Enquanto ocupou a presidência do STF, a ministra Cármen Lúcia se esquivou de pautar as ADCs que questionam a prisão em segunda
instância por entender que discutir o assunto novamente seria apequenar a Corte.
Mas Toffoli, que a sucedeu no cargo a partir de setembro do ano passado, rendeu-se à insistência do ministro
laxante Marco Aurélio, relator das
tais ações, e pautou-as para 10 de abril de 2019. Depois, a pretexto de atender um pedido da OAB, retirou-as da pauta e adiou o julgamento sine die. Agora, fala-se que o tema será rediscutido ainda este mês, juntamente com a estapafúrdia tese gestada e parida pelo Tribunal, que concede a à defesa de réus delatados o direito de apresentar suas razões finais depois dos réus delatores.
A ala garantista na nossa mais alta corte de injustiça quer a volta
da prisão somente após o trânsito em julgado — regra que vigeu no Brasil em 7 dos últimos 77 anos, mais exatamente entre 2009 e 2016. O atual
mestre de cerimônia do cirquinho supremo, que posa de conciliador, sugere a
condenação em terceira instância como marco inicial para cumprimento da pena.
Se a jurisprudência for mudada novamente, haverá impacto no
combate à corrupção como um todo, mas Lula,
que é tido e havido como o maior beneficiário desse retrocesso, já foi
condenado pelo STJ (no caso do tríplex), não havendo, portanto, que
falar em anulação da sentença, pois não havia réus delatores naquele processo.
Por outro lado, sua condenação nas outras ações pode ser retardada: no caso do sítio de Atibaia, por exemplo, que está
grau de recurso no TRF-4 (para quem
não se lembra, a juíza federal Gabriela
Hardt, que substituiu o hoje ministro Sérgio
Moro na 13ª Vara Federal do Paraná
até a efetivação do juiz Luiz Antônio
Bonat, condenou o safardana a 12 anos e 11 meses de prisão), havia réus
delatores e delatados, e portanto pode retornar à fase das alegações finais.
Cristiano Zanin e
companhia, que já interpuseram mais de uma centena de recursos no caso do
tríplex, agora apostam suas fichas no reconhecimento da parcialidade do então
juiz Sérgio Moro, que teria agido de
caso pensado, pois aceitou ser ministro da Justiça o governo de Bolsonaro. O
argumento não para em pé, mas o "animus
condenandi" de alguns maugistrados
supremos os leva até a validar as mensagens roubadas por Vermelho e seu bando, embora sejam imprestáveis como prova.
Em tese, o que não está nos autos não existe para o decisor,
mas a Vaza-Jato pode, sim, ter
efeito na decisão do STF, já que as
revelações midiáticas causaram prejuízos à imagem dos procuradores. Como é Moro que está em questão, é difícil que
um argumento tão frágil tenha potencial para anular uma condenação que
sobreviveu ao escrutínio de suas instâncias recursais (TRF-4 e STJ). Mas no
meio do caminho tem uma pedra — a famosa maritaca
de Diamantino, na impagável definição de Augusto Nunes. Então, se a tese estapafúrdia da defesa prosperar, o
cefalópode petista não precisará nascer de novo para deixar a prisão pela porta
da frente, exibindo o atestado supremo de que foi realmente perseguido e
injustiçado. E é por isso que ele rejeita o regime semiaberto.
A progressão de regime é uma regalia que nossa bizarra Lei
de Execuções Penais garante aos condenados que cumprem uma fração da pena (isso
varia conforme o tipo de delito que motivou a condenação) e apresentem
"bom comportamento carcerário" (há outras condições pessoais, como no
caso de mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas
com deficiência, por exemplo, mas isso não vem ao caso).
Para crimes especiais, a lei pode exigir requisitos
específicos. No caso de delitos praticados contra a Administração Pública, por
exemplo, reza o art. 33, § 4º, do Código Penal: “O condenado por crime contra a
administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena
condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do
ilícito praticado, com os acréscimos legais. ”Ou seja, aquele que comete
delitos dessa natureza só progride de regime se, além de satisfazer os
requisitos anteriores, também ressarce o dano causado ou devolve tudo que
lucrou com o ilícito.
Lula já teria atendido o requisitos
temporal e de bom comportamento carcerário, mas estaria impedindo de progredir
de regime por não satisfazer o pressuposto retrocitado. Como foi condenado por crime de corrupção passiva — delito
previsto no Título XI do Código Penal,
que elenca as infrações penais contra a
Administração Pública —, o petista tem de reparar os danos para passar do
regime fechado para o semiaberto. Aliás, a própria sentença condenatória previu
expressamente essa condicionante nos seguintes termos: “Considerando as regras do art. 33 do Código Penal, fixo o regime
fechado para o início de cumprimento da pena. A progressão de regime fica, em
princípio, condicionada à reparação do dano no termos do art. 33, §4o, do CP.”
E tanto o TRF-4 quanto o STJ mantiveram a decisão de primeira
instância nesse sentido.
O valor fixado pelo STJ
como “produto do crime” foi de R$ 2.424.991, que deverá, segundo
trecho não modificado da sentença, ser “corrigido monetariamente e agregado de 0,5% de juros simples ao mês a
partir de 10/12/2009”. Demais disso, a corte entendeu que os valores
decorrentes da venda do imóvel não podem ser abatidos da indenização mínima a
ser paga pelo condenado.
Atendidos todos esses pressupostos, Lula teria direito ao regime semiaberto, que em Curitiba é cumprido
na Colônia Penal Agrícola do Complexo de
Piraquara. Não havendo vaga, a defesa pode pleitear o regime semiaberto harmonizado, no qual o apenado permanece fora da
colônia penal, mas monitorado por tornozeleira eletrônica. A nenhum condenado
da Lava-Jato no Paraná foi concedida
a transferência direta do regime fechado para a prisão domiciliar, mas Lula é Lula, e Lula manda e desmanda no STF,
onde nada menos que sete ministros foram nomeados por ele ou por sua nefasta
sucessora.