quinta-feira, 19 de setembro de 2019

E VIVA O POVO BRASILEIRO!


Na avaliação do ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, 80% do gasto público tem a ver com o funcionalismo público e a Previdência. Os investimentos públicos giram em torno de 1% do PIB, bem aquém, portanto, do pico de 5% alcançado nas últimas décadas.

O Brasil gasta bem mais com funcionalismo do que a maioria dos países do Ocidente. Ainda segundo o economista, parte desse excedente advém do fato de termos 20% de participação de empregos públicos no total de empregos do país, um total relativamente alto se comparado com a média dos demais países. Sem mencionar que os proventos dos servidores públicos superam em cerca de 60% a remuneração paga pela iniciativa privada a assalariados com qualificações semelhantes.

Esse quadro levou o deputado federal Pedro Paulo a apresentar uma PEC que limita o crescimento de despesas obrigatórias, com o acionamento de gatilhos sempre que os gastos passarem de limites predeterminados, podendo chegar a medidas mais drásticas — como a redução temporária da jornada de trabalho — em caso de descontrole grave, até que volte o equilíbrio.

Segundo o parlamentar, o Estado brasileiro quebrou há algum tempo: Litteris: "Já quebramos todas as metas fiscais, e estamos a caminho de quebrar as que restam, com o teto de gastos". Para ele, o cerne da questão são o tamanho e o descontrole da despesa obrigatória e a enorme rigidez orçamentária. A solução, portanto, seria conter crescimento exponencial dos gastos públicos, em especial os obrigatórios, que consomem 96% do orçamento.

Na contramão dessa história, o Congresso quer engordar sua quota-parte no já minguado Erário, aumentando o aumento do Fundo Eleitoral para R$ 3,7 bilhões. Durante o serão que fizeram na noite do último dia 3, os parlamentares aprovaram (por 263 votos contra 144) um projeto que permite, entre outras barbaridades, o uso de verbas do fundo partidário — dinheiro seu, meu, nosso — no pagamento de advogados para políticos encrencados com a lei. Ou seja, o partido vai filiar o picareta, ele mesmo patrocinará a corrupção, ele mesmo fornecerá o advogado. Entidades de combate à corrupção, como a Transparência Partidária, fizeram estudos e divulgaram um documento alertando para os prejuízos que esse projeto pode trazer (que eu não vou detalhar porque meu estoque de Plasil acabou).

Atualização: Alguns pontos polêmicos do projeto foram suprimidos pelo Senado, mas reinseridos pelos nobres deputados na noite passada. Entre os pontos que voltaram ao texto estão a autorização para usar recursos públicos para a construção de sede partidária, a contratação de advogados para defender filiados investigados e a anistia a multas eleitorais, além da volta do tempo de propaganda partidária em rádio e TV. As maiores divergências recaem sobre a aplicação do dinheiro do Fundo Partidário e do Fundo de Financiamento de Campanha. O texto permite, entre outros, que os recursos financiem compra ou aluguéis de imóveis pelos partidos; contratação de contadores e advogados; e pagamento de juros, multas e débitos eleitorais. Especialistas veem brechas para caixa 2 nas propostas. Para aprovar essa pouca vergonha, os deputados fizeram duas votações. Na primeira, votaram os pontos em que havia concordância com o Senado e que deveriam ser retirados do texto. Foram 252 votos a favor e 150 contra; na segunda, votaram os pontos de discordância com o Senado, ou seja, quais trechos deveriam ser trazidos de volta à medida. Essa votação foi simbólica. Resta saber se e o que nosso indômito Presidente vai vetar e se, depois, a quadrilha não lhe derruba os vetos.

O combate à corrupção também sofre com o projeto, pois retira as contas bancárias dos partidos dos controles da Receita Federal de pessoas politicamente expostas. Autorizar as siglas a utilizar sistemas diferentes para prestação de contas demonstra claramente a intenção de dificultar a fiscalização. Ou haveria outra razão para isso que não impedir a comparação e a verificação mais eficiente das prestações de contas dos partidos políticos?  

Outro ponto da lei que terá consequências diretas e indiretas no controle dos candidatos aptos a concorrer é que eles poderão disputar a eleição sub judice — a avaliação da regularidade da candidatura ocorrerá somente na data da posse. Isso desaguará em inevitáveis disputas judiciais que a Justiça Eleitoral não tem estrutura para julgar com a necessária celeridade.

O resumo da ópera é que esta pobre banânia está sendo trapaceada à luz do dia por aqueles que deveriam representar a sociedade civil. Deputados e senadores, que haviam começado a recuperar sua credibilidade junto à opinião pública liderando o projeto de reformas do Estado, ora põem tudo a perder votando e aprovando, em benefício próprio, medidas de uma imoralidade a toda prova.

Num momento em que o país está literalmente quebrado, chega a ser escandaloso as campanhas eleitorais drenarem quase R$ 4 bilhões dos minguados recursos públicos nas eleições de 2020. Quantos cortes mais terão de ser feitos na Educação, na Saúde, na Segurança e em tantas outras áreas já desassistidas, apenas para que os políticos recebam essa dinheirama toda?