE JACARÉ, ENTÃO NÃO PODE SER UM COELHINHO BRANCO

 

Segundo a revista Veja, o aposentado da Marinha Mercante Waldir Ferraz, vulgo Jacaré e autointitulado o amigo “Zero Zero” do presidente da República, já era bolsonarista antes de o bolsonarismo ter virado uma ideologia para 20% dos brasileiros e dos filhos e ex-mulheres do capetão terem se tornado um motivo frequente de dor de cabeça para o presidente.

A amizade entre Cavalão e Jacaré começou há mais de três décadas, a partir da insatisfação que ambos compartilhavam com os baixos soldos pagos aos militares, e desde então só se fortaleceu. Pelas mãos de Bolsonaro, o réptil de boca grande e cheia de dentes foi contratado para trabalhar nos gabinetes do então deputado, na Câmara Federal, de Zero Um, na Alerj, e de Zero Dois, na Câmara Municipal do Rio, e recebeu duas condecorações do governo federal, uma delas das mãos do próprio presidente, por “serviços meritórios e virtudes cívicas”.

Sem cargo público, Jacaré integra o grupo de inteligência particular de Bolsonaro. Diariamente, encaminha, quase sempre antes das 6 horas da manhã, toda sorte de denúncias e suspeitas ao número pessoal do presidente, salvo em sua lista de contatos como JB BR 4. Os dois têm até um código específico para tratar de conspirações e movimentações políticas. “Como tá o clima aí?” é a senha disparada por Bolsonaro, que em seguida recebe informes sobre possíveis apoios para a campanha.

Desde a época da transição de governo, Jacaré é frequentador assíduo dos palácios. No último dia 18 ele se reuniu com o presidente no Planalto para “colocar os assuntos em dia”. Em encontros no Rio de Janeiro e em Brasília, nos quais as conversas foram gravadas, declarou que houve rachadinha nos gabinetes de Jair, Flávio e Carlos Bolsonaro e afirmou que a advogada Ana Cristina Valle, ex-mulher do capetão, foi quem organizou e comandou a arrecadação irregular de parte dos salários dos servidores.

Jacaré disse ainda que o presidente foi traído e não sabia dos rolos da ex-esposa, que ainda hoje pede dinheiro em troca de seu silêncio. “Ela fez nos três gabinetes. Em Brasília, aqui no Flávio e no Carlos. O Bolsonaro deixou tudo na mão dela para ela resolver. Ela fez a festa. Infelizmente é isso. Ela que fazia, mas quem é que assinava? Quem assinava era ele. Ele vai dizer que não sabe? É batom na cueca. Como é que você vai explicar? Ele está administrando. Não tem muito o que fazer”, afirma o amigo de fé, irmão e camarada do presidente (clique aqui para ouvir as gravações).

Segundo Jacaré, a rachadinha entrou nos gabinetes do clã ainda na década de 90, quando Bolsonaro era deputado federal. Naquela época, Ana Cristina, então casada com um sargento, aproximou-se do capitão durante um movimento de mulheres de militares que reivindicava aumento no soldo dos maridos. Ela foi se “infiltrando” e rapidamente ganhou a confiança de Bolsonaro, com quem iniciou um relacionamento amoroso e de quem logo recebeu carta branca para administrar seu gabinete na Câmara dos Deputados.

Ainda segundo Jacaré, o esquema funcionava da seguinte maneira: responsável por uma cota de contratações, Ana Cristina recolhia documentos de algumas pessoas, abria contas bancárias em nome delas e embolsava grande parte de seus salários. Em muitos casos o funcionário era fantasma e sequer tinha conhecimento de que estava oficialmente empregado no gabinete do deputado.

