quinta-feira, 14 de março de 2019

O BRASIL, O GOVERNO E O FIM DA PICADA.


Uma das peculiaridades do atual governo é fazer ele próprio o trabalho da oposição. O presidente deixou isso bem claro antes, durante e depois do Carnaval. Sua "incontinência tuitária", sem os filtros institucionais que protegem o governante de cometer erros, pode prejudicar seu capital político e as reformas.

Autoridades de alto nível não devem fazer declarações públicas ou participar de entrevistas à imprensa sem submeter-se a filtros dos órgãos de assessoramento direto e dos ministérios. Trata-se de ação prudente, pois tais autoridades não dominam todos os assuntos sobre os quais se pronunciam. Mais do que qualquer outro membro do governo, o presidente precisa passar por briefings antes de emitir opiniões, já que suas falas costumam ter repercussões.

Segundo Diego Mainardi, a queda de Jair Bolsonaro é tema recorrente no Congresso, no mercado financeiro e na imprensa. Olavo de Carvalho, o folclórico guru presidencial, vaticinou que, se continuar assim, “esse governo não dura seis meses”, e passou a disparar mensagens alucinadas contra o general Hamilton Mourão, acusando-o de tramar um golpe para assumir o poder.

É uma estupidez colossal especular que, dois meses depois da posse, o mandato de Bolsonaro esteja em perigo, mesmo que o comportamento tresloucado do capitão alimente essa hipótese: ao se entrincheirar no Palácio do Planalto, cercado apenas por seus seguidores mais ardorosos, preparando-se para o assédio de inimigos imaginários, o presidente queimou as pontes com o resto da sociedade. Se o Congresso quiser derrubá-lo, basta barrar a reforma previdenciária. Ou então aprová-la depois de dizimar suas tropas. O resultado é igual, e o vice não precisa fazer nada para herdar o poder, pois o titular já está fazendo tudo por ele.

Mudando de pato pra ganso: neste país de merda, cenas de puro terror se sucedem sem cessar, e a cada minuto a mídia divulga algo ainda mais tenebroso — na manhã de ontem, por exemplo, dois indivíduos (não tenho adjetivos para qualificá-los) cometeram uma igualmente inominável barbárie numa escola municipal de Suzano, na região metropolitana de São Paulo — quatro horas depois da chacina, o presidente, sempre ativo nas redes sociais, ainda não havia dado um pio sobre o assunto.

Falando em chacina, a tese improvável de a execução de Marielle Franco e seu motorista não ter tido motivação política nem mandante faz a apresentação de novos dois suspeitos parecer uma peça de ficção. Uma versão difícil de engolir, nas palavras de Merval Pereira (clique aqui para mais detalhes). Mas não é só.

STJ pode aproveitar uma janela de oportunidade aberta pelo ministro supremo-divino Gilmar Mendes para tirar o criminoso de Garanhuns da cadeia — a expectativa é a de que a Corte reveja parte da pena imposta no processo do tríplex do Guarujá, o que abriria brecha para a mudança do regime imposto ao petista, afirma a Folha. Paralelamente, o STF ameaça matar, sepultar e jogar uma pá de cal sobre a Lava-Jato, transformando em simples crime eleitoral  (caixa dois) as rapinagens cometidas políticos larápios. Ainda que o caso sub examine envolva os ex-prefeito do Rio de Janeiro Eduardo Paes e o deputado federal Pedro Paulo, a decisão pode favorecer Mantega, Dilma, Temer e um sem-número de outros picaretas. É o fim da picada.

Falando em fim da picada, fala-se que Lula anda deprimido, tadinho. Familiares, amigos e advogados receiam que essa melancolia evolua para algo mais grave e crônico. Segundo O Antagonista ouviu de alguém que visita o molusco abjeto regularmente, ele montou um altar com imagens de santos (um buda, um orixá, um crucifixo, etc.) e, de normalmente brincalhão, passou a meditabundo e retraído. Talvez porque a prisão, que o privou da cachaça e da roubalheira, agora o leva a deixar também as piadinhas de lado.

Que Deus nos ajude.

Falando em Deus nos ajude, O Supremo adiou para esta quinta-feira a conclusão do julgamento sobre a competência da Justiça Eleitoral para conduzir inquéritos de políticos investigados na Lava-Jato. Até o momento, o placar está em 2 votos a 1 a favor do envio das acusações para a Justiça Eleitoral quando envolverem simultaneamente caixa 2 de campanha e outros crimes comuns, como corrupção e lavagem de dinheiro. Faltam os votos de oito ministros.

ATUALIZAÇÃO (17h30): A ministra Rosa Weber, atual presidente do TSE, votou contra a competência da Justiça Eleitoral para investigar casos de corrupção quando envolverem simultaneamente caixa 2 de campanha e outros crimes comuns, como corrupção e lavagem de dinheiro. Com o voto da ministra, o placar do julgamento está em 3 votos a 2 a favor da competência da Justiça Federal. Até o momento, os ministros Marco Aurélio e Alexandre de Moraes votaram pela competência da Justiça Eleitoral. Luís Roberto Barroso e Edson Fachin entenderam que os casos de crimes conexos devem ser julgados pela Justiça Federal.