Os políticos ficaram esperando Janot. Na última terça-feira, às cinco em ponto da tarde, saiu a
notícia de que a lista do procurador-geral havia chegado ao Supremo. E agora? Primeiro,
o privilégio do foro tem que ser restringido. Só nesta leva são 83 pedidos de
inquérito. Segundo, o que começou na Lava-Jato vai se espalhar pelo país.
Terceiro, os políticos aumentarão a pressão por leis que os protejam desse
apocalipse.
A divulgação da lista interessa a muita gente. Até aos
próprios atingidos. Se estão juntos, eles se sentem de certa forma protegidos.
Se todos são considerados corruptos, podem argumentar que ninguém é, que tudo é
culpa do sistema e que basta aprovar uma reforma política. A companhia do grupo
os fortalece e por isso estão pedindo publicidade. Por outro lado, para os
procuradores, sempre acusados de serem os responsáveis pelos vazamentos, é
melhor que tudo seja tratado à luz do dia. O ministro Edson Fachin é que terá que decidir, mas agora, além dos 116
procuradores que trabalharam para tomar os depoimentos, dos 77 executivos da
Odebrecht e dos múltiplos advogados de cada investigado, há também os que
trabalham diretamente com o ministro Fachin.
Impossível segurar segredo tão compartilhado.
A chegada da lista torna concreto o que vinha sendo
discutido. O STF já está abarrotado de outros processos contra políticos com
foro privilegiado. Essa é a segunda lista da série. A restrição do privilégio
de foro é o único caminho para o Supremo continuar sendo uma corte
constitucional. Se não houvesse nome algum na lista, o tribunal já teria muito
trabalho com o que está lá tramitando. Para cumprir seu papel de corte que
dirime dúvidas sobre a Constituição, ela não poderá ficar tão dominada pelo seu
papel de tribunal criminal de políticos com a prerrogativa de serem julgados
pela corte suprema. Por que tantos querem o foro? Porque o STF é mais lento,
tem menos capacidade de julgar rapidamente. Se não fosse assim, os investigados
iriam preferir instâncias inferiores que permitem o uso dos sucessivos
recursos.
A Lava-Jato tem passado bem pelos testes de ampliação. Era
Curitiba apenas e agora há focos do combate à corrupção em outras partes do
país. O ex-governador Sérgio Cabral
tem apenas uma ação em Curitiba, no caso do Comperj, o resto está no desdobramento muito bem-sucedido da
Lava-Jato que é a Calicut. Em São
Paulo, não houve o mesmo sucesso e em Brasília há novos ramos como o da Operação Greenfield. Os 211 sem
prerrogativa de foro vão ajudar a espalhar ainda mais as investigações contra a
corrupção.
Mas hoje o grande veio é o de Brasília, com a investigação
dos políticos na PGR e no STF. Para quem acha que os 320 de ontem são um número
grande demais, é bom lembrar que a “Operação Mãos Limpas”, em um par de anos,
ampliou sua investigação sobre seis ex-primeiros-ministros, 500 parlamentares e
milhares de administradores públicos locais. Ao crescer, caiu numa armadilha.
O professor Alberto
Vanucci, da Universidade de Pisa, analisou a operação criticamente e
concluiu que, pela reação dos políticos, exatamente no momento em que ela se
ampliou, as punições que eram suaves passaram a ser inexistentes e abriu-se o
caminho para tudo o que veio depois. Os conflitos entre os políticos e o
Judiciário continuaram, e a nova força que surgiu, o ex-primeiro-ministro Berlusconi, manteve-se no poder por
vários anos apesar das muitas ações por corrupção em que ele foi envolvido.
Este é, portanto, o momento de maior força e,
contraditoriamente, de mais vulnerabilidade da Operação Lava-Jato. As informações entregues pela maior empreiteira
do país permitiram que a lista da PGR se ampliasse sobre 83 autoridades e
políticos de diversos partidos e chegasse a 320 possíveis investigados. Os que
se sentem ameaçados têm agora oficialmente um ponto em comum para se unirem,
como demonstraram nos últimos dias. Tentarão, através da lei e de reação
coordenada, reduzir o impacto da Lava-Jato. A Operação está tendo a coragem de
expor a dimensão da corrupção, mas os atingidos pela avalanche se agarraram uns
aos outros para tentar salvar o sistema do qual se beneficiaram.
(Com Álvaro Gribel)
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