Jacaré alega que ele em que mais trabalhava com o ex-capitão antes da chegada de Ana Cristina não participava do esquema. “Ela é muito perigosa. É uma mulher que quer dinheiro a todo custo. Às vezes, ela vai ao cercadinho, frequenta o cercadinho. É uma forma de chantagem. A gente nem toca nesse assunto pra não deixar o cara de cabeça quente.” Waldir Ferraz “A jogada dela era a seguinte: ‘Quer ganhar um dinheiro? Te dou 1000 reais por mês. Me empresta seu documento aí’. Pegava a carteira do cara que estava entrando na Câmara, recebia 8000, 10000, e dava 1000 (reais) pro cara.

Leal a Bolsonaro, Jacaré faz questão de ressaltar que nem o presidente nem seus filhos sabiam das traficâncias da ex-mulher. Em sua tese de defesa, argumenta que os parlamentares se preocupam apenas com a atividade política, deixando a rotina do gabinete para pessoas de confiança. “Ele, quando soube, ficou desesperado, era uma fria. O cara foi traído. Ela que começou tudo. Bolsonaro nunca esteve ligado em nada dessas coisas. O cara não tinha visão do que estava acontecendo por trás no gabinete. Às vezes o chefe de gabinete faz merda, e o próprio deputado não sabe. Mesmo o deputado vagabundo não sabe, só vem a saber depois.

Pelo relato do ex-assessor, Bolsonaro só veio a saber muito tempo depois. Na verdade, décadas depois — mais precisamente em novembro de 2018, após conquistar a Presidência da República. Confrontado com a gravidade da história, o amigo diz que o ex-capitão teria entrado em contato com o esquema de rachadinhas nos gabinetes da família só depois da revelação pelo jornal O Estado de S. Paulo do relatório do Coaf que registrava movimentações milionárias de Fabrício Queiroz. Apenas ali ele teria puxado o fio de toda a meada. Como todo marido enganado, Bolsonaro teria sido o último a saber.

Queiroz — que também é amigo do presidente há mais de trinta anos — substituiu Ana Cristina como responsável pela arrecadação dos salários dos servidores e o esquema continuou sem o chefão saber. Detalhe: a ex-mulher de Bolsonaro nunca trabalhou oficialmente para o Zero Um, mas teve parentes empregados no gabinete dele na Alerj até 2018 e que hoje estão sob investigação do MP do Rio.

Depois da passagem pela Câmara dos Deputados com Jair, Ana Cristina foi chefe de gabinete do vereador Carlos Bolsonaro por sete anos. Ela e Zero Dois também são investigados pelo MP pela prática de rachadinha. Antes de o STF praticamente reverter à estaca zero a apuração sobre o esquema no gabinete de Flávio, este foi denunciado por lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e organização criminosa. Queiroz chegou a ser preso preventivamente enquanto se refugiava num imóvel de Frederick Wassef, advogado de Jair e Flávio Bolsonaro.

Jacaré conta que, ainda no governo de transição, Bolsonaro ouviu de um auxiliar que Zero Um poderia ser condenado a vinte anos de cadeia e ficou entre preocupado e emocionalmente fragilizado diante da previsão. Desde então o caso paira como uma sombra ameaçadora sobre o presidente, seu governo e sua família. Nas palavras do amigo, “Bolsonaro vive na corda bamba” e tem convicção de que ninguém acreditará que ele e os filhos não sabiam de nada do que ocorria dentro de seus respectivos gabinetes. “Não tem como reagir. Vai fazer o que para desmanchar isso aí? É como um beco sem saída. Ela fez uma merda, eles assinaram sem saber, e agora vão pagar caro por isso. Acho que ele vai ter problema se não for reeleito. Vai tudo cair, vai perder o foro privilegiado e tal.”

Jacaré diz ainda que Ana Cristina chantageia o presidente. Exige dinheiro e outras vantagens para não contar o que sabe. Ela teria, inclusive, ido algumas vezes ao cercadinho do Palácio da Alvorada, onde Bolsonaro interage com apoiadores, para ser vista e percebida pelo mandatário. Só para lembrá-lo, de acordo com Jacaré, dos segredos que unem os dois até hoje e podem complicar a vida do ex-marido. “Ela é muito perigosa. É uma mulher que quer dinheiro a todo custo. Às vezes, ela vai ao cercadinho, frequenta o cercadinho. É uma forma de chantagem, lógico que é chantagem. A gente nem toca nesse assunto pra não deixar o cara de cabeça quente”.

A relação de Bolsonaro com a ex-mulher não é das mais tranquilas. Os dois se envolveram num divórcio litigioso em que, conforme revelado por VEJA em 2018, Ana Cristina acusou o marido de, entre joias e outras coisas, ter um patrimônio incompatível com a própria renda. No processo, ela anexou uma relação de bens e a declaração do imposto de renda de Bolsonaro, demostrando que o patrimônio do casal incluía três casas, um apartamento, uma sala comercial e cinco lotes de terra que o deputado havia “esquecido” de relatar à Justiça Eleitoral. Sua remuneração mensal, por exemplo, seria de R$ 100mil — quase três vezes mais do que ele recebia, na época, como parlamentar e aposentado do Exército.

Acusada agora por Jacaré de chefiar a rachadinha em três gabinetes da família, Ana Cristina não disse à Justiça de onde vinha a diferença de valores e recuou dessa história, dizendo que estava brava com o ex-marido. Nos últimos tempos, embora distantes, Bolsonaro e Ana Cristina não se atacam. Após a separação, ela viveu um tempo no exterior, casou-se outra vez e, em 2018, utilizando o sobrenome Bolsonaro, tentou uma vaga na Câmara dos Deputados (obteve apenas 4.555 votos).

Em agosto do ano passado, VEJA revelou que Ana Cristina vive em uma confortável mansão no Lago Sul, bairro nobre de Brasília, com o filho Jair Renan, o Zero Quatro, também investigado por receber vantagens de empresários com interesses no governo federal. “Ela também usa o menino para fazer dinheiro”, dispara Jacaré.

Na terça-feira 18, durante uma conversa por telefone com VEJA, Ana Cristina negou que tenha comandado esquemas de rachadinha, que chantageie Bolsonaro e disse que as acusações partem de inimigos que querem atingir os “meninos” Flávio e Carlos. “Se eu tiver que falar com o presidente, acha que eu vou para o cercadinho para todo mundo ficar vendo, para jornalista ficar vendo? Sou discreta”, declarou. Apesar de alegar inocência e entoar um discurso em defesa do ex-marido e dos enteados, ela fez questão de arrematar sua defesa com a seguinte ponderação: “Não sou mentora da rachadinha. Ele (Bolsonaro) me chamava de sargentona, mas quem mandava no gabinete era ele. Quem assina as nomeações e exonerações é o parlamentar. Não faz sentido assinar sem ler porque todos eles são bem instruídos”.

Jacaré, que nada tem de inimigo do presidente, mantém-se vigilante. Municiar Bolsonaro com informações de coxia sempre foi uma de suas missões. Não raro, o ex-capitão recebe os dados e as ideias de Jacaré e sai repetindo por aí. Numa tentativa de demonstrar quão zeloso ele é, o amigo do presidente diz ter sido decisivo para convencê-lo de que o ex-ministro Gustavo Bebianno, morto em março de 2020, estava por trás de um plano para assassinar Bolsonaro, que seria executado por Adélio Bispo, o esfaqueador que não rasga dinheiro nem come merda, mas foi declarado inimputável.

Segundo a tese de Jacaré, Bebianno queria, com a morte do então candidato, ser ungido seu substituto na corrida presidencial. Ao descobrir o plano, ele teria contado detalhes da trama para o presidente e seu filho Carlos. Bolsonaro realmente ouviu essa história, tanto que mencionou a existência de uma conspirata para matá-lo em entrevista concedida a VEJA em 2019 — e falava explicitamente na participação de “quem estava do meu lado”.

Bolsonaro espera explorar politicamente na próxima campanha o atentado a faca que sofreu. Ele quer usar o episódio para requentar a tese de que Adélio agiu a mando de alguém e vender a versão de que ele, Bolsonaro, enfrenta uma oposição sem limites de forças ocultas a serviço do sistema. O problema dessa tese é que a própria PF concluiu que o napoleão de hospício agiu sozinho e deu a questão da autoria por encerrada. Já o caso das rachadinhas continua em aberto e caiu no gosto popular, especialmente a informação de que Queiroz, o operador do esquema, depositou R$ 89 mil para a primeira-dama. Bolsonaro disse que esse dinheiro era parte do pagamento de uma dívida que o amigo tinha com ele.

Até aqui, a Famiglia Bolsonaro alega que as denúncias são infundadas, visam desestabilizar o governo e partem de adversários. As declarações de Jacaré põem em xeque essa versão. Não é um inimigo falando. Ele pode ser acusado de um monte de coisas, menos de não compartilhar da intimidade, da amizade e da história de vida de Bolsonaro

Procurado, o presidente não se manifestou até o fechamento da edição 2773 da revista Veja.

MAIS VAZAMENTO DE DADOS ENVOLVENDO CHAVES PIX

TEM CAUTELA; AJUDA O SOL COM UMA VELA.

O Banco Central comunicou mais um vazamento de dados pessoais de clientes vinculado a chaves do Pix, agora na instituição Acesso Soluções de Pagamento S.A.

O incidente ocorreu entre os dias 3 e 5 de dezembro e envolveu 160.147 chaves Pix, com o vazamento do nome do usuário, CPF, instituição de relacionamento, número da agência e da conta.

Segundo o Bacen, o incidente de segurança ocorreu em "razão de falhas pontuais em sistemas" da Acesso, mas que não foram expostos dados sensíveis, como senhas, movimentações ou saldos financeiros em contas ou informações sob sigilo bancário. "As informações obtidas são de natureza cadastral, que não permitem movimentação de recursos nem acesso às contas ou a outras informações financeiras."

O BC informou ainda que adotou as ações necessárias para apuração detalhada do caso e que aplicará medidas sancionadoras previstas na regulação vigente. As pessoas que foram atingidas pelo vazamento serão notificadas exclusivamente por meio do aplicativo ou pelo internet banking de sua instituição de relacionamento. "Nem o BC nem as instituições participantes usarão quaisquer outros meios de comunicação aos usuários afetados, tais como aplicativos de mensagem, chamadas telefônicas, SMS ou e-mail".

Segundo o órgão, a legislação não exige a comunicação desses incidentes ao público, mas o BC resolveu divulgá-los à sociedade "à vista do compromisso com a transparência que rege sua atuação". O BC também criou uma página específica para registrar incidentes de segurança

Este é o segundo caso de vazamento de dados vinculado a chaves Pix. Em 24 de agosto de 2021, problema semelhante ocorreu no Banco do Estado de Sergipe, com exposição de dados vinculados a 414.526 chaves. Na época, o Banese publicou um comunicado esclarecendo o ocorrido. Segundo a área técnica, foram detectadas consultas indevidas a dados relacionados a 395 mil chaves do Pix, exclusivamente do tipo telefone, de não clientes do banco. 

O acesso foi feito a partir de duas contas bancárias de clientes do Banese, provavelmente roubadas por meio de phishing, ou seja, com links maliciosos, e as contas foram canceladas.

domingo, 23 de janeiro de 2022

CIRCO SEM BILHETERIA

No Rio, a criminalidade não está apenas nas bocas de fumo ou nos escritórios da milícia. O crime organizado ocupou os palácios Guanabara e Laranjeiras, sede da administração estadual e residência oficial do governador.

Quando era deputado federal pelo Rio de Janeiro, Bolsonaro ocupou a tribuna da Câmara para elogiar milicianos — gente que despia a farda de policial nas horas vagas para vender segurança a preços módicos a comerciantes e moradores das áreas conflagradas. Na campanha de 2018, ensaiou um lamento: "As milícias tinham plena aceitação popular, mas depois acabaram se desvirtuando. Passaram a cobrar “gatonet” e gás".

O então presidenciável esqueceu de mencionar o transporte clandestino e as construções ilegais. Mas lapsos de memória são compreensíveis. Bolsonaro tinha ao seu redor o ex-sargento e operador de rachadinhas Fabrício Queiroz, além do ex-capitão Adriano da Nóbrega. O primeiro livrou-se da cadeia graças ao prestígio dos amigos nos tribunais superiores de Brasília, e o segundo foi passado nas armas no interior da Bahia.

Bolsonaro impulsionou a eleição de Witzel, um ex-juiz que prometeu extinguir a corrupção e "mirar na cabecinha" dos bandidos. Foi deposto por desvio de verbas da saúde. Antes disso, Luiz Pezão, o antecessor de Witzel, armou com Michel Temer uma intervenção federal cenográfica na segurança do Rio quando faltavam dez meses para o melancólico final de sua gestão. E deu no que está dando.

Chefiava a "intervenção" o general Braga Netto, hoje ministro da Defesa e opção de candidato a vice na chapa de Bolsonaro. Na última quarta-feira, enquanto a polícia escalava o Jacarezinho, o governador-tampão passava o pires em Brasília. Sob intensa oposição do Tesouro Nacional e da Procuradoria da Fazenda Nacional, tentava convencer a gestão Bolsonaro a ignorar pareceres técnicos que desaconselham a admissão do Rio na UTI federal do plano de recuperação fiscal.

De duas, uma: ou Bolsonaro adere ao espetáculo do seu aliado, ou Castro terá de explicar como fará para levantar a lona do circo eleitoral da segurança pública, com o prometido viés social, sem bilheteria.

Com Josias de Souza

sábado, 22 de janeiro de 2022

DE VOLTA À TERCEIRA VIA

 

Perguntado sobre como seria a 3ª Guerra Mundial, o físico alemão Albert Einstein respondeu que não saberia dizer, mas que a quarta certamente seria com pedras e paus. 

Se, como disse Carl von Clausewitz, a guerra nada mais é que a continuação da política por outros meios, poderíamos dizer que a política é apenas guerra com outro formato. Mas isso é outra conversa. De momento — e ao longo dos próximos meses — a questão que se coloca é quem vai vencer a próxima eleição presidencial. 

Afora videntes, cartomantes, oráculos, pitonisas e institutos de pesquisas eleitoreiras, ninguém sabe a resposta (nem se o Brasil sobreviverá à atual gestão). Mas sabe-se que a disputa será a mais violenta de nossa história recente, com campanhas marcadas não pela disputa de ideias, mas pela bestialidade. 

Tanto a reeleição de Bolsonaro quanto a volta do lulopetismo seria uma tragédia de proporções épicas. O dublê de mau militar e parlamentar medíocre que elegemos em 2018 para evitar um mal maior nada fez de útil em três anos de governo, e nada indica que algo vá mudar daqui até o final de seu deplorável mandato. Negando todas as evidências, seus puxa-sacos atribuem a desgraça nacional à pandemia, como se a Covid fosse um problema exclusivo do Brasil e o "mito" já não brincasse de reizinho havia 14 meses quando os primeiras mortes decorrentes do vírus maldito (falo do biológico) ocorreram em solo tupiniquim.

No ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA, publicado em 1995, o escritor português José Saramago (Nobel de Literatura em 1998) ensinou que “a cegueira é uma questão privada entre a pessoa e os olhos com que nasceu” e que “a pior cegueira é a mental, que faz com que não reconheçamos o que temos pela frente”. Relembro essas pérolas porque muita gente ainda fala em “esquerda” e “direita”, no âmbito político-ideológico, como nos anos 1970, quando havia União Soviética e Muro de Berlim .

Como essa gente vota, a próxima eleição presidencial está fadada a ser uma reprise do pleito plebiscitário de 2018, com a diferença de que, em 2018, para evitar que o país fosse governado por um bonifrate que não soltava um peido sem a bênção do então presidiário de Curitiba, elegemos destrambelhado que se serve da Presidência para veranear em Dubai, promover motociatas, dar cavalos-de-pau “lá no Beto Carreiro”, pilotar jet-ski no litoral catarinenses e vituperar as instituições do alto de algum palanque improvisado

Outra diferença é que a rejeição ao lulopetismo corrupto, que campeava solta na eleição passada, agora perde longe da aversão ao bolsonarismo boçal. Assim, só nos resta torcer para que a tal terceira via se consolide.

Tanto Lula quanto Bolsonaro são populistas demagogos, ainda que de polaridades político-ideológicas invertidas. Ambos têm seu público fiel, mas campanha é treino e governo é jogo. Espera-se que um presidente eleito que governe para todos — coisa que nenhum desses dois jamais fez. A questão é que as “convicções” do demiurgo de Lula velhas conhecidas, ao passo que Bolsonaro, enquanto candidato, encenou a pantomima de cruzado contra a corrupção na política, o toma-lá-dá-cá, os partidos venais do Centrão, a nefasta reeleição e blá, blá, blá. E deu no que deu.  

Lula, que nos tempos pujantes da Lava-Jato colecionou 20 processos criminais e foi condenado a mais de 25 anos de prisão, agora se diz absolvido. Insiste na cantilena da conspiração, de que não há (nunca houve e jamais haverá) alguém mais honesto do que ele, de ter sido o melhor presidente desde Tomé de Souza (a despeito do Mensalão, do Petrolão, dos R$ 300 milhões da Odebrecht, das palestras pagas a peso de ouro, do tríplex, do sítio etc. e tal) e promete voltar a ser o parteiro do Brasil Maravilha, o pai dos pobres e mãe dos ricos, o enviado pela Divina Providência para acabar com a fome, presentear a imensidão de desvalidos com três refeições por dia e multiplicar a fortuna dos milionários. E o pior é que um bocado de gente se presta a lhe emprestar o ouvido para servir de penico.

Tanto a esquerda lulopetista corrupta quanto a direita bolsonarista boçal são nefastas para o país, e ambas mobilizarão seus devotos (e seus robôs) para espalhar fake news travestidas de propostas de governo. Bolsonaro, para justificar a humilhação pública no dia 2 de outubro, quando for expurgado da disputa já na primeira consulta aos eleitores, deve intensificar preventivamente os ataques às urnas eletrônicas e alardear a suposta fraude que culminará com sua derrota. 

Como bem salientou o historiador e professor Marco Antonio Villa, a tarefa de todos os democratas, independentemente dos matizes político-ideológicos, é transformar o processo eleitoral em um palco de discussão dos grandes problemas nacionais. E o Brasil está fadado mais uma vez a perder essa oportunidade histórica por se imiscuir em questões menores e dar trela a provocações de extremistas que priorizaram temas absolutamente secundários e carregados de reacionarismo, como ser ou não favorável a “banheiro trans”.

Em entrevista à Gazeta do Povo, o governador João Doria disse que ele, Sergio MroSimone Tebet e Alessandro Vieira continuarão dialogando até o início de junho, quando então farão uma avaliação sobre as condições para a convergência em torno de uma candidatura com potencial para pôr fim a essa maldita polarização. Que Deus os ajude e não nos desampare. No que me concerne, já estaria de bom tamanho se um deles tirasse Lula ou Bolsonaro do páreo — e melhor ainda se ambos os extremistas extremados forem escorraçados no primeiro turno